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O Cidadão José Carlos Brasileiro
O Cidadão José Carlos Brasileiro
O Cidadão José Carlos Brasileiro
E-book207 páginas3 horas

O Cidadão José Carlos Brasileiro

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Sobre este e-book

Desde que conheci Brasileiro em 1999 na Secretaria de Estado de Direitos Humanos, onde trabalhamos juntos durante alguns anos, pensei que a sua história daria um livro bem interessante. E isso porque eu sabia muito pouco sobre ele, somente que era um ex-presidiário. Mas dava pra ver que ele era um personagem rico e extremamente espirituoso, cheio de carisma e com um extraordinário senso de humor, o que fazia todo mundo rir a todo instante, pelas situações mais diferentes que surgiam no dia a dia daquela repartição pública tão movimentada e atuante àquela época.

Entretanto, eu não podia imaginar quão rica era a sua história.

A sua trajetória de vida nos apresenta um verdadeiro panorama de todas as facetas que um ser humano pode vivenciar, envolvendo um número tão variado, quanto complexo de pessoas de todas as classes, culturas, níveis de educação e, sobretudo, níveis de consciência.

À medida que ele foi me relatando suas experiências, fui descobrindo um mundo inacreditável de tanta força e crueza, momentos de horror e miséria, como atos de grandeza, sublime espírito de perdão e puro amor. A que níveis de degradação e baixeza se pode chegar e a que graus de tão elevado altruísmo e abnegação pode alçar o espírito humano! Como podem apresentar tão diferentes faces? Como podem cometer atos tão vis e perversos e mesmo assim continuarem entes humanos? E por que outros tantos, sendo tão simples e tendo vivido situações sociais análogas, podem apresentar exemplo de tanta sabedoria e generosidade?

Na verdade, aprendi muito com essa experiência. Aprendi com cada personagem que aparece nas suas narrativas, como nos contatos que tive oportunidade de estabelecer. E o que pude constatar foi que as minhas convicções sobre os Direitos Humanos se reforçaram ainda mais. Pude comprovar o que pode ser mais importante para a nossa compreensão da natureza humana, que é o fato de que cada pessoa está em constante evolução e cada ato que pratica, seja o mais i+A8:T58gnóbil ou abjeto, não lhe tira nem diminui a sua condição humana. Pelo contrário, o habilita a aprender, seja pelo castigo imposto pelas leis, ou pelas conseqüências de suas ações em sua vida pessoal e em toda a sociedade. Vai aprender e vai se transformar. Essa transformação, entretanto, para que se efetue de maneira conduzida e programada, e nesse caso, pelo Sistema Penitenciário, demanda algumas pré-condições. Não será com a tortura, nem com o ódio, mas com educação, cultura, disciplina e respeito humano. Religião também é importante, mas sem fanatismo e sem prejudicar a capacidade de avaliação e crítica isenta da realidade. Tratamento psicológico e assistência social são imprescindíveis e mais adiante capacitação profissional e emprego.

É maravilhoso observar o processo de transformação de um ser humano, emergindo do caos moral a um estado de compreensão de si e de sua condição e partir daí para uma mudança de atitude perante a vida e a sociedade, começando lá de baixo, para se resgatar como cidadão.

Não quero me alongar mais nesta apresentação, mas vale dizer que a lição mais importante de toda essa história é que a que nos passa Dona Celina, como tantas outras sofridas mães– a lição do amor incondicional.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento31 de jul. de 2023
ISBN9788577858743
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    Pré-visualização do livro

    O Cidadão José Carlos Brasileiro - Benedita Maria Vieira de Carvalho

    CAPÍTULO I

    Da adolescência rebelde ao sonho

    de trabalhar na TV Globo

    Chego à sala do Instituto Mandela às 10:50h e ele já me esperava. Estava digitando uma carta à VEP (Vara de Execuções Penais), onde comunicava o desligamento do seu ajudante na ONG, em regime de condicional, por abandono do posto. Enquanto espero, passo os olhos pela sala, modesta, mas bem cuidada. Uma mesa maior, a sua, e mais duas. Um armário de madeira e um de aço, para pastas suspensas. Nas paredes, vários posters: um do Abdias do Nascimento, outro de seminário para discutir as questões dos presídios, outro de campanha pelos direitos dos presos, outro grande sobre a Conferência de Durban contra Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas – realizada em 2001– e um grande retrato de Nelson Mandela, o patrono da ONG– Instituto de Cultura e Consciência Negra Nelson Mandela ­­­– para a qual eu já havia elaborado, em outras épocas, muitos projetos. Na parede de fundo, à esquerda, dois certificados de participante em cerimônia do Ibmec, como palestrante: uma na graduação dos alunos de MBA e CBA em 29/05/2007, e outra na Mostra de Arte no Cárcere do Núcleo de Estudos Criminais da Faculdade de Direito do Ibmec/RJ. À direita, algumas fotos ampliadas e emolduradas: numa ele está com o Reverendo Jack Jacson e o neto do ex-presidente americano John Kennedy; noutra está ao lado de Fernando Henrique Cardoso, nas comemorações do Dia da Consciência Negra, em Brasília, em 2002; noutra com Marcelo Crivella; noutra abraça a apresentadora da BAND, Ana Maria Nascimento Silva e em outra abraça Martinho da Vila, por ocasião do aniversário do embaixador da África do Sul, em 2000.

    Fico agora observando discretamente a sua própria figura e a comparo com o outrora negão alto, forte e vigoroso, com um sorriso fácil, voz rouca, respostas espirituosas que faziam sempre rir o seu interlocutor e, na verdade, era o seu charme, certamente a explicação porque conseguia encantar e conquistar todo mundo, até o mais durão ou o mais emproado. Embora mantenha ainda o espírito altivo, vejo agora um homem alquebrado, muito magro, rosto chupado, andando com o auxílio de uma bengala, consequência de uma recente cirurgia que lhe retirou um tendão da perna direita. Desde que voltou de Durban, em 2001, onde foi com o pessoal da antiga Secretaria de Estado de Direitos Humanos, do Rio de Janeiro, descobriu que estava com diabetes. Chegou tão magro e doente, que muitos pensaram que ele havia se contaminado com o vírus HIV. De lá pra cá, o diabetes tem consumido seu vigor e, depois de algumas internações, a última para a cirurgia que quase lhe amputa o pé inteiro, modificou radicalmente seus hábitos. Deixou de beber e de usar qualquer droga, inclusive o cigarro comum. Entrou para uma igreja evangélica, para alívio e vitória de sua sofrida mãe. Mas sem fanatismos. Adquiriu o hábito de orar, uma maneira de se encontrar consigo mesmo e repassar sua vida.

    Agora ele senta-se à mesa e eu fico à sua frente, para iniciarmos o relato de sua vida. Afasta um pouco um enorme maço de cartas de presos, de todo o Brasil, que ainda tem que responder. Para iniciar, pergunto-lhe:

    – Quando foi a primeira vez que foste preso? E como foi?

    Com voz pausada e rouca, ele começa a falar.

    – A primeira vez que fui preso, na minha vida, mesmo, eu devia ter de quinze a dezesseis anos. Foi por volta de 1972, 73. Eu fazia parte do grupo do Bob´s, da Rua Gen. Roca. Naquela época, tinha os grupos de lanchonetes. Tinha o pessoal da Palheta, na Saenz Peña, tinha o grupo da Rick´s, o do Tijuca Tênis Club. A gente ficava fazendo bagunça, se divertindo. Colocávamos o marshmelow do sorvete nos telefones dos orelhões e ficávamos em frente esperando, só para ver quando alguém pegava o telefone e se lambuzava todo. Era um monte de sacanagem que a gente fazia, mas era coisa leve. A gente se vestia com calça do exército, tênis All Star e camisa Hand Teng. Usávamos umas pulseiras de metal, tipo hippie, com conchinhas. Tinha também as garotinhas. Era um bando alegre, que ficava fazendo bagunça. Tinha os fliperamas e a gente ficava a maior parte do tempo jogando. Falsificávamos as fichas do fliperama com plaquinhas de chumbo, que a gente comprava em lojas de ferragens e moldávamos em cima de uma base de couro de sapateiro. Na primeira vez, fomos levados para a 19ª DP, na Tijuca. Só os garotos. As meninas foram liberadas. Ficamos lá no corredor da delegacia, até que o pai do Encrenca veio nos tirar. O Encrenca era o mais forte do grupo. O pai dele era coronel e todas as vezes que íamos presos, ele vinha nos liberar. Isso aconteceu algumas vezes e o pai do Encrenca sempre nos tirava.

    – E estudar, nada?

    –Não, eu estudava, estudava sim. Eu estudava numa escola pública em frente à Rua Araújo Lima. Estudei também no Instituto Batista Brasileiro na Rua Uruguai. Colégio particular, bacana. Nunca tirei notas altíssimas, mas sempre fiquei acima da média. Em matemática eu era meio ruim... e em ciências também, mas no resto eu me dava bem. Eu tenho o segundo grau completo.

    – E tua infância, foi legal?

    – Foi, foi muito legal. Eu e meu irmão tínhamos tudo. Estudamos em bons colégios, brincamos muito. Éramos muito amigos. Nas férias, a gente ia lá pra casa da Tia Chica, que tinha uma casa de sítio em Santa Anésia, distrito de Barra do Piraí. A gente brincava muito e aprontava um bocado também, em companhia dos nossos primos. Era o primo Getúlio e as primas Giovana e Silvana. Era um tempo muito legal. Uma vez também passamos as férias em Petrópolis e nos hospedamos no Hotel Quitandinha. Foi uma época muito feliz.

    – E teu irmão era comportado ou bagunceiro como tu?

    –Ele fazia as mesmas maluquices que eu. Meu irmão fazia parte da turma do Rick´s. Antes, esses grupos eram rivais, depois que meu irmão entrou, os dois grupos se uniram e barbarizavam naquela área. A gente se divertia muito.

    – Teu pai tinha boas condições financeiras? Em que ele trabalhava?

    – Meu pai era comerciante. Trabalhava com o Sílvio Santos.

    – Então ele era camelô?

    – Sim, mas antigamente era diferente desses camelôs que a gente vê por aí. Ele trabalhava com coisas importadas, coisa fina. Tinha que ter muito conhecimento. Ele levava as mercadorias para empresários, gente de grana, que comprava relógios, canetas, perfumes e outras coisas bacanas. Meu pai tinha uma boa condição. Era um homem muito rígido, mas muito legal. A gente morava na Rua Uruguai, esquina de Conde de Bonfim, num prédio muito bonito. A primeira vez que o Jair Rodrigues veio ao Rio, foi meu pai que foi buscá-lo no aeroporto. A primeira casa que ele entrou no Rio foi a minha. Meu pai era muito legal. Ele se preocupava com a vida que eu e meu irmão levávamos. Por isso, antes de completarmos dezoito anos, ele nos arranjou um emprego. Foi o meu primeiro emprego e com carteira assinada.

    Meu irmão foi para um escritório, como ofice-boy, e eu fui trabalhar numa loja de ferragens, na Rua da Candelária, 83. A.S.Teixeira Ferragens. Eram portugueses. Eu era ajudante de balcão, mas fazia de tudo. A loja trabalhava com construção naval e todo o material era pesado. Eram tubos enormes de metal e coisas grandes. Eu ajudava a carregar os caminhões e saía para as entregas. O seu Noronha pegava muito no meu pé. Toda hora ele me chamava. Quando estava de saco cheio, eu me escondia no almoxarifado para eles pensarem que eu estava fazendo outra coisa. Mas tinha um cara lá que não gostava de mim e era só o seu Noronha começar a me chamar: Cadê o negão, cadê o negão?, pra ele logo me entregar:

    – Tá lá no almoxarifado.

    O seu Noronha gritava:

    – Vambora, negão, que o caminhão vai sair.

    Fiquei lá por quase um ano, quando aconteceu uma desgraça. O motorista do caminhão pediu para fazer uma mudança no fim de semana e o seu Noronha autorizou. Era no morro do Tuiuti e ele me pediu para ir ajudar. Claro que eu aceitei, era pra ganhar uma grana. Fizemos a mudança e, no final da tarde, tinha um bujão de gás da dona do barraco que estava vazando. Eu quis agradar e me prontifiquei a trocar o bujão. Como já estava escuro, coloquei uma vela em cima do fogão, para enxergar melhor o serviço. De repente, começou a sair um fogaréu enorme. Corri para procurar um extintor de incêndio, mas não deu tempo. Antes de eu voltar, o barraco explodiu. Foi um drama. Ninguém morreu, mas a mulher ficou queimada, muita gente ficou queimada. Tivemos que sair do morro correndo, porque o pessoal queria me bater.

    No dia seguinte, o cara contou lá na empresa tudo o que aconteceu e disse que foi por irresponsabilidade minha que o barraco explodiu. Não teve jeito, fui despedido. Também eu já não estava aguentando mais aquele trabalho, já estava mesmo querendo cair fora. Embora tenha conhecido muita gente ali. Eles vendiam um arame de metal que servia para fazer aquelas correntinhas hippies. Os hippies chegavam lá e pediam dois quilos de arame e eu colocava na nota um quilo e eles me davam um por fora. Aí começaram as primeiras fraudes. Eles começaram a perceber. Todo mundo só queria comprar comigo. Se eu estivesse ocupado, eles esperavam. Tava mesmo na hora de sair.

    – Me diz uma coisa, quando começaste a cheirar? Começaste com a maconha?

    – A droga entrou em minha vida muito mais tarde. Eu não usava, não gostava. Até cheguei a fumar, o pessoal da turma usava, mas eu não. O meu caso era a bebida. Eu bebia muito. Naquele tempo a gente comprava garrafão de vinho Sangue de Boi. Mais tarde, eu conheci cocaína, fumei, cheirei, mas nunca fiquei dependente de nenhuma droga, só da bebida. Por mais incrível que pareça, só fiquei dependente da bebida. Todas as besteiras que fiz na vida, fiz alcoolizado. Nesses momentos, estava sempre embriagado e não sabia direito o que estava fazendo.

    Saindo do português, fui trabalhar na TV Globo.

    – Como foi isso?

    – Eu batalhei pra entrar pra Globo. Em toda oportunidade pedia emprego. Era status trabalhar na TV Globo e era o que eu queria. Eu ficava todo dia lá, na frente do portão principal. Depois de algum tempo, todo mundo me conhecia. Eu ia bem vestido, ficava esperando a saída dos artistas, conversando com um, com outro. Cheguei a fazer figuração. Foi na novela A Escrava Isaura.

    Até que um dia a TV Globo pegou fogo. Na confusão, fui ajudar a tirar os equipamentos, as câmeras. Era uma correria danada. Em um dado momento, quando estou saindo com uma câmera, vi um fotógrafo cobrindo a situação. Nesse momento, pensei, essa é a minha chance, então, me joguei no chão. Imediatamente vieram me apanhar, me colocaram numa maca e os caras me fotografaram, enquanto era levado pelo Corpo de Bombeiros. No dia seguinte, não deu outra. Eu estava na primeira página do jornal, que dizia: funcionário da Globo ferido no incêndio. Era só o que eu precisava. Botei aquele jornal debaixo do braço e saí procurando os diretores da Globo. Eu mostrava o jornal e dizia: Olha aí, eu não sou funcionário, mas gosto tanto daqui que arrisquei minha vida pra salvar as coisas no incêndio.

    E tanto pedi a um e a outro, que acabaram me arranjando um emprego. Só que esse emprego, para mim, foi uma decepção. Me arranjaram um lugar na Zeladoria. O chefe era um paraibão que me conhecia. Ele me conhecia da porta da TV. A primeira coisa que ele me mandou fazer foi varrer o portão principal da entrada. O quê que é isso? Tive que colocar o macacão verde pra varrer o portão principal. Mas eu varri. Rápido, mas bem feito. Em seguida ele me mandou lavar um banheiro que ficava num prédio anexo, com entrada por uma rua transversal, que também fazia parte da Globo. Quando eu vi o banheiro, fiquei chocado. Estava repugnante. Eu lavei o melhor que pude. Deixei tudo limpo. Enquanto isso, eu pensava: Já entrei na Globo, vou ter que melhorar, o negócio é já estar aqui dentro. Quando terminei de limpar o banheiro, fui limpar as salas. Já eram umas dez horas da manhã, quando estava passando o aspirador em uma sala e chegou um jovem, depois a secretária. Ele parecia um pouco com o Luciano Szafir. Eu olhava para ele, pensava, olhava de novo e pensava: falo ou não falo? Até que me decidi. Perguntei:

    – Doutor, o senhor me dá licença? Posso falar com o senhor?

    – Muito bem, pode falar.

    – Doutor, será que o senhor poderia me ajudar? É que eu queria melhorar de profissão, sou da Zeladoria, mas gostaria de fazer outra coisa.

    – Está bem, pode deixar. Qual é o seu nome?

    – José Carlos Brasileiro.

    Ele anotou o meu nome e quando eu já estava saindo, ele me chamou e perguntou:

    – Você entende de eletricidade?

    – Entendo, sim senhor.

    – E tu entendias?

    – Claro que não, mas eu não podia perder aquela chance.

    Ele então escreveu um bilhete, assinou, carimbou e mandou que eu procurasse o Sr. Vladimir no Departamento Técnico de Eletricidade. Era muito difícil ter acesso a um alto escalão técnico da Globo. Eu tive essa oportunidade porque estava ali, limpando aquela sala.

    Quando saí dali, escutei um barulho de marreta e ponteiro de obra. Estavam quebrando o banheiro que eu tinha acabado de limpar. Corri pra lá.

    – O que é isso amigo, por que vocês estão quebrando o banheiro que eu acabei de limpar?

    – E por que você limpou, se esse banheiro está interditado há mais de um mês? Você não viu a sujeira que estava lá?

    Então, peguei o balde e fui para a Zeladoria. Eu já sabia que estava encaminhado. Quando cheguei lá, joguei o balde pro lado e o paraibão me perguntou:

    – Já fez tudo direitinho lá?

    E eu respondi: – Não trabalho mais aqui na Zeladoria.

    – E tu estais trabalhando aonde?.

    – Não sei, não.

    Tudo isso foi no primeiro dia, no primeiro dia de serviço.

    Fui procurar o seu Vladimir e lhe entreguei a carta. Ele leu, olhou pra mim, olhou de novo pra carta, depois perguntou:

    – Você entende de eletricidade?

    – Entendo sim senhor.

    Então, ele fez outro bilhete, me mandou descer e procurar o seu Valter na sala de geradores de força, que fica no subsolo. Desci e procurei o seu Valter. Era um senhor grisalho. A sala era maior que esta aqui do Instituto Mandela, com as paredes cheias de cortiça, tinha um exaustor enorme e dois imensos geradores, monitores de voltagem, amperímetro, chaves inversoras. Era ali que se ligava e desligava a televisão. Antigamente a televisão era desligada à meia noite, ao final da última programação. Só voltava ao ar às seis horas da manhã seguinte.

    Quando entreguei o bilhete para o seu Valter e ele leu, ficou contente. Ah! Um rapaz novo! A gente estava mesmo precisando de um operador de gerador. Há mais de três meses que estávamos precisando de um profissional qualificado. Estava faltando um. Você vai trabalhar aqui com a gente, somos nós que colocamos a TV no ar. E foi me mostrando tudo. Aqui são as nossas chaves inversoras, esses são os nossos geradores... Você vai usar esse jaleco aqui.

    Era o jaleco mais importante da área operacional da Globo. O jaleco azul, escrito Equipe Técnica, com o símbolo da Globo, o símbolo

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