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Verdadeiros Poemas De Bosta Satânica
Verdadeiros Poemas De Bosta Satânica
Verdadeiros Poemas De Bosta Satânica
E-book808 páginas3 horas

Verdadeiros Poemas De Bosta Satânica

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Sobre este e-book

No dizer diretamente funda-se a poesia simples, como aqui é expressa, com a sua estética sem adornos de ostentação de profundidade intelectual e sem regras, considerando-se que também o Mistério não tem regras. Ademais, esta poesia de corpo simples, muitas vezes quase monossilábica, pode em razão disso indicar pouco apuramento com sua percepção da natureza humana fragmentada no finito, mas reitero que tal poesia fundamenta sua estética no dizer direto ao coração. Não menos que isto a sua tenção.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento3 de jul. de 2020
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    Verdadeiros Poemas De Bosta Satânica - Marcus Gabriello

    Nota

    Um capeta pensativo, absorto, sentado num tronco de árvore seco, olhos fixos, perdidos além, dirigidos para o chão; na mão esquerda aprumado um tridente, na direita, palma aberta, do humano o crânio ressequido. Um verdadeiro capeta a mergulhar em vão no inferno do Mistério. Essa a capa das delícias horrorosas que exponho ao Leitor.

    02.01.99

    O paraíso terrestre um shopping cheio de luzes, colorido, onde minha sombra se apaga e meu corpo se reflete mergulhado no fundo do piso vitrificado percorrido sob pés de vaidosos desfiles de belas belezas.

    02.01.99

    Mistério é mais do que o impenetrável ao conhecimento. Mistério é projeção da inefável certeza que toma o mundo de consciências imanentes na morte e no tempo como princípio em direção a um fim não definível e não atingível entre os limites de aparecimento e ida. O Mistério é a totalidade ante o discurso singular não atingida no calabouço das palavras. É o saber da voz muda que a si mesma se projeta no fundo escuro do silêncio profundo em razão de ela ser, apenas ser, sedento ser. Assim entendido o Mistério, reina ele em obscuras regiões do espírito que desafiam apertadas paredes de ser no mundo. Desafio ante a morte. Desafio ante o tempo. Projeção para além do bem e do mal: nossas criações de pés na terra.

    02.01.99

    Que o mundo

    De luz

    É uma cápsula fechada

    Vagando

    No Universo

    Negro

    E cintilante:

    Trêmulo crepitar

    Assopro da boca do fogo

    Tremeluz

    Na duração do seu lampejo

    Aqui

    Lucilante fagulha

    Apagada nas alturas

    De coisas que mudo

    O verbo não alcança

    Êxtase de descoberta

    Aqui

    Não ocorrente.

    08.12.99

    Violeta

    Do sinuoso cálice de sol

    Aberto sorriso

    Das torneadas membranas

    De luz

    Restou seco enegrecido empalhado graveto

    Como sebo de carne decomposta

    Encrostado em torno de um osso.

    17.10.2018

    INTRODUÇÃO

    Posto que pareça confuso este gesto inicial, há nele um dizer de palavras. Vã a palavra e vão mais ainda o sentido que nela cabe. Mas não assim, pois que à procura do ideal o sonho se mergulha em si mesmo. E o fato, bem o entendes, é pouco. O fato. O fato do mundo. Apenas isto. Não apenas um fato contemplado nas tecnológicas religiões de mundo e consumo da mesma forma que contempla do deus a face aquele de todo aqui por essas coisas possuído. Não. O humano é mais do que ele aparenta ser com suas pinceladas de inteiro poder para pouca a imagem qu’ele consegue pintar no passo a passo de mundano, e delimitado, percorrer. Sabes o que absolutamente te contém? No que me concerne eu não o sei. Por isso nestas páginas algumas palavras de rompimento. Rompo com o mundo porque o mundo é pouco para mim com os seus fatos prevalecentes, às vezes insuportáveis. Não suportado o fato, pintamos no mundo o paraíso nosso de formas várias, embora ele possa acabar ali na próxima esquina porque mínima dentro da totalidade do fato uma simples decisão nossa ou de outro, atenta ou não, desgraçadamente mudou-nos a sorte no mundo. É tamanha nossa sujeição ao todo-poderoso fato que nossa felicidade ou infelicidade nada significam perante o peso do seu domínio que nos empurra para rumos que mal poderíamos imaginar. Não é meu pessimismo, pois o ruim não é absoluto para a vida desejada no cristal pulsátil do coração recheado de sangue. Não é também demasiado realismo, porquanto a realidade, em face do maior sonho que somos nós, é cerração qu’encobre as cores da primeira manhã da nossa origem, quer sejamos aqui perfeitos ou imperfeitos. De impessoal humano pronome se, indeterminado, sem a específica, e muitas vezes exigida, determinação de transparência e positiva realidade, surgem os primeiros passos de real dúvida que mais nutre nos humanos sua humanidade sem preconcebidas verdades de inteiras violências: o primeiro passo para o sentido afago consiste na suspensão de pré-conceitos que totalmente definem, acabados, a imperfeição da qual eles fogem com a sua perfeita disposição de fatos feitos e inteiros. Mas não se trata disto somente. O que se patenteia é que maior o sentimento, menor o não-existir de coisas singelas, qual uma tela de girassol de Gogh pendurada na parede do seu quarto, ele ao lado fumando cachimbo sentado na cadeira de palha, ali sozinho. Parto do seguinte princípio: a totalidade das coisas reside justamente no próprio mundo por descobrir abundante a seiva mundana, infinito o Mistério nos humanos, juntos, disjuntos, eis um fato, eis o problema. Sem mais digressões, apresento ao leitor uns novíssimos Verdadeiros Poemas de Bosta Satânica. Por que bosta? Por que satânica? Tanto gosto das minhas bostas que as defecações que faço ao menos para mim são reservas de alimento. E de Satanás tanto eu gostar que somente Nele e a partir Dele em mim Deus se revela, assim creio. Ser eu mais um desses bajuladores de Deus que intentam mostrar a verdade para criar em torno de si uma corrente de seguidores que nutrem verdes notas embolsadas atestantes do valor da Totalidade é mesmo impensável. Sou um pobre infeliz aqui no mundo e meus também pobres Verdadeiros Poemas de Bosta Satânica são apenas desafogos do autor. Por último devo acrescentar que a temporal e finita poesia que busca incansavelmente o âmago da misteriosa natureza humana já pulsa viva no núcleo do sol com sua simplicidade que sugere ao leitor sensível e receptivo alguns estreitos caminhos que ele pode utilizar para atingir o pasmo da abertura filosófica à vida de tempo e morte. No dizer diretamente funda-se a poesia simples, como aqui é expressa, com a sua estética sem adornos de ostentação de profundidade intelectual e sem regras, considerando-se que também o Mistério não tem regras. Ademais, esta poesia de corpo simples, muitas vezes quase monossilábica, pode em razão disso indicar pouco apuramento com sua percepção da natureza humana fragmentada no finito, mas reitero que tal poesia fundamenta sua estética no dizer direto ao coração. Não menos que isto a sua tenção.

    18.12.98

    PRIMEIRO CADERNO

    Prólogo

    Inventar

    E escrever

    É quase como

    Cagar

    E não limpar.

    Foda-se.

    Isso é bosta.

    E tão bosta

    Que a bosta

    De verdadeiros poemas

    Satânica

    É bosta simplesmente.

    Foda-se.

    Apenas bosta satânica

    De restos feita

    Verdades Mentiras

    Digeridas

    Deuses Demônios

    Vividos

    Realidades Ilusões

    Do coração

    Ao estômago

    Deuses Demônios

    Verdades Mentiras

    Realidades Ilusões

    Fluxo da vivida

    Respiração

    Do nascimento à partida

    Entre a vida e a morte

    De pulmões carnais que

    Inspiram expelem

    Inspiram expelem

    Inspiram expelem

    Os deuses os demônios

    De suas fundadas

    Alegrias tristezas

    Certezas incertezas

    E no fim

    Quem vence

    É derrotado:

    Apaga-se a chama

    De uma vela sob um sol

    Pontilhado

    Perdido

    No universo negro

    Sem cores.

    Única certeza

    E alegria

    O prazer de respirar

    O instante

    De cores criadas

    Pelos deuses que se é

    Contra o negror

    Sem cores

    Do demônio que se não é

    Vela

    A chama

    Sob pontilhado sol

    Estampado

    Perdido

    Em negro universo

    Que recolhe todas as coisas

    Em seu estômago faminto

    Sem cores

    Sem esperança

    Sem desesperança

    Única certeza

    Que tudo é e não é

    Quando último o bafejo

    De vida

    No porto da partida

    Leva o barco

    Ao Indefinível Oceano

    Claras certezas

    Claras incertezas

    Mergulhadas no abismo

    Das Incógnitas Sombras:

    O maior medo não reside

    Em saber

    Ou não saber,

    Mas em sermos definidos

    Por aquilo

    Que não podemos

    Definir.

    O medo humano absoluto

    Reside no ser-se possuído

    Pela escuridão

    Que o entendimento

    Não domina.

    Impotente

    Resta-lhe a entrega

    Da vida à Morte Suma

    Da partida.

    Gostoso viver caminhar

    Sobre o fio da navalha

    Saber

    Que a morte

    Dissipa

    Tudo o que se espera

    Tudo o que não se espera

    Para tornar-se grande

    O sentimento

    De sermos pequenos acima de nossos

    Pequenos deuses pequenos demônios

    E crescer ind’aqui agora

    O anseio pelo infinito.

    24.12.97

    ***

    Sonho

    Todo o sonho

    De uma vida

    É um grito de despedida

    Ao encontro

    De uma lua embalada

    Por mariposas.

    O fato de viver não é solar:

    É noturno e crepuscular.

    Quando a noite morre

    E o sol começa a brotar despontar

    O único refúgio da nossa alma

    São as lembranças que guardamos

    De nossos beijos nos lábios da lua.

    O sol queima nossa pele.

    24.12.97

    ***

    A arte de viver

    É viver a sorte

    De estar

    Sem ser

    Na pura sorte sede

    De procurar ser

    O que é o ser

    Na sorte de

    Estar viver.

    24.12.97

    ***

    O beijo das carnes

    Há um beijo salivoso

    De brilho

    E contemplação

    No primeiro olhar

    Mútuo

    De seres que se cruzam

    Encontrados

    De extremos opostos

    Da distância

    Não mais separados

    No primeiro olhar que mata

    O vazio da solidão:

    Espera do encontro

    Que não chega.

    Que estranho o Destino o Acaso

    Em duas naturezas que s’encontram

    No mundo a sombra do Mistério

    Não sabermos que rumos

    Para nós se traçam

    De encontros e desencontros

    Quando súbito a surpresa

    Desce do céu

    O anjo

    Com espada de flamas

    Acalenta e acalora

    O coração triste e frio

    Cirze-o rasgado;

    Que estranho o Destino o Acaso

    Inesperadamente mostra-se

    A face de luz e salvação

    No seio do inferno!

    Ah vida!

    Porque és surpresa e revelação

    Todos os infelizes

    Podem contar

    Em sua desesperança

    E aflição

    Com o seu manto de estrelas

    A envolver a iluminar

    A perdição que grassa

    Na Terra

    De escuridão;

    Porque és tão e tão

    Transcendente

    Ensinas a uma dolorosa

    Lágrima imanente

    Que suas dores eram pequenas

    Ante a grandeza que ela agora sente

    De ser mais e mais

    Do que ela fora descrente

    No nada de su’alma de penas.

    Quando duas carnes se beijam

    Na troca mútua de lábios

    Entre si entregues e apaixonados

    A saliva trocada mata

    O espectro da morte.

    No outro dia

    Há um bebê bonito

    A sorrir em seus braços

    De contemplação embalado.

    Esse o ideal.

    26.12.97

    ***

    Para mim

    O coração da poesia

    Resume-se em sofrer o desalento

    Ante a real finitude

    Acalentado pelo sonho que pulsa

    À espera do real e verdadeiro

    Que não sofra o beijo

    Do tempo.

    Para mim

    O coração da poesia

    É grito de desfalecimento

    Ante a essência do sonho

    Não alcançada pela voz

    Que se conforta em cantar.

    Para mim

    O coração da poesia

    Busca a eternidade

    No ser frágil

    Que ele é

    Num mundo de morte

    Que não lhe permite viver

    Como ele queria.

    Para mim

    O coração da poesia

    Sente seu sangue vazado

    E tinge de vermelho

    A face do Deus

    Que o criou

    E não lhe respondeu.

    Para mim

    O coração da poesia 

    Vive o movimento

    De dias e noites

    Que se alternam indiferentes

    Aos corações que batem, gemem e sentem

    E choram de saudade e sorriem e cantam

    Até recolher-se o choro da saudade

    E também o canto da alegria

    E tudo misturar-se num só canto

    De cinzas e restos no canto

    De um túmulo.

    Para mim

    O coração da poesia

    É choro da morte

    A cantar

    As coisas belas e feias

    Do tempo.

    26.12.97

    ***

    Poetastros negócios

    O verdadeiro poeta é aquele

    Que da sua mesa de gerente

    Telefona para Deus

    E mata a morte

    E resolve o negócio.

    26.12.97

    ***

    A arte e o tédio (fragmentos)

    Para alguns

    Somente isto

    Dá sentido

    À vida:

    Arte.

    Nem consegui reproduzir

    E não sei

    Se faço

    A arte que julgo

    Às vezes fazer.

    Arte

    O argumento

    Que uso

    Para usar

    O tédio

    Que me usa

    E dele me libertar

    No instante

    De imaginar-me

    Ser

    Vivo e total.

    Tédio 

    Cansaço do

    Amarás teu próximo

    Como a ti mesmo

    Da mesmice

    Do mesmo

    No mesmo do

    Amor

    E valor

    Que não devem

    Morrer

    Em nome

    Das perfeitas

    Coisas

    Coisas

    Coisas:

    A Perfeição

    E o Infinito

    São coisas

    No coração

    Do tédio que vê

    Repetição

    Em toda a boa nova

    Que o mundo pode

    Revelar

    A novidade

    A novidade

    A triste novidade

    Que não mais

    Encanta

    Os olhos

    Cansados

    De novidades

    Tanto

    Que o mundo

    Tão cheio

    De formas

    Novas

    Perdeu a graça:

    Tão feliz sou

    No âmago

    Da graça

    De carcaças

    Cá criadas

    Que morro de desgraça

    A desejar

    Uma verdadeira

    Desgraça

    Dessas

    Que deveras remotas

    E impossíveis

    Façam-me sentir

    Que sou mais

    Do que sou

    E me salvem

    Lá onde

    Aqui

    Jamais

    Poderia eu

    Salvar-me.

    O tédio um clamor

    De cansaço contra

    A perfeita

    Humanidade

    Que não sou

    Na qual estou.

    Somente isto 

    Dá sentido

    À vida de alguns

    Cansados:

    A arte

    De manifestar

    O desencontro

    No paraíso

    Dos encontros.

    Arte a

    Indefinição

    Tornada obra

    Que define

    O sonho

    De atingir-se

    Nos outros

    Que não nos deixam

    Morrer.

    O Deus-Artista

    Modelo

    Da minha

    Fantasia e euforia

    O tédio...

    Ah! que é o tédio

    Senão o rastejar

    Na praia escaldante

    Como lagarto

    E sentir

    Que minha oceânica

    Amada

    Oferece seus lábios e braços abraços

    De infinitas águas

    A desejar e sorver e tragar envolver

    Aquele outro

    Que a conquistou

    E que não sou?!

    Arte é arte

    No tédio

    Dos desencontros

    Singulares

    Imersos em sombras

    De universalidade

    Que permeiam

    Os sonhos

    Dos perdidos.

    Vai assim a vida

    Como a prometer

    Um dia melhor

    No céu noturno

    De Gogh.

    03.01.98

    ***

    Escorpiões

    O beijo do escorpião

    Nos lábios da barata

    Meter o ferrão

    Nos seus intestinos

    Sugar-lhe

    A seiva de vida:

    O humano poder

    Não tem ferrão

    Mas inocula anestésico

    Tem próprio espírito

    Que não suga

    S’infiltra nos poros vazios

    De perdidas existências

    No chão

    Que se erguem e descobrem

    Um novo mundo

    De salvação!

    De salvação! mas preciso é

    Que paguem a entrada

    No pórtico do templo

    A décima parte

    Do salário de suor recompensada

    Com lágrimas de emoção

    Em nome de Deus

    Tão pessoalmente humano

    Que falta Ele se revirar

    No céu incomodado

    Com seus representantes

    Abonados por histórico

    Evangelho montado

    Padres e pastores

    Que Lhe tomaram a voz e o lugar

    No terreno metafísico supermercado da fé.

    Padres e pastores agradecem

    Alguns pederastas pedófilos

    Cornos irreduzíveis uns outros

    Que na mansão de luxo adquirida

    Ou sob os auspícios do conforto papal

    Multiplicam o capital

    Em ofertando às baratas um ideal

    Tudo sobre um palco de festival

    Armado por aqueles

    Que em benefício próprio

    Buscam dedetizar o mundo

    Livrá-lo de improfícuas descrenças:

    Os escorpiões salvam

    Do esgoto as baratas

    E Deus sofre

    Pela alma de cada um

    Que não soube encontrá-lO

    Por meios nenhuns

    Senão respirá-lO

    No peido duns bumbuns

    Prepotentes salvadores

    Retumbantes vozeadores

    Sociedades Anônimas

    De excrescentes apropriadores

    Revestidos do sagrado manto

    Da Verdade

    Sobre o fino terno de empreendedores.

    03.01.98

    ***

    Imaginação

    Varado

    No coração

    Sob os pés da sua dama

    Imagina-se o ser

    Bailando além lá

    E dançante

    Faz do baile

    A sinfonia

    Que ela não ouviu.

    Assim vão

    Os passos da dança

    De pés que percorrem

    O chão de andança

    Sob as tranças

    Da amada

    Perdido

    O amante

    Em fios retorcidos

    Emaranhados

    Fios do seu amor.

    Que coisa essa coisa

    Barram as grades

    O vôo do pássaro

    Que pena!

    E penas

    E penas

    No ar volitando

    Estourado o corpo

    Estampido sonoro chumbo

    A resposta

    A pólvora

    Ardente

    Espingarda

    E fumaça

    E quente!

    Assim vai o ser

    Que aí está

    Sem saber

    Por que então!

    Por que então ser

    Na explosão

    Que nos dilacera

    O coração?!

    Pois vai,

    Já que procuras

    E tudo o que almejares

    É quimera em teu

    Absurdo sonho

    Devorado

    Nos pesadelos

    Da ave noturna.

    Voa

    Voa

    Açoite!

    Em tuas asas 

    Podadas

    Para o chão

    De teus pés

    De andarilho

    Na terra crua.

    De qualquer forma

    Aí está

    O que não soubeste alcançar

    E o que alcanças

    É o som

    Ecoante

    Do teu falar:

    Dama, abateste o pássaro

    E quem sou eu

    Abatido

    Para definir

    Teu dizer?

    Portanto vamos nós

    À procura de mais

    E quem sabe ali esteja

    O que antes não havia.

    E vamos nós!

    Vamos nós

    Não importa aonde

    Em qualquer lugar

    Volto aqui

    A encontrar-me

    Com vagos sentidos

    De coisas no mundo

    Construído

    Mas nuas e cruas

    Palavras não bastam

    E geme o sentimento

    A pulsar

    No coração

    Um moinho de aflição.

    Quem pode vai além

    Como as coisas

    A fluir

    Na correnteza do rio

    Que é e não é.

    Seres tu para quê?!

    Não és ser no ser

    Em que pretendias ser,

    Portanto vou além

    Como aquém não bastasse

    E tudo o que sou

    É o ser

    Que não sou,

    Que fazer?! que fazer?!

    Prossigo mundo adentro

    À procura de salvação

    Acabar em suas margens

    De areias com sereias

    Que m’encantam co’o seu canto

    A mim que procuro um canto

    Para ali permanecer 

    E salvar-me da tempestade 

    Do deserto reinante

    No útero da minha concepção:

    Sei de tudo

    Sei de tudo tanto quanto

    O espermatozóide sabe

    Que come o óvulo.

    Palavras!

    Palavras!

    Que fazem as palavras

    A não ser construir

    Casas de definição

    Por aí definindo

    Coisas e coisas

    E digo apenas

    Que isto é o que é.

    Acendo mais um cigarro.

    Mais um gole de cerveja.

    Ouço Bilhetinho Azul

    Do meu amado

    Cazuza:

    Minh’amada Baby foi-se embora pra Bahia:

    Seu amor por mim

    Foi engano

    Meu.

    13.01.98

    ***

    Amor

    Passio

    Paixão

    Padecer

    Sofrer

    Padecer com

    Sofrer com

    Com-paixão

    O amor

    Que nasce

    Da união

    De seres

    Que compassivos

    Desejam salvar da dor

    O seu outro

    Dele a dor

    Sua tornada viva

    Dele a morte

    Sua vivida

    Nele a existência sua

    Externada e afirmada

    Seres recíprocos

    Um com o outro

    Que padecem com

    O padecimento do outro

    E salvam-se um no outro

    Unidos

    E a alegria

    Que brota do amor

    É o sorriso cândido

    De faces que se miram

    No núcleo

    De aconchego

    De afastada morte

    Nas coisas do dia

    Vividas

    Entre afetos 

    E desafetos,

    Nuvens vadias

    Que passam

    Sob o sol

    Da vida

    Repartida.

    Aquele há, no entanto,

    Só no cômodo

    Sob a lâmpada acesa,

    Que no fundo do espelho

    A si mesmo se encontra

    No acariciar

    Narcíseo

    O próprio corpo

    E alma

    Em autocontemplação

    Que se ama e odeia

    O amor

    Dos amantes

    Acompanhados,

    Que sob a luz da manhã

    Afagados pela brisa

    Contemplam-se

    No fundo do espelho das retinas

    Do seu outro e estranham

    Solitário o amor

    Do amante

    Desacompanhado:

    O desespero

    Dos amantes

    Reside na solidão

    De acordar no outro dia

    Ao seu lado

    Vazio e nu

    O leito invadido

    Pela névoa fria

    Ou estilhaçado o espelho

    No cômodo escuro

    Sem autocontemplação.

    No final de todos os caminhos

    De sol e de chuva

    De brisa e de vento frio

    Resta ao amante,

    Estrela fria que arde reduzida,

    O padecer consigo, retraído,

    Retirado ao berço de dor

    Que cada um tem

    Sobrevivente.

    17.01.98 (sábado)

    ***

    Vida

    Coisa estranha:

    Você descobre

    Uma verdade

    Que te sustenta,

    Vive com ela

    E prega

    "Ninguém é obrigado

    A sustentar-se

    Na verdade que me sustenta"

    E se contempla 

    Em sua reconhecida

    Verdade

    Individual

    Contente

    Satisfeito

    Com a universalidade

    Válida

    No teu lar:

    Em mim

    Coca-Cola

    É a verdade tua

    Que bebo

    E mijo,

    Mas você pouco s’importa

    Co’os meus atos

    Que acusam

    A mentira

    Da tua certeza.

    Prevalente

    O valor

    Da tua verdade

    É o valor que usas

    Contra 

    Mentirosas verdades

    Que desafiam

    Teu poder

    De ser

    Que seguro exprime

    "Ele ainda não conhece

    O caminho".

    O que alicerça

    Tua verdade

    Do lar edificado

    É a tua voz

    Que escolhe palavras

    Que servem

    Às tuas próprias

    Necessidades.

    Se você

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