As palavras não são desse mundo
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As palavras não são desse mundo - Hugo von Hofmannsthal
As palavras não são deste mundo
Briefwechsel: Hugo von Hofmannsthal — Edgar Karg von Bebenburg
Hugo von Hofmannsthal
© Editora Âyiné, 2ª edição, 2020
Seleção: Marco Rispoli
Tradução: Flávio Quintale
Preparação: Érika Nogueira
Revisão: Fernanda Alvares, Ana Martini
Projeto gráfico: Luísa Rabello
Imagem de capa: Julia Geiser
Conversão para ePub: Cumbuca Studio
ISBN 978-65-86683-11-0
Editora Âyiné
Belo Horizonte, Veneza
Direção editorial: Pedro Fonseca
Assistência editorial: Érika Nogueira Vieira, Luísa Rabello
Produção editorial: André Bezamat, Rita Davis
Conselho editorial: Lucas Mendes de Freitas,
Simone Cristoforetti, Zuane Fabbris
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30170-140 Belo Horizonte — MG
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Sumário
Capa
Créditos
Folha de Rosto
As palavras não são deste mundo
Landmarks
Capa
Página de Créditos
Folha de Rosto
Sumário
Introdução
As palavras não são deste mundo
Segue-se a seleção das cartas feita por Marco Rispoli.
Todas as notas são do tradutor.
Lélzw, departamento de Ain, França,
6 de setembro de 1892.
Caro Edgar!
Estou numa aldeia no fim do mundo, na região francesa do Jura, já há uma semana. Vim parar aqui por acaso e não sei quando esta carta poderá chegar em tuas mãos. Infelizmente não vi mais em Strobel nem tua mãe nem o Aníbal; consegui cumprimentar apenas a Leonor; por enquanto é somente uma menina engraçadinha, mas tem uma exuberância tão particular, tão viva e é tão imprévue¹, cheia de caprichos, que se tornará, creio, muito mais que uma jovem senhora boa apenas para jogar tênis e frequentar socialites. É um hábito meu, bom e mau ao mesmo tempo, em todo caso um hábito, que faz parte de minha essência mais profunda, ser sempre interessado nas pessoas e refletir sobre elas; nem sempre consigo encontrar alguma coisa que me traga felicidade, como encontro na natureza, um vento forte, a lua cheia ou um grande espelho d’água. Viajei rápido pela Suíça, o tempo todo com os olhos fechados; agora vou devagar, com os olhos bem abertos, descendo pelo antigo vale do Ródano até atingir a costa. Normalmente sinto-me mal nas viagens: falta-me espontaneidade, fico me observando viver e aquilo que vivencio é como se estivesse lendo um livro. Apenas o passado transfigura para mim as coisas e lhe dão cor e perfume. Isso é que me transformou também em «poeta», essa necessidade da arte de viver, a necessidade de embelezar e interpretar poeticamente aquilo que é comum e pálido. Se eu um dia escrever algo em que consiga me exprimir de modo vivo e claro sobre mim mesmo te enviarei, em vez de te mandar uma fotografia, que sempre é algo morto e parvo. A tua amizade foi a maior alegria que já me caiu do céu; não foi algo longamente procurado, justificado e que precisa de explicação; algo que, no fim das contas, permanece um monólogo e não um diálogo. Com a gente não é assim; e isso é muito bom. Não nos consideramos gênios incompreendidos e jamais falamos de «união de almas». Em geral o patético não me agrada, acho um sinal de falta de educação. Logo, porém, se percebe que são muito poucas as pessoas com quem se tem, por uma série de coisas, mais afinidade, não é verdade? Com algumas pessoas a gente pode dividir algumas coisas com tranquilidade e simpatia, mas somente pouquíssimas nos fazem realmente bem; apenas elas nos consolam do chamado «tédio da vida», l’ennui de la vie, comum a todas as criaturas bem-nascidas.
Espero que não te inibas em me escrever. Escreve-me quando quiser, escreve tudo aquilo que te vem à mente, sempre no endereço de Viena, rua dos Salesianos, número 12. Já terminamos a escola, já sabemos que não receberemos nenhuma descarga elétrica, estamos no mesmo barco...
Não poderemos contar as coisas importantes que vivermos, pois não nos lembraremos delas. Creio, contudo, que de vez em quando poderemos pôr no papel algum fragmento de uma sensação subjetiva, de um estado de humor, e disso poderá surgir uma troca de correspondências, como se fazia no século passado, quando as pessoas escreviam com mais