Museu, educação e cultura: Encontros de crianças e professores com a arte
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Sobre este e-book
Na primeira parte da obra estão reunidos textos cuja tônica é a conceituação de museus e demais espaços culturais como locais privilegiados de preservação da memória cultural e de produção de conhecimento. A especificidade do conhecimento em questão, que abarca não apenas o científico, mas também os de natureza estética e poética, destaca-se como o interesse maior das autoras. A segunda parte traz à cena a perspectiva de professores e crianças que foram ao encontro da obra, por meio de narrativas das experiências vividas em diversos museus brasileiros - viagens investidas de subjetividade, depoimentos que relatam experiências estéticas.
Com essa publicação, as organizadoras atestam sua crença na importância do encontro com a obra, que pode nos levar à experiência da alteridade: encontro com diferentes culturas, com o outro e sua diferença, encontro consigo mesmo. - Papirus Editora
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Museu, educação e cultura - Maria Isabel Leite
MUSEU, EDUCAÇÃO E CULTURA
ENCONTROS DE CRIANÇAS E
PROFESSORES COM A ARTE
Maria Isabel Leite e
Luciana E. Ostetto (orgs.)
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COLEÇÃO ÁGERE
Ágere, termo latino, é fonte primeira de duas palavras de uso corrente em português: agir (que chegou a nós do francês, agir) e arte (de ars, artis).
Assim, escolhemos Ágere para denominar uma coleção que busca instigar o debate e desenvolver a crítica tanto no agir educacional, no sentido amplo, relacionado às várias disciplinas que integram o currículo (campo do universo objetivo), quanto no campo da arte, via de expressão privilegiada do universo subjetivo e espelho das culturas e de seu tempo.
SUMÁRIO
PREFÁCIO
Ary de Macedo
APRESENTAÇÃO
Maria Isabel Leite e Luciana Esmeralda Ostetto
PARTE I
MUSEU, EDUCAÇÃO E CULTURA
1. MUSEUS DE ARTE: ESPAÇOS DE EDUCAÇÃO E CULTURA
Maria Isabel Leite
2. MUSEU DO BRINQUEDO COMO CENTRO CULTURAL INFANTIL
Telma Anita Piacentini e Monica Fantin
3. OLHARES E SABERES DO ENCONTRO COM A ARTE
Gabriela Salles Argolo
4. TURBILHÃO DE SENTIMENTOS E IMAGINAÇÕES: AS CRIANÇAS VÃO AO MUSEU, OU AO CASTELO...
Adriana Aparecida Ganzer
5. O SEU OLHAR MELHORA O MEU: O PROCESSO DE MONITORIA EM EXPOSIÇÕES ITINERANTES
Adriana de Almeida Machado
6. ESPAÇOS DE CULTURA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES/MONITORES
Cristina Carvalho
PARTE II
ENCONTROS DE CRIANÇAS E PROFESSORES
COM A ARTE: OLHARES E DIZERES
1. DE LUZES E DE VOOS: EM BUSCA DA BELEZA PARA SER HUMANO
Luciana Esmeralda Ostetto
2. AMPLIANDO MEU REPERTÓRIO VIVENCIAL, VIAJANDO E ENTRANDO NO MUSEU
Magda Ugioni do Livramento
3. MEU ENCONTRO COM PICASSO... E COMIGO
Samantha Fernandes da Silva
4. O ESCOLAR – COMO VAN GOGH ME FEZ PENSAR SOBRE ESCOLA
Celia Lucia Baptista Flores
5. COMI O ABAPORU COM OS OLHOS: UM MERGULHO ANTROPOFÁGICO NAS CORES DE TARSILA
Rita Márcia Magalhães Furtado
NOTAS
SOBRE AS AUTORAS
OUTROS LIVROS DA COLEÇÃO ÁGERE
REDES SOCIAIS
CRÉDITOS
PREFÁCIO
Talvez nada exista de mais importante que isso: que para nos deleitarmos com essas obras, devemos ter um espírito leve, pronto a captar todo e qualquer indício sugestivo e a reagir a todas as harmonias ocultas.
E.H. Gombrich, A história da arte
É com grande alegria que constatamos o desaparecimento de antigos preconceitos contra os museus. Eram eles considerados depósitos empoeirados que mereciam visita apenas em caso de pesquisas especializadas, ou raríssimos surtos de curiosidade própria de gente mais velha.
Envolvidos com atividades correlatadas a museus e órgãos culturais, sem vínculo pecuniário, há mais de 40 anos, podemos comparar a passada ausência de público com a atual alta frequência dos museus.
Em 1962, a convite do então diretor do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, José Roberto Teixeira Leite, e aceitando sua esplêndida sugestão, fomos fundadores, com outros companheiros, da Associação de Amigos, a qual serviu e ainda serve de exemplo para sociedades semelhantes. Publicações de álbuns de gravuras, valorização da arte africana, destaque para os nossos fantásticos naïfs foram algumas das atividades iniciais que visavam tornar popular
a importância do museu.
Na década de 1990, o entusiasmo e a competência da diretora do MNBA, Heloísa Lustosa, fizeram reviver a Associação de Amigos; Heloísa conseguiu, em sua inspirada gestão, dar o grande impulso e indicar caminhos para a visitação em larga escala a nossos museus. Indispensável lembrar as exposições, entre outras, de Rodin, Monet, Dalí e do nosso Guignard, as quais atraíram milhares de visitantes. A mostra de Monet, por exemplo, teve picos de 15 mil pessoas/dia e mais de 400 mil pessoas em seu total. A semente lançada germinou e cresceu com a megaexposição Mostra do Redescobrimento
, inicialmente apresentada em São Paulo e posteriormente ramificada em vários museus do Brasil, dando continuidade às novas perspectivas, demonstrando excelente receptividade do grande público, o qual, ficou comprovado, necessitava daquelas oportunidades para confirmar o valor e a importância da arte na vida da comunidade.
As teses e as esplêndidas conclusões de Luciana Esmeralda Ostetto e Maria Isabel Leite, reveladas já em algumas publicações anteriores e ora confirmadas, fazem acreditar que desapareceram, por completo, aqueles antigos preconceitos, eles, sim, empoeirados e bolorentos.
É uma verdadeira proclamação das autoras o reconhecimento e a divulgação de serem os museus de arte espaços de educação e cultura. Daí partem corolários e premissas que vão desde a apreciação do redescobrimento de linguagens até a busca da beleza para o ser humano. No caminho, aprofundam temas que, esperamos, constituirão futuras obras: novos olhares para a formação de professores; melhora da qualidade de atendimento nos museus; abertura para novas experiências que falem ou transmitam sentimentos; atenção ao que seriam atrações para crianças; importância dos monitores como agentes ativos de cultura – esses são temas de real importância que as autoras oferecem, como dádivas, para quem desejar aproveitá-los e expandir-se em novas direções da cultura. São acenos e promessas para novos impulsos criadores, como um desafio a quem por eles se apaixonar e quiser se embrenhar na realização de novos textos.
Algumas passagens e sugestões são inesquecíveis, neste livro. Assim é o encontro do original da obra que era conhecida, pelo observador, em reproduções. Essa visão, além de dominadora, pode servir de abertura para outros caminhos, para outras aventuras
plásticas que enriquecerão o visitante do museu, como nenhuma experiência momentânea
poderá realizar. Dizemos momentânea
porque outros tipos de enriquecimento cultural demandam tempo, e tempo longo. Assim, os valores literários só são apreciados depois de vastas leituras; a apreciação musical, depois de muito ouvir. Só o encontro com a obra de arte constitui o momento supremo (Stefan Zweig não o contemplou!) que pode modificar e dar novos rumos à vida do atento observador, ampliando seus conhecimentos na descoberta de novos horizontes para a beleza.
Ousaríamos dizer que também encontramos neste livro preciosos conselhos até para renomados críticos. Até onde tem o texto escrito o direito de invadir
as artes visuais? Até onde vai a responsabilidade das informações? Como veiculá-las, com palavras esdrúxulas, sem macular a obra, o objeto de sua apreciação?
Importante – de alta consideração – é enfocarmos a bibliografia e as citações que enriquecem o volume. São elas fonte de buscas com preciosas indicações para o desenvolvimento dos temas. Representam um valioso auxílio para quem deseja o aprofundamento dos assuntos abordados.
Nos Encontros de crianças e professores com a arte
, título tão bem-completado com Olhares e dizeres
, encontramos testemunhos vários, com os mais diversos aspectos de relacionamento, ou de aventuras
, que enriquecem, sobremodo, os principais temas do volume. São complementações subjetivas com a pureza e o frescor que só se encontram nas experiências pessoais que envolvam dedicação e, por que não dizê-lo, amor ao que se faz. Ressaltar um ou alguns desses testemunhos redundaria em meras traduções que quase sempre são a simples sombra do original. Melhor lê-los em primeira mão, sem impressões de terceiros, as quais, por certo, impediriam que cada leitor pudesse tirar desses exemplos pessoais e inalienáveis o que de melhor eles oferecem: a lembrança e a saudade de um encontro com a arte. Recebendo tal impressão, terá o leitor a imensa vantagem de utilizá-la em um próximo convívio com o museu e com a arte.
Merecem, as jovens autoras, nosso profundo respeito e nosso agradecimento pelos caminhos que descortinam em suas louváveis peregrinações. São as novas gerações que, agora, indicam caminhos de cultura, como vias de educação e aprimoramento, estradas que, passando pelos museus, visam atingir seu destino final – o conhecimento e a valorização da arte.
Ary de Macedo[1]
APRESENTAÇÃO
Instigadas pela lacuna de publicações na área que permeia a educação, a arte e a cultura, publicamos o livro Arte, infância e formação de professores: Autoria e transgressão, em que apresentamos algumas pesquisas e experiências. Nele falamos de criação, de afirmação da autoria – que se faz transgressão, na escola e na vida. Apontamos a necessidade de rever conceitos e de estruturar teoricamente esse campo de conhecimento que se situa na interface da arte com a educação. Mais importante, fazemos um convite ao diálogo com diferentes linguagens, ao ensaio de novos olhares para a formação de professores, a fim de contemplar a formação cultural.
Lá, somos duas professoras, pedagogas de formação, com histórias que se encontravam e se identificavam, colocando nossas vozes no convite, no chamado. Aqui, hoje, vamos ampliando vozes e olhares, promovendo mais e significativos encontros. Desejo maior: possibilitar o encontro de tantas e diferentes vozes a falar de suas experiências, de suas pesquisas, de sua aproximação com o universo artístico-cultural e que, ao estruturarem seu discurso, também provoquem o encontro do público/leitor com objetos de cultura. Encontros gerando encontros: autoras/professoras de cantos diversos desse imenso Brasil, falando de instituições diferenciadas de educação e cultura; pensando a educação estética, a educação do olhar, a formação cultural do ser humano sensível, implicado no mundo que o cerca.
Na multiplicidade de olhares, fazeres e dizeres, os artigos reunidos neste livro tratam das relações entre museu, educação e cultura, trazendo elementos teóricos de análise e crítica; enfocam, também, a relação direta do sujeito com o objeto de cultura, a obra, discutindo, assim, os processos constitutivos do olhar sensível e crítico. Estão aqui não apenas textos de pesquisa, mas, também, depoimentos que evidenciam e problematizam a experiência estética. Esse talvez seja um dos aspectos mais caros da nossa organização, que apresenta os textos em duas sessões, percorrendo a temática, já no título revelada.
Museu, educação e cultura
, como primeira parte, reúne seis textos provenientes de pesquisas cariocas, catarinenses, gaúchas e paulistas. Neles, a tônica foi a conceituação dos museus e demais espaços culturais como lócus privilegiados – mas não únicos – de acervo e preservação da memória cultural, e de produção de conhecimento. A especificidade do conhecimento em questão, que abarca não apenas aquele científico, mas também os de natureza estética e poética, destaca-se como o interesse maior das autoras.
Se os conceitos de arte, de cultura, de memória são ali evidenciados, os artigos aprofundam essa relação e trazem importantes e reveladoras análises sobre as condições oferecidas pelos museus para que diferentes sujeitos se apropriem e produzam conhecimento. O papel social do museu foi questionado. Sua importância na formação cultural de todos os cidadãos foi sublinhada. Assim, museu, educação e cultura, mais do que simples termos complexos, transformam-se em materialidade de propostas e ações que podem se entrelaçar, que precisam se encontrar para a realização de uma cidadania plena, para a vida ampliada de todos, trançada, tecida e enriquecida nos encontros do vasto mundo... no cotidiano, com a arte e a cultura.
Na continuidade dessas discussões sobre a forma como museus e demais espaços culturais se organizam para favorecer a relação entre o sujeito e o objeto cultural, podemos vislumbrar propostas de serviços educativos – tanto em museus de arte, como o Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro e o Museu de Arte do Rio Grande do Sul, quanto em outros espaços de cultura, como a Assembleia Legislativa e o Solar Grandjean de Montigny, também no Rio de Janeiro, ou o Museu do Brinquedo, em Florianópolis, assim como diversos espaços que abrigaram exposições itinerantes por todo o interior de São Paulo.
E sobre os monitores, guardas e visitas guiadas, algo a dizer? Muito! A formação de monitores é igualmente trazida para o centro do debate, com os dados de pesquisa apresentados oferecendo um roteiro para reflexão. Guiar, monitorar, mediar, educar... há diferença? Como poderia ser viabilizada a formação dos sujeitos que atuam em museus e instituições culturais? São perguntas que surgem e vão ampliando o tratamento do tema, que poderia ser formulado assim: como garantir um dos papéis sociais do museu, a apresentação dos objetos de cultura de forma crítica, provocando o diálogo do público com eles, sem ofuscar o olhar, sem barrar o encontro direto do sujeito com a obra?
E seguimos. Encontros de crianças e professores com a arte: Olhares e dizeres
, a segunda parte do livro, como o próprio título indica, traz à cena olhares e dizeres de professores e crianças que foram ao encontro da obra. Os textos narram experiências vividas em museus brasileiros, em diferentes partes do país. Essa característica é fundamental, pois, ao falarem desses espaços – Pinacoteca do Estado, Museu de Arte Contemporânea da USP, Museu de Arte de São Paulo e Museu de Arte Brasileira/Faap, em São Paulo; Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro –, conferem-lhes visibilidade. Temos, igualmente, a citação de espaços expositivos tradicionais, como a OCA-Ibirapuera, cenário de grandiosas exposições, em São Paulo.
Essas narrações são viagens investidas de subjetividade, particularidades de cada fruidor. Aqui, ali ou acolá, todas carregadas de significados, porque traçadas com as tintas e as cores – pode-se dizer com a história – de cada narrador. Todos professores, da educação infantil ao ensino superior. Uns trazendo também a escola e as crianças para a cena – escolas onde trabalham e crianças das quais são professores ou as escolas onde estudaram as crianças que foram... Cada um falando de um ponto de vista – um lugar social, um espaço geográfico, que dá o tom do discurso. É justamente a diversidade entre eles que possibilita o encontro e a troca – de olhares, dizeres e saberes... Na diversidade, a certeza de saber-se único e ao mesmo tempo múltiplo – O seu olhar melhora o meu
, diz o poeta. A partilha com o outro fica aqui evidenciada na busca de respostas às questões: o que é arte? Para que a arte? O que é feio ou bonito? Qual a intenção dos artistas? Qual o papel da escola na educação estética?
Outro aspecto a ser ressaltado dessa segunda parte é a ousadia de dizer o talvez indizível. Ao elaborar um discurso que marca o encontro de cada um com a obra de arte, cada qual se afirma autor. Mas, antes de dizer, foi preciso entrar no museu, autorizar-se a estar diante da obra. Estranhar, indignar-se, reagir positiva ou negativamente, acolhendo ou rejeitando a obra, emocionar-se às lágrimas, calar-se, surpreender-se, maravilhar-se, deslumbrar-se, refletir, indagar: todas ações possíveis, que só acontecem a partir do momento em que cada um se autoriza a entrar no espaço do museu – tão comumente encarado como pertencente a alguns, uma minoria, os escolhidos, ilustrados, eruditos... Não há, pois, aqui, o discurso do especialista. Todavia, vai ficando evidente, por meio do conjunto desses ensaios no livro, que, se a obra fala, desperta em nós o desejo de saber seu idioma. A cada vez que estamos diante dela, trabalhamos a educação dos sentidos