Liberdade acadêmica e o direito de aprender em um ambiente seguro
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Sobre este e-book
A obra investiga os limites à liberdade acadêmica para se garantir um espaço de aprendizado livre de ofensas e/ou de advocacia política e terá como resposta a defesa um sentido robusto de liberdade acadêmica. Ou seja, de que a liberdade acadêmica não se compadece com a censura e que qualquer restrição só deve ocorrer em situações extremas de silenciamento e de boicote ao debate público que deve caracterizá-la, mesmo quando se trate de temas sensíveis e capazes de gerar desconfortos. É que alguns temas, por si só, incomodam, intimidam e afugentam, mas tal fato não deve aniquilar o debate e a liberdade acadêmica, mas, sim, prestigiá-los, demandando estratégias de inclusão e participação e não o contrário. Eis o fio que conduzirá o/a Leitor(a).
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Liberdade acadêmica e o direito de aprender em um ambiente seguro - Igor Pires Gomes da Costa
CAPÍTULO 1 - O ENIGMA DA LIBERDADE ACADÊMICA
O primeiro capítulo é um enorme desafio: expor o que se entende por uma liberdade que sofre constantes evoluções, é dotada de várias dimensões, possui diferentes modelos.
O primeiro passo importante é o de diferenciar a liberdade acadêmica das demais, especialmente a de expressão, o que será feito no tópico 1.1. Para tanto, será visto que a liberdade acadêmica é dotada de parâmetros e responsabilidades próprias, especialmente em razão do que se espera daqueles a quem a proteção desta liberdade é dirigida em um Estado Democrático de Direito. Tal quadro a conecta mais a um dever coletivo, que envolve educação e democracia, do que a uma espécie de direito individual, ainda que qualificado.
Apesar de o primeiro tópico fornecer uma visão panorâmica, o aprofundamento dos estudos sobre a liberdade acadêmica vai mostrar que as tentativas de conceituação encontram dificuldades, principalmente porque a liberdade acadêmica possui diferentes camadas.
Sendo assim, propõe-se, no tópico 1.2, o estudo destas dimensões, mais precisamente a relacionada à dimensão individual (1.2.1), institucional (1.2.2) e extramuros (1.2.3).
Ao longo dos subtópicos retrocitados, será visto que as dimensões da liberdade acadêmica revelam a existência de um manto de proteção especialmente confeccionado para resguardar os acadêmicos, excluindo os demais membros da sociedade.
Sendo natural o surgimento de questionamentos, o tópico 1.3 se ocupará de analisar as justificativas para se garantir a liberdade acadêmica em todas as suas dimensões, seguindo a mesma estrutura: dimensão individual (1.3.1), institucional (1.2.2) e extramuros (1.2.3).
Algumas dessas justificativas necessariamente levarão a choques entre as dimensões. A forma como os conflitos serão resolvidos vai variar segundo o modelo adotado por um determinado país. O mesmo ocorre com o grau de proteção necessário para não permitir interferências externas.
Diante de tal cenário, sem a pretensão de explorar todos os modelos existentes e tampouco esgotar a complexidade dos escolhidos, o tópico 1.4 tem por objetivo apresentar as escolas britânica (1.4.1), alemã (1.4.2), estadunidense (1.4.3) para, enfim, chegar ao modelo brasileiro (1.4.4).
Deve ser ressaltado que a evolução histórica da liberdade acadêmica de cada um desses modelos exigiria um trabalho próprio que não se revela na proposta deste livro. O estudo dos diferentes modelos fornecerá uma visão geral que apenas apontará fatos históricos marcantes para a formação de cada escola.
1.1 LIBERDADE INDIVIDUAL OU COLETIVA? IMPORTANTE PARA AS UNIVERSIDADES, IMPRESCINDÍVEL PARA A DEMOCRACIA
Durante a última corrida presidencial brasileira, ações policiais e decisões judiciais, pretensamente fundadas no art. 37 da Lei n. 9.504/1997³, realizadas em diversas Universidades, obrigaram a retirada de faixas com propagandas eleitorais ou de cunho político e ensejaram a propositura de Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 548/DF⁴) pelo Ministério Público Federal visando garantir, em suma, a liberdade acadêmica⁵.
A relatora dessa decisão, Ministra Cármen Lúcia, seguida pela unanimidade do Supremo Tribunal Federal, votou no sentido de proibir o ingresso de agentes públicos em universidades para recolher documentos ou de qualquer maneira impedir os debates ou manifestações nos ambientes universitários.
Em que pese o acerto dessa decisão, deve ser destacado que a liberdade acadêmica foi tratada como uma espécie qualificada de liberdade de manifestação e pensamento e não de forma autônoma, com seus próprios fundamentos e especificidades. Tal confusão pode ser facilmente compreendida pela peculiar dificuldade em conceituar e justificar a liberdade acadêmica.
Com efeito, a decisão abordou a liberdade acadêmica como uma simples decorrência da liberdade de expressão e, de forma ainda mais geral, de todas as formas de manifestação da liberdade
⁶.
Não à toa, o principal fundamento adotado foi o disposto nos incisos IV, IX e XVI do art. 5º da Constituição da República⁷: as decisões judiciais e as ações policiais questionadas na ação, além de não encontrarem respaldo no previsto no art. 37 da Lei nº 9.504/97, representavam atos de autoritarismo, que é a providência sem causa jurídica adequada e fundamentada nos princípios constitucionais e legais vigentes
⁸, destacando-se a livre manifestação.
As normas constitucionais pertinentes à autonomia universitária e à liberdade acadêmica foram, então, apenas referidas ao final da decisão e, ainda assim, em conjunto com os direitos à liberdade de expressão, de pensamento, de informar-se, de informar e de ser informado. Assim, o conjunto desses direitos seria capaz de assegurar espaços para a libertação das pessoas, das ideias e para o florescimento de teorias acerca da compreensão do