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Direitos Humanos e Saúde Mental no Trabalho
Direitos Humanos e Saúde Mental no Trabalho
Direitos Humanos e Saúde Mental no Trabalho
E-book830 páginas10 horas

Direitos Humanos e Saúde Mental no Trabalho

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Sobre este e-book

"Direitos Humanos e Saúde Mental no Trabalho" é um verdadeiro compêndio sobre a tutela da saúde mental dos trabalhadores e trabalhadoras à luz dos princípios axiológicos dos direitos humanos fundamentais.
Por meio da presente obra, o leitor terá contato com ensaios científicos, pesquisas e doutrina de diversos especialistas, numa relação de interdisciplinaridade e interseccionalidade que possibilita a compreensão dos diversos aspectos do complexo tema da saúde mental nas relações de trabalho, na dinâmica das relações de trabalho no mundo contemporâneo, que vai desde a própria forma de realização do trabalho no sistema capitalista de produção, passando pelas novéis morfologias do trabalho e de gestão empresarial, bem como pelas questões da precarização, migrações e de ameaça de desemprego, entre outras pertinentes e que determinam estados psicopatológicos nas relações de trabalho.
O conteúdo foi idealizado pelos professores e juristas Rúbia Zanotelli de Alvarenga e Luiz Eduardo Gunther para possibilitar uma ampla reflexão sobre a saúde mental do trabalho, propiciando aos operadores do Direito do Trabalho, dos mais variados graus de formação, e estudiosos de outras áreas, compreender, de uma forma holística, profunda e didática, a complexa trama da saúde mental do trabalho.
Ronaldo Lima dos Santos
IdiomaPortuguês
Data de lançamento5 de jan. de 2022
ISBN9786525215914
Direitos Humanos e Saúde Mental no Trabalho

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    Direitos Humanos e Saúde Mental no Trabalho - Luiz Eduardo Gunther

    CAPÍTULO 1. SAÚDE MENTAL EM TEMPOS DE COVID-19

    Adriana Calvo¹*

    INTRODUÇÃO

    É notório que a saúde mental não é dissociável da saúde física, tal como a famosa expressão latina mens sana in corpore sano (uma mente sã num corpo são), contudo, este artigo tem como objetivo refletir sobre os custos psicológicos advindo das medidas de combate ao COVID-19 para a saúde mental dos trabalhadores.

    A doença provocada pelo Coronavírus teve o seu ponto de partida na China. Os primeiros casos da COVID-19 ocorreram em um mercado de frutos do mar na cidade de Wuhan, na China, na virada do ano (2019/2020).

    Essa doença, contudo, ao contrário das anteriores, gerou preocupação mundial pela sua rápida proliferação, tendo em vista sua capacidade de levar ao colapso o sistema de saúde de qualquer país, independentemente do seu grau de desenvolvimento e de organização.

    Em janeiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou o surto do Covid-19 como uma emergência de saúde pública de interesse internacional e alertou sobre a possibilidade da doença se espalhar no mundo.

    Em março de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) reconheceu o surto da Covid-19 como pandêmico, uma vez que a doença reunia as 3 (três) características para tanto: 1) o aparecimento de uma nova doença na população; 2) o agente infectando humanos, causando uma doença séria; e 3) o agente espalhando-se fácil e sustentavelmente entre humanos em uma grande geográfica.

    Diante da inexistência de vacinas e de drogas para o combate e tratamento da pandemia, a própria Organização Mundial de Saúde (OMS) recomendou medidas sem precedentes para retardar a transmissão do COVID-19 e com isso reduzir o impacto da doença sobre o sistema de saúde de cada país.

    As medidas de distanciamento físico, isolamento, o fechamento de escolas e locais de trabalho, além de outros medidas recomendadas pelos órgãos de saúde pública podem ser eficazes no combate a pandemia do COVID-19, contudo, há que se refletir sobre os custos psicológicos advindos de tais medidas preventivas e como as empresas devem tomar cuidados para prevenir tais riscos psicossociais.

    A EPIDEMIA OCULTA: SAÚDE MENTAL NA ERA COVID-19

    Wuhan, centro da epidemia, não contabiliza mais casos de COVID-19, pessoas retomam às suas atividades, contudo, pesquisadores da Universidade Médica Naval de Shangai alertam que até 20% dos habitantes da nação asiática apresentam sinais de transtorno de estresse pós-traumático (TSPT)².

    No Brasil, desde que foram detectadas as primeiras pessoas infectadas em Wuhan, na China, até o primeiro caso detectado no Brasil foram pouco mais de dois meses (26 de fevereiro de 2020).

    Em 20 de março de 2020, o Brasil declarou Estado de Calamidade Pública até o dia 31 de dezembro do mesmo ano de 2020, por força do Decreto Legislativo n. 06.

    Desde então, o governo publicou diversas medidas provisórias para regular os impactos da pandemia da Covid-19 nos contratos vigentes de trabalho, contudo, nenhuma dessas medidas trouxe qualquer recomendação jurídica para os empregadores lidarem com os impactos psicológicos advindos das medidas de isolamento e quarentena para combate da pandemia.

    A prestigiada revista do mundo da saúde The Lancet aponta em interessante artigo sobre os impactos psicológicos da quarenta que os principais estressores durante a quarentena são: i) duração da quarentena ou do lockdown; ii) medo de ser infectado ou ter alguém da família infectado; iii) frustação e depressão por estar confinado, com redução de contato social e física e sem rotina; iv) insuficiência de fornecimento de comida, medicamentos e outros serviços essenciais e v) informação inadequada, incerta ou excessiva (tradução nossa) ³.

    Aponta também os principais estressores pós quarentena: i) problemas financeiros e desemprego e ii) estigma e discriminação, inclusive com comentários críticos de colegas e vizinhos (tradução nossa) ⁴.

    Quanto ao excesso de informações, a comunidade médica é unânime que este pode ser um estressor. Manter-se informado é importante, mas o excesso de informações pode gerar preocupação excessiva e injustificada, elevando os níveis de ansiedade e gerando transtornos mentais.

    A infomedia é definida como a sensação de aflição e pânico que se instala na população devido a quantidade de informações e desinformação na mídia⁵.

    A Organização Mundial de Saúde reconheceu este problema e está estabelecendo parcerias e colaborações para apoiar a resposta à infodemia por meio da criação de recursos globais para verificar fatos e controlar a desinformação, medir e analisar a infodemia, sintetizar evidências, traduzir conhecimentos, comunicar riscos, envolver a comunidade e amplificar as mensagens⁶.

    Alexandre Loch, psiquiatra coordenador de pesquisas do Hospital das Clínicas de São Paulo alerta que cada um brasileiro com Covid, haverá outros 40 (quarenta) trabalhadores com doenças psiquiátricas por conta da pandemia⁷.

    Os pesquisadores do Reino Unido apontaram, ainda, para o grande risco de desenvolvimento de estresse pós-traumático entre os pacientes curados da Covid-19⁸.

    Segundo a referida pesquisa, os reflexos na saúde mental são: cerca de um terço dos pacientes desenvolveram estresse pós-traumático. Além disso, 15% deles reportaram sintomas de depressão até um ano após a recuperação da doença e outros 15% informaram fenômenos diversos, como problemas de sono ou de memória, mudanças repentinas de humor e cansaço constante.

    Pesquisa na China apresentada por pesquisadores da Universidade Médica Naval de Shangai, mostra que até 20% da população após o fim da quarentena do Covid já apresenta sinais de síndrome do estresse pós-traumático (TSPT). Este tipo de transtorno mental costuma emergir após situações como guerras, desastres naturais e pandemias, embora também possa atingir pessoas que passaram por experiências negativas em nível individual⁹.

    A preocupação com os custos psicológicos da pandemia é noticiada por vários veículos de imprensa no Brasil: Veja Saúde: a epidemia oculta: a saúde mental na era Covid¹⁰, Uol notícias: Psiquiatras alertam para ‘tsunami’ de problemas de saúde mental na pandemia¹¹; Globo- Bem-estar: OMS alerta para crise global de saúde mental devido à pandemia de Covid-19¹².

    As diversas matérias na mídia citadas acima, alertam para possível epidemia oculta de transtornos mentais advindos como custos psicológicos das medidas adotadas no país para combate ao vírus.

    Por fim, é importante lembrar que do ponto de vista de saúde mental, a gripe espanhola de 1918 não pode ser citada como lição para os tempos atuais de Covid-19, uma vez que na época a Psiquiatria e a Psicologia não possuíam estudos sobre os impactos das emoções na saúde humana.

    Dada essa importância para compreensão do tema, analisaremos no próximo tópico a evolução histórica dos estudos de saúde mental no Brasil e no mundo.

    A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS ESTUDOS DE SAÚDE MENTAL: DA MEDICINA DO TRABALHO ATÉ A PSICODINÂMICA DO TRABALHO

    O marco histórico do surgimento do serviço de Medicina do Trabalho no mundo foi em 1830 quando Robert Dernhan, proprietário de uma indústria têxtil, preocupado com as péssimas condições de saúde dos seus empregados, procurou Robert Baker, um importante médico inglês de sua região¹³.

    Pela primeira vez na história foi colocado um médico no interior da fábrica para servir de intermediário entre o dono da empresa e os trabalhadores. A função incumbida ao médico Robert Baker era investigar o efeito do trabalho sobre as pessoas com o objetivo de prevenção das doenças físicas.

    Pode-se dizer que a Medicina do Trabalho somente percebeu a importância do ambiente relacional do trabalho e dos efeitos que propicia na saúde mental dos trabalhadores a partir do último terço do século XX.

    Durante o século XIX até a Primeira Guerra Mundial, a medicina laboral voltou-se à proteção da saúde física dos trabalhadores e o foco principal era a prevenção dos acidentes de trabalho, principalmente aqueles que causavam sequelas aos trabalhadores e, muitas vezes, levando-os até a morte.

    De fato, durante a 1ª e 2ª Revolução Industrial (modelo taylorista fordista) o foco da luta dos trabalhadores era obter melhores condições de trabalho (redução da jornada de trabalho e melhores salários), pois não havia espaço para uma luta direta por melhores condições de saúde física e sequer era aventada a proteção da saúde mental¹⁴.

    Na verdade, pode-se afirmar que foi somente após o início da Primeira Guerra Mundial que a Medicina do Trabalho passou a se preocupar com a saúde mental dos trabalhadores.

    Beynon, ao descrever a fábrica de automóveis de River Rouge da Ford nos anos 1930 e 1940 do século XX, alerta para o sofrimento físico e psíquico ao qual estavam submetidos os trabalhadores, em intenso ritmo de trabalho, severa disciplina e rígido controle no interior e fora da fábrica.

    Conversar ou confraternizar com colegas de trabalho na hora do almoço era tabu nos velhos tempos, época que durou 20 anos ou mais. Era então normal, durante o intervalo do meio-dia, ver um empregado da Ford agachado no chão, carrancudo e reservado, mastigando sua comida no mais completo isolamento¹⁵.

    O autor lembra ainda que, quanto à proibição de falar, cantarolar, assobiar e sorrir no trabalho, medida adotada para não atrasar a linha de produção, os trabalhadores desenvolveram diferentes habilidades – para driblar os vigilantes e se comunicar entre eles – que ficaram conhecidas como a fordização da face.

    Um mecânico muito inteligente nesse departamento (ferramenteiros e estampadores) inventou um tipo todo próprio de linguagem da Ford: aprendeu a falar com o ventríloquo. Depois de passar dez anos trabalhando na Ford, esse homem transformou-se em objeto de ridículo para a esposa e os amigos, pois o hábito de falar pelo lado da boca sem mover os lábios acabou por torna-se ingovernável; ele passou a falar dessa maneira inconscientemente, em casa ou em conversas informais com pessoas fora do ambiente de trabalho.¹⁶

    A terceira Revolução Industrial, também conhecida como Revolução Tecnológica, iniciada nos anos 70 do século passado, trouxe um novo modelo de organização do trabalho: o modelo toyotista.

    Beltran descreve bem a relação entre o aumento da violência psicológica e a reestruturação produtiva toyotista e o surgimento da era da ditadura da performance:

    A intensificação do trabalho e a degradação das condições de trabalho (tarefas penosas, flexibilidade de horários, exigência de disponibilidade) estão patentes em muitos setores; descobre-se que a ditadura da "performance", o aumento do tempo de utilização dos equipamentos, a produção just-in-time, são causas de sofrimento para todos os trabalhadores.¹⁷

    É notório que com a reestruturação produtiva toyotista implementada no Ocidente, conhecida por essa razão de pós-toyotista, surgem novas doenças ocupacionais, sendo que a maioria delas ligadas ao estresse profissional e do seu agravamento, ou de seu estado mais agudo, conhecido como síndromede burnout.

    Hirigoyen sustenta que o toyotismo trouxe um novo modelo de gestão de pessoas: a gestão por injúria, que nas próprias palavras da autora significa: "todo tipo de comportamento despótico de certos administradores, despreparados, que submetem os empregados a uma pressão terrível ou os tratam com violência, injuriando-os e insultando-os, com total falta de respeito"¹⁸.

    Em meados do século XX. neste cenário de novos adoecimentos ligados à saúde mental, foi criada na Europa a Psicopatologia do Trabalho: escola doutrinária da psicologia do trabalho que estuda as relações entre o trabalhador e o meio, bem como seus efeitos na psiquedos trabalhadores.

    A Psicopatologia do Trabalho é o estudo das doenças psíquicas desenvolvidas no meio de trabalho e possui ampla interdisciplinaridade com a Medicina do Trabalho, uma vez que muitos transtornos mentais podem ocasionar também doenças físicas.

    A sua grande importância foi reconhecer que a organização do trabalho pode afetar a saúde mental dos trabalhadores e causar sofrimento psíquico, contudo, estudos recentes da última década apontam o surgimento de um novo olhar: a Psicodinâmica do Trabalho, que passou a criticar a Psicopatologia do Trabalho.

    A principal crítica deve-se ao fato da Psicopatologia do Trabalho limitar seu estudo do trabalho a ideia de sofrimento, já a Psicodinâmica do Trabalho defende que o trabalho pode proporcionar prazer ao homem.

    A contribuição de Christophe Dejours é imensurável para a Pscicodinâmica do Trabalho, tanto que, seus seguidores no Brasil passaram a chamar o estudo de suas ideias como "escola dejouriana".

    Christophe Dejours é médico francês, com formação em psicossomática e psicanálise, diretor científico do Laboratório de Psicologia do Trabalho e da Ação no CNAM de Paris.

    Dejours publicou seu primeiro livro em 1980 – momento inicial de desenvolvimento – intitulado "Trabalho: Desgaste Mental – Um Ensaio de Psicopatologia do Trabalho", livro publicado no Brasil sete anos depois com um título de apelo comercial: "Loucura do Trabalho: Estudo de Psicopatologia do Trabalho"¹⁹.

    De forma sucinta, Dejours foi pioneiro ao defender que a sociedade pós-industrial liberta os movimentos do trabalhador da correia taylorista de produção, contudo exige total integração da sua mente e da sua alma.

    Nesse mesmo sentido, Fonseca concorda com Dejours afirmando que a sociedade pós-industrial toyotista: "como se sabe, liberta os movimentos do trabalhador da correia taylorista de produção. Livra seus gestos corporais, mas exige total integração da mente, da alma do trabalhador"²⁰.

    Em 1984, Dejours ajudou a realizar o I Colóquio Nacional de Psicopatologia do Trabalho, o tema escolhido foi: Sofrimento e Prazer no Trabalho. A partir daí, sua abordagem, ao mesmo tempo, reformulou-se e afirmou-se na comunidade científica e seus efeitos levaram às mudanças assumidas em 1992, propondo uma nova denominação: "Psicodinâmica do Trabalho" (que incorporaria no seu interior as questões da psicopatologia do trabalho)²¹.

    Em 1998, Dejours publicou o seu último livro "A Banalização da Injustiça Social" defendendo a ideia de que a banalização do mal e da injustiça é fruto do sistema neoliberal relativo às novas formas de organização do trabalho²².

    Fonseca citando Dejours traz importante reflexão sobre a fronteira vida privada/trabalho do trabalhador contemporâneo:

    os programas de qualidade total, da tolerância zero ao erro, o aparente afrouxamento da vinculação do trabalhador com o espaço de trabalho e a flexibilização do tempo de trabalho, têm gerado novas questões que se acrescem às experiências da psicopatologia do trabalho, posto que a fronteira entre a postura assumida pelo indivíduo no trabalho e aquela referente a sua vida privada está cada vez mais tênue.²³

    Lampoglia defende que todos ganham com a empresa psicossocialmente saudável na qual existe principalmente inteligência colaborativa:

    a colaboração é uma capacidade composta que emerge do domínio das capacidades de Inteligência Sócio Emocional. A lealdade em equipe é inquestionável. Quando uma equipe colabora, encontram-se soluções que integram a sabedoria da equipe. Isso exige um maior comprometimento porque se deve investir tempo para que se escutem uns aos outros, para que pensem detalhadamente nas situações e em coordenar a execução das soluções com genuíno respeito uns pelos outros.²⁴

    A título de conclusão deste tópico, citamos Oliveira que aborda de forma bem didática as 4 (quatro) etapas evolutivas da relação trabalho-saúde estudadas acima:

    1ª etapa) surgimento da disciplina Segurança do Trabalho com preocupação em garantir a segurança dos trabalhadores no ambiente do trabalho, prevenindo acidentes do trabalho;

    2ª etapa) surgimento da disciplina Medicina do Trabalho com preocupação em curar as doenças ocupacionais, principalmente relacionadas à função;

    3ª etapa) surgimento da Higiene Industrial com preocupação em garantir a saúde do trabalhador na indústria; e

    4ª etapa) iniciada por volta de 1985, contudo, ainda se encontra em fase de elaboração, essa se refere ao grau de satisfação do trabalhador no trabalho, vale dizer, a busca pela qualidade de vida no trabalho (Psicodinâmica do Trabalho)²⁵.

    A seguir, passaremos ao estudo da tutela jurídica da saúde mental no ordenamento jurídico nacional e internacional.

    A TUTELA JURÍDICA DA SAÚDE MENTAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO NACIONAL E INTERNACIONAL

    A Organização Mundial de Saúde define saúde como um "estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não somente a ausência de afecções ou enfermidades"²⁶.

    A Organização Mundial de Saúde esclarece que não há uma definição oficial de saúde mental, uma vez que diferenças culturais, julgamentos subjetivos e teorias relacionadas concorrentes afetam o modo como a saúde mental é definida²⁷.

    O conceito de saúde mental é mais amplo que a ausência de transtornos mentais. Em psiquiatria e em psicologia prefere-se falar em transtornos mentais e não em doença, isso porque apenas poucos quadros clínicos mentais apresentam todas as características de uma doença no sentido tradicional do termo – isto é, o conhecimento exato dos mecanismos envolvidos e suas causas explícitas. O conceito de transtorno, ao contrário, implica um comportamento diferente, desviante, anormal²⁸.

    O Dr. Lorusso foi o primeiro psiquiatra a definir saúde mental como:

    equilíbrio emocional entre o patrimônio interno e as exigências ou vivências externas. É a capacidade de administrar a própria vida e as suas emoções dentro de um amplo espectro de variações sem, contudo, perder o valor do real e do precioso. É ser capaz de ser sujeito de suas próprias ações sem perder a noção de tempo e espaço. É buscar viver a vida na sua plenitude máxima, respeitando o legal e o outro.²⁹

    Segundo a enciclopédia livre Wikipédia, a saúde mental (ou sanidade mental) é:

    um termo usado para descrever um nível de qualidade de vida cognitiva ou emocional ou a ausência de uma doença mental. Na perspectiva da psicologia positiva ou do holismo, a saúde mental pode incluir a capacidade de um indivíduo de apreciar a vida e procurar um equilíbrio entre as atividades e os esforços para atingir a resiliência psicológica.³⁰

    A Convenção 155 da OIT de 1981, ratificada pelo Brasil em 1992, afirma que "a saúde, em relação ao trabalho, abrange não só a ausência de afecções ou de doença, mas também os elementos físicos e mentais que afetam a saúde e estão diretamente relacionados com a segurança e a higiene do trabalho"³¹.

    O art. 225 da Constituição Federal brasileira prevê que o meio ambiente deve proporcionar às pessoas uma sadia qualidade de vida. Se o meio ambiente do trabalho integra o meio ambiente geral (art. 200, inciso VIII, da CF), também na empresa deve o trabalhador encontrar condições que lhe assegurem uma boa qualidade de trabalho.

    A Convenção 155 da OIT traz a obrigação de formulação, implementação e revisão periódica da política nacional de saúde e segurança no trabalho, por meio da participação plena de todos os níveis de empregadores, trabalhadores e suas respectivas organizações.

    A Convenção 155 da OIT define as responsabilidades institucionais, os direitos dos empregados e trabalhadores e realça a necessidade de informação, educação, treinamento dos trabalhadores.

    Desta forma, recomendável que os protocolos de saúde ocupacional sejam elaborados dentro de um processo de negociação coletiva ou de concertação social, baseados nos princípios da prevenção e da precaução, a fim de evitar ou de refrear a potencial propagação de riscos ocupacionais (artigo 19, "e" e 20 da Convenção nº 155 da OIT).

    O princípio da precaução preceitua o agir de forma antecipada, a tomada de medidas amplas, que possam evitar a ocorrência de possível ameaça à saúde e segurança no trabalho.

    Precaução é um comportamento de cautela, que visa precaver-se para evitar um possível risco, ainda que indefinido, procurando reduzir o potencial danoso oriundo do conjunto de atividade. Portanto, o princípio da prevenção relaciona-se com a adoção de medidas que corrijam ou evitem danos previsíveis.

    A Recomendação 164 da OIT de 1981 trata do estresse relacionado ao trabalho (item II, 3, letra e):

    "Relativamente aos diferentes setores da atividade econômica e dos diferentes tipos de trabalho e com fundamento no princípio da prioridade da eliminação de riscos na fonte, medidas devem ser tomadas pela política pública referida no art. 4 da Convenção, particularmente nos seguintes campos: [...] (e) Prevenção de estresse prejudicial ao físico ou à mente, relacionado a condições de trabalho (tradução livre nossa)."

    A Convenção 187 (ainda não ratificada pelo Brasil) e a respectiva Recomendação 197, ambas de 2006, reiteram a importância do estabelecimento da política, do sistema e do programa nacionais nesse campo, além de reforçarem a importância da cultura de prevenção em matéria de saúde e segurança no trabalho³².

    No mesmo sentido, a NR-1 da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia (nova redação conferida pela Portaria nº 6.730/2020) estabelece que os empregadores devem implementar medidas de prevenção, ouvidos os trabalhadores e que os empregadores devem evitar os riscos ocupacionais que possam ser originados no trabalho, bem como classificar os riscos ocupacionais para determinar a necessidade de adoção de medidas de prevenção.

    A participação dos trabalhadores pode ocorrer por intermédio de seus representantes nas Comissões Internas de Prevenção de Acidentes (CIPA), regulamentadas nos termos da NR-5.

    Enfim, restou demonstrando neste tópico que o ordenamento jurídico nacional e internacional possui ampla regulamentação sobre o direito fundamental à saúde e traz inúmeras recomendações jurídicas para todos os atores sociais implementarem de forma conjunta e negociada programas de prevenção e precaução para minimizar os riscos à saúde de forma integral dos trabalhadores no cenário pós-Covid.

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    No cenário pós-covid -19, as empresas brasileiras estão preocupadas com os riscos a serem assumidos em caso de contaminação do vírus no ambiente do trabalho e com as responsabilidades que terão que assumir perante tal pandemia.

    Da mesma forma, os empregados receiam serem contaminados no local de trabalho e isso gera obviamente além de riscos de saúde física, aumento de casos de transtornos mentais devido ao medo, ansiedade e até pânico diante desta expectativa de retorno ao trabalho.

    Dentro deste cenário, algumas empresas vêm aplicando protocolos empresariais de combate ao Coronavirus com foco exclusivo e restrito nos riscos à saúde física (uso de álcool gel, máscaras, dentre outros) e quase nenhuma preocupação com os riscos psicossociais que também afetam a saúde mental dos trabalhadores.

    Ainda mais preocupante é o fato de que algumas empresas vêm implementando programas de combate empresariais de forma unilateral, sem consulta aos trabalhadores e às vezes sem consulta aos órgãos internos responsáveis gestão de riscos ocupacionais.

    Os princípios constitucionais da redução progressiva dos riscos (art. 7º, inciso XXII) e da conciliação como instrumento de pacificação social (preâmbulo da Carta Magna) são diretrizes importantes para nortear os empregados na busca de soluções de prevenção que atendam a saúde de forma ampla (física, mental e bem-estar social).

    Na epidemia do Coronavírus, mais do que nunca, todos os atores sociais (empresa, empregado e governo) devem pautar suas decisões nos princípios da prevenção e da precaução durante o mapeamento dos riscos psicossociais, conforme incisos II, III, IV e V do § 1º do art. 225 da CF.

    O direito à saúde é o gênero do qual o direito à saúde do trabalhador é espécie. Em termos globais, a saúde, seja física ou mental, é um direito humano fundamental e, como tal, é inalienável, imprescritível e irrenunciável.

    Urge que todos os atores sociais busquem soluções dentro do espírito de concertação social e do pacto social para regular melhor as formas de combate aos riscos ambientais psicossociais presentes e futuros advindas desta epidemia (Convenções 98 e 154 da OIT).

    Enfim, repita-se: medidas empresariais aprovadas de forma unilateral com foco exclusivo na prevenção da saúde física, tais como uso de álcool gel e máscaras no ambiente do trabalho, não serão capazes de lidar com a epidemia oculta de transtornos mentais que assolará os locais de trabalho no cenário pós-Covid-19.

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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    Quarentena pode desencadear estresse pós-traumático. Correio Braziliense, Brasil, 22 de março de 2020. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2020/03/22/interna_ciencia_saude,835885/quarentena-pode-desencadear-estresse-pos-traumatico-especialistas.shtml. Acesso em 20/05/2020.

    Quarentena pode desencadear estresse pós-traumático. Correio Braziliense. Brasil, 22/03/2020. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2020/03/22/interna_ciencia_saude,835885/quarentena-pode-desencadear-estresse-pos-traumatico-especialistas.shtml. Acesso em 20/05/2020.

    Para cada um brasileiro com Covid, haverá outros 40 (quarenta) trabalhadores com doenças psiquiátricas por conta da pandemia. Huffpost. Brasil, 09 de maio de 2020. Disponível em: https://www.huffpostbrasil.com/entry/transtornos-mentais-covid_br_5eb63a4fc5b6c3bd86ff4f42 Acesso em 15/05/2020.


    1 Adriana Calvo é Doutora e Mestre em Direito das Relações Sociais (PUC-SP), Professora Convidada de Direito do Trabalho do Curso FGV Direito RJ. Professora de Direito do Trabalho do curso de Graduação do Mackenzie/SP. Coordenadora de Direito Individual do Trabalho da Comissão Especial de Direito do Trabalho da OAB/SP. Advogada trabalhista.

    2 Quarentena pode desencadear estresse pós-traumático. Correio Braziliense, Brasil, 22 de março de 2020. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2020/03/22/interna_ciencia_saude,835885/quarentena-pode-desencadear-estresse-pos-traumatico-especialistas.shtml. Acesso em 20/05/2020.

    3 BROOKS, Samantha K, Rebecca K Webster, Louise E Smith, Lisa Woodland, Simon Wessely, Neil Greenberg, Gideon James Rubin. O impacto psicológico da quarentena e como reduzi-lo: rápida análise das evidências (tradução nossa). Disponível em: https://www.thelancet.com/pdfs/journals/lancet/PIIS0140-6736(20)30460-8.pdf. Acesso em 22/05/2020.

    4 Ibid.

    5 Infodemia: fluxo de informações pode afetar saúde mental em tempos de pandemia de Covid-19. Gntech notícias. Brasil, 23/04/2020. Disponível em: https://gntech.med.br/blog/post/infodemia-saude-mental-pandemia. Acesso em 01/05/2020.

    6 Como a infodemia pode afetar a saúde. Estadão summit saúde. Brasil, 27/04/2020. Disponível em: https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,oms-combate-uma-epidemia-alem-do-coronavirus-uma-infodemia,70003189336. Acesso em 10/05/2020.

    7 Para cada um brasileiro com Covid, haverá outros 40 (quarenta) trabalhadores com doenças psiquiátricas por conta da pandemia. Huffpost. Brasil, 09 de maio de 2020. Disponível em: https://www.huffpostbrasil.com/entry/transtornos-mentais-covid_br_5eb63a4fc5b6c3bd86ff4f42 Acesso em 15/05/2020.

    8 Delírios, depressão e estresse pós-traumático: estudo britânico alerta para efeitos do Covid -2019. Globo: extra digital. Brasil, 22/05/2020. Disponível em: https://extra.globo.com/noticias/coronavirus/delirios-depressao-estresse-pos-traumatico-estudo-britanico-alerta-para-efeitos-da-covid-19-24440434.html. Acesso em 01/06/2020.

    9 Quarentena pode desencadear estresse pós-traumático. Correio Braziliense. Brasil, 22/03/2020. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/ciencia-e-saude/2020/03/22/interna_ciencia_saude,835885/quarentena-pode-desencadear-estresse-pos-traumatico-especialistas.shtml. Acesso em 20/05/2020.

    10 A epidemia oculta: saúde mental na era Covid-19. Revista Veja Saúde. Brasil, 18 de maio de 2020. Disponível em: https://saude.abril.com.br/mente-saudavel/a-epidemia-oculta-saude-mental-na-era-da-covid-19/ Acesso em 25/05/2020.

    11 Psiquiatras alertam para ‘tsunami’ de problemas de saúde mental na pandemia. Uol notícias. Brasil, 17/05/2020. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/saude/ultimas-noticias/bbc/2020/05/17/psiquiatras-alertam-para-tsunami-de-problemas-de-saude-mental-na-pandemia.htm Acesso em 20/05/2020.

    12 OMS alerta para crise global de saúde mental devido à pandemia de Covid-19. Globo- Bem-estar. https://g1.globo.com/bemestar/coronavirus/noticia/2020/05/14/oms-alerta-para-crise-global-de-saude-mental-devido-a-pandemia-de-covid-19.ghtml

    13 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica à saúde do trabalhador. 5. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 64.

    14 SOUZA, 1992, p. 66.

    15 BEYNON, H. Trabalhando para Ford: trabalhadores e sindicalistas na indústria automobilística. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. p. 54.

    16 Ibid., p. 54.

    17 BELTRAN, Ari Possidonio, 2001, p. 234 apud BELTRAN, Ari Possidonio. Direito do trabalho e direitos fundamentais. São Paulo: LTr, 2002. p. 223.

    18 HIRIGOYEN, 2011, p. 28.

    19 DEJOURS, Christophe. Da psicopatologia à psicodinâmica do trabalho. Selma Lancman e Laerte I. Sznelman (Org.). Rio de Janeiro: Fiocruz/Brasília: Paralelo 15, 2004. p. 346.

    20 FONSECA, 2012.

    21 DEJOURS, op. cit., p. 348.

    22 Ibid., p. 340.

    23 FONSECA, 2012.

    24 LAMPOGLIA, Marco Antônio. Empresas psicossocialmente saudáveis. Disponível em: . Acesso em: 10 jan. 2013.

    25 OLIVEIRA, Sebastião Geraldo. Estrutura normativa da segurança e medicina do trabalho no Brasil. Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 45, n. 75, p.110, jan./jun. 2007.

    26 CONSTITUIÇÃO da Organização Mundial da Saúde (OMS/WHO) - 1946. Biblioteca Virtual de Direitos Humanos – USP. Disponível em: . Acesso em: 1 mar. 2013.

    27 Definição de saúde mental. Site da Secretaria de Saúde. Disponível em: . Acesso em: 1 abr. 2012.

    28 COSTA, Adriana Cajado. Psicanálise e saúde mental: a análise do sujeito psicótico na instituição psiquiátrica. São Luis: EDUFMA, 2009. p. 4.

    29 COSTA, 2009, p. 5.

    30 Disponível em: . Acesso em: 2 out. 2012.

    31 CONVENÇÕES da OIT. Disponível em: . Acesso em: 10 mar. 2013.

    32 SCHMIDT, Martha Halfeld Furtado de Mendonça, Trabalho e saúde mental na visão da OIT. Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.51, n.81, p.489-526, jan./jun.2010.

    CAPÍTULO 2. A CONCEPÇÃO DE SOFRIMENTO E O DIREITO COMO MECANISMO DE PROTEÇÃO DO TRABALHADOR

    Adriana de F. Pilatti Ferreira Campagnoli³³

    Silvana Souza Netto Mandalozzo³⁴

    INTRODUÇÃO

    Ao longo da história se pode verificar discussões que buscam relacionar trabalho, saúde e doença, seja no campo da saúde, seja na área das Ciências Sociais. Dentre os estudos, ressaltam-se as análises sobre as condições de trabalho realizadas por Marx, ao desvendar, na primeira metade do século XIX, a dinâmica do desenvolvimento capitalista, a acumulação de capital a partir da extração da mais-valia, trazendo à baila não apenas a lógica da exploração do trabalho assalariado, mas também seus efeitos.

    A discussão teve sua intensificação no início do século XX, com novos modelos organizacionais do trabalho, que se baseavam no aprofundamento da alienação do trabalho, a partir de uma rígida divisão de tarefas. Contudo, foi somente no final dos anos 1960, quando por força do movimento operário desencadeado na França, que se passou a criticar duramente as condições de trabalho, baseado em princípios que inauguraram um novo paradigma teórico, ao considerar que o estudo das condições de trabalho somente pode ser feito a partir da consideração da organização do processo de trabalho e os diferentes tipos de sofrimento físico e psíquico que ela impõe aos trabalhadores.

    Sob tal concepção e ao se considerar que o trabalho representa uma dimensão fundamental da vida, será constituída a preocupação com a problemática da saúde no meio ambiente laboral. Para tanto, será abordada a relevância da preservação da saúde e da segurança no ambiente laboral, através da busca de elementos indispensáveis à manutenção de tal higidez. Para o cumprimento dessa proposta, será procedida uma análise da relação homem, saúde-doença e trabalho, utilizando-se como referencial a ótica dejouriana e tratando do aludido liame na sociedade capitalista. A ênfase estará na preservação da dignidade da pessoa do trabalhador e a concretização do valor social do trabalho, preceitos fundamentais do Estado Democrático de Direito, consagrados na Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), de 1988.

    O caminho trilhado no presente estudo, utilizado em Ciências Sociais, pauta-se pela pesquisa qualitativa, através do método hermenêutico-dialético, utilizando somente dados retirados de fontes bibliográficas.

    Como objetivo, pelo presente estudo se busca analisar a existência de mecanismos legais de proteção dos trabalhadores frente às situações causadoras de sofrimento, decorrente da organização do trabalho.

    O RELAÇÃO HOMEM-TRABALHO-SAÚDE NA SOCIEDADE CAPITALISTA

    O interesse que move o estudo em questão é a restauração da integridade e dignidade do trabalhador, no papel de produtor de bens e serviços necessários à satisfação das necessidades humanas. Para atender a esta proposta, se parte da psicopatologia do trabalho, que estuda o conflito entre organização do trabalho e sofrimento do trabalhador, que não se mostrava passivo em face das exigências e pressões organizacionais, mas capaz de se proteger dos efeitos nefastos, através da construção de sistemas defensivos, fundamentalmente coletivos. Nesse sentido, mister se faz a utilização, como referencial teórico, de Christophe Dejours.

    Ao enfocar a psicopatologia do trabalho, Dejours analisa a forma como o trabalho é organizado e os respectivos riscos potenciais ao equilíbrio psíquico e à saúde mental do indivíduo. Assim, tem-se que a organização do trabalho representa o insumo básico para se discutir o prazer e o sofrimento, pois concretiza a possibilidade do trabalho se apresentar como uma fadiga ou um equilíbrio, como fonte de alienação ou realização para o trabalhador.

    Trazendo este entendimento para o presente artigo e como meio de análise do comportamento do trabalhador em situações que desrespeitem a sua integridade e dignidade, tem-se que os impactos da organização do trabalho sobre os indivíduos derivam de determinadas condições físicas, químicas, biológicas e psíquicas presentes no ambiente laboral. Isso significa que a forma e a condição como o trabalho é realizado, bem como o ambiente no qual é prestado, determinam o tipo e o montante de desgaste causado ao trabalhador e isso impactará diretamente sobre a produtividade e todo o contexto socioeconômico.

    Desta forma, e baseando-se em premissas laborais, aliadas às contribuições dejourianas com relação à abordagem do prazer e sofrimento vinculados ao trabalho, se pretende analisar o processo de prazer e desgaste vivenciado pelos trabalhadores que prestam serviços em condições nocivas, sejam estas ambientais, como por exemplo a exposição a agentes insalubres ou perigosos, sejam estas relacionadas a exploração do trabalhador, com baixos salários, pressões, excessivas jornadas, dentre outras.

    Em primeiro lugar, merece ser considerado que o trabalho representa um valor muito importante em face das importantes transformações vivenciadas na atualidade, com o aparecimento de novas tecnologias e modos de organização das tarefas. A realidade que se enfrenta é paradoxal, pois ao mesmo tempo em que milhares de pessoas sofrem pela falta de uma vaga de trabalho, outras sofrem pelo trabalho excessivo³⁵.

    Vale ressaltar que o avanço tecnológico e a automação contribuíram para essa redefinição da divisão do trabalho, ao imporem novas formas de gerenciamento que buscam produtividade e qualidade, aliadas a um baixo custo. Isso faz com que se normalizem situações de trabalhos em condições adversas, pois o labor sob tais circunstâncias, muito embora se trate de uma solução precária, é visto como se fosse a normalidade, ou seja, considera-se melhor trabalhar em condições adversas do que não trabalhar³⁶.

    Dejours³⁷, ao analisar o sofrimento no trabalho, estabelece os elementos que põem em risco a saúde mental e os constrangimentos alusivos à saúde física (que também afetam àquela, evidentemente). Afirma que as pressões do trabalho que afetam o equilíbrio psíquico e a saúde mental derivam da organização do trabalho, esta entendida enquanto divisão de tarefas e divisão dos homens. A divisão de tarefas diz respeito ao modo operatório, atingindo diretamente a questão do interesse e do tédio no trabalho, enquanto a divisão dos homens se refere a questões de hierarquia, comando, submissão, afetando as relações que os trabalhadores estabelecem entre si próprios no local de trabalho.

    No que diz respeito aos constrangimentos alusivos à saúde física, Dejours³⁸ os relaciona às condições de trabalho, ou seja, aos agentes químicos, físicos e biológicos, fatores que conduzem para que as situações no ambiente de trabalho se tornem adversas. Este contexto, aliado à necessidade de alta produtividade a baixo custo, torna-se um inimigo a ser enfrentado em uma batalha diária. Ao se conceber que o indivíduo passa uma parte considerável de sua existência no ambiente de trabalho, há necessidade da busca de estratégias para lidar com esse sofrimento e transformar o trabalho em fonte de prazer.

    Interpretando-se a concepção dejouriana, constata-se que o sofrimento não tem origem na realidade exterior, mas nas relações que o sujeito estabelece com esta realidade. E o trabalho, como parte deste mundo externo ao sujeito, representa uma fonte de prazer e de sofrimento, desde que as condições externas oferecidas atendam ou não à satisfação dos desejos inconscientes. Desta forma, merece consideração que a busca do prazer e a fuga do desprazer no trabalho se constituem como um desejo permanente para o trabalhador, em face das exigências contidas no processo, nas relações e na organização do trabalho.

    Contudo, há ocasiões em que o trabalho se realiza em ambientes onde as condições são degradantes à dignidade e integridade do trabalhador, gerando perda da saúde e, por consequência, sofrimento, ainda que não de imediato. Neste sentido, o labor se transforma em mera atividade para prover a necessidade de sobrevivência, afastando-se de qualquer consideração como fonte sublimatória de prazer. A questão a ser respondida com base na análise da teoria dejouriana é: por que os trabalhadores se sujeitam ao labor em ambientes nocivos à sua integridade e por que os empregadores insistem em manter tal tipo de labor, ou, nas palavras do autor, por que uns consentem em padecer de sofrimento, enquanto outros consentem infringir tal sofrimento aos primeiros?³⁹.

    O autor apresenta como ponto central para a tratativa do assunto a noção política de guerra econômica, ou seja, a necessidade do aumento da produtividade a um custo reduzido, o que acaba retirando do mercado pequenas e médias empresas, que são eliminadas pelos gigantes lucrativos. Trata, também, da banalização do mal no sistema liberal econômico, afirmando que por detrás das vitrines da contemporaneidade, do progresso tecnológico, que deveria resultar na melhoria da qualidade de vida, surgem imposições de horário, ritmo, produção, dentre outros fatores que resultam em precarização das condições e sacrifício do trabalhador. Mas como o desemprego é uma situação indesejável, para conservar seu posto de trabalho o indivíduo participa conscientemente de tais atos injustos⁴⁰.

    Para desbanalizar o mal, Dejours⁴¹ enfatiza que se deve abandonar tudo aquilo que é dissimulado, o que significa conduzir-se de modo a combater a distorção, através de medidas individuais e coletivas desenvolvidas nos espaços disponíveis na empresa, sindicato e espaços públicos, ou seja, não mais suprimir a faculdade de pensar e se expressar do trabalhador.

    Assim, merece importante consideração o papel do trabalho na vida humana, pois não se trata apenas de um meio de manter a sobrevivência, mas é o local onde o ser humano passa uma parcela importante de sua vida e por isso não deve ser enfrentado como algo que o desgasta, mas como um fator essencial de seu equilíbrio e desenvolvimento. Dessa forma, o labor não deve ser avaliado apenas como uma máquina de produzir o mal e a injustiça, mas como um elo mediador insubstituível da reapropriação e da realização do ego. Para que isso seja viabilizado, há que se atribuir importância ao meio ambiente em que é realizado, a fim de que possa ser prestado de forma digna e socialmente valorizado, atendendo a princípios fundamentais insculpidos na CRFB, que serão a seguir abordados.

    O DIREITO COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO A DIGNIDADE DO TRABALHADOR

    A CRFB ao trazer a dignidade da pessoa humana como um de seus fundamentos, reconheceu a prerrogativa de todo ser humano ser respeitado como pessoa, de não ser prejudicado em sua existência e de fruir de um âmbito existencial próprio. Sua finalidade, como princípio fundamental, é assegurar ao homem um mínimo de direitos que deve ser respeitado pela sociedade e pelo poder público, de forma a preservar a valorização do ser humano. Também se considera como alicerce de todo o ordenamento jurídico pátrio, não podendo ser mitigada ou relativizada, sob pena de gerar instabilidade no regime democrático.

    Quando a CRFB adotou a dignidade como valor básico do Estado brasileiro, reconheceu o ser humano como o centro e o fim do direito, prerrogativa esta que assume valor absoluto e torna esse princípio uma barreira não passível de remoção, pois zela da dignidade da pessoa humana, que é um valor absoluto cultivado pela Lei Maior. Considera-se, assim, a dignidade da pessoa humana como um sobredireito e o núcleo axiológico de todo o ordenamento jurídico, o que faz com que o Poder Público e toda a sociedade tenham o dever de promovê-la e torná-la efetiva. Esse princípio se constitui num critério unificador de todos os direitos fundamentais, pois todos estes se reportam a ele, em maior ou menor grau.

    Ao se abordar o princípio sob um viés justrabalhista, tem-se que o universo social, econômico e cultural dos direitos fundamentais passa por este ramo, à medida que ele regula a principal modalidade de inserção dos indivíduos no sistema socioeconômico capitalista, cumprindo o papel de lhes assegurar um patamar civilizado de direitos e garantias jurídicas que, regra geral, por sua própria força ou habilidades isoladas, não alcançariam. Diante disso, a conquista e a afirmação da dignidade da pessoa humana envolvem a sua conquista e afirmação da individualidade no meio econômico social, o que gera reflexos no plano cultural e o que se alcança, de maneira geral, mediante o trabalho e, particularmente, o emprego⁴².

    A dignidade, enquanto fundamento do Estado brasileiro, concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às pessoas humanas, afastando a ideia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. É um atributo intrínseco do indivíduo e, como tal, expressa valor absoluto, pois não pode ser desconsiderada, mesmo cometendo o sujeito as mais indignas ações⁴³.

    Portanto, tem-se que a dignidade da pessoa humana não gera total imunidade a qualquer espécie de restrição, pois a prática de atos indignos por um indivíduo não lhe acarreta a perda da dignidade, mas o coloca numa condição de desigualdade com seus semelhantes, o que gera a necessidade de proteção da dignidade do ofendido ou até mesmo de toda a sociedade⁴⁴.

    Quanto à saúde do trabalhador e ao meio ambiente de trabalho tem-se que são direitos protegidos por regras constitucionais e infraconstitucionais e por princípios, visando proporcionar melhores condições de trabalho e de vida aos trabalhadores. Dentre os referidos princípios está o da dignidade da pessoa humana, ora em discussão.

    Contudo, uma discussão que se trava é como conceber a proteção da dignidade do trabalhador frente ao desenvolvimento e à livre iniciativa, também consagrados pela CRFB. No contexto em análise, tem-se que o direito à vida, à integridade física e mental, à dignidade deve preceder a tais. Não que estes fundamentos não tenham importância, pois somente através deles é que se concretiza o direito ao trabalho, corolário da dignidade. Contudo, o desenvolvimento e a livre iniciativa devem ser contextualizados tendo como linha mestra a proteção à vida, à saúde, à integridade física e metal e à dignidade dos trabalhadores.

    Cabe ao Estado atuar, inclusive de forma preventiva, zelando pela proteção da dignidade do trabalhador contra os poderes públicos e agressões de particulares. Para isso são necessárias tomadas de medidas positivas, ou seja, normatizar, fiscalizar, orientar, estimular e punir qualquer violação a tal princípio, inclusive sobrepujando qualquer interesse de ordem econômica⁴⁵, isso significando que a proteção à saúde e integridade do trabalhador e ao meio ambiente de trabalho não podem ser vistos ou usados como moeda de troca, pois são inegociáveis, por maior importância que se dê à livre iniciativa.

    Ante ao exposto, e como a CRFB elevou o valor social do trabalho à categoria de princípio constitucional estruturante, anunciado está que a ordem econômica deve ter seu fundamento na valorização do trabalho humano⁴⁶. Dessa forma, mesmo numa sociedade capitalista, a ordem econômica deverá priorizar o valor do trabalho humano sobre todos os demais valores da economia de mercado. A justificativa de tal prevalência deverá servir de norte à intervenção Estatal na economia, que não poderá priorizar o capital em detrimento do fator humano.

    CONCLUSÃO

    O trabalho é uma categoria fundante do ser social, através do qual se viabilizam as transformações nas relações materiais de produção e reprodução humana. A partir do desenvolvimento dessas forças produtivas, tem-se o ponto de partida para a criação de novas necessidades, modificando o homem nas dimensões objetiva e subjetiva, determinando a relação complexa entre existência e consciência.

    No sistema capitalista, as transformações no mundo do trabalho ganham contorno diferenciado, dado que as relações naturais e tradicionais são dissolvidas e convertidas em relações mercantis, isso significando que, devido ao modo de apropriação do trabalho, no qual o homem se apresenta alienado dos frutos por ele produzidos, os meios de vida e o trabalho são transformados em mercadorias.

    Mesmo nessa lógica exploratória, o trabalho permanece como elemento estruturador da sociedade, pois é fonte de subsistência do indivíduo e de seus dependentes. Contudo, o que se prega é que, além do sustento, o labor precisa ser fonte de satisfação pessoal e não pode se constituir numa forma de destruição pessoal, daí a necessidade de sua proteção.

    Nessa seara, merece consideração que os impactos da organização do trabalho sobre os indivíduos derivam de como as tarefas são realizadas e das condições do meio ambiente laboral, fatores que determinam o tipo e o montante de desgaste causado ao trabalhador. Isso impactará diretamente sobre a produtividade e todo o contexto socioeconômico. Portanto, os efeitos negativos de uma tarefa executada em condições ambientais de risco, ou de forma a ferir a dignidade e integridade do trabalhador geram reflexos na sua saúde e, por consequência, sobre todo o sistema produtivo, o que justifica a importância atribuída no presente estudo ao fator humano e suas implicâncias.

    Os sintomas estão presentes no dia a dia da prestação laboral. Por isso, necessário se faz que sejam observados os princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho, prescritos na CRFB, atentando-se ao fato de que esta norma vinculou a ordem econômica e produtiva ao liame que se forma entre os sujeitos da relação de emprego. Isso quer afirmar que os poderes empresariais devem ser limitados, ou seja, o empregador está obrigado a respeitar os direitos fundamentais dos trabalhadores, proporcionando-lhe condições dignas e saudáveis quando da prestação laboral. As novas tecnologias, metas e atividades desenvolvidas e adotadas devem estar a serviço do homem e devem ser reguladas para impedir o potencial risco de redução da dignidade humana, devem ser construídas de forma a assegurar a integridade física e psíquica dos trabalhadores e garantir a função social do trabalho. Essas são algumas das medidas necessárias para retomar o passo no sentido do cumprimento do compromisso constitucional de fazer Justiça Social, garantindo a todos o direito a buscar o progresso material e seu desenvolvimento espiritual com liberdade, dignidade, segurança econômica e igualdade de oportunidades, atendendo o preceito Dejouriano de que o trabalho deve proporcionar ao indivíduo uma maneira de traçar a sua história.

    REFERÊNCIAS

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    33 Doutora em Direito Econômico e Social pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUC/PR. Mestre em Ciências Sociais Aplicadas pela Universidade Estadual de Ponta Grossa - UEPG. Professora Adjunta do Departamento de Direito do Estado, do Curso de Direito da Universidade Estadual de Ponta Grossa- UEPG.

    34 Mestre e Doutora em Direito pela UFPR. Professora dos Cursos de Direito, Mestrado e Doutorado em Ciências Sociais Aplicadas na UEPG. Juíza do Trabalho.

    35 MORIN, E. Os sentidos do trabalho. In: WOOD JUNIOR, T. (Ed.). Gestão empresarial: o fator humano. São Paulo: Atlas, 2002, p. 13.

    36 FORRESTER, V. O horror econômico. Trad. Álvaro Lorencini. 4 reeimp. São Paulo: UNESP, 1997, p. 17

    37 DEJOURS, C. Uma nova visão do sofrimento humano nas organizações. In: CHANLAT, Jean-François (Coord.). O indivíduo na organização: dimensões esquecidas. Org. ed. brasileira Ofélia de Lanna Sette Tôrres. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 153.

    38 DEJOURS, C. Uma nova visão do sofrimento humano nas organizações. In: CHANLAT, Jean-François (Coord.). O indivíduo na organização: dimensões esquecidas. Org. ed. brasileira Ofélia de Lanna Sette Tôrres. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 160-161.

    39 DEJOURS, C. A banalização da injustiça social. Trad. Luiz Alberto Monjardim. 3. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2000, p. 17.

    40 DEJOURS, C. A banalização da injustiça social. Trad. Luiz Alberto Monjardim. 3. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2000, p. 19-23.

    41 DEJOURS, C. A banalização da injustiça social. Trad. Luiz Alberto Monjardim. 3. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2000, p. 134-137.

    42 DELGADO, M. G. Curso de Direito do Trabalho. 10. ed. São Paulo: LTr, 2011, p. 56-57.

    43 SARLET, I. W. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 43.

    44 SARLET, I. W. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 130.

    45 SARLET, I. W. A eficácia dos Direitos Fundamentais. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 163-164.

    46 BALERA, W. O Valor Social do Trabalho. In: Revista LTr, n. 10, p. 1.167-1.178, out. 1994, p. 1.167.

    CAPÍTULO 3. CLÍNICA PSICODINÂMICA DO TRABALHO COM MAGISTRADOS TRABALHISTAS: ESPAÇO DE COOPERAÇÃO E MOBILIZAÇÃO

    Ana Cláudia de Jesus Vasconcellos Chehab⁴⁷

    Lêda Gonçalves de Freitas⁴⁸

    INTRODUÇÃO

    O presente artigo consiste em pesquisa empírica realizada entre os anos de 2018/2019 e resulta da tese de doutoramento intitulada Clínica Psicodinâmica do Trabalho com Magistrados Trabalhistas da 10ª Região, cujo foco reside na compreensão do trabalhar desses profissionais, por meio do referencial teórico-metodológico da Psicodinâmica do Trabalho, desenvolvido a partir de 1980, pelo francês Christophe Dejours - médico do trabalho, psiquiatra e psicanalista. Essa abordagem busca estudar as relações subjetivas do trabalhador com sua atividade, com o sofrimento e seus efeitos sobre sua saúde física e mental.

    A partir de uma mesa redonda, cujo tema debatido era voltado à saúde mental dos juízes, num encontro institucional para os magistrados dessa região em dezembro de 2017, passou-se a vislumbrar um projeto de clínica do trabalho para essa categoria.

    Surgiam então os primeiros questionamentos: seria possível uma clínica com magistrados? Eles aceitariam dispensar horas de seu exíguo tempo para falarem de si e refletirem sobre seu ofício? Como aconteceria na prática? Foram muitas interrogações, mas com a expectativa de que seria possível e viável, uma vez que a clínica tem se mostrado como uma potência metodológica nos estudos que relacionam saúde mental e trabalho.

    A contar de então, foram articuladas conversas e reuniões no sentido de alinhar os interesses institucionais sobre a demanda que também passou a ser do próprio Órgão, sendo muito bem acolhida a proposta da Clínica do Trabalho pela administração da Instituição.

    Dessa forma, a pesquisa foi ganhando corpo e se propôs a compreender questões sobre o trabalhar na magistratura do trabalho nessa região específica, o que diferencia de outros tribunais regionais do trabalho. O termo trabalhar está além da mera execução de uma tarefa, mas significa ação e mobilização subjetiva, segundo as premissas teóricas da Psicodinâmica do Trabalho.

    O entendimento do trabalhar dos juízes compreende sua forma de agir, sua identidade e realização profissionais, seus anseios, suas dificuldades e criatividades diante dos imprevistos, suas estratégias para fazer o trabalho acontecer e lidar com as frustrações e sofrimentos, bem como os desafios vivenciados para a manutenção de sua saúde física e mental.

    Assim, o estudo buscou contribuir para o aprimoramento de ações que viabilizem um maior sentido e reconhecimento no trabalho dessa categoria.

    Pode parecer um paradoxo: como em uma carreira tão cobiçada, disputada, que detém um status na sociedade, com boa remuneração e vitaliciedade poderia gerar sofrimento? Dejours (1999, p. 20) enfatiza que o sofrimento preexiste ao encontro com a situação do trabalho, ele é ontologicamente primeiro e anterior ao trabalho.

    Assim, trabalhar consiste em se deparar inevitavelmente com a experiência de sofrimento, todavia, o que não se pode prever é o destino desse sofrimento. Dentro da perspectiva teórica da Psicodinâmica

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