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Ajoelhar Jamais
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E-book522 páginas7 horas

Ajoelhar Jamais

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Sobre este e-book

Embora Ajoelhar jamais seja um bordão inventado por um sonhador como pretexto para mobilizar seus amigos desocupados no início da ditadura getulista, ressurge 40 anos depois como um grito de guerra no comício de "Diretas Já". Vinculado a esses acontecimentos, conta-se a saga de um menino chamado Jean, que vai se tornando adulto e reencontrando suas origens. Um delicioso romance pela aventura tortuosa da vida.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento9 de fev. de 2018
ISBN9788547320843
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    Ajoelhar Jamais - Franccis Yoshi Kawa

    Editora Appris Ltda.

    1ª Edição - Copyright© 2017 dos autores

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.

    Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.

    Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.

    Dedico esta obra à Vó Lena, que mesmo longe esteve sempre presente.

    (Helena Douthe)

    AGRADECIMENTOS

    Franccis Yoshi Kawa

    Agradeço a Ana Kawajiri, Claudia Kawajiri, Marco Kawajiri, Paulo Gabardo, Ane Gonçalves Kawajiri, Lidia Furusato, Hegbert Yamagami e Isabel Furini, que direta ou indiretamente contribuíram na realização deste livro.

    Helena Douthe

    Agradeço à minha companheira, Nina, ao meu querido filho, Paulo, e à Editora Appris, por acreditar no potencial da obra.

    À querida amiga Lidia Furusato agradeço pela grande dedicação em ajudar a revisar a obra.

    PREFÁCIO

    Quando fomos convidados a elaborar o prefácio de Ajoelhar Jamais, ficamos em dúvida sobre qual seria a abordagem mais interessante aos leitores. Foi difícil decidir como poderíamos contribuir com este livro sem destoar de sua excelente história, agregando algo além da trama desenvolvida pelos autores, mas que não se desviasse completamente dela. Optamos por contar um pouco da história por trás da história, num prefácio que é quase um pequeno conto.

    Ajoelhar Jamais começou a ser escrito por Franccis Yoshi Kawa no ano de 2010, quando o autor estava em viagem para o Japão. Franccis, que na juventude gostava de criar histórias e desenhar quadrinhos, já era então um avô, próximo dos 60 anos, há muito distanciado da sua fase de produção artística, em grande parte por não enxergar conciliação com os compromissos de sua vida e por não atribuir importância aos seus anseios criativos. Nessa viagem, no entanto, o dom adormecido, inconformado com seu sono prolongado, acordou e recuperou seu lugar na vida do autor.

    Franccis delineou a história, combinando ação, suspense e reviravoltas, seus ingredientes prediletos, incluindo referências culturais e políticas da sua juventude, transcorrida na época do Regime Militar. No entanto, o autor se ressentia da inserção de efeitos poéticos e estéticos, bem como de um desenvolvimento emocional mais aprofundado dos personagens. Já tendo retornado ao Brasil, Franccis começou a participar de diversos grupos literários e eventos para novos escritores, buscando caminhos que tornassem real a sua primeira publicação.

    Foi então que, em 2011, conheceu a poetisa Helena Douthe, a quem convidou para compartilhar a autoria do livro. Apesar do hábito de escrever poesia, a autora ficou motivada com o desafio de experimentar a prosa – desafio ainda maior por envolver dois autores – e, após conhecer o material criado por Franccis, aceitou o convite, abrindo caminho para que o livro se desenvolvesse e chegasse ao seu formato atual.

    Parcerias dessa natureza não são muito comuns, mas o que parecia improvável tornou-se a razão do sucesso deste livro. Os estilos e as habilidades artísticas de cada um, em vez de colidirem ou entrarem em conflito, mostraram-se plenamente complementares, resultando num texto harmônico e dinâmico. É impossível perceber a multiplicidade da autoria, tamanha a unidade e coerência do texto.

    Mas muito além de um processo criativo de sucesso, impressionante pela diversidade de sua autoria, este livro é uma manifestação da superação dos autores, redenção de ambos ao talento inato, finalmente tornado público. Pela obra, os autores dão protagonismo às suas vontades criativas – ato inspirador e corajoso, que serve de exemplo a quem ainda duvida de sua própria capacidade ou não dá a devida atenção aos permanentes impulsos artísticos. E quem mais ganha com esse ato de coragem e com essa peculiar combinação de habilidades somos nós, privilegiados leitores.

    Paulo Gabardo

    Escritor

    Ana Kawajiri

    Artista plástica

    Sumário

    Prólogo

    Capítulo 1 - Celine e Jean

    Parte 1 — Celine

    Parte 2 — A empresa

    Parte 3 — A faculdade

    Parte 4 — Infância de Jean, cinco a sete anos

    Parte 5 — Desfalque

    Parte 6 — Infância de Jean, oito a 11 anos. A escola rural

    Parte 7 — Fatura

    Parte 8 — Aprendiz de malandragem. 12 a 17 anos

    Parte 9 — Um bom motivo para ir embora

    Parte 10 — Viagem 61

    Capítulo 2 - Depois dos 17

    Parte 1 — A garota que parecia uma estátua

    Parte 2 — Bruxinha

    Parte 3 — Sangue sedativo

    Parte 4 — Casa incendiada

    Capítulo 3 - Vivendo em Nova Udine

    Parte 1 — Cristina

    Parte 2 — Aulas de vôlei

    Parte 3 — Emprego

    Parte 4 — Convite

    Parte 5 — Casamento

    Parte 6 — Operação Nova Udine

    Capítulo 4 - Nova fase

    Parte 1 — Carla, a colega de trabalho

    Parte 2 — Barraco

    Parte 3 — Ângelo

    Parte 4 — O dia seguinte

    Parte 5 — Luiza

    Capítulo 5 - Conexões decisivas

    Parte 1 — Creche das crianças

    Parte 2 — Geovani e Natália 

    Parte 3 — Pedido de Jean 

    Parte 4 — Uma solução

    Parte 5 — Comboio 

    Parte 6 — Final de ano 

    Capítulo 6 - Encontros e desencontros

    Parte 1 — Repercussão da viagem

    Parte 2 — Missão secreta de Natália 

    Parte 4 — Ricardo 

    Parte 5 — Queixa

    Parte 6 — Mesa redonda

    Parte 7 — Alice e Maria

    Capítulo 7 - Vingança

    Parte 1 — Ricardo e sua filha Maria

    Parte 2 — Renata

    Parte 3 — Busca 

    Parte 4 — Janete no último ato

    Parte 5 — Cristina e seu carro azul 

    Parte 6 — Dona Denise 

    Parte 7 — Nova gerente-geral

    Parte 8 — Novo emprego

    Parte 9 — Bilhete 

    Capítulo 8 - Acerto de contas

    Parte 1 — Escolha

    Parte 2 — Morte na imobiliária

    Parte 3 — Princesinha

    Parte 4 — Sucessão

    Parte 5 — Convocado para uma reunião

    Parte 6 — Mensagem

    Parte 7 — Antônio

    Parte 8 — Na porta de casa

    Capítulo 9 - Tempo de mudanças

    Parte 1 — Juarez 

    Parte 2 — Casamento de Jean 

    Parte 3 — Novo atentado 

    Parte 4 — Rio de Janeiro 

    Parte 5 — De volta à realidade 

    Parte 6 — Carina e Catarina 

    Parte 7 — Novo executivo

    Parte 8 — A tia-avó Mariana

    Parte 9 — A repórter

    Capítulo 10 - A verdade sempre aparece

    Parte 1 — Visita de Cristina

    Parte 2 — Carla e sua banda

    Parte 3 — Reportagem

    Parte 4 — Reação de Carla

    Parte 5 — O sequestrado

    Parte 6 — Mobilizando as forças

    Parte 7 — Dr. Mário

    Parte 8 — Maleta

    Capítulo 11 - Reescrevendo a história

    Parte 1 — Desvendando o mistério

    Parte 2 — Negociação

    Parte 3 — Aguardando notícias

    Parte 4 — O ponto de vista de uma repórter

    Parte 5 — Falando com Juarez

    Parte 6 — Henrique 

    Parte 7 — Natália em ação

    Capítulo 12 - Confrontando os fatos

    Parte 1 — Translado 

    Parte 2 — Velório

    Parte 3 — Infiltrando no hospital

    Parte 4 — Hora da verdade

    Parte 5 — Volta para casa 

    Parte 6 — A mãe de Alice

    Capítulo 13 - Seis meses depois

    Parte 1 — Hora de voltar a viver 

    Parte 2 — Surpresa

    Parte 3 — Gustavo 

    Parte 4 — Patrocínio

    Parte 5 — Dr. Alfredo

    Parte 6 — Prisão e delação do Dr. Alfredo

    Parte 7 — A ascensão de Juarez

    Parte 8 — Governanta

    Parte 9 — O líder voltou

    Capítulo 14 - Reencontros

    Parte 1 — Chantagem

    Parte 2 — O antigo comitê eleitoral

    Parte 3 — Clima de romance

    Parte 4 — A união

    Parte 5 — A espera

    Parte 6 — E viveram felizes... Nem todos!

    Dezoito anos depois (2003)

    Prólogo

    São Paulo, 1936. Na rua de terra batida circulam carroças, charretes, cavalos e poucos carros. Ali perto, na rua de paralelepípedos, passa um bonde — é possível ouvir o ruído metálico das rodas sobre os trilhos. A vida é sem sentido, sem objetivo, agravada pela falta de oferta de trabalho. Nesse universo de monotonia sufocante, que inibe até a iniciativa de sair da letargia, vivem os irmãos Juarez, Gílson e Mariana Rodrigues e os amigos Jonas Monteiro, Alfredo e Antônio. Além de serem vizinhos na mesma rua de periferia, aqueles jovens fortes e saudáveis compartilhavam de uma zona de conforto, sobrevivendo à toa e evitando se arriscar fora do limite conhecido. Afundavam, assim, no marasmo de uma vida sem grandes expectativas. Os mais novos, Antônio, Mariana e Alfredo, tinham orgulho de desfrutar da companhia dos mais velhos, que, em seus 18 a 25 anos, encontravam-se desempregados.

    Por serem reféns da mesma situação, eles podiam rir e debochar sem constrangimento dos contratempos e dificuldades que faziam parte de seu cotidiano. Dentro daquele universo limitado, era impossível imaginar um mundo melhor. Tudo parecia sem sentido e até mesmo dedicar-se aos estudos parecia inútil. Ninguém ousava sonhar com uma carreira de médico, advogado ou engenheiro, por parecer, naquele momento, uma realidade inacessível. Se na rotina do dia a dia faltava comida na mesa, muito menos havia recurso para custear os estudos — era a desculpa pronta entre eles quando alguém se atrevia a levantar a hipótese de voltarem a frequentar a escola. Talvez fosse uma solução, mas o torpor que deles se apoderava impedia-os de lutar por um futuro melhor.

    A legislação trabalhista, ao conceder direitos ao trabalhador urbano, tornou atraente o emprego na cidade de São Paulo, aumentando a migração do campo para a área urbana, provocando excesso de mão de obra e a proliferação de favelas, bem como o aumento do desemprego. A carteira de trabalho, a regulamentação do trabalho e a criação de sindicatos foram constituídas no governo de Getúlio Vargas, no início dos anos 1930. Nesse cenário de mudanças, o jovem Gílson Rodrigues decidiu que era necessário também mudar, despertar o potencial de cada um para transformar o mundo. Não pretendia ser líder de nada, mas, a cada sonho que inventava, havia gente disposta a sonhar com ele. De repente, todos achavam que ele seria o líder que mudaria o mundo, só porque fantasiava o futuro, tornando suportável a dura tarefa de viver.

    Logo em seguida veio a ditadura getulista, em l937, acompanhada da alta no custo de vida. Tal conjuntura foi uma justificativa para promover manifestações carregando bandeirolas e faixas. E era como se alcançassem a glória ao final de cada passeata. Finalmente, estavam saindo do marasmo da vida parada e se enchiam de coragem, lutando por algo maior que a própria existência. Cada medida impopular do governo era um pretexto para se carregar faixas e gritar slogans, contudo, diante do agravamento da crise, os provedores naturais perdiam seus empregos e eles não podiam viver de retórica, protestos e manifestações. Alguém tinha de trabalhar ou todos morreriam de fome. Aos poucos foram se dispersando, cada um procurando uma maneira de sobreviver. Até os menores resolveram trabalhar e, com seus caixotes de engraxate, foram para o centro de São Paulo em busca de trocados.

    Oito anos depois, em 1945, no fim da ditadura Getulista, os amigos voltaram a se encontrar. Aqueles que se deram bem na vida apareceram ostentando seus carrões e tudo o que tinham conquistado. Entre estes estava Gílson, que havia se casado com a herdeira de uma indústria metalúrgica em franca expansão. Era conhecido e respeitado como Sr. Rodrigues, mas continuava parecendo uma pessoa simples. Sempre foi avesso à ostentação, porém aquele jeito humilde era só enganação. Não queria que seus ex-companheiros de manifestações soubessem que, além de se casar com uma mulher rica, tinha estudado, graduado-se em Economia e melhorado de vida. Na tentativa de calar os que não gostaram de sua transformação, Gílson, ou melhor, o Sr. Rodrigues, estava contratando quem quisesse trabalhar com ele. Achou que, dando oportunidade de trabalho, ganharia a confiança daqueles que o apontavam como traidor de uma causa que não fazia mais sentido.

    No decorrer do governo JK, que se iniciou em l956, o ramo de metalurgia começou a prosperar de maneira nunca vista, com a implantação da indústria automobilística. As pequenas empresas que se dedicavam a fabricar panelas e latinhas para as indústrias alimentícias e utensílios domésticos passaram a produzir peças de automóveis e caminhões em grande escala, possibilitando a contratação de um grande contingente de trabalhadores.

    Ao lado de grandes empresas multinacionais que montavam caminhões e automóveis, passaram a existir as metalúrgicas fornecedoras de peças e acessórios, alavancando a economia e criando uma nova categoria de trabalhadores.

    Para muitos jovens, abriam-se oportunidades de serem bem-sucedidos na vida, mas os ex-companheiros de vida parada não enxergavam a nova realidade. Se antes necessitavam de alguém que lhes desse um sonho, agora havia trabalho, mas sonhar era melhor que trabalhar. Tinham experimentado o êxtase de serem conduzidos, era bom demais fugir da realidade, era bom demais sonhar que eram capazes de mudar o mundo, mas era apenas sonho. Antes existia um líder que mostrava a visão de um futuro grandioso; sem ele, a realidade não tinha o mesmo glamour.

    À medida que as oportunidades surgiam com a industrialização, muitos se conscientizavam da necessidade de se organizar para lutar por direitos que antes não existiam. Os que estavam perdidos por falta de um pretexto para protestar viram uma chance de voltar a reviver os velhos tempos de manifestações, criando uma estranha situação: os sonhadores que nunca levaram o trabalho a sério defendiam a causa dos trabalhadores. Na visão daqueles que abraçaram a nova causa, o Sr. Rodrigues, o antigo líder, era um traidor, um sujeito que havia mudado de lado, de oprimido para opressor, de empregado para empregador, e precisava ser combatido.

    Capítulo 1

    Celine e Jean

    Parte 1 — Celine

    Setembro de 1957, aeroporto de São Paulo. Uma multidão aguardava o voo procedente do Rio que trazia, entre outros, os passageiros do avião da PanAm que vinha de Londres. Toda vez que retornava de uma temporada de estudos no exterior, amigos e amigas preparavam uma grande recepção no aeroporto e seguiam depois para comemorar na Cantina Ilha, um restaurante frequentado por universitários. Entretanto, naquele dia o local não estava reservado. Pretendia descansar, estava cansada de festas. A quantidade de gente animada no portão de desembarque era enorme. Foi abordada pelo repórter de uma emissora de rádio. Quando se fez de desentendida, o repórter tentou conversar em inglês. Para despistá-lo, rapidamente mudou de idioma, dizendo algumas palavras em francês.

    — O que foi isso? — perguntou Marina, atenta a tudo.

    — O que foi o quê?

    — Aquilo! Aquele lance com o repórter.

    — Ah, o cara me perguntou se eu ia participar da manifestação a favor da greve. Fiquei sem palavras, fingi que era estrangeira.

    — Fez bem! — disse Marina, virando-se para irem embora.

    — Espera!

    — O que foi?

    — Quem está planejando uma manifestação? — Após pensar um pouco, Celine perguntou: — Por acaso conversou com o Giancarlo?

    — Sim.

    — O que ele disse?

    — Quase nada, só perguntou.

    — O quê?

    — Perguntou o dia e a hora de sua chegada. Ele queria organizar uma grande manifestação de protesto no aeroporto. Eu disse o dia, mas menti quanto ao horário. Quando ele chegasse com a sua turba, você já teria ido embora, mas como o seu voo atrasou, deixou de ser mentira. Ele deve estar chegando.

    — Qual é o problema? — Celine percebeu o ar de contrariedade no semblante delicado de Marina.

    — Você diz que ele é seu amigo, mas eu acho que não merece sua confiança. Alguém está querendo te envolver nessa história de manifestações. Pense bem! Você ficou surpresa com a pergunta do repórter.

    — Hum... Não sei.

    — O que vai fazer com essas pessoas que vieram te recepcionar?

    — Não sei.

    — Mande-os embora.

    — Como?

    — Eu dou um jeito! — disse Marina se afastando. — Sempre dou um jeito.

    Havia uma movimentação de pessoas ao seu redor tentando abraçá-la. Alta e bem vestida, no esplendor de seus 20 anos, irradiava a elegância e a distinção de uma princesa, mas naquele momento estava em estado de choque. Seu espírito estava ausente, procurando uma solução para um perigo iminente. De repente, Celine ouviu a voz inconfundível de Marina no sistema de som do aeroporto. Ela solicitava a todos os amigos universitários frequentadores da Cantina Ilha a gentileza de imediatamente deixarem o aeroporto. Convidava toda a turma para uma churrascada no salão de festas na mansão.

    — Como é que essa louca conseguiu? — Celine estava atônita.

    — Vamos embora daqui. As suas bagagens já estão no carro — ouviu alguém dizer. Era o motorista da família, um senhor de cabelos e bigodes pretos, corpo forte e atlético. — Parece que vai esquentar o clima por aqui. Estão chegando uns baderneiros com suas bandeirolas.

    — Antônio! Gostaria de ficar um pouco mais. Não sei como, mas preciso impedir que uma loucura aconteça.

    — Mau sinal! Quem vai preparar essa festa que a sua amiga acabou de anunciar? Que eu saiba, não tem nada preparado.

    — Por favor! Prepare essa festa para mim. Preciso falar com o chefe desses baderneiros. Tenho de impedir que aconteça uma insanidade.

    — O quê?

    — Não posso explicar! Por favor, vá! É uma ordem.

    — Sim, senhora.

    — Se eu não puder chegar em casa hoje, diga aos meus pais que eu os amo!

    — Não entendi o que quis dizer com isso, mas tudo bem! Se a senhorita não puder ir, dou o recado para seus pais. Essa menina está cada vez mais esquisita! Mau sinal! — disse Antônio indo embora do aeroporto.

    Parte 2 — A empresa

    O retorno de Celine era também aguardado com expectativa na empresa da família. Por sua reconhecida capacidade de enfrentar questões conflitantes, as partes que se digladiavam por métodos e soluções divergentes esperavam por alguém que pudesse mediá-las e, talvez, conciliá-las. Sua mãe, Claire, ocupava a presidência e o pai, Gílson Rodrigues, a vice-presidência da empresa Indústrias Metalúrgicas Dumont.

    Claire Dumont era filha única e, após o falecimento de seus pais, tornou-se dona de um grupo de empresas. Beirava os 43 anos, alta, magra, pele branca e cabelos negros com alguns fios brancos aparentes, era metódica e controladora. O Sr. Rodrigues, como era conhecido na empresa, com seus 45 anos, pele branca, alto, robusto e com uma aparente calvície, visava apenas poder, aumento de produção e lucratividade. As divergências entre os dois nas tomadas de decisões na direção da empresa resultavam em conflitos entre empregados subalternos que disputavam os melhores cargos, transformando a empresa em uma panela de pressão prestes a explodir.

    Gílson Rodrigues era um empregado na empresa antes de se casar com Claire. Ao contrário dela, adotou a motivação como principal método de trabalho, sobretudo a competição e a vontade de superar metas estabelecidas. Dedicado ao trabalho, havia conquistado o seu espaço, aumentando a cada dia a sua área de influência, nomeando seus amigos e aliados para os cargos de confiança. Vangloriava-se de manter a fábrica parcialmente funcionando, enquanto os concorrentes estavam parados com a greve. Era a prova de sua capacidade de liderar, mas Claire não via dessa maneira. Achava que era mais uma evidência de sua capacidade de manipular os empregados. Contrariada com o excesso de competição entre os empregados para produzir mais, extinguiu regras de promoções que produziam conflitos e até mesmo acidentes de trabalho. No exercício da função de presidente da empresa, modificou radicalmente a estrutura do organograma e a hierarquia dos cargos, centralizando novamente o poder em suas mãos, mesmo sabendo que haveria resistência em massa e implicaria em redução de produtividade.

    Celine se viu diante de um fogo cruzado. Apesar da aparente calmaria, todos fingiam que acatavam as novas regras, mas nos bastidores travavam a luta para preservar as respectivas áreas de domínio. Sabia que seu pai era um homem sensato e, mesmo contrariado, acataria qualquer ordem vinda de Claire, mas não podia dizer o mesmo de seus comandados, que viam nele o único comandante supremo e fariam por ele qualquer coisa para ter de volta o poder de antes. Temeu pela vida de sua mãe, pois incomodava grupos radicalizados que eram a favor do Sr. Rodrigues e não aceitavam os expurgos e as demissões. A sua vida também corria perigo, pois sempre foi vista como alguém que estava do lado da dona Claire.

    — O que faz de seu empregado melhor que a velha raposa? — perguntou Celine.

    — Que falta de respeito é essa? É sua mãe! De que me chamam quando viro as costas?

    — As pessoas te chamam respeitosamente de Senhor Rodrigues!

    — Pensa que acredito?

    — O senhor sabe! Ninguém está livre de sua vigilância. O poder é tal, que é como se houvesse uma câmera espionando cada movimento suspeito, mas são pessoas levando segredinhos e recados aos seus ouvidos.

    — Por favor, não exagere!

    — Gostaria de entender a lealdade de seus comandados. Ouvi falar que a obediência é tanta que são capazes de se atirar num poço a um gesto seu.

    — Não! Ninguém vai se atirar no poço porque estou mandando, mas eles são capazes de dar a vida para salvar o grupo do qual fazem parte. Sentir que é alguém importante só é possível quando se faz parte de algo maior que a própria existência, é infinitamente melhor que ser um ninguém sozinho. Essa certeza faz de meus comandados um grupo de empregados insuperáveis.

    — Teoria interessante!

    — Reparou que nenhum engenheiro que sua mãe contratou para reorganizar o setor produtivo resistiu à contagem regressiva de 90 a 0? A contagem regressiva corresponde exatamente aos 90 dias de experiência, ou seja, aquele que é contratado por sua mãe já sabe que será demitido no fim do período.

    — Isso é boicote!

    — Se é boicote ou não, não sei dizer... Porém não há motivação para mostrar a capacidade de melhorar o que já existe.

    — Entendi. O senhor, por outro lado, acredita em cultivar a lealdade para estimular a produtividade. Acho que consegui entender a força produtiva de seus comandados. A mãe costuma dizer outra coisa.

    — O que ela costuma dizer?

    — Que o senhor é exímio manipulador de pessoas.

    Parte 3 — A faculdade

    Já não frequentava mais as aulas na faculdade de Direito. Havia convencido Giancarlo a esperar a mobilização dos diversos segmentos da sociedade para, então, participar ativamente da greve contra a carestia e por melhores salários. Tinha de lidar com as diversas correntes ideológicas na faculdade. Os que se achavam os donos do mundo imaginavam que os estudantes pobres deveriam ser impedidos de estudar. Temiam que, depois de formados, eles se tornariam seus oponentes. Os do centro e os que se consideravam neutros eram a maioria dos estudantes; tendiam para um lado ou outro, conforme suas conveniências. Os da esquerda tinham um discurso próprio, baseado no manifesto comunista. Enquanto isso, os ativistas radicais de diversas tendências digladiavam entre si para conseguir o domínio, o privilégio de ditar as regras. Unir todos os estudantes em torno de um objetivo comum estava se tornando cada vez mais difícil e desgastante. Mas havia um ponto em comum: eram todos contra as atuais políticas do Estado.

    Alguns membros do próprio movimento achavam que Celine, sendo alguém da classe rica, não poderia liderar um movimento que era do povo, em busca de melhores salários. Havia gente implicando até com as suas roupas de grife. Por ser alta e bonita, destacava-se das demais, sendo constantemente assediada, mas se enganavam aqueles que pensavam que as garotas que faziam parte do movimento eram liberais. Precisava estar atenta, percebeu que a cordialidade era só aparência. A disputa do comando estava repleta de maquinações e traições. Por conta disso, havia recebido diversas ameaças de morte. Externamente, o cerco da polícia se fechava em torno dela. Parecia ser iminente o momento de ser apreendida.

    Quando foi detida com um grupo de universitários, após uma manifestação que terminou em pancadaria, a mãe pensou que sua detenção era um equívoco da polícia militar, não sabia o que estava acontecendo. Quando os fatos vieram à tona, percebeu que não conhecia a própria filha. Justificou o comportamento dela, dizendo que ela estava em lugar errado por uma questão de solidariedade a outros estudantes menos favorecidos. Aproveitou para culpar o pai. Durante a juventude, Gílson Rodrigues tinha sido o líder de um bando de desajustados, em sua visão, que hoje o chamavam de traidor. Achava que esse fato tinha influenciado negativamente a sua filha.

    Utilizou os serviços de advocacia da empresa e sua influência para acobertar os fatos, pois uma ficha na polícia seria inconveniente no currículo da futura presidente da empresa. Durante a apuração do incidente, ficou evidente a participação de sua filha. Já era de conhecimento de muitos, mas foi uma surpresa desagradável a confirmação de que ela liderava a tal manifestação.

    Celine foi liberada com os outros estudantes. Tinha um pedido a fazer. Desta vez ela se dirigiu ao pai, para tentar libertar um amigo que continuava preso por falta de alguém influente que intercedesse por ele.

    Gílson solicitou os serviços do setor de advocacia. Ao descobrir que o rapaz era um velho conhecido da polícia, por envolvimento em outras manifestações de protesto, decidiu não dizer nada a Claire. Sabia o que era um delírio idealista, anseio de um coração puro que sonhava com igualdade e justiça.

    Aos poucos, Celine deixou de voltar para casa, para não ser obrigada a enfrentar as queixas da mãe, que vivia incomodada com os problemas administrativos. Centralizar o poder parecia ter sido uma péssima decisão. Claire estava sobrecarregada de decisões a tomar e não conseguia raciocinar com clareza.

    Claire parou de creditar o valor equivalente à sua manutenção mensal, com a intenção de demonstrar o seu poder, mas percebeu o erro, constatando que a filha podia sobreviver sem sua ajuda. A decepção era grande. Além de não poder contar mais com Celine como aliada nas futuras reformas de sua administração, sentia que havia perdido o poder de controlar a filha.

    Havia começado um expurgo na diretoria financeira, em que não havia necessidade de ser um campeão em produção ou empregado muito competitivo, bastava ser competente e honesto. Até nesse setor havia gente boicotando a nova ordem, já que dona Claire estava extinguindo setores, destruindo a estrutura de comando que não interessava a ela.

    Um dos protegidos do Sr. Rodrigues era Alfredo, antigo companheiro de aventuras de sua juventude. Em diversas ocasiões, Claire tentou demiti-lo, sem sucesso. Além de irascível, era maquiavélico, jogando as pessoas umas contra as outras, tumultuando o ambiente de trabalho. Monteiro era outro antigo amigo do Sr. Rodrigues, mas havia virado a casaca e debandado para o lado de dona Claire. Por ser um sujeito interesseiro, não era confiável, apesar de dizer que era fiel, trabalhava apenas em seu próprio benefício. Por estar exercendo a chefia no setor de segurança, não interferia na administração da empresa.

    Celine voltava para casa esporadicamente, como se tivesse saudade de seu quarto. Entrava e saía na ausência de todos, mas nunca levava nenhuma de suas roupas caras ou seus objetos, nem sequer as lembranças de viagem ao exterior. Portanto, sua mãe tinha certeza de que ela retornaria. O tempo passou, dia após dia, durante meses, a espera foi em vão. Os pertences dela foram ficando, como se tivessem sido desprezados. Com a intenção de apressar o retorno da filha para o lugar de onde nunca devia ter saído, Claire chamou Monteiro e ordenou que afastasse de vez o tal de Giancarlo Ricci. Ela acreditava que o rapaz era o único empecilho para que Celine voltasse a se comportar dentro da normalidade esperada. Eliminando a causa do mal, tudo voltaria a ser como antes. Com a ajuda de Monteiro, armou o cenário e apresentou queixa na polícia contra Giancarlo como sendo o sequestrador de sua filha. Celine, quando soube da estratégia arquitetada por sua mãe, deixou de voltar para casa.

    Um ano depois, aconteceu uma tragédia: o pequeno avião da família desapareceu. Estavam a bordo o piloto e Claire, em viagem de negócios a caminho de Rio Grande do Sul. Ao saber a notícia pelos jornais, Celine reapareceu com um filho no colo, quase irreconhecível, vestindo roupas simples demais para quem sempre escolhia roupas refinadas.

    — Vou sentir muito se algo acontecer com a minha mãe. Não gostaria que fosse assim... Eu a amo e sei que sempre se preocupou comigo. Meu Deus, cuide da mãe!!!

    Gílson demonstrou preocupação com a aparência da filha e perguntou se estava passando dificuldade financeira. Celine negou e recusou qualquer tipo de ajuda. O passado cheio de glamour não a interessava mais.

    Pareceu que ia ficar por algum tempo, mas Celine permaneceu na mansão do pai apenas durante a busca pelo avião desaparecido, o encontro dos destroços na serra catarinense e o enterro. Não tinha mais nada para falar, como se tivesse perdido a familiaridade. Ficou o tempo todo com o bebê, sem conversar com ninguém. Vagou pelos corredores e quartos vazios o tempo suficiente para chorar a tragédia. Encontrou o pai no escritório anexo ao seu quarto. Nas últimas semanas ele trabalhava pouco naquele lugar. Passava o dia inteiro e parte da noite na empresa. Parecia desnorteado, mas quando a viu fez sinal para que ela se aproximasse. Tinha chegado a hora de avaliar a situação e decidir o que fazer. A sobrevivência e o futuro deles dependiam da decisão que tomariam naquele momento.

    — Como se chama? — Gílson olhava para o bebê no colo de Celine, reconhecendo nele alguns traços familiares.

    — Jean — respondeu Celine com indiferença, como se não quisesse falar a respeito disso.

    — Só?

    — Jean Dumont.

    — Não tem o sobrenome do pai?

    — Sou sua filha e também não tenho o seu sobrenome... Quer falar a respeito?

    — Não! Você é minha filha e isso basta — Gílson se sentia visivelmente desconfortável com o assunto. Perguntava-se intimamente por que se deixara convencer por Claire e pelo sogro de que era vital dar continuidade ao nome da família Dumont, abdicando de registrar a filha com seu sobrenome.

    — Não diga a ninguém que tenho um filho.

    — Fiquei feliz e já disse.

    — Para quem?

    — Para quem quisesse ouvir. Não precisa se preocupar. São pessoas simples e boas da empresa.

    — Era isso que eu temia. As notícias se espalham rápido... do porteiro à copeira. Pode comprovar!

    — Estou aqui para te proteger — disse Gílson, estendendo-lhe a mão e oferecendo-lhe o sofá.

    — Sei disso — disse Celine, sem convicção, mas se acomodando no sofá.

    — Vou pedir ao chefe dos seguranças uma atenção especial para você e para o bebê.

    — A mãe morreu. Parece que ninguém a protegeu.

    — Ela não foi morta, foi um acidente — Gílson queria encerrar a conversa antes que se tornasse incômoda, mas Celine prosseguiu:

    — Estou falando de investigadores da aeronáutica, da polícia, do seguro. Eles falaram em sabotagem.

    — Como sabe?

    — Falei com o Alfredo. O senhor nomeou esse sujeito para diretor financeiro.

    — Pensei que não falasse com ele.

    — Parece que tomou o lugar da mãe, está se comportando como se fosse o presidente da empresa.

    — Preciso de alguém que tome decisões por mim por algum tempo. No momento ainda estou abalado.

    — É compreensível... mas logo ele?

    — Não gosta dele.

    — Ninguém gosta dele.

    — Eu o conheço desde criança. É honesto e independente, não se deixa corromper. Está comprometido com o seu trabalho e vigiado de perto por seus desafetos.

    — Claro! Subiu pisando nos colegas.

    — Por isso, tem de andar direito ou será denunciado. Ele sabe disso.

    — Sei, mas acho que não é só isso.

    — A partir do momento em que assumiu a responsabilidade de cuidar da empresa, tem filtrado todos os problemas. É um alívio para eu ficar livre de pequenos problemas e focar apenas em questões relevantes.

    — Sonegar informações é filtrar? — Celine não conseguiu reprimir a ironia ao falar sobre alguém que há muito enxergava como mau caráter.

    — Depende do ponto de vista. Para mim o trabalho do Alfredo é satisfatório. Os investigadores chegaram e ficaram conversando com ele. Significa que o assunto não era relevante.

    — Acredita nisso?

    — Sim!

    — Não confie tanto nesse sujeito.

    — Ele tem um débito comigo, aliás, um débito antigo. Disse que tinha chegado a hora de retribuir o que eu tinha feito por ele. Quando éramos jovens, eu o protegia. Ninguém ousava bater nele.

    — Sei, é seu cão fiel. Isso que ele é.

    — Ele é meu amigo. Disse que havia uma equipe de advogados tratando do meu caso e sugeriu que eu desaparecesse por algum tempo, para evitar o assédio de gente tentando me incriminar.

    — Por que isso?

    — Sou beneficiário de sua mãe de várias formas, sobretudo num seguro de vida. Por isso estão me investigando.

    — Faça o que achar melhor. Preciso ir.

    — Pensei que ia ficar.

    — Eu gostaria, mas não posso.

    — Claro que pode! Você é livre para fazer o que quiser.

    — O senhor sabe que não. No início você faz parte da turma que fala de coisa à toa, depois o comprometimento vai aumentando... Quando menos se espera, não é possível mais sair. Percebe que faz parte de algo maior que a própria vida.

    — Você e o bebê vão ficar bem? — perguntou Gílson, mudando de assunto.

    — Vamos, não tenha sombra de dúvida.

    — Tem condições de cuidar do bebê?

    — É mais seguro comigo que deixar ele aqui.

    — Por que diz isso, minha filha?

    — Lembra-se da Marina? O filho dela morreu e está culpando o marido dela pelo acidente. Está sozinha e me ajuda a cuidar do Jean. Ninguém é totalmente livre quando se tem um filho.

    — Sei, a Marina, sua colega de faculdade...

    — Ela também está comprometida com a causa.

    — Quer dizer que existe uma causa?

    — Pare de me interrogar.

    — Tem ajuda do pai do menino?

    — É melhor ninguém saber quem é ele.

    — Tem alguma coisa que não quer me dizer?

    — É questão de tempo. Vão descobrir que a arma que foi encontrada depois daquele confronto está em meu nome.

    — De qual confronto está falando?

    — Aquele do tumulto quando fui presa...

    — Se é inocente, não tem o que temer.

    — Naquele dia, houve feridos de ambos os lados e um policial foi baleado. Lembrei que eu tinha uma arma, fui olhar no porta-malas do carro e constatei que não estava mais lá.

    — Como sabe que é a mesma arma?

    — Eu sei.

    — Alguém está tentando incriminar você. Como a arma foi parar nas mãos do atirador? Quem tem acesso a seu carro?

    — O Giancarlo, mas alguém pode ter arrombado o carro e eu não percebi.

    — Não! Acho que você perceberia. Acho que foi esse sujeito.

    — Giancarlo jamais faria isso comigo.

    — Você não sabe.

    — O senhor também não sabe... Por que está dizendo isso?

    — Já fui líder e conheci pessoas que sacrificam tudo por uma ideia, por uma causa. Fique alerta!

    — Está acusando o Giancarlo?

    — Não — Gílson percebia que de nada ia adiantar qualquer coisa que dissesse a ela.

    — Pai! Não entendo o que está dizendo.

    — É irracional! — esbravejou Gílson, inconformado com a indignação da filha por um sujeito que não parecia se importar com ela.

    — Se eu tivesse percebido a falta da minha arma teria feito um boletim de ocorrência provando que o revólver 32 não estava mais comigo — disse Celine, ainda exaltada.

    — Fique! Temos bons advogados, não se preocupe.

    — O policial que foi baleado continua em estado grave. Pode morrer a qualquer momento.

    — Não tem o que temer, é inocente.

    — Tenho que ir! — Celine apressou-se a levantar do sofá com o bebê no colo. — Já disse que vou estar segura. E o bebê estará protegido comigo.

    — Por que não esquece tudo e me ajuda a administrar a empresa? É tudo o que tenho. E um dia será tudo seu.

    — Pai! Com todo respeito, o senhor podia ter sido muito mais, mas renegou aqueles que acreditaram em tudo o que dizia.

    — Era outro tempo e outro lugar, em que as pessoas chegavam

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