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Sonhos Dracônicos
Sonhos Dracônicos
Sonhos Dracônicos
E-book374 páginas5 horas

Sonhos Dracônicos

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Sobre este e-book

Em minha sombra você dorme, faminto por minha alma.

Em meu coração você vive, alimentado e em paz.

Em minha vida você pertence, sempre.

O alvorecer rubro da guerra se choca com a maré. Cai o negror. Sombras ganham vida.

Eu chamo por você. Vejo você do outro lado do campo de batalha, chamando por mim. Tantos estão entre nós.

Viro as costas para a maré; a maré avança, crescendo, estourando, cobrindo.

Levanto minha mão e encaro o céu acima. Cai o silêncio. Uma quietude. Lágrimas caem. Líquidas, elas caem pelo meu rosto, minhas bochechas encardidas, em minhas roupas manchadas de sangue.

Levanto minha outra mão. Uma explosão de tempo avança, galopando como meu coração enquanto aguardo o golpe final. . . Mas ele nunca vem. Eu congelei o momento no tempo, enquanto a lâmina destinada ao meu coração perfura o dele.

Os soluços estrangulam meu peito enquanto encaro o metal, reluzindo vermelho como o sol nascente, despontando de seu peito. Seus olhos estão também congelados, fixados nos meus. Eles não parecem surpresos. Eu caio de joelhos; lágrimas rolam mais intensamente.

Ouço sua voz. Um berro, um grito de dor e raiva e desespero e medo atravessando o campo. Eu não me volto. Eu olho direto para frente, para os olhos que estão fixos nos meus enquanto trago ambas as mãos para baixo em um gesto tão cortante quanto a lâmina. Luz explode para fora a partir de mim, disparando através do campo de batalha, consumindo tudo.

Eu caio. Ele cai também. Seus olhos falam de coisas que ele não pode dizer. Eles se fecham após um minuto, mas os meus permanecem abertos.

Você, então, me alcança. Todos os outros estão prensados ao chão, revolvendo-se na terra encharcada de sangue, mas você chega até mim. Você me vira com a face para cima. Você me recolhe em seus braços. Você chora, mas meus olhos estão secos agora. Meus olhos estão secos. 

—Vai ficar tudo bem — eu sussurro para você. — Vai ficar tudo bem.

_____________________________________________________________________________

Auri é apenas uma garota élfica criada no castelo e na corte humanos de Ardalan. Ela não sabe nada sobre a profecia da Rainha Branca, e menos ainda sobre os elfos. Tudo o que ela conhece é um mundo de intriga política humana, e as informações vislumbradas pelos espiões de seu pai adotivo. . .

A notícia se espalhou. Os Dragões Rebeldes estão se movendo novamente, e morte, medo e destruição são tudo o que eles deixam em seu rastro.  

E então Liran a encontra.

Liran é o líder dos Vi'dal, uma força-tarefa élfica de elite enviada anos atrás pela rainha dos elfos para encontrar uma forma de impedir a morte que está se espalhando pelas terras conhecidas. Sua tarefa: encontrar a Rainha Branca.

A Rainha Branca é lendária heroína do futuro. Uma rainha tão poderosa que é capaz de unir dragões, elfos, animais, humanos e anões contra os Dragões Rebeldes, e derrotá-los. Uma elfa que cura com um toque, e que pode viajar ao centro da terra e inflamar os fogos de seu mundo moribundo.

Uma elfa tão poderosa que é dito ser capaz de parar o próprio tempo . . . e até mesmo revertê-lo.

IdiomaPortuguês
Data de lançamento12 de jul. de 2017
ISBN9781547508129
Sonhos Dracônicos

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    Sonhos Dracônicos - Dusty Lynn Holloway

    Sonhos Dracônicos

    As Crônicas de Sombra e Luz Livro Um

    Também por Dusty Lynn Holloway:

    Vínculos Dracônicos

    Luz Dracônica

    Alma Dracônica (Chegando em 2017)

    Dedicatória

    Este livro é dedicado a todos aqueles que se recusam a desistir; aqueles que continuam se esforçando e tentando muito depois que achavam que não conseguiriam dar outro passo. Este é para vocês.

    Prólogo

    ––––––––

    Em minha sombra você dorme, faminto por minha alma. Em meu coração você vive, alimentado e em paz. Em minha vida você pertence, sempre.

    O alvorecer rubro da guerra se choca com a maré. Cai a escuridão. Sombras ganham vida.

    Eu chamo por você. Vejo você do outro lado do campo de batalha, chamando por mim. Tantos estão entre nós.

    Viro as costas para a maré; a maré avança, crescendo, estourando, cobrindo.

    Levanto minha mão e encaro o céu acima. Cai o silêncio. Uma quietude. Lágrimas caem. Líquidas, elas caem pelo meu rosto, minhas bochechas encardidas, em minhas roupas manchadas de sangue.

    Levanto minha outra mão. Uma explosão de tempo avança, galopando como meu coração enquanto aguardo o golpe final. . . Mas ele nunca vem. Eu congelei o momento no tempo, enquanto a lâmina destinada ao meu coração perfura o dele.

    Os soluços estrangulam meu peito enquanto encaro o metal, reluzindo vermelho como o sol nascente, despontando de seu peito. Seus olhos estão também congelados, fixados nos meus. Eles não parecem surpresos. Eu caio de joelhos; lágrimas rolam mais intensamente.

    Ouço sua voz. Um berro, um grito de dor e raiva, de desespero e medo atravessando o campo. Eu não me volto. Eu olho direto para frente, para os olhos que estão fixos nos meus enquanto trago ambas as mãos para baixo em um gesto tão cortante quanto a lâmina. Luz explode para fora a partir de mim, disparando através do campo de batalha, consumindo tudo.

    Eu caio. Ele cai também. Seus olhos falam de coisas que ele não pode dizer. Eles se fecham após um minuto, mas os meus permanecem abertos.

    Você, então, me alcança. Todos os outros estão prensados ao chão, revolvendo-se na terra encharcada de sangue, mas você chega até mim. Você me vira com a face para cima. Você me recolhe em seus braços. Você chora, mas meus olhos estão secos agora. Meus olhos estão secos.

    —Vai ficar tudo bem — eu sussurro para você. — Vai ficar tudo bem.

    Capítulo Um — Consciente

    Ele acordou gritando a plenos pulmões, como como o toque de um clarim ao alvorecer. Sua respiração arquejava em seu peito apertado, como se ele tivesse acabado de correr por milhas e milhas. Ele não conseguia desacelerá-la. Fechou seus olhos para concentrar-se. Lento. Lento. Respire lentamente. Inspire. Expire. Lento. As imagens do sonho salpicavam o primeiro plano de sua mente, infiltrando-se pelas barricadas.

    Lágrimas rolavam por seu rosto e em seus cabelos escuros e emaranhados. Ele levantou uma mão trêmula até sua cabeça e gemeu profundamente.

    Vá embora. Por favor. . . só vá embora.

    Suor e lágrimas misturavam-se.

    Ele estava cansado, mais cansado do que jamais havia estado em toda sua vida. Noite após noite ele sonhava com ela. Noite após noite após interminável noite. Ele tentou colocar-se em um estupor entorpecido, construindo uma turva parede de cansaço entre si mesmo e o resto do mundo — preparações de batalha para a vindoura guerra com Obsidiano — mas não funcionou. Pois não importava quanto ou por quanto tempo ele forçasse seu corpo, sua mente estava lentamente desmoronando sobre si mesma.

    Os sonhos retornavam independente do que ele fizesse.

    Ele tentou não dormir. Simplesmente passando dias intermináveis sem dormir. Mas pagou por isso. O sonho, quando ele finalmente desmoronou em completa exaustão, foi ainda pior. Este foi o resultado.

    A parte que machucava — que tornava isso mais que apenas uma batalha, apenas uma pessoa sem rosto morrendo — era que . . . ele sentia como se a conhecesse, essa elfa chamada Auri. Ele sentia como se ela fosse uma parte dele, de uma forma que ele não compreendia. Ele entendia o que a fazia correr no sonho, não de, mas para algo. Ele entendia o que a fazia lutar, o que a fazia chorar, o que a fazia tremer. Ele viu tantas coisas nela que ele desejava ver em si mesmo quando olhava no espelho.

    Haviam-no ensinado desde que aprendeu a andar que a guerra era iminente, e que precisariam dele para liderar nessa batalha. Em outras palavras, haviam-no ensinado a ser forte. Mas Auri era mais forte. Mais forte por dentro.

    Sua respiração ainda estava alta, mas seu coração havia desacelerado um pouco. As lágrimas continuaram a escorrer pelas laterais de suas têmporas, por seu cabelo, e caindo nos lençóis de linho brancos. Ele não podia mais suportar isto. Ele temia estar enlouquecendo. O que mais poderia ser quando se sonhava com a morte todas as noites? Quando você sonhava com a sua própria morte, e a morte de alguém que você conhecia e com quem se importava muito. . . mas que nunca havia visto em toda a sua vida?

    Uma mão desceu suavemente sobre seu ombro, e ele reagiu instintivamente. Aço encontrou aço mais rápido do que ele conseguiu levantar os olhos para seu atacante, e então sua faca caiu ruidosamente no chão de madeira quando reconheceu o rosto à sua frente. Cerralys. Ele quase matara o rei.

    Ele não falou, mas segurou a cabeça com as mãos de novo, tremendo loucamente. Ele quase matara o rei. . .  Isso passou por seu cérebro mais uma vez em um longo, entorpecido e destorcido pensamento, ecoando e ecoando. Ele quase matara seu pai.

    A cama afundou quando Cerralys sentou-se ao seu lado.

    —Nachal — ele disse cuidadosamente, como se falando com alguém prestes a pular de um penhasco —, eu estou bem. Não se preocupe.

    Nachal soltou um brado cortante de risada maníaca.

    —Eu quase matei você — ele sussurrou roucamente, sua garganta seca de tanto gritar.

    Ele ouviu o sorriso na voz do rei, apesar de não ter olhado para ver por si mesmo.

    —Então fui muito afortunado de ter minha lâmina ao alcance.

    Nachal gargalhou novamente. O som saiu como se fosse parte soluço.

    Mãos quentes desceram sobre seus ombros.

    —Você não está enlouquecendo, pequeno.

    Ele olhou para cima, usando os punhos para limpar as lágrimas dos olhos. Os olhos do velho eram daquele azul celeste, perfurante e profundo ao qual ele havia se acostumado tanto durante os anos. Eles eram completamente únicos, aqueles olhos, e eles sempre enxergavam as profundezas dele, as profundezas de qualquer um. Ele viu compreensão neles, pesar, amor . . . e medo.

    —Então por que você está com medo? — ele perguntou em voz baixa.

    Cerralys parecia nunca temer nada. Ele vivera tanto tempo, vira tantas coisas. Hoje era o primeiro dia em que ele vira aquela emoção em particular, e ela o balançou mais do que o sonho. Ele sentiu como se o chão abaixo de si estivesse subitamente instável.

    O rei não respondeu. Ele moveu-se para posicionar-se frente à lareira agora fria, enquanto Nachal tremia na cama observando seus movimentos como um falcão. O velho acendeu o fogo em momentos.

    —O que você teme? — ele exigiu novamente em um sussurro rouco, escondendo suas mãos trêmulas dentro das dobras do cobertor. Ele as fechou em punhos enquanto esperava.

    —Eu temo perder o meu filho — o velho finalmente sussurrou.

    Nachal fechou os olhos. Os músculos simplesmente o fizeram por si sós, ele não os controlou. Ele não podia olhar para o rei à sua frente agora sem querer chorar de novo.

    E ele estava cansado de chorar.

    —Você vai me perder eventualmente. Eu sou humano, você é da raça dos dragões. Nossas expectativas de vida são amplamente diferentes.

    O quarto ficou imóvel. Quieto. Era a quietude antes da alvorada. Antes de tudo acordar. Antes de a luz chegar. Era uma quietude não natural.

    —Sim — foi sua única resposta.

    Nachal suspirou. Os dragões pareciam ter essa habilidade, quase como se a natureza reagisse a eles. Isso era, infelizmente, parte do problema.

    Ele gemeu ao levantar-se. O quarto inclinou-se loucamente por um minuto, e depois se endireitou. Ele cambaleou até a torneira em forma de golfinho e bombeou água fria para a bacia azul abaixo dela. Quando terminou de banhar o suor de seu peito e rosto nus, ele cambaleou cansadamente até o guarda-roupas de mogno e começou a procurar um par de calças e uma camisa limpos.

    Não conseguiu encontrar nenhum. Ele não gostava que ninguém além de Cerralys entrasse em seu quarto, e havia estado tão desesperadamente ocupado nos últimos tempos que não tivera tempo de levar suas roupas sujas para baixo até os cômodos da lavanderia. Pegou algo do chão, cheirou e então deu de ombros, vestindo. Calças foram primeiro, depois sua camisa, meias e botas. Quando terminou, ele voltou-se mais uma vez para o rei. Ele não se movera. Ainda estava encarando profundamente as chamas tremulantes.

    Eles ficaram assim por um minuto, ele encarando as costas do rei, e o rei encarando diretamente através da lareira para as profundezas de seus pensamentos.

    —Eu não sei quem ela é, essa elfa com quem você sonha, mas eu sei que ela precisa de você, Nachal. Você não pode simplesmente afastar isso — sua voz soou tão cansada quanto o corpo de Nachal se sentia.

    —São apenas sonhos. Eles irão embora eventualmente.

    Silêncio novamente pela duração de algumas batidas de seu coração.

    —Eu não criei você para ser tão ignorante assim sobre seus próprios sentimentos. Ela é real, pequeno.

    —Mande um dos Luminari até ela então. Se ela está em algum tipo de problema, um dragão seria um protetor melhor.

    —Ela precisa de você.

    —Por quê? — Sua voz havia ficado rouca novamente. Por dentro, ele tremia. Com medo.

    —Eu não sei. — Sussurrou suave, angustiado.

    Nachal cruzou a distância entre eles.

    —Você pode me dizer o que você sabe? — ele perguntou silenciosamente. Ele nunca vira Cerralys assim. Era profundamente perturbador.

    —Eu sei que ela é vital. Para você, para mim, para Terradin, para a guerra. . . E de uma forma muito pessoal. É quase como se ela fosse Terradin.

    —Isso é... — Nachal começou a dizer que isso era impossível, então fechou a boca abruptamente. Seria impossível? Suspirou. Provavelmente não. — Algo mais?

    Outro longo período de silêncio.

    —Não é que eu saiba, é mais uma . . . sensação.

    De certa forma, isso era quase pior, pois, enquanto o conhecimento estava frequentemente certo — caso reunido corretamente e utilizado sabiamente — a intuição do Rei Dragão Cerralys era lendária, assim como sua força e sabedoria. O que era parte do motivo pelo qual Nachal ainda estava tremendo por dentro.

    —Por favor — ele sussurrou com lábios repentinamente amortecidos.

    Outro período. Este mais longo. A quietude se tornou algo por e em si só. A natureza pausou, segurou a respiração.

    —Você morrerá por ela.

    Nachal suspirou.

    —Eu sei — ele disse, cansado.

    Virou-se para procurar sua sacola.

    ––––––––

    Quando a encontrou, voltou-se novamente para o terraço. O rei estava ali, cabelos brancos e longos esvoaçando na brisa, postura forte e inabalável. Ele estava agora em sua forma transformada — a forma de um elfo. Os dragões, após muitos anos de estudo, aprendiam a habilidade de mudar de uma forma para outra. Apenas uma. Pois ela se tornava tão parte da constituição de seu ser como sua metade dragão.

    A maioria dos dragões escolhia uma forma transformada élfica, pois eles compartilhavam naturalmente muitas das mesmas características: grande força, agilidade, vidas longas, e um vínculo igualmente forte com a natureza, apesar de em formas muito diferentes. A própria terra parecia reagir aos dragões — especialmente aos poderosos como Cerralys. Mas os elfos? Os elfos recorriam à natureza, e a natureza respondia.

    A alvorada estava apenas começando quando ele veio a se postar ao lado do rei. Eles observaram O Salão ganhar vida lentamente abaixo deles. Soldados começaram a treinar no pátio interno, aguardando a chegada do rei. Os homens do rei o amavam. Todos o amavam. Incluindo o pequeno garoto adotivo que ele havia acolhido vinte anos antes.

    O oceano estava logo abaixo deles. O Salão ficava no topo de um penhasco com vistas para o Mar Eldrian à esquerda e para a Floresta Du’lna à direita. De seu terraço, ele podia ver por quilômetros. Azul infinito e verde infinito.

    Ele pensou em Auri morrendo enquanto ele ficava ali, e sua alma estremeceu.

    —Você esteve vivo por tanto tempo, viveu tantas coisas, perdeu tantos. Em algum momento se torna mais fácil perder aqueles que você ama, viver mais que todos?

    As ondas pulsaram sobre a praia abaixo, subitamente sem som. Uma gaivota voou sobre eles, abrindo sua boca como se guinchando alto, mas nenhum som foi emitido. Nachal voltou olhos vermelhos e arenosos para a causa. Os olhos de Cerralys brilhavam. Feixes gêmeos de pura luz. Lágrimas cintilaram.

    —Não — veio a voz suave —, nunca fica mais fácil.

    —Eu pensei que o tempo curava todas as feridas — Nachal murmurou enquanto esfregava sua face para secá-la.

    Cerralys soltou uma risada irônica e estrangulada.

    —Não — ele disse —, não cura.

    Eles observaram as listras róseas de luz queimarem pelo azul pálido cintilante do céu.

    Sons retornaram lentamente, suavemente.

    Alvorada: O início.

    Capítulo dois — o mapa

    Cerralys o deixou para descer e treinar os homens enquanto ele ficou encarando distraidamente o desastre que era seu quarto. Ele tinha tratados sobre todos os assuntos espalhados ao redor das várias superfícies de seu quarto: relações exteriores, geografia, redação, aritmética, diversos ramos diferentes de ciência, e todos eles tinham anotações copiosas e calhamaços de papel espalhados ao redor e dentro deles. Ele suspirou enquanto movia grandes quantidades de papéis para chegar a seus baús abaixo deles.

    Todos os outros espaços que não estavam ocupados por livros estavam ocupados por pilhas de roupas. Ele não havia lavado roupas em tantos meses que perdera a conta. Tudo o que possuía estava sujo. Não apenas um pouco sujo, mas sujo como lama seca. Ele afastou algumas das roupas imundas e começou a empilhar suprimentos em sua sacola. As últimas coisas que pegou foram seu arco, sua aljava de flechas de aço dracônico, e sua espada. Ele segurou a espada gentilmente por um momento, passando seu dedo indicador pelo punho. Esta espada representava tantas coisas para ele: sacrifício, disciplina, amor. . . ela lhe fora dada pelo único mestre em espadas dracônicas existente: Cerralys. 

    O termo mestre — no mundo dracônico — era um título concedido a um dragão que atingira um nível de habilidade inigualável em um dos cinco estudos diferentes. Eles tinham um mestre para voo, combate, furtividade, cura, e transformação ou mudança de essência. Esses mestres estavam espalhados por todas as terras de Terradin, e cada escola se localizava em um local remoto pois, caso Obsidiano conseguisse rastrear as escolas e seus mestres, ele os destruiria.

    Ele amarrou sua sacola e levantou-se. Obsidiano destruiria Auri também se ele não se apressasse. Pendurou seu arco e aljava de flechas em suas costas, deslizou sua espada na bainha feita sob medida que cruzava com o arco em suas costas, e deixou seus aposentos sem olhar para trás.

    Seus pés moveram-se inconscientemente pelas muitas escadas e corredores até o pátio interno, deixando sua mente livre para vaguear. Adiante, para o que ele estava fazendo. Para dentro, para o que ele estava sentindo. A resposta a ambos era que ele não sabia. Ele não sabia o que estava fazendo, e certamente não entendia nada do que estava sentindo.

    Ele andou rapidamente pelo Grande Salão e pausou do lado de fora para abrir outra porta à sua esquerda. Esta porta era posicionada no fundo de um recesso escondido. Ela levava a uma escadaria escurecida e raramente utilizada, e finalmente se abria no pátio interno central: O campo de treinamento do Salão.

    Quando chegou ao fim, ele abriu a porta e imediatamente levantou sua mão para proteger os olhos quando o brilho intenso do sol o atingiu em cheio no rosto. Ele deu alguns passos para dentro do pátio interno e olhou ao redor. Parecia que Cerralys terminara de treinar os soldados — eles estavam estacionados em lugares diferentes nas partes superiores do Salão — e agora ele seguira para treinar seus estudantes. Seu estudante mais novo estava no momento no círculo interno com ele.

    Stephen era franzino, de figura rígida, cabelos castanho escuros, e grandes olhos verdes. Desde o primeiro dia em que o rei concedera a Stephen uma vaga na escola, houvera uma ligação especial entre eles. O rei via algo diferente no garoto . . . algo que os outros não podiam ver.

    Eles estavam próximos, a alguns passos um do outro. O rei avançou sobre Stephen com lentidão exagerada, enfatizando cada ponto de ataque e movendo a espada do garoto para a posição correta quando ele falhava em colocá-la ali por si só. Nachal assistiu à cena desenrolar-se por vários minutos em silêncio — ninguém havia notado sua entrada no pátio interno — antes de deixar cair silenciosamente sua sacola, esgueirar-se furtivamente atrás de dois homens desconhecidos parados em formação ao redor do círculo, e descaradamente bisbilhotar sua conversa sussurrada. Raiva aflorou instantaneamente.

    —Não sei porque o rei se dá ao trabalho com este — sussurrou o de cabelos escuros, mantendo os olhos no que ocorria no círculo interno.

    —A criança é patética. Mesmo daqui eu posso vê-lo tremer.

    O outro concordou e riu enquanto Stephen atrapalhava-se com sua espada no meio do ringue. Ela caiu com um baque surdo no chão.

    Nachal não para pensar, apenas agarrou e puxou. Os dois voaram para trás, aterrissando na terra empoeirada e batida do pátio interno. Ele moveu-se para ficar sobre eles enquanto balbuciavam cegamente, suas cabeças girando para cima para ver o rosto de seu atacante. Quando o viram, ambos ficaram completamente imóveis.

    Ele agachou-se ao lado deles para que ninguém mais pudesse ouvir.

    —Vocês demonstram respeito a todos aqui — ele disse silenciosamente, gelo escorrendo em suas palavras.

    —Se não conseguirem fazer isso, vocês irão embora —seus olhos queimaram os deles por um longo momento. Sua voz caiu ainda mais em tom. —Estamos entendidos?

    Ambos acenaram com a cabeça, quase simultaneamente. Ele analisou seus rostos para garantir que haviam compreendido antes de esticar uma mão para cada um. Depois de ter colocado os dois em pé, ele afastou-se propositadamente. Ele podia sentir seus olhos acompanhando-o enquanto se encaminhava para o limiar do círculo.

    Um homem mais velho que estivera parado próximo aos dois esperou até que Nachal se aproximou dele e então sussurrou:

    —Eles são humanos, e novos.

    —Isso explica um pouco — disse Nachal com um meio sorriso, assistindo à ação no meio do círculo. Humanos nunca sabiam como lidar com ele. Com dragões parecia ser instintivo. Talvez viesse com experiência. . .

    —Como você está, Glines?

    Glines, um dragão que parecia mais velho que a terra na qual pisavam, sorriu.

    —Me sinto vivo.

    Nachal riu entre dentes enquanto dava um tapa leve nas costas dele.

    —Agarre-se a esse sentimento — ele disse secamente. Passou pelo limiar do ringue e entrou no círculo interno.

    —Acho que vou tentar um turno no ringue.

    —Isso vai ser interessante — Glines murmurou atrás dele.

    Cerralys parou de falar assim que Nachal se aproximou o suficiente para entender o que ele estava dizendo para Stephen. Ele olhou para cima, baixando suas palmas para apoiá-las no pomo da espada que havia enfiado na terra.

    —Você não deveria estar fazendo as malas? — Ele perguntou em tom levemente divertido.

    Nachal gargalhou.

    —Feito. Chute minhas roupas sujas para baixo para os aposentos da lavanderia enquanto eu estiver fora, sim? Está começando a cheirar mal lá dentro.

    Cerralys fez uma careta.

    —Não sei qual parte dessa declaração é mais deplorável, o fato de você me pedir para fazer algo que você é mais do que capaz de fazer sozinho, ou que você só agora está começando a perceber o fedor absoluto que exala do seu quarto e se infiltra pelas minhas escadas.

    Nachal chutou a espada de Stephen do chão para o ar com seu pé. Ela caiu perfeitamente em sua palma.

    —Estive ocupado. Não havia reparado.

    —Você deve ter estado extremamente ocupado então — disse Cerralys secamente.

    Nachal acenou com a cabeça distraidamente, depois entregou a espada do garoto de volta a ele.

    —Regra número um — ele disse —, não deixe ninguém intimidar você. Nem mesmo o rei.

    Especialmente o rei — adicionou Cerralys em voz baixa.

    Ele desembainhou sua própria espada e encarou Cerralys, suas sobrancelhas escuras elevando-se em direção ao cabelo que vivia caindo em seu rosto enquanto sorria sombriamente.

    —Que tal provarmos para ele que não estamos intimidados, Stephen?

    Stephen parecia não concordar muito com a parte de não estar intimidado.

    —Você ainda não treinou comigo, não é?

    Stephen negou com a cabeça.

    —Agora é uma boa hora.

    Stephen suspirou.

    —Se você diz, senhor.

    Ele segurou sua espada cuidadosamente com um aperto muito forte, obviamente tentando não a derrubar novamente.

    —Solte seu aperto — Nachal aconselhou. — Isso, assim mesmo. Agora fique assim — ele empurrou-o gentilmente até a posição de prontidão.

    —É importante manter a sua espada nesta posição. Muito alta e você não consegue proteger seu corpo em tempo; muito para baixo e você não consegue proteger seu rosto e pescoço.

    Stephen acenou com a cabeça, concentrando-se intensamente em manter sua espada na posição correta.

    —Quando eu disser agora, dê uma investida e tente acertar um golpe.

    —Mas ele é o rei — Stephen sussurrou miseravelmente.

    —Agora não, ele não é — disse Nachal sombriamente, virando-se para encarar Cerralys de novo. — Agora ele é o seu mestre de esgrima.

    Ele atacou rapidamente e sem aviso, lutando com intensidade ardente desde o primeiro encontro de espadas. Todas as suas frustrações, sua raiva reprimida, sua tristeza e desespero, ele os libertou todos de dentro de seu coração e de sua mente, e os deu voz com sua espada. Todo o pátio interno ficou completamente silencioso. Era uma quietude que até ele podia sentir.

    Ele lançou-se para trás bem a tempo — por pouco — e então lançou-se de volta novamente para outra rajada de golpes. Mas cada um deles Cerralys defendeu com a rapidez de uma víbora. Cerralys era muito rápido para ele. Sempre fora muito rápido para ele.

    Quanto mais ele lutava, mais difícil ficava respirar. Ele começou a tomar grandes goles de ar para os pulmões, tentando conseguir o suficiente para continuar firmemente em pé. O ar sufocante estava espesso e quente. Suor gotejava em sua testa, escorrendo em seus olhos e fazendo-os arder.

    A fadiga de repente se chocou contra ele. Ele cambaleou e por pouco evitou a lâmina de Cerralys conforme ela assoviava pelo ar, varrendo em direção ao pulso que pulsava forte em seu pescoço. Foi então que ele percebeu que ele realmente deveria tentar dormir mais.

    Ele defendeu o golpe desajeitadamente, cambaleando de novo quando as espadas colidiram. Precisou de toda a sua concentração só para evitar ser empalado. Cerralys era um mestre, e neste momento ele se sentia cada centímetro o aluno desajeitado. 

    O ar chiando em seus pulmões queimava mais ferozmente agora. Cada golpe ecoava por seu corpo inteiro, ressoando com cada osso. Ele fez uma finta para a esquerda, circundou, fez uma finta para a direita, circundou, avançou, defendeu, recuou um passo, avançou novamente, e depois começou a bater como louco no aço que correspondia, conseguindo forçar Cerralys a recuar um único passo.

    —Agora! — ele bradou roucamente para Stephen.

    Várias coisas aconteceram então, quase simultaneamente. Cerralys olhou para Nachal e então baixou sua espada até ela estar com a ponta na terra, deixando-o completamente indefeso. Stephen avançou. Nachal assistiu a completa paz envolver a expressão de Cerralys antes de entrar em pânico e avançar também, apenas uma fração de segundo depois de Stephen. Seu momento maior e seu terror absoluto o fizeram chegar primeiro. Suas lâminas se encontraram com um som doentio de metal guinchando, a menos de um centímetro do peito de Cerralys.

    Stephen caiu ao chão, derrubando sua espada, enquanto os dedos entorpecidos de Nachal derrubaram a sua própria.

    —O que — ele perguntou com as mãos nos joelhos, ofegando profundamente — foi aquilo?

    —Treinamento.

    —Suicídio — ofegou Nachal.

    —Treinamento.

    Seus olhares se travaram. Nachal suspirou enquanto se levantava lentamente.

    —Treinamento para quem?

    Os lábios de Cerralys estremeceram.

    —Para Stephen, é claro.

    —Humph — Nachal grunhiu. Então ele olhou ao redor e riu. — Acho que assustamos o resto dos seus alunos, velho. 

    Cerralys o ignorou e ajudou Stephen a levantar-se do chão, tirando um pouco do pó dele. Stephen estava encarando o rei com olhos arregalados que não piscavam.

    —Eu quase matei você! — ele sussurrou horrorizado. — Eu quase matei o Rei dos Dragões!

    Nachal estremeceu, lembrando que dissera quase essas exatas palavras apenas algumas horas atrás. Cerralys olhou para ele com uma risada dançando em seus olhos antes de voltar-se novamente para o garoto pálido e trêmulo.

    —Parece ser o meu dia para esse tipo de experiência.

    —Não é engraçado — Nachal rosnou para ele.

    Stephen apenas sacudiu a cabeça, ainda em choque. Ele tremia visivelmente da cabeça aos pés. Cerralys pôs uma mão quente em seu ombro. Seu sorriso era muito gentil.

    —Nunca entre no quarto de Nachal sem ser anunciado, Stephen. Ele é muito mal-humorado pela manhã.

    O olhar arregalado de Stephen voltou-se para Nachal — dando a ele o tipo de olhar que uma lagosta cozida daria à pessoa que a comia, caso estivesse viva—e Nachal sentiu um sorriso flutuar em seus lábios.

    —Eu não tinha comido ainda — ele disse

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