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Rastros de telerrecriação em cartografia movente
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Rastros de telerrecriação em cartografia movente
E-book127 páginas1 hora

Rastros de telerrecriação em cartografia movente

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Sobre este e-book

Este livro é uma coletânea de conferências, palestras e apresentações realizadas por Adriana Coca, em 2017 e 2018, na Casa do Saber de São Paulo e em universidades brasileiras e no exterior. As exposições foram revisadas e ampliadas para serem publicadas como texto e têm como fio condutor a reflexão sobre a dinâmica da criação e da pesquisa, sobretudo em relação à linguagem televisual e as rupturas e reconfigurações de sentidos na teledramaturgia da TV aberta no Brasil. Ainda que as abordagens versem sobre diferentes temas como: a pesquisa cartográfica, as estruturalidades das narrativas ficcionais seriadas e as semioses ou os processos de significação na TV, Coca tece conexões sobre esses vieses aparentemente distintos, com a desenvoltura de quem conhece a produção acadêmica da área e sabe traduzi-la para o seu leitor, sem abandonar a leveza textual e o rigor científico, inerentes a sua produção como pesquisadora. Eis um livro que nos instiga a pensar a televisão.

Adriana Pierre Coca é doutora em Comunicação e Informação pela UFRGS, mestra em Comunicação e Linguagens pela UTP e especialista em Teoria e Técnicas da Comunicação pela Fundação Cásper Líbero. Antes de se tornar professora de televisão, trabalhou na TV Cultura de São Paulo e no SBT, onde produziu, editou e dirigiu programas de TV. É autora dos livros Tecendo rupturas – o processo da recriação televisual de Dom Casmurro (Rio de Janeiro: Tríbia, 2015) e Cartografias a teledramaturgia brasileira (São Paulo: Labrador, 2018).
IdiomaPortuguês
Data de lançamento25 de mar. de 2019
ISBN9788587740625
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    Rastros de telerrecriação em cartografia movente - Adriana Coca

    As estruturalidades

    da teleficção e a busca

    pelo efeito de real

    ¹

    Olá, boa tarde a todos. Primeiramente, agradeço ao Prof. Carlos Eduardo Marquioni², por esse convite que muito me honra.

    Recentemente, publiquei a minha pesquisa de doutorado que trata das rupturas e reconfigurações de sentidos na teledramaturgia da TV aberta brasileira. E hoje vou discutir com vocês um dos aspectos abordados na tese, que é a construção do efeito de real (BARTHES, 2012). Dividi a exposição em dois momentos, uma introdução teórica para vocês compreenderem como foi pensado esse estudo e, em seguida, a discussão de alguns exemplos empíricos, para observarmos os signos que asseguram o efeito de real, uma das regularidades da teleficção.

    Essa investigação tem como pilar teórico central a Semiótica da Cultura (SC). Iuri Lotman é o principal representante dessa perspectiva teórica. Lotman (1999) pensa a cultura como um texto que abarca textos dentro de textos. Para o autor, os códigos tecem os textos da cultura, que tecem as linguagens, que formam os sistemas culturais. Cada linguagem tem códigos específicos, que organizam suas estruturalidades, suas gramáticas. A linguagem televisual é um texto da cultura, com códigos próprios que a constituem, que a regem.

    A estruturalidade é a qualidade textual da cultura sem a qual as mensagens não podem ser reconhecidas, armazenadas, divulgadas. Diríamos que o sistema modelizante cria estruturalidades ao mesmo tempo em que é determinado por ela num processo de impregnação mútua (MACHADO, I., 2003, p. 158-159). Compreender as estruturalidades é reconhecer as gramáticas que organizam determinada linguagem, que se modelizou a partir de uma codificação própria para a transmissão de mensagens, constituindo seus sistemas modelizantes, ou seja, os modos de organização das linguagens.

    Segundo os pressupostos da SC, são os códigos que asseguram certa regularidade na transmissão da informação de um sistema cultural para outro. No entanto, os sistemas se atualizam, ou por transformações graduais, mais lentas, ou por rupturas de sentidos em relação aos códigos já conhecidos, sendo essa via a forma mais intensa de reconfiguração dos textos da cultura. Para Lotman (1999), os órgãos do sentido reagem aos estímulos que, pela consciência, são percebidos como algo contínuo. Esse processo de percepção pode operar sobre o previsível e o imprevisível. A primeira percepção é aquela já esperada, que tende à estabilização; a segunda, oposta, leva à desestabilização, que pode provocar rupturas de sentidos. Quando a ruptura é drástica, Lotman (1999) nomeia o processo de explosão semiótica ou explosão cultural.

    Ou seja, os sistemas se organizam por meio de previsibilidades e imprevisibilidades. Imprevisível é algo que não é regular em determinado sistema da cultura, portanto a imprevisibilidade pode provocar as rupturas de sentidos. Como não está incluída num sistema, essa irregularidade/imprevisibilidade pode não propiciar uma troca semiótica, tornando necessária a reordenação dos códigos de determinada linguagem. Dito de outro modo, os elementos regulares asseguram a comunicação, mas são os irregulares que propõem o novo, a reconfiguração do sistema e, consequentemente, a sua reorganização. Penso que, em relação à teledramaturgia, podemos pensar nas telenovelas, sobretudo as que seguem predominantemente os elementos regulares de se narrar e produzir ficção na TV, como o exemplo mais fácil de identificação do que seria uma previsibilidade, pois, há décadas, a maioria dessas produções é pautada pelos aspectos do melodrama e pela busca incessante ao efeito de real (BARTHES, 2012). Já como exemplos de textos teledramatúrgicos com momentos de imprevisibilidades, aqueles textos televisuais que se desviam das regularidades vigentes, recorro à obra do autor e diretor de audiovisual, Luiz Fernando Carvalho, que dirigiu e assinou o roteiro de séries como: Hoje é dia de Maria (TV Globo/2005) e Capitu (TV Globo/2008). Este foi, inclusive, o foco da minha pesquisa, as narrativas ficcionais transgressoras em relação às regularidades do meio, no entanto, nesta apresentação vou refletir apenas sobre as estruturalidades construtoras do efeito de real, que também compõe a investigação, porque, para chegar às rupturas de sentidos, foi preciso que eu compreendesse primeiro os códigos que constituem a linguagem televisual, para só depois ser capaz de apontar como esses códigos estavam sendo desconstruídos.

    Acredito que muitos aspectos das regularidades das narrativas ficcionais na TV se constroem, principalmente, porque essas histórias primam pelo efeito de real, que, grosso modo, pode ser pensado como a noção de realidade que vem do senso comum. Como explicita Balan, o telespectador tem em seu repertório o pré-conhecimento dos ambientes reais onde vive […], logo, o programa de TV proporcionará melhor grau de convencimento se os cenários e iluminações utilizadas proporcionarem ambientes que correspondam à realidade já conhecida pelo cidadão comum (1997, p. 21). Ainda citando o autor:

    Imaginemos como exemplo uma cena que ocorra em uma cozinha. Já é do conhecimento, pela vivência do telespectador, o padrão normal de luz, cor de paredes, tipos de sombras que são projetadas. Em uma cena de novela, se a cozinha não parecer ao telespectador como natural, vai proporcionar-lhe a impressão de um ambiente irreal o que, por sua vez, provocará ruídos na interpretação do conteúdo da cena. Este repertório ou pré-conhecimento do telespectador é adicionado, no dia a dia, ao ver revistas, jornais, filmes, os mais variados programas de TV, que além do real trazem embutidos certos padrões de luz e enquadramento de imagens.

    Embora eu concorde com o pensamento de Balan, que me parece contemplar com exatidão o que seria o efeito de real que atribuímos ao senso comum, acredito que, teoricamente, essa noção é um pouco mais complexa, porque os códigos que formam a linguagem audiovisual abarcam signos sonoros, visuais, corporais, entre outros, e podem se constituir como signos dotados de significação. Cada um dos elementos da cena (figurino, objetos, fotografia, cores…) em uma narrativa de ficção é pensado para traduzir na tela a história que está sendo contada. Lotman afirma que, em certos enquadramentos, a iluminação é um elemento mais significante do que a representação dos objetos […] (1978, p. 104) e, em outros, pode ser o inverso. Para o semioticista, todos os elementos de uma cena no audiovisual podem ser carregados de significação e exercer um papel fundamental na narrativa. Nessa via, compreendi que, sim, são as imagens que produzem o efeito de real, mas arriscaria dizer que, mais do que isso, impõem um sentido de realidade, que vai além da correlação com o senso comum. Antes de desenvolver essa reflexão, faço uma

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