A Fratura
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Sobre este e-book
A história pessoal de um naugrágio, seguido de sua superação, por meio da escrita. A luta contra a doença e o espectro social : aquele em que a desintegração do indivíduo caminha de mãos dadas com a desistegração de nossa socidade.
“E ao cair da noite – o relógio badalou doze horas – um dos pontos luminosos se amplia, se transforma em luz radiante, incandescente, a mais bonita das cores. E ele a tudo ilumina, eliminando dúvidas e escuridões, esperança gigantesca, amor revelado, mulher última, a de sua vida. Pelo melhor de sua existência, pelas doze horas do relógio que restam a serem vividos, para confrontar no plano real todos os demais pontos luminosos. Ainda ela, Anoushka.”
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A Fratura - Patrick LOISEAU
Prefácio (edição de 2018)
Para este ensaio de reedição, não pedirei indulgência para algumas passagens do livro, quer seja por parecerem indesejáveis, incorretas, ou por serem até mesmo violentas e desrespeitosas.
Na prática, me parece que devemos levar em conta um duplo contexto, para legitimar as palavras que não pretendo censurar. Muito além de tudo isso, trata-se da realidade vivida que não se pode apagar.
Eis o duplo contexto:
- Os textos desta história foram quase integralmente escritos durante o tempo da doença e se tornaram uma forma de escrita de sobrevivência; como tal, as palavras pronunciadas ou escritas tratavam-se de gritos, de suspiros, de pedidos de socorro, e não de uma abordagem literária, pensada ou construída.
- Esta história se situa no período entre 1982 e 1983, isto é, no início da primeira regressão sociocultural — que até os dias de hoje, nunca deixou de existir — organizada consciente e metodicamente pelo primeiro governo dito de esquerda
, desde a segunda guerra mundial.
Esse período viu surgirem as primeiras privatizações, dos primeiros a colocarem na pauta do dia os ganhos dos trabalhadores, das primeiras medidas para minar o laicismo, o direito à saúde, os serviços públicos, etc., para o benefício de uma futura Comunidade Europeia, supranacional e vertical, ditando suas regras comerciais e políticas a todo o conjunto dos países europeus.
Diante disto, o personagem dessa história também padeceu...
––––––––
Cheville, 28.03.2018
- Preâmbulo
- Do direito de escrever
O mundo cultural está repleto de ilusões e de falsos acadêmicos que almejam proibir o direito de escrever.
Das escolas aos quartéis, dos quartéis aos primeiros escritos, destes primeiros escritos à tentativa de publicação, tudo é arquitetado para colocar a criação, o primeiro ímpeto, de joelhos. O instinto da vida, comum a todos os animais, é delimitado no homem pela razão comum, pela mediocridade servil.
Em sua base, há apenas uma palavra: democracia. Esta que é desrespeitada, na maioria das vezes, por aqueles que a reivindicam com maior orgulho. Quantos operários, quantos jovens operários ou desempregados, aposentados, poderiam escrever sobre aquilo que dura toda uma vida, se não tivessem sido expulsos, desde o seu nascimento, da cultura e do conhecimento?
A verdadeira cultura, aquela que libertará essa sociedade de suas rotinas, não é a cultura do Prêmio Literário Goncourt[1] ou a dos pequenos gênios. Será aquela quando todos puderem livremente e com os meios materiais necessários, trazerem à tona todos os seus sonhos e seus conflitos, todos os seus monstros e aliados íntimos, todos os seus jardins desconhecidos, quando finalmente a palavra socialismo não for mais um brinquedo na mão de políticos questionáveis, mas uma realidade feita por todos e para todos.
Daqui até lá, há que se travar uma luta. Escritores e operários, estamos todos unidos, ombro a ombro, pela mesma causa: a da liberdade. À frente, um inimigo comum: o lucro, isto é, o capitalismo.
Agradeço ao acaso e à lógica enigmática da minha vida, por me fazer conhecer Serge Livrozet[2] e Bernard Chatron.
Talvez, com eles, eu possa iniciar um outro combate, também essencial, pelo bem maior da Escrita: o de ser capaz de integrar esse combate a todas as minhas outras paixões e causas essenciais, no intuito de construir a Unidade da minha vida.
Agradeço à Editora Les Lettres Libres.
Espero termos ainda muito o que realizar juntos.
Patrick Loiseau
"A história de um homem pode, por vezes, lhe ser revelada em toda a sua extensão pela infinitude de um segundo, esse em que ele vive, com intensidade, um dia.
A partir do confronto com o seu outro é que surge a deleitosa — ou implacável — verdade do porquê da existência. De quando em quando, é preciso uma ruptura para que sejam reveladas as possibilidades de reconstrução.
Esse é todo o significado das fraturas da vida."
"Nos insetos, não há forma com asas que seja adulta (...) A ninfa passa por uma verdadeira revolução interior. Nada se parece mais com um cadáver em estado de putrefação do que uma crisália cujos tecidos, sob a pele e o casulo, não são mais do que a aparência de uma gosma desorganizada. A continuidade da vida é assegurada apenas por dois órgãos vitais: o coração e a cadeia nervosa, os únicos preservados da deterioração ou da destruição dos tecidos das larvas.
É nesse estágio que serão desenvolvidos determinados grupos de células, os discos imaginais que, até então, permaneciam adormecidos. Em cerca de 18 dias, um ser inteiramente novo, sem nada ou quase nada em comum com a lagarta, será identificado sob a espécie ninfal: é a mariposa adulta, alada, sexuada, reprodutora."
Lagarta e borboleta ou a conquista do espaço
- Enciclopédia Larousse - Volume 2
[3]
[4]
––––––––
––––––––
21 de setembro de 1982.
Um escritor-estagiário se torna estagiário-fresador[5].
Reciclagem forçada. O mal menor.
Conversão e mobilidade
,
dizem eles.
O primeiro ato da regressão social.
Lênin