Difusão De Saberes Sobre Doenças Crônicas Não-transmissíveis
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Difusão De Saberes Sobre Doenças Crônicas Não-transmissíveis - Ricardo Coutinho Mello
RICARDO COUTINHO MELLO
DIFUSÃO DE SABERES
SOBRE DOENÇAS CRÔNICAS
NÃO-TRANSMISSÍVEIS:
UM ESTUDO SOBRE A ASMA
1ª edição
Rio Grande
2015
Copyright ©2015 Ricardo Coutinho Mello
Todos os direitos reservados aos autores, cedidos à Pluscom Editora -
um selo da Pluscom Comunicação Ltda - para a presente edição.
Projeto gráfico, diagramação e capa:
Pluscom Editora
Editor:
Marcelo França de Oliveira
Conselho Editorial
Prof. Dr. Elio Flores (UFPB)
Prof. Dr. Francisco das Neves Alves (FURG)
Prof. Dr. Rodrigo Santos de Oliveira (FURG)
Prof. Dr. Luiz Henrique Torres (FURG)
Prof. Dr. Moacyr Flores (IHGRGS)
Dados internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
D5689 Difusão de Saberes sobre Doenças Crônicas não-transmissíveis: um
estudo sobre a asma / Ricardo Coutinho Mello. (edição eletrônica)
Rio Grande: Pluscom Editora, 2015.
159p.
Bibliografia
ISBN: 978-85-62983-70-2
1. Saúde. 2. Saúde Pública. 3. Informação. 4. Difusão da
Informação. I. Mello, Ricardo Coutinho. II. Título.
CDU:61:614
Pluscom Editora
(um selo de Pluscom Comunicação Ltda)
Rua 19 de Fevereiro, 550 / 301 - Centro
96200-490 - Rio Grande - RS - Brasil
+55 53 3232.1972 - contato@casaletras.com.br
www.casaletras.com.br
Publicação digital. Editado no Outono de 2015
À memória de Jessie da Cunha Rangel
A G R A D E C I M E N T O S
Ao CNPq, pelo provimento parcial da bolsa de estudo.
Ao Prof. Dr. Álvaro Cruz e ao Prof. Dr. othon Jambeiro, por lançarem
as bases que tornaram esta investigação possível.
Ao Prof. Dr. Gilberto almeida, mais do que um orientador, um amigo,
uma referência profissional e pessoal.
À Profa. Dra. maria líGia ranGel, pela paciência, pelo acolhimento e
incentivo em fazer desta uma nova caminhada.
À Profa. Dra. vera mendes, pela revisão criteriosa e, ao Prof. Dr.
dante Galleffi, pelas recomendações ao projeto.
Aos amigos Prof. Dr. antônio sérGio e Prof. Dr. ernani Coelho
neto, pela generosidade de compartilhar vivências neste momento de
reencontro das nossas trajetórias profissionais.
Ao Prof. Dr. rodriGo Pinto, por tornar possível a pesquisa na Michigan
State University (MSU). Aos preceptores no James Madison College, Sherman
Garnett e mark larGent, por proporcionarem a infraestrutura para
o desenvolvimento das atividades na MSU. Aos docentes do College of
Communication Arts and Sciences, a Profa. Dra. lourdes martinez e o Prof.
Dr. folu oGundimu, e à Profa. nwando aChebe, do College of Social Work,
pela calorosa recepção e disposição em expandir a cooperação científica.
À Paula almeida, por me receber e amparar as atividades de campo no
ProAr. Aos participantes da pesquisa, pela colaboração, em especial, à Dra.
mÁrCia alCântara holanda e lorena maffra, por viabilizarem o contato
com os programas em asma no Brasil.
Aos colegas marCos vianna e Jurema lindote, pelo incentivo e
interlocução fraterna. Aos amigos albano oliveira e ivo santana, pelo
aconselhamento e encorajamento em se seguir adiante.
S U M Á R I O
INTRODUÇÃO
I. A asma como objeto de políticas públicas .........................................................................11
I.1.1 A asma como problema de saúde pública ...................................................................................13
I.1.1.1 O desenvolvimento de políticas públicas ................................................................................15
I.1.1.2. O papel da comunicação em saúde no controle da asma ...................................................16
I.1.1.2.1. A disseminação de saberes em asma .....................................................................................18
I.1.1.2.1.1. O ProAr ........................................................................................................................................19
I.1.1.3. Mediação de saberes em saúde ..................................................................................................20
I.1.1.5. A questão do conhecimento sobre a asma ..............................................................................23
I.1.1.6. Necessidade informacional dos profissionais de saúde ......................................................24
I.1.1.6. Necessidade informacional por parte dos usuários dos serviços .....................................26
II. Justificativa. . . . . . ....................................................................................................................................... 27
CAPÍTULO 1
Asma como Fenômeno Social ...............................................................................................29
1.1 Dimensões dos Saberes ....................................................................................................................... 37
1.2 Difusão e de Disseminação de Conhecimento ..............................................................................42
1.2.1 Educação e disseminação do conhecimento .............................................................................45
1.2.2 Fenomenologia e a Difusão do Conhecimento em Saúde .....................................................48
1.3 Semiótica em Saúde .............................................................................................................................51
1.3.1 Semiótica Clínica................................................................................................................................52
CAPÍTULO 2
As Políticas Públicas de Controle da Asma ..........................................................................56
2.1 Dimensões conhecidas da asma........................................................................................................ 57
2.2 Ações governamentais para tratar a asma como problema de saúde pública ....................64
2.3 Determinantes sociais ..........................................................................................................................69
2.3.1 Rede de referência em asma ..........................................................................................................71
CAPÍTULO 3
Métodos e Técnicas de Pesquisa ...........................................................................................75
3.1 Trajetória de pesquisa ..........................................................................................................................80
3.1.1 Aspectos Éticos ...................................................................................................................................83
3.1.2 Coleta de dados .................................................................................................................................84
3.1.3 Análise de dados ................................................................................................................................85
3.1.4 Plano de Análise .................................................................................................................................86
CAPÍTULO 4
Divulgação de Saberes em Asma ..........................................................................................93
4.1 Estratégias e meios de divulgação de saberes nos serviços de referência em asma........94
4.1 Visões e divulgação de saberes em asma ...................................................................................... 97
4.2.1 O olhar do Estado sobre atenção à asma ...................................................................................98
4.2.2 Percepções e ações dos profissionais do ProAr .......................................................................101
4.2.2.1 Ações comunicacionais do ProAr .............................................................................................105
4.2.3 A percepção dos usuários sobre as ações do ProAr ...............................................................107
4.1 Saberes em asma ................................................................................................................................112
4.3.1 Mediação de Saberes ......................................................................................................................115
4.3.2 Saber Teórico .....................................................................................................................................116
4.3.3 Saber Prático .....................................................................................................................................119
4.3.4 Intencionalidade Informacional ..................................................................................................121
CAPÍTULO 5
Conclusões............... ...........................................................................................................125
BIBLIOGRAFIA . . . . . .....................................................................................................................................130
APÊNDICES.................. .................................................................................................................................150
ANEXOS...................... ...................................................................................................................................156
Difusão de Saberes sobre Doenças Crônicas não-transmissíveis: um estudo sobre a asma I N T R O D U Ç Ã O
Doenças crônicas têm progressão lenta e causam sofrimento
contínuo no decorrer da vida dos enfermos. Entre elas incluem-se as não-
transmissíveis, tais como os acidentes vasculares cerebrais, câncer, diabetes
e doenças respiratórias. No ano de 2005, segundo a Organização Mundial
de Saúde (OMS), as Doenças Crônicas Não-Transmissíveis (DCNT) foram
responsáveis por 60% das mortes em todo mundo, sendo que 80% destas
ocorreram em países em desenvolvimento (baixa e média renda), mas,
aproximadamente, 23% dos óbitos poderiam ser evitados (WHO, 2008). A
tendência estimada para o período entre 2006 e 2015 é de aumento em 17%
das mortes (WHO, 2010a; WHO 2008).
As DCNT chamam a atenção porque são enfermidades sub-
diagnosticadas, pouco tratadas continuamente com medicamentos,
prevalecendo a assistência somente quando os portadores estão em crise
aguda, fato corrente nos países em desenvolvimento. A falta de controle
das DCNT respiratórias1 advém da limitação na oferta de cuidados dos
sistemas de saúde dos países em desenvolvimento, pela política pública2 de
assistencialismo imediatista adotada3 (WHO, 2008; GINA, 2010). Nessa
esguelha, fica a cargo dos governos e autoridades a divulgação de dados
1 Neste grupo incluem-se as doenças pulmonares (hipertensão, obstrução e ocupacionais),
alergias respiratórias e a asma.
2 Política pública é o "corpo do conhecimento que busca, ao mesmo tempo, colocar o
governo em ação e/ou analisar essa ação (variável independente) e, quando necessário,
propor mudanças no rumo ou curso dessas ações (variável dependente)." (HOCHMAN et
al., 2002, p. 69). Visa responder a razão e a forma pela qual ocorrem os processos. A política social, por sua vez, trata das consequências proporcionadas pelos fatos políticos. A política de saúde é a decisão, intenção ou consolidação de ações governamentais com o intuito de
firmar alianças para se debelar forças contrárias a geração de valor para a sociedade (HARTZ
e VIEIRA DA SILVA, 2005).
3 Corresponde a intervenções no processo saúde-doença com vistas a prover soluções,
fundamentalmente, de cunho médico-curativo aos problemas de uma coletividade (PAIM,
1999).
9
Ricardo Coutinho Mello
relacionados a riscos à saúde da população4.
No Brasil existe uma valorização dos veículos de comunicação
massa, sobretudo a televisão, por sua abrangente cobertura, para divulgar
o risco, a prevenção e o combate de doenças infecciosas e parasitárias
(VASCONCELOS, 1999). O Ministério da Saúde (MS) utiliza meios de
produção veiculação de dados para o grande público, no entanto, como
instrumento da área de saúde, o processo comunicacional tende a ser
pouco abrangente e compreensivo (PITTA, 1995). Estrutura-se tendo
como entendimento a transmissão
, o repasse
de informação sobre os
riscos de contrair ou agravar uma doença (WILLIAMS et al., 2011), em
práticas não-reflexivas, com pouco espaço para a escuta ativa além dos
interesses demarcados na agenda estabelecida (CORIOLANO et al., 2012;
HARTMAN et al., 2013).
É discutível, também, a correlação entre a abrangência do meio usado na
transmissão da informação e a eficiência em comunicar. Em uma campanha
necessita-se ser efetivo não só em termos de alcance e quantidade de público
atingido, mas ponderando a intercessão dos espaços midiáticos sobre a
construção da opinião pública nos processos de interação (BOULET, 1998,
WERNECK e TORO, 1996; POPE e MAYS, 2006).
Ao se construir uma mensagem sobre determinado risco para se
promover comportamento saudável, necessita-se saber para quem a
informação é transmitida, e como a informação é ressignificada. O
entendimento dos fenômenos subjacentes à comunicação faz-se mister
em especificidades culturais, na medida em que os símbolos são mutáveis,
conforme a sociedade que os acolhe, e os saberes transformam-se em um
curto espaço de tempo, como é típico de uma campanha de comunicação
de massa.
Diferentemente de outras DCNT, a asma não possui campanha de
comunicação nos países onde tem alta de prevalência, como é o caso do
4 Num panorama multicêntrico, outros atores e centros de decisão são responsáveis pelo
estabelecimento de políticas públicas. Por outro lado, a orientação estadocêntrica entende que às autoridades compete a liderança do processo decisório, e, a outros agentes, a elaboração e implementação de políticas ( policy) (SECCHI, 2013). Nesta, prevalecente no Brasil, a pressão inicial pela formulação de políticas em saúde é maior entre especialistas e profissionais que assistem à população.
10
Difusão de Saberes sobre Doenças Crônicas não-transmissíveis: um estudo sobre a asma Brasil. Entretanto, a eficácia de mediações individualizadas5 a portadores de
asma não difere muito dos métodos considerados tradicionais de atenção
(PARKER et al., 2008). As intervenções pouco a corroboram à transformação
do conhecimento do indivíduo – se comparada a não-intervenção, ou ao uso
tradicional de mídia –, o mesmo sendo observado em termos de melhoria
da sua saúde (KRIEGER et al., 2005; PARKER et al., 2008; WILLIAMS,
2005).
Como melhor adequar as interlocuções é ainda um ponto a se
pesquisar, portanto. A redução do campo da educação à instrumentalidade
da comunicação ignora as possibilidades epistêmicas do indivíduo como
agente de transformação da sua própria história, no caso da asma, carente
de estudos que explorem e correlacionem à experiência vivida à divulgação
de saberes (MANDERSON e ROSE, 2000), bem como as representações
dos atores do campo da saúde.
I. A asma como objeto de políticas públicas
No campo da saúde, a teoria e a prática estão imbricadas de sobremaneira
no processamento de informação e de transformação, mais do que em
qualquer outro campo do conhecimento, por possibilitarem a transformação
da realidade (MINAYO, 1996). Nas últimas décadas, pesquisas estão sendo
desenvolvidas com o propósito de apreender a conexão entre a comunicação,
a educação e a saúde, com destaque para os esforços em se avaliar ora as
mensagens, ora os meios e as técnicas utilizadas, bem como a repercussão
entre os atores/agentes sociais.
Entre as linhas de ação relacionadas às melhores práticas, está a de
Produção e Disseminação de Conhecimentos e Informações em Saúde que
objetiva "a produção de conhecimentos e informações sobre as relações
entre os determinantes sociais e a situação de saúde, particularmente as
5 O conceito de participações em comunidade varia desde a distribuição de material
impresso a visitas domiciliares (PARKER et al., 2008).
11
Ricardo Coutinho Mello
iniquidades em saúde, com vistas a fundamentar políticas e programas."
(CNDSS, 2008). Dos modelos desenvolvidos para se demonstrar a
sistemática das determinantes de saúde (WHO, 2005a), o estudo do fluxo
de informações desponta como um dos componentes para se debelar os
agravos, o que sugere interações com a comunidade.
A significação do agir remete ao plano de análise das experiências vividas
para além das condições conscientes, exteriorizadas em comportamentos
e discursos pelos atores sociais. O desafio é discutir a multiplicidade dos
determinantes da doença, com ênfase nas condicionantes intervenientes
ao longo da vida do portador, que inclui o padecer por se tratar de uma
experiência subjetiva e singular (JANSSENS et al., 2009).
Há de se compreender, portanto, as identidades e interesses relacionados
ao estudo de uma enfermidade, não só no seu contexto epidemiológico,
como também entre os posicionamentos e relações políticas estabelecidas
pelos subgrupos com o mundo à sua volta. Destarte, compete examinar o
processo de difusão e disseminação6 do conhecimento nas tessituras próprias
a cada ator social, valendo da inserção da asma no grupo de enfermidades
crônicas e não-transmissíveis.
6 os conceitos de difusão e disseminação são tratados distintamente. O primeiro é entendido tal como defende Hochman et al (2002, p. 92): "um processo no qual os indivíduos que
defendem uma ideia procuram leva-la a diferentes fóruns, na tentativa de sensibilizar não
apenas as comunidades de políticas ( policy communities), mas também o público em geral, vinculado a audiência às propostas e construindo progressivamente na aceitação. Dessa
forma, as ideias são difundidas, basicamente, por meio da persuasão". Corresponde, pois,
a um processo ativo de agentes que agem planejadamente para atingir grupos e propósitos
particulares, com mecanismos de propagação dirigidos e controlados (GREENHALGH
et al., 2004; ALBUQUERQUE e CASSIOLATO, 2000). A difusão em saúde refere-se à
provisão de recursos psicológicos e materiais por uma rede social para beneficiar o portador no manejo da doença, e o público não acometido pela enfermidade, para se apropriar de
saberes com vistas à profilaxia, quando possível. Por sua vez, o conceito de disseminação está associado à multiplicação de enunciados na semiose, possibilitando a circulação de saberes,
em diversos espaços e contextos, de forma simétrica, inclusiva, multidirecional, multipolar e descentrada (COSTA e RANGEL-S, 2007; ARAÚJO e CARDOSO, 2007).
12
Difusão de Saberes sobre Doenças Crônicas não-transmissíveis: um estudo sobre a asma I.1.1 A asma como problema de saúde pública7
A Constituição Federal de 1988 reconhece a saúde como um direito
do cidadão, enfatizando ao engendramento de políticas, em três níveis
de governo. A composição do Sistema Único de Saúde (SUS) permite a
participação e o controle da comunidade sobre o planejamento de políticas
e planos em saúde. O direito à informação é garantido constitucionalmente,
porém a difusão de conhecimento em saúde, em particular, as DCNT,
como a asma, não dispõem de apoio governamental para empreendimentos
diversificados. Faltam meios apropriados para se atingir