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Conflitos Sociais: &  SUBJETIVIDADES NA INFÂNCIA,  ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE
Conflitos Sociais: &  SUBJETIVIDADES NA INFÂNCIA,  ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE
Conflitos Sociais: &  SUBJETIVIDADES NA INFÂNCIA,  ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE
E-book163 páginas4 horas

Conflitos Sociais: & SUBJETIVIDADES NA INFÂNCIA, ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE

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Sobre este e-book

O contexto em que nasceu a composição deste livro se localiza na
operacionalização de proposta, vinda da Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da
PUC Minas, através do Edital 037/2022, favorecedor do processo de
internacionalização.
A PUC Minas, na clareza de que a dinâmica da globalização envolve as
dimensões de conhecimento racionalista, produção capitalista, tecnologia
automatizada e governança, tem buscado sua função de internacionalização, na
convicção de que as universidades se fundamentam, neste caso, no conhecimento
racionalista. E, aquelas que têm, de fato, a pesquisa em sua rotina, são estratégicas já
que produtoras de capital humano e de inovação, de acordo com consideração de
Brennan et al (2004). Ela se fundamenta, portanto, tal como propõe Knight (2008), no
fato de que a internacionalização do ensino superior é processo responsável pela
integração de abordagem internacional ou intercultural no ensino, pesquisa e gestão
de serviços prestados por uma instituição. Neste sentido, ela não deve ser encarada
como um fim, mas como meio para se atingir um fim.
Neste contexto, a partir de certo consenso têm sido consideradas importantes, as
estratégias programáticas, relativas às atividades acadêmicas e serviços associados,
e as organizacionais, que asseguram políticas e serviços favorecedores da
internacionalização em seus campus e no exterior. Elas vêm ganhando corpo nos
últimos tempos, pois, a partir da década de 1990 as universidades foram obrigadas a
pensar em modos de sociedade cada vez mais multicultural e complexa.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento15 de mai. de 2024
ISBN9786588547731
Conflitos Sociais: &  SUBJETIVIDADES NA INFÂNCIA,  ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE

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    Pré-visualização do livro

    Conflitos Sociais - Mário Elkin Ramírez

    1.png

    FICHA CATALOGRÁFICA

    Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

    Ficha catalográfica elaborada por Fabiana Marques de Souza e Silva - CRB 6/2086

    © 2023 – Todos os direitos reservados pela Editora PUC Minas. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida sem a autorização prévia da Editora. Texto revisado segundo o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

    Mário Elkin Ramírez

    Ilka Franco Ferrari

    Cristina Moreira Marcos

    Magali Reis

    Cristina Almeida Cunha Filgueiras

    (ORGANIZADORES)

    CONFLITOS SOCIAIS

    &

    SUBJETIVIDADES NA INFÂNCIA,

    ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE

    Belo Horizonte

    2023

    CONFLITOS SOCIAIS & SUBJETIVIDADES NA INFÂNCIA, ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE

    PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

    Grão-chanceler Dom Walmor Oliveira de Azevedo

    Reitor Prof. Dr. Pe. Luiz Henrique Elói e Silva

    Pró-reitor de Pesquisa e de Pós-graduação Professor Sérgio de Morais Hanriot, PhD

    EDITORA PUC MINAS

    Direção e Coordenação Editorial

    Mariana Teixeira de Carvalho Moura

    Coordenação Comercial

    Daniela Figueiredo Andrade Albergaria

    Conselho Editorial 2023

    Alberico Alves da Silva Filho | Conrado Moreira Mendes | Édil Carvalho Guedes Filho | Eliane Scheid Gazire | Ester Eliane Jeunon | Flávio de Jesus Resende | Javier Alberto Vadell | Leonardo César Souza Ramos | Lucas de Alvarenga Gontijo | Márcia Stengel | Pedro Paiva Brito | Rodrigo Coppe Caldeira | Rodrigo Villamarim Soares | Sérgio de Morais Hanriot.

    Linha Editorial

    Educação & Pesquisa

    Programa de Pós-Graduação em Educação da PUC Minas

    Colegiado 2023-2026

    Prof. Dr. Carlos Roberto Jamil Cury | Prof. Dr. Simão Pedro Pinto Marinho (Coordenador) |

    Profa. Dra. Vânia de Fátima Noronha Alves

    DISTRIBUIÇÃO DA OBRA

    Sob licença Creative Commons Atribuição-SemDerivações-SemDerivados

    Logotipo Descrição gerada automaticamente

    Capa

    Simão Pedro P. Marinho

    {imagem gerada no Midjourney)

    Diagramação

    Madalena Araujo | Madesigner

    Diagramação ebook

    Cristiane Flores

    SUMÁRIO

    Internacionalização: crianças e jovens na solidariedade acadêmica

    Ilka Franco Ferrari

    A hipermodernidade: o discurso capitalista

    Mario Elkin Ramírez

    PARTE I: Conflitos Sociais e Subjetividades

    1. Trajetórias infracionais: adesão e permanência de adolescentes no mundo do crime

    Cynthia Maria Santos Águido

    Rita de Cássia Fazzi

    2. Infâncias atravessadas pela violência

    Tharso Peixoto Santos e Souza

    Cristina Moreira Marcos

    3. A-dolex-cencia: del túnel, a la más delicada de las transiciones

    Diego Fernando Bolaños

    Yorladiz Giraldo G

    4. A delinquência como objeto de controle do Estado

    Carlos Frederico Felício Fagundes

    PARTE II: Subjetividades das Infâncias, Adolescências e Juventudes

    5. Vivências juvenis em um território estigmatizado, o bairro do Cruzeiro

    Cristina Xavier Cordeiro

    Cristina Almeida Cunha Filgueiras

    6. Ser jovem em situação de vida nas ruas do centro de Belo Horizonte

    Célia Barbosa da Silva

    Cristina Almeida Cunha Filgueiras

    7. Del amor en los vínculos educativos: posibles posiciones subjetivas

    Nathalie Londoño Díaz

    María Paulina Mejía Correa

    Marta Cecilia Palacio Arteaga

    8. Dinámicas subjetivas en las redes sociales virtuales: la exposicíon de la intimidad y su espectador

    Nathalie Londoño Díaz

    Pontos de referência

    Cover

    Sumário

    CONFLITOS SOCIAIS & SUBJETIVIDADES NA INFÂNCIA, ADOLESCÊNCIA E JUVENTUDE

    Internacionalização: crianças e jovens na solidariedade acadêmica

    A hipermodernidade: o discurso capitalista[2]

    Parte I Conflitos Sociais e Subjetividades

    Trajetórias infracionais: adesão e permanência de adolescentes no mundo do crime

    INFÂNCIAS ATRAVESSADAS PELA VIOLÊNCIA

    A-dolex-cencia: del túnel, a la más delicada de las transiciones

    A DELINQUÊNCIA COMO OBJETO DE CONTROLE DO ESTADO

    Parte II Subjetividades das Infâncias, Adolescências e Juventudes

    VIVÊNCIAS JUVENIS EM UM TERRITÓRIO ESTIGMATIZADO, O BAIRRO DO CRUZEIRO

    SER JOVEM EM SITUAÇÃO DE VIDA NAS RUAS NO CENTRO DE BELO HORIZONTE

    Del amor en los vínculos educativos: posibles posiciones subjetivas[127]

    DINÁMICAS SUBJETIVAS EN LAS REDES SOCIALES VIRTUALES: LA EXPOSICIÓN DE LA INTIMIDAD Y SU ESPECTADOR

    A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais a alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar. (Eduardo Galeano)

    Internacionalização: crianças e jovens na solidariedade acadêmica

    Neste texto, capítulo para este livro, você leitor encontrará esclarecimentos sobre o surgimento desta publicação, bem como o desenvolvimento de alguns temas que são caros no momento desta escrita e das ideias que sustentaram as atividades a partir das quais esta obra se estruturou.

    Intercâmbio de conhecimentos e aprimoramento de estudantes e docentes

    O contexto em que nasceu a composição deste livro se localiza na operacionalização de proposta, vinda da Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da PUC Minas, através do Edital 037/2022, favorecedor do processo de internacionalização.

    A PUC Minas, na clareza de que a dinâmica da globalização envolve as dimensões de conhecimento racionalista, produção capitalista, tecnologia automatizada e governança, tem buscado sua função de internacionalização, na convicção de que as universidades se fundamentam, neste caso, no conhecimento racionalista. E, aquelas que têm, de fato, a pesquisa em sua rotina, são estratégicas já que produtoras de capital humano e de inovação, de acordo com consideração de Brennan et al (2004). Ela se fundamenta, portanto, tal como propõe Knight (2008), no fato de que a internacionalização do ensino superior é processo responsável pela integração de abordagem internacional ou intercultural no ensino, pesquisa e gestão de serviços prestados por uma instituição. Neste sentido, ela não deve ser encarada como um fim, mas como meio para se atingir um fim.

    Neste contexto, a partir de certo consenso têm sido consideradas importantes, as estratégias programáticas, relativas às atividades acadêmicas e serviços associados, e as organizacionais, que asseguram políticas e serviços favorecedores da internacionalização em seus campus e no exterior. Elas vêm ganhando corpo nos últimos tempos, pois, a partir da década de 1990 as universidades foram obrigadas a pensar em modos de sociedade cada vez mais multicultural e complexa.

    Os interessados encontram, no documento Plano institucional de Internacionalização, PUC Minas, 2022 — 2026, um breve mas orientador estudo acerca deste tema, bem como os passos dados pelos gestores para que esta instituição criasse seu próprio caminho. Pode-se dizer que os passos são mencionados, como mais estruturados, a partir de 1996. No documento os leitores poderão constatar, então, esta Universidade inserida nas principais redes de internacionalização do ensino superior, no Brasil e no mundo, por exemplo, na Association of International Educators, NAFSA, na European Association for International Education, EAIE, e na Associação das Assessorias das Universidades Brasileiras para Assuntos Internacionais, FAUBAI, tendo participação destacada. Observarão sua participação em outras redes e associações, tais como Rede PUCBR, Grupo Coimbra de Universidades Brasileiras, Rede UNIMINAS que compõe um consórcio de 15 universidades do estado, e nelas também em posição que se sobressai. Na atualidade é considerável que possua mais de 150 acordos bilaterais com universidades de 30 países, cuida de procedimentos de cotutelas, estágios internacionais, dupla diplomação, português para estrangeiros e formação de redes de pesquisas interinstitucionais, nas quais seus programas de pós-graduação são os principais atores.

    Nessa conjuntura aconteceu o Edital 037/2022, e três Programas de Pós-graduação stricto sensu, pertencentes a áreas afins, ou seja, Ciências Sociais, Educação e Psicologia congregaram interesses e buscaram a vinda de um professor visitante, oriundo da Universidad de Antióquia, Medellín, Colômbia, no mês de outubro de 2022.

    A decisão pelo professor Mário Elkin Ramirez Ortiz se sustentou em parcerias que ele já havia desenvolvido, com o Programa de Pós-Graduação em Psicologia, para aulas, bancas de mestrado e doutorado, participação em projetos de pesquisa e jornadas, supervisão teórica para alunos da pós-graduação, palestras em disciplinas do curso de graduação, entre outras atividades. Neste caso, ponderou-se a ampliação desta base de interlocução, já que lhe favoreciam sua formação, seu respeito acadêmico e clínico, na área da psicanálise, em seu país e fora dele, mais especificamente no Brasil.

    Entre a variada e intensa jornada de trabalho deste período, tanto para o convidado quanto para os professores brasileiros que não tinham como deixar o que já faziam e precisavam acrescentar o novo, bem como para os alunos dos três cursos, vale destacar que duas atividades constituem os pilares desta publicação: a disciplina Conflictos sociales y subjetividades de los niños y adolescentes, a cargo do professor Mário Elkin e da professora Ilka Ferrari, e uma aula ministrada pelo mesmo professor, em uma disciplina ofertada pelos Programas de Pós-Graduação em Educação e Psicologia, intitulada Docência na Educação Superior. A aula, que encerrava o curso, denominou-se Laços sociais próprios da subjetividade da época e o contexto da educação, e foi aberta a todos alunos de outros Programas e, também a professores de graduação que se interessavam. Uma das metas estabelecidas, na proposta enviada para a Pró-reitoria de Pesquisa e Pós- Graduação, era a realização de um livro, escrito por diferentes profissionais, a partir de tema crucial da experiência vivida. O interesse pelo tema foi então definido e aconteceram reuniões com professores dos três Programas e professor convidado, para o planejamento da operacionalização.

    O foco foi localizado na atualidade das questões e em alguns modos de vida que caracterizam a realidade social dos jovens ou, segundo outra forma de denominação, dos adolescentes, em situações de conflitos nada simples, se é que alguns conflitos podem ser considerados simples: os conflitos armados. Neste primeiro volume, Mario Elkin aborda a realidade social marcada pela vida capitalista e, no próximo -o volume 2- se dedicará a escrever acerca das crianças e dos adolescentes recrutados pelos grupos armados. Ele escreve a partir de pesquisa realizada na Colômbia, como poderão constatar em seu livro Conflicto aramado y subjetividade (2017), mas não desconhece a realidade brasileira.

    Vale a pena aguardar o novo volume. Neste momento algumas pontuações são feitas, de modo a colocar alguns pontos de reflexões no horizonte e expressar um pouco do que se veiculou naqueles dias.

    Mutação radical do discurso ordenador da civilização: os proletários

    O meio psicanalítico conhece que muitos fazem mau uso daquilo que Freud escreveu sobre o social. No livro O Outro que não existe e seus comitês de ética, o psicanalista Jacques-Alain Miller, (2005), significativo representante da orientação lacaniana, relembra que John Searle escreveu um livro intitulado "The construction of social reality", com grande repercussão nos Estados Unidos, apresentando como novidade a ideia do social como uma construção. Mas, ela já existia em Freud, desde o final do século XIX. Na verdade, a filosofia norte-americana desconhecia ou desconsiderou que a realidade social, construída, estruturada, fundada sobre um ato de fala em dado contexto, é parte das formalizações freudianas.

    Nesse sentido, o institucional deve sua existência à linguagem e, consequentemente, ao universo simbólico, e a linguagem é antigo parceiro no trabalho dos psicanalistas, sem desconsiderar o imaginário e o real. Ressalta-se, portanto, que a existência de uma realidade, que é social, supõe ser transindividual, socializante, simbólica, distanciada da ideia de centralidade do eu. Esta centralidade infelizmente tem sido imputada à psicanálise, principalmente a Freud, não sem apoio de alguns desvirtuamentos dentro do próprio movimento psicanalítico. Os interessados, no entanto, podem ler e constatar, no Seminário 2 de Lacan (1954-1955/1987, p. 19), por exemplo, que Freud movido pela prática clínica estava atento ao fato de que a subjetividade se modifica no decurso dos tempos. Nas palavras de Lacan, segundo uma causalidade, uma dialética própria, que vai de subjetividade a subjetividade, e que talvez escape a qualquer espécie de condicionamento individual.

    No ensino de Lacan a realidade social está evidente desde o início, pois ele pisa nas trilhas de Durkheim considerando que as instâncias culturais dominam as naturais, que as relações sociais constituem uma ordem original de realidades. Nele o leitor observa, já de início, a relação do sujeito com o Outro, com maiúscula, tal como escreve Miller (2005, p. 165), este lugar da palavra, da linguagem, do discurso universal e da realidade social, cultural e institucional também. O social como realidade supõe, portanto, objetividade social e não se trata de ilusão individual. Consequentemente, entre as condições da realidade social está a capacidade de inteirar-se de que ela não é sem consequências, ela se modifica, varia. Por isso mesmo, estudiosos sempre se ocupam de modos de nomeação para os tempo vividos. Esta atualidade tem diferentes batismos, a exemplo de: pós-modernidade para Lyotard, Hipermodernidade é seu nome para Lipovetsky, Alta modernidade por Giddens, Modernidade líquida foi escolha de Baumann, Guy Debord a leu como sociedade do espetáculo, e Byung-Chul Han, muito recentemente a chamou de sociedade do cansaço... Há outras nomeações, estes autores não esgotam o assunto.

    No meio psicanalítico, sem desprezar as considerações feitas pelos diferentes pensadores, mas seguindo orientações lacanianas sobre o modo de pensar o social, tem havido preferência pela nomeação hipermodernidade (Lipovetsky, 2004), na qual encontram-se as consequências da exacerbação de valores propostos pela modernidade, ou seja, individualismo, culto à liberdade e busca de igualdade. Considera-se que esta época se iniciou por volta dos anos 1980, alimentada pelo liberalismo globalizado, mercantilização dos modos de vida e exploração da razão instrumental, ou seja, em sua base estão os pilares fundados na modernidade, conhecidos como democracia, direitos humanos e o mercado. Assentada neste pilares, a hipermodernidade os engrandece e fortalece, promovendo a globalização.

    A psicanalista Hebe Tizio (2007) é uma entre os que enfatizam que cada época traz em si coordenadas discursivas que caracterizam sua atualidade e possibilitam coletividade humana, permitindo laço social. Não existindo, portanto, realidade pré-discursiva. E tem sido muito discutido e divulgado que na hipermodernidade o discurso capitalista, como Lacan o denominou, reina ditando e organizando formas de viver. Formas de viver que prescindem dos laços sociais, estando os sujeito imersos na solidão com seus gadgets (Ferrari, 2008). Tizio relembra que Lacan formalizou, inovou e foi capaz de antecipar consequências desta forma de discurso que não faz laço social, por isto mesmo não deveria se chamar discurso, pois laço social é

    [...] a relação entre os seres humanos que se sustenta do discurso e, por meio dele, assume as modalidades de época e as marcas de uma cultura determinada. Há laço social porque não há laço natural, na medida em que vivemos em um mundo de linguagem. A esta aproximação geral é preciso acrescentar que o laço social se particulariza com as modalidades do gozo dos sujeitos que o realizam. (Tizio, 2007)

    O revolucionário Karl Marx, filósofo e sociólogo, e suas considerações sobre a sociedade, a economia e a política, nas quais as sociedades humanas só progridem através da luta de classes, com uma classe social controlando os meios de produção, a classe trabalhadora fornecendo a mão de obra para a produção, e o Estado protegendo os interesses da classe dominante, recebeu o respeito e atenção de Lacan. Mas, Lacan e suas formalizações sobre o mundo que é regido pelo discurso do capitalista deu também valor ao jurista e economista alemão, tido como um dos fundadores da sociologia: Max Weber. Weber era conhecedor de Marx, mas defendeu a ideia de que nesse regime, na verdade, todos são proletários no afã de mais e mais. O proletário, por ter consciência de sua exploração acaba por fazer daquilo que perdeu seu objeto de desejo, e o capitalista, preocupado em reinvestir no seu plus, em aumentar seu capital, acabará mantendo o circuito da produção, ou seja, o aumento do consumo necessário para o sistema, e em sofrimento por considerar que não disfruta o suficiente.

    Não é sem consequências, portanto, viver em época com estas peculiaridades. Por isso mesmo Lacan disse que nela aconteceu uma mutação radical do discurso ordenador da civilização. Mutação é termo propositalmente escolhido, vindo da genética e enfatizando mudança que se transmite à geração posterior. No ocidente, em determinado momento apareceu o capitalismo, com transformações afetando gerações. Todos, agora, imerso na falta-de-gozar, movidos pela falta de um gozo que os complete, na crença de que isto existe. Este é o sujeito conhecido como consumidor. Nesta posição ele sempre exige um objeto que lhe faça crer que pode completá-lo, ainda que por pouco tempo (Ferrari, 2014). Em posição de dominante, este discurso tem a meta de sobrepor o mercado à sociedade e, como se pode aprofundar no texto de Ramirez, publicado neste volume, ele exclui o outro e o sujeito só se relaciona com a mercadoria. Sua política é a de cada um por si, não havendo direitos iguais para todos, já que isto se perde no abismo da desigualdade do mercado. Segregador? Sem dúvidas, pois o mercado determina quais são os sujeitos que têm ou não acesso aos produtos, por exemplo, da ciência e da técnica, parceiras fiéis deste discurso.

    Em determinado momento Lacan (1972, p.48) afirmou que o discurso do capitalista não tem como andar melhor, mas desse modo isso anda rápido demais, isso se consome, isso se consome tão bem que isso se consuma, o que o leva à situação de crise. Crise que lhe é inerente, mas necessária para sua existência, pois, loucamente astucioso, tal como enfatiza preciso texto de Calazans e Cardoso (2022). Estas crises alimentam o mercado e claramente o próprio sujeito, consumidor, como produto a ser consumido. E, tal como asseguram estes autores, o contorno é bem preciso quando se considera o discurso capitalista na versão neoliberal, na qual a ele se agrega o ilimitado e o instantâneo do tempo. E, recorrendo à preciosa consideração de Jorge Alemán (2016, p. 15), relembram que neste casamento o capitalismo se comporta como força acéfala, que se expande ilimitadamente até os confins da vida, daí produzindo subjetividades que se configuram segundo paradigma empresarial, competitivo e gerencial da própria existência.

    No dia a dia constatam-se facilmente alguns resultados desse processo: descrédito no futuro, cada vez mais incerto; supervalorização do momento presente, do aqui–agora; individualização acentuada; queda da hierarquia e da autoridade; liberalismo globalizado; mercantilização dos modos de vida; consumismo elevado à potência, valorizando o efêmero, os gadgets; comunicação midiática voltada para a globalização, com perda das particularidades e singularidades; acentuação de reivindicações de reconhecimento de igualdades e apagamento das diferenças; laços sociais facilmente desconectáveis de qualquer intersubjetividade com o outro...

    E nesse contexto todos estão imersos, para mais ou para menos...

    Jovens, adolescente, púberes... sem teatro para suas cenas

    No cotidiano da vida, ao se usar a palavra adolescência usualmente não ocorre ao ser falante que ela se trata de expressão relativamente nova no vocabulário humano, e tampouco o que ela supõe para além do senso comum. O historiador francês, Philippe Ariès (1981), ao escrever sobre as idades da vida ensina que até o século XVIII a adolescência era confundida com a infância. Naquela época, a indiferença pelos fenômenos biológicos fazia com que a infância tivesse longa duração, principalmente porque a ela se associava a ideia de dependência, ou seja, a infância acabava quando se reduzia ou terminava a dependência de alguém, o que podia durar bastante.

    Idades da vida! Expressão bonita que acaba convocando os psicanalistas a se perguntarem, a partir de Lacan, o que é a vida. Seguramente ela não se resume em existir, já que existir está na conta de sermos lançados no mundo, com toda dor que isso comporta, e é de conhecimento da humanidade. Viver é algo mais, supõe o existir já recoberto pelos laços sociais, pela cultura, pela linguagem, modos de dar conta da dor de existir que é inerente a todos. Por isso mesmo é preciso considerar a realidade social dos viventes.

    No estudo histórico, realizado por Ariès (1981), e passível de confirmação, pode-se observar o recobrimento da existência pelos modos de vida. Segundo ele, o século XVII privilegiou o que se chamou de juventude, tomando consistência no pós-guerra de 1914. Ela expressava período em que a pessoa está na plenitude de suas forças, a exemplo dos ex-combatentes preferidos para estarem na frente de batalha, dando possibilidade de que os homens de retaguarda pudessem viver mais. A infância, por sua vez, ocupou a cena no século XIX, e a expressão adolescência surgiu no século XX, empurrando a infância para trás e lançando a maturidade para frente, com o desejo de se chegar cedo a ela. A realidade social atual tem suas peculiaridades, distintas, e que serão mencionadas a seguir

    Sérgio Campos (2016), psicanalista da atualidade, por sua vez, detalha que a juventude tem sido considerada um tempo que ocorre ao final da adolescência e início da vida adulta; adolescência é o que acontece a partir da puberdade até a fase adulta. Ele recorre à Organização Mundial de Saúde (OMS), que demarca a juventude no período vivido entre 15 e 29 anos, e a adolescência à época teen, isto é, dos 13 aos 19 anos. E observa que a demarcação de diferenças nas faixas etárias não apaga algo que as conecta, ou seja, trata-se de época de encontro com a sexualidade em um corpo que já pode experimentar satisfação diferente da infantil, pois o ser falante experimenta uma intimidade transformada, fora do padrão, tanto no público como no privado (Campos, 2016, p. 22). Alguns profissionais usam estes dois termos indiscriminadamente, outros fazem questão de diferenciar. Na disciplina ofertada no projeto de internacionalização, Ramirez usou, no título da disciplina, o significante adolescentes, mas, em sua fala recorria também à expressão jovens.

    Ao se dispor a conversar sobre a vida, portanto, o horizonte da época dita mesmo o rumo. Para épocas distintas, diferentes periodizações da vida humana, recobrimentos da existência que não ocorrem ao acaso. Tais periodizações surgem a partir de interpretações dadas pelos membros de dada cultura, ao se depararem com a duração da vida, diante da certeza da morte, mesmo que nem todos passem pelos períodos estabelecidos. Ao final do século XIX e começos do século XX, por exemplo, os adolescentes se tornaram objeto de estudo da psicologia, sociologia, pedagogia e, também da psicanálise. O leitor de Freud notará, entretanto, que ao fazer suas formalizações ele prefere o termo puberdade, ainda que nela insira alterações psíquicas e sociológicas, próprias destes sujeitos, descritas por autores que utilizavam a expressão adolescência.

    Vários psicanalistas atuais, conjugando elaborações freudianas e lacanianas, têm considerado a adolescência como sintoma da puberdade, a partir das ponderações do psicanalista belga, Alexander Stevens (2004). Ou seja, um modo de funcionamento do sujeito púbere que supõe vivência das transformações da puberdade, sem desconsiderar as marcas da infância e a intromissão do adulto na criança. Momento de um novo despertar, relativo à sexualidade fálica, que supõe saída da forma autoerótica e entrada no universo do gozo do ato sexual que passa pelo corpo do parceiro, neste momento da vida.

    O corpo -assunto importante que acaba de surgir neste texto-, nas trilhas das formalizações de Lacan, estudioso de Freud, não se confunde com organismo. Ele está articulado à inserção do humano no mundo da linguagem que o recorta com nomes variados, a exemplo de cabeça, ombro, joelho e pé, e até mesmo o nome próprio. A psicanalista Hebe Tizio (2007), a esse respeito, afirma de modo bonito que o corpo é território colonizado pela imagem, pelos significantes que o modelaram, pelos objetos de satisfação que o recortam, e pelas representações correspondentes a cada época. Representações que podem ser vistas nos modelos de beleza, para exemplificar, que não são unívocos na história. Ele não é, portanto, qualquer objeto. Merece respeito, e o encontro corpo a corpo nunca é, consequentemente, fácil.

    Os adolescentes/jovens dão muito bem notícias disto e sabem contar que neste ponto da vida acontece a dura constatação de que para o amor, esse véu que ajuda a recobrir e suportar a insuficiência do corpo nas trocas sexuadas, não há garantias nem regras fixas, embora a sociedade pretenda estabelecê-las. Cada qual na dor desta realidade: na natureza humana não há um saber inato que favoreça o encontro harmonioso entre os sexos, esse campo sempre aberto aos desencontros e exigências de soluções singulares, sem pai nem mãe, ainda que se conte com eles nas identificações. Não é sem sentido, portanto, que o psicanalista Jacques-Alain Miller (2016) afirma que se as definições de adolescência são controversas, e sobre ela se pode dizer que se trata de uma construção.

    Para os jovens/adolescentes, na fluidez e declínio de valores simbólicos atuais, uma primeira aproximação oferece a leitura de que o corpo e a subjetividade também se tornaram formas de mercadoria, em sistema de troca proletarizada. Calazans e Cardoso (2020) focalizam três categorias de efeitos do projeto neoliberal sobre a juventude, nesta atualidade capitalista: a estetização da juventude transformada em um gadget a ser consumido em qualquer idade, a medicalização da adolescência e a criminalização. De fato, o assunto medicalizar os jovens é muito sério e merece acirradas discussões. Centra-se, aqui, no entanto, dada a conjuntura das aulas e do curso que foi desenvolvido durante a internacionalização, nas outras duas categorias. Estes dois autores, mas, também Campos (2016), dedicaram-se a certo fenômeno que não pode ser descartado: o imperativo, na atualidade, de que todos sejam jovens, fazendo da juventude um modelo de bem-viver.

    Nesse sentido, a juventude não concerne mais à idade, mas deve ser continuada na manutenção de gostos, hábitos, modos de falar e até mesmo nas práticas sexuais, constituindo-se não em época de passagem, mas um fim em si mesma. Calazans e Cardoso, por exemplo, em determinado momento citam Byung-Chul Han dizendo que a urgência da performance exige o

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