Contextos e condutas em atenção primária à saúde – Volume 2
De Isadora Ferreira Teixeira, José Dias Linhares Júnior, Julia de Oliveira Zubaran e Rayssa Ruszkowski do Amaral
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Contextos e condutas em atenção primária à saúde – Volume 2 - Isadora Ferreira Teixeira
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ORGANIZADORAS
CONTEXTOS E CONDUTAS EM ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE – VOLUME 2
Série Acta Medica | 2
logoEdipucrsPorto Alegre, 2019
© EDIPUCRS 2019
CAPA Thiara Speth
EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Maria Fernanda Fuscaldo
REVISÃO DE TEXTO André Luiz da Silva, Carmen Vera Giacobbo Daudt, Cristina Furlan Zabka, Eder de Mattos Berg
Edição revisada segundo o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
C761 Contextos e condutas em atenção primária à saúde
[recurso eletrônico] / organizadores Isadora Ferreira Teixeira ...
[et al.]. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : EDIPUCRS, 2019.
Recurso on-line (367 p.) – (Série Acta Médica ; 2)
Modo de Acesso:
ISBN 978-85-397-1331-8
1. Cuidados primários de saúde. 2. Medicina. I. Teixeira, Isadora Ferreira. II. Série.
CDD 23. ed. 613
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SUMÁRIO
Capa
Conselho Editorial
Folha de Rosto
Créditos
CARTA DO EDITOR
APRESENTAÇÃO
SAÚDE DA CRIANÇA
19 PUERICULTURA NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: A IMPORTÂNCIA DA VIGILÂNCIA DO DESENVOLVIMENTO DURANTE OS 1000 PRIMEIROS DIAS DE VIDA
CARLOS G. S. GOMES
ALLAN Y. KIMURA
LISS JANUÁRIO DE OLIEIRA
VANESSA M. RIOS
MARGARETH R. SALERNO
20 IDENTIFICAÇÃO E MANEJO DA VIOLÊNCIA SEXUAL INFANTIL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
DÉBORA DETTMER
FABIANA COLOMBO
ISADORA FERREIRA TEIXEIRA
LUÍZA MARTÍNEZ RAUTER
CRISTIAN TEDESCO TONIAL
21 O USO DA MEDITAÇÃO COMO PRÁTICA INTEGRATIVA NA ANSIEDADE E DEPRESSÃO E SEUS BENEFÍCIOS NO PACIENTE PEDIÁTRICO
FABIANA COLOMBO
JOÃO HENRIQUE CAURIO DA SILVA
DÉBORA DETTMER
ISADORA FERREIRA TEIXEIRA
GIBSI MARIA POSSAPP ROCHA
22 PREVENÇÃO DA OBESIDADE NA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA
ISADORA G. ZANROSSO
LUÍSA DE J. MARTINS
MATIAS EPIFANIO
23 TOSSE CRÔNICA NA INFÂNCIA
GABRIELE WINTER MOURA
GEORGEA MALFATTI
LEONARDO ARAÚJO PINTO
24 A CRIANÇA RESPIRADORA ORAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
MARINA FARIA FIGUEIREDO
CAMILA VALVASSORI NOVAK
VICTÓRIA DE BITTENCOURT ANTUNES
ALINE SILVEIRA MARTHA
VIVIANE FELLER MARTHA
GRAVIDEZ, PARTO E PLANEJAMENTO FAMILIAR
25 ANTICONCEPÇÃO NA ADOLESCÊNCIA EM ATENÇÃO PRIMÁRIA
PEDRO CAVALCANTI MORETTO
VICTÓRIA CAMPOS DORNELLES
DÉBORA CHEDID EIZERIK
MARCELO MORETTO
CAMILA HENZ
26 A OBESIDADE E O DESEJO DE GESTAR: ABORDAGEM DE PONTOS CHAVES NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
VICTÓRIA CAMPOS DORNELLES
DÉBORA CHEDID EIZERIK
PEDRO CAVALCANTI MORETTO
MARTA RIBEIRO HENTSCHKE
RAFAELLA GEHM PETRACCO
27 INFECÇÕES GESTACIONAIS – PREVENÇÃO DE COMPLICAÇÕES
WILLIAM PINTO DÖERING
DIOGO MARTINS DE OLIVEIRA
RODOLFO WERRMANN
CAMILA HENZ
JORGE HORNOS
28 ABORDAGEM À GESTANTE QUE DESEJA ABORTAR
LEONARDO ZANETTI FLORIAN
ALESSANDRA CORTE REAL LANÇA
BIANCA BASSANI FEDERIZZI
JOÃO ALFREDO PIFFERO STEIBEL
SAÚDE DO APARELHO REPRODUTOR
29 PREVENÇÃO PRIMÁRIA DE NEOPLASIAS DO COLO DO ÚTERO
GABRIELLE SOARES BEHENCK
GEOVANA RIBAS VIRTUOSO
JOÃO GUILHERME MEINEM GARBIN
FERNANDO ANSCHAU
30 PREVENÇÃO SECUNDÁRIA DO CÂNCER DO COLO DO ÚTERO
FERNANDA RAUBER
PEDRO LUCAS DE PAULA
FERNANDO ANSCHAU
31 RASTREAMENTO PERSONALIZADO PARA CÂNCER DE MAMA EM POPULAÇÕES DE ALTO RISCO
PEDRO MARCHIORI CACILHAS
PAULO RICARDO SANTOS NUNES FILHO
GUSTAVO GÄRTNER MICHEL
RENAN TREVISAN JOST
ANDRÉ POISL FAY
SAÚDE MENTAL
32 ABORDAGEM SOBRE DEPRESSÃO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA
VANESSA MACHADO RIOS
LISS JANUÁRIO DE OLIVEIRA
RICARDO TAVARES MONTEIRO
CARMEN DAUDT
33 IDEAÇÃO SUICIDA E TENTATIVA DE SUICÍDIO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: UM RASTREAMENTO (IM)POSSÍVEL?
RICARDO TAVARES MONTEIRO
CRISTINA FURLAN ZABKA
34 TRANSTORNO DO DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
ANA PAULA FEIER
MATEUS VIZENTINI MENDES
GABRIELA MEIRELLES MARCHESE
SIMONE SUDBRACK
ALESSANDRA MARQUES PEREIRA
AFECÇÕES NEUROLÓGICAS
35 MANEJO DO PACIENTE COM EPILEPSIA NA ATENÇÃO PRIMÁRIA: DIAGNÓSTICO, TRATAMENTO CLÍNICO E INDICAÇÕES CIRÚRGICAS
GUTIERRE NEVES DE OLIVEIRA
NATHAN LEÃO PEIXOTO
BIANCA BASSANI FEDERIZZI
NORMANDO GUEDES PEREIRA NETO
ELISEU PAGLIOLI NETO
AFECÇÕES OCULARES
36 RASTREAMENTO DE RETINOPATIA DIABÉTICA EM ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: VISÃO GERAL E PERSPECTIVAS
ALESSANDRA CORTE REAL LANÇA
VICTÓRIA D’AZEVEDO SILVEIRA
LEONARDO ZANETTI FLORIAN
JOSÉ AMADEU DE ALMEIDA VARGAS
LUCIANA ROESCH SCHREINER
37 PRINCIPAIS AFECÇÕES OFTALMOLÓGICAS NA ATENÇÃO PRIMÁRIA
GUSTAVO MICHEL
GEORGEA MALFATTI
VICTÓRIA SILVEIRA
PEDRO CACILHAS
LISIANE PEREZ
38 ABORDAGEM DAS CONJUNTIVITES NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
GEORGEA MALFATTI
GABRIELE WINTER DE MOURA
FLÁVIO ROMANI
AFECÇÕES DE OUVIDO, NARIZ E GARGANTA
39 OTITE MÉDIA AGUDA: ABORDAGEM E MANEJO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA EM SAÚDE
CAMILA VALVASSORI NOVAK
MARINA FARIA FIGUEIREDO
VICTÓRIA DE BITTENCOURT ANTUNES
ALINE SILVEIRA MARTHA
VIVIANE FELLER MARTHA
AFECÇÕES DE PELE
40 ABORDAGEM DA ACNE NA ATENÇÃO PRIMÁRIA
ISABEL CRIVELATTI
MARIA ELISA PEINADO MILLER
THAÍS CORSETTI GRAZZIOTIN
41 ABORDAGEM DA DERMATITE ATÓPICA NA ATENÇÃO PRIMÁRIA
MARIA ELISA PEINADO MILLER
ISABEL CRIVELATTI
JAQUELINE MICHEL
CLARISSA PRATI
THAÍS GRAZZIOTIN
AFECÇÕES MUSCULOESQUELÉTICAS
42 COXARTROSE NA ATENÇÃO BÁSICA
ANDREW TEER
ARTHUR CORREA PIGNATARO
LAURO ETCHEPARE DORNELLES
OSWALDO ANDRÉ SERAFINI
43 ABORDAGEM DA DOR OSTEOMUSCULAR
GABRIELA MEIRELLES MARCHESE
ANA PAULA FEIER
GABRIELA JACQUES
NILA CAROLINA ARNEZ CAMACHO
CRISTINA FURLAN ZABKA
44 MANEJO CLÍNICO DA SÍNDROME DO TÚNEL DO CARPO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
GUSTAVO GUTHMANN PESENATTO
FÁBIO HERRMANN
THALES DANIEL ACKER
JEFFERSON BRAGA SILVA
45 O AGULHAMENTO SECO NO TRATAMENTO DA SÍNDROME DOLOROSA MIOFASCIAL
JÚLIA LORENZ CABEZUDO SILVEIRA
LUCIANA SCHWANN
AFECÇÕES RESPIRATÓRIAS
46 TUBERCULOSE: ENTENDER A DOENÇA PARA ATINGIR A META EM 2030
DIOGO MARTINS DE OLIVEIRA
ANDRÉ BARCELLOS AMON
CHRISTIAN BRANDÃO KLIEMANN
JOÃO PEDRO DA ROSA BARBATO
GUSTAVO CHATKIN
AFECÇÕES METABÓLICAS E VASCULARES
47 HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA EM ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
JOÃO PEDRO DA ROSA BARBATO
ANDRÉ BARCELLOS AMON
CHRISTIAN BRANDÃO KLIEMANN
PEDRO MARCHIORI CACILHAS
MARIO WIEHE
48 O MANEJO DA OBESIDADE NA ATENÇÃO PRIMÁRIA
LUÍSA DE JESUS MARTINS
ISADORA GUBERT ZANROSSO
ALEXANDRE VONTOBEL PADOIN
49 EDEMA DE MEMBROS INFERIORES: UMA ABORDAGEM NA ATENÇÃO PRIMÁRIA
CARLOS AUGUSTO BORBA
RAFAELA FRANCESCHI
LUISA MASCOLO
FERNANDA LONGHI
AFECÇÕES GASTROINTESTINAIS
50 DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
RAYSSA RUSZKOWSKI DO AMARAL
JONNY ANDERSON KIELBOVICZ BEHLING
CARLOS KUPSKI
51 RASTREAMENTO DE CÂNCER COLORRETAL NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
PEDRO BOHM BORTOLOSSO
KELVIN BURIGO
LUCIO SARUBBI FILLMANN
52 PARASITOSES INTESTINAIS: COMO NÃO ESQUECER DE INVESTIGAR
FÁBIO HERRMANN
GUSTAVO GUTHMANN PESENATTO
THALES DANIEL ACKER
CARLOS KUPSKI
AFECÇÕES DAS VIAS URINÁRIAS
53 ANTIBIOTICOTERAPIA PARA INFECÇÃO DO TRATO URINÁRIO BAIXO NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: UMA REVISÃO INTEGRATIVA
KELVIN BÚRIGO
ADIR SCHREIBER JUNIOR
PEDRO BOHM BORTOLOSSO
LEONARDO VILIANO KROTH
54 DIAGNÓSTICO E MANEJO CLÍNICO DA NEFROLITÍASE NA ATENÇÃO PRIMÁRIA
NATHAN LEÃO PEIXOTO
GUTIERRE NEVES DE OLIVEIRA
ANDREI CARDOSO CENTENO
GUSTAVO FRANCO CARVALHAL
55 INCONTINÊNCIA URINÁRIA FEMININA NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE
JOÃO GUILHERME MEINEM GARBIN
GABRIELLE SOARES BEHENCK
LUCAS SCHREINER
EDIPUCRS
CARTA DO EDITOR
Estimados leitores,
É com uma alegria imensa que agora entregamos a Acta Medica 2019, tendo como tema central a Atenção Primária à Saúde. Quando falamos de saúde para todas as pessoas, levando em conta toda a diversidade humana, é com satisfação que aqui apresentamos a produção científica desses brilhantes médicos e médicas da ATM 2019 no cenário entendido como norteador da formação médica nas melhores escolas médicas, e porta de entrada do sistema em saúde nas localidades com os melhores indicadores em saúde para as pessoas.
Levando em consideração as diversas reflexões desses jovens profissionais, foram produzidas ricas revisões tanto no aspecto clínico-assistencial como no aspecto conceitual, já que a Atenção Primária à Saúde tem seus atributos bem definidos.
É extremamente recompensador atestar as contribuições e reflexões no cenário de excelência da formação médica desde a graduação até a residência, ou seja, no sistema que atende, pelo menos, 75% da população brasileira - o Sistema Único de Saúde, com alguns desafios, mas com inúmeras potencialidades e exemplos de referência, como o Programa Nacional de Imunizações, o tratamento de pessoas vivendo com HIV/AIDS e o maior sistema público de transplante de órgãos do mundo.
Foram meses de trabalho árduo, muitas conversas, reuniões, trocas de mensagens, rodadas de revisões, até esse resultado primoroso.
Aproveitem desta excelente produção científica feita pelos mais jovens médicos e médicas da PUCRS, sobre aspectos clínicos e conceituais da porta de entrada de um sistema de saúde que busque excelentes indicadores, como Canadá, Austrália, Israel e Reino Unido.
Afetuosos AbraSUS,
André L. Silva
Editor-chefe da Acta Médica 2019
APRESENTAÇÃO
Em mais uma edição desta tradicional publicação dos formandos das Associações de Turmas Médicas da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, a Série Acta Medica – agora apresentada como uma Série Editorial, por meio da obra Contextos e condutas em atenção primária à saúde – Volume 1 e Volume 2, aborda, pioneiramente, a temática da Atenção Primária à Saúde (APS), que compõe a porta de entrada dos sistemas de saúde.
A APS está apta para prover atendimento a todas as pessoas, independentemente de queixas de saúde, idade, gênero ou condição social, e resolver até 90% de suas demandas em saúde sem a necessidade de encaminhamento a outros níveis de atenção. Possui como particularidade o fato de estar presente no território onde vivem os usuários do sistema de saúde e suas famílias.
A APS se baseia em atributos essenciais e derivados, dentre os quais se destacam a longitudinalidade e a integralidade no atendimento. O profissional especialista em APS é o médico de família e comunidade, e esta obra aborda alguns aspectos de sua prática.
Os formandos da Associação da Turma Médica 2019 escolheram essa temática por acreditarem em sua relevância biomédica e social.
Apresentamos, nesse sentido, dois volumes: o primeiro, de eixo conceitual, traz seções sobre ferramentas da prática do médico de família e comunidade, prevenção e promoção em saúde, entre outros; o segundo, de eixo clínico, traz seções sobre saúde da criança, gravidez, parto e planejamento familiar, saúde mental e afecções de sistemas específicos.
A publicação tem por objetivo auxiliar o leitor na obtenção de condutas médicas, abordando temas de prevalência clínica relevante e de contextualização epidemiológica destacada.
Os autores esperam que essa seja uma ferramenta de construção coletiva de conhecimento e desejam boa leitura.
SAÚDE DA CRIANÇA
19
PUERICULTURA NA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE: A IMPORTÂNCIA DA VIGILÂNCIA DO DESENVOLVIMENTO DURANTE OS 1000 PRIMEIROS DIAS DE VIDA
CARLOS G. S. GOMES
ALLAN Y. KIMURA
LISS JANUÁRIO DE OLIEIRA
VANESSA M. RIOS
MARGARETH R. SALERNO
INTRODUÇÃO
A atenção à criança no contexto da atenção primária busca oferecer a promoção não somente de boas práticas parentais, mas também recursos para garantir boas práticas visando ao adequado crescimento e ao ótimo desenvolvimento neuropsicomotor desta população. Os primeiros 1000 dias de vida - que correspondem, aproximadamente, aos 0 a 3 anos - é especialmente crítico para o crescimento e desenvolvimento do sistema nervoso central: se, por um lado, é a faixa etária mais suscetível a lesões cerebrais, é também o grupo que apresenta melhor prognóstico, desde que a intervenção seja realizada em tempo hábil. Diversas propostas de rastreamento e intervenção têm sido estudadas, em especial nas últimas décadas, nas quais tem sido crescente a preocupação com a qualidade de vida destas crianças e em seu potencial impacto socioeconômico, tanto imediato quanto ao atingirem a idade adulta. Este trabalho, portanto, teve como objetivo realizar uma revisão integrativa da literatura médica a respeito do impacto da atenção primária pediátrica no que tange ao desenvolvimento neuropsicomotor, bem como aos avanços no entendimento e nas propostas de intervenção precoces durante os 1000 primeiros dias de vida da criança.
MÉTODOS
Foram pesquisados artigos de língua inglesa e portuguesa nas bases de dados MEDLINE e LILACS, utilizando os termos de busca (Primary Health Care
[Mesh]) AND ((Child Development
[Mesh]) OR (Growth and Development
[Mesh]). Foram utilizados os filtros: 5 anos, revisão, humanos e faixa pediátrica.
RESULTADOS
Foram encontrados 44 artigos na base de dados MEDLINE, sendo destes selecionados 7 artigos, e 50 artigos encontrados na base de dados LILACS, sendo selecionados 3 conforme adequação ao tema proposto, totalizando 10 artigos. Os principais achados foram descritos a seguir.
Contexto social e de saúde do neurodesenvolvimento infantil
A importância da vigilância do desenvolvimento da criança está no fato de que os primeiros 3 anos de vida, principalmente, são um período crítico para o crescimento e desenvolvimento do cérebro infantil, e esse período pode impactar posteriormente não só na saúde da criança como na sua qualidade de vida social, psicológica e econômica. Um atraso na linguagem e no desenvolvimento psicossocial na primeira infância não detectado, por exemplo, pode levar a dificuldades de adaptação escolar, logo, representando menores índices de graduação e de retenção escolar2. Sendo assim, os anos iniciais do desenvolvimento da criança são de grande impacto em sua posterior trajetória educacional e, subsequentemente, em sua vida adulta.3 Outra importante razão para a atenção ao desenvolvimento na primeira infância reside no fato de que a resposta às intervenções comportamentais e de desenvolvimento é maior durante estes anos de vida, além de que estudos em neuroimagem e epigenética têm comprovado o impacto negativo da falta de cuidados adequados e permissividade quanto a atrasos de desenvolvimento nessa faixa etária.3
Vigilância do desenvolvimento e puericultura na Atenção Primária
A vigilância do desenvolvimento da criança envolve tanto o rastreamento de atraso nos componentes do desenvolvimento neuropsicomotor, como também intervenções precoces com potencial de garantir o crescimento adequado da criança, seu desenvolvimento cognitivo ideal, além da prevenção de doenças a curto e a longo prazo. Estudos demonstraram que intervenções multicomponentes na atenção primária, levando em consideração a saúde da criança como um todo e não apenas em um único aspecto, são mais bem-sucedidas do que intervenções de componente único. Contudo, para que a saúde preventiva se torne mais generalizada, são necessárias intervenções que incentivem as modificações do ambiente de consulta, associadas a um melhor nível de atendimento e puericultura e, ainda, que as intervenções visem não só a mudança de comportamento individual como também a do ambiente sociopolítico. 4
No Brasil, o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) e o Programa de Saúde da Família (PSF) são as principais estratégias para vigilância da saúde infantil, destacando-se instrumentos para monitorar o crescimento e desenvolvimento da criança, incentivo a aleitamento materno, imunizações e atenção a doenças prevalentes da infância.
Fatores de risco e rastreamento de atrasos do neurodesenvolvimento
ALEXANDER et al. (2017) enfatiza que a triagem é parte do processo de vigilância e se caracteriza por ser circunstancial, em geral por meio de um instrumento padronizado. O uso sistemático de vigilância e triagem é decisivo para que o profissional possa identificar potenciais fatores de risco e/ou atrasos e promover a intervenção.
Entre os instrumentos utilizados na triagem está a Caderneta de Saúde da Criança (CSC), uma ferramenta imprescindível na assistência ao desenvolvimento infantil, utilizada para acompanhar as crianças desde o nascimento até os 10 anos de idade. A CSC, em sua primeira parte destinada aos pais, contém informações e orientações sobre saúde, direitos da criança e dos pais, registro de nascimento, amamentação e alimentação saudável, vacinação, crescimento e desenvolvimento, sinais de perigo de doenças graves, prevenção de violências e acidentes, entre outros. A segunda parte da Caderneta da Criança é destinada aos profissionais de saúde, com espaço para registro de informações importantes relacionadas à saúde da criança. Contém, além dos instrumentos de vigilância do desenvolvimento, as curvas de crescimento, e tabelas para registro de vacinas aplicadas. Entre os fatores de risco citados na CSC associados a problema do desenvolvimento estão: ausência ou pré-natal incompleto, problemas na gestação, parto ou nascimento, prematuridade (< de 37 semanas), peso abaixo de 2,500 g, icterícia grave, hospitalização no período neonatal, doenças graves, como meningite, traumatismo craniano e convulsões, parentesco entre os pais, casos de deficiência ou doença mental na família, fatores de risco ambientais (como violência doméstica, depressão materna, drogas ou alcoolismo entre os moradores da casa, suspeita de abuso sexual etc). Além disso, fatores físicos podem estar associados, tais quais perímetro cefálico < -2 escores z ou > +2 escores z e presença de alterações fenotípicas - fenda palpebral oblíqua, olhos afastados, implantação baixa de orelhas, lábio leporino, fenda palatina, pescoço curto e/ou largo, prega palmar única e 5º dedo da mão curto e recurvado. A CSC avalia, também, os marcos do desenvolvimento infantil nas idades específicas e, a partir disso, aliado a fatores de risco, classifica se há atrasos no desenvolvimento (figura 1).
Portanto, segundo LIMA et al (2016) a necessidade da utilização deste instrumento é nítida para a vigilância da saúde da criança, visto que, como já foi explanado anteriormente, a prevenção e a identificação de possíveis agravos ao crescimento infantil devem ser tratadas com mais desvelo, para que sua finalidade de promover uma melhor qualidade de vida na infância seja, de fato, eficaz.
Intervenções no desenvolvimento infantil na Atenção Primária
Estudos sobre intervenções comportamentais na promoção do desenvolvimento saudável têm demonstrado benefícios em diversos aspectos, como fala e linguagem, sociabilidade e cognição. Tais intervenções baseiam-se em atividade ou avaliação diretamente envolvendo a criança, e, mais frequentemente, nas práticas parentais, promovendo benefício à criança por meio da educação dos pais. Intervenções direcionadas a componentes como leitura compartilhada, higiene do sono e disciplina não violenta têm sido relatados como as estratégias mais bem-sucedidas entre os componentes que englobam a saúde e o desenvolvimento da criança.
Práticas parentais positivas são um componente essencial para promover o adequado desenvolvimento nos anos iniciais de vida, dos quais destacam-se dois aspectos: participação frequente e precoce em atividades que estimulem a cognição e interações sensíveis e responsivas durante a convivência diária entre pais e filhos, sendo a soma destes fatores preditora tanto de um melhor desenvolvimento em aspectos de linguagem, social-emocional e desenvolvimento cognitivo, bem como de sucesso educacional nos anos subsequentes. Práticas simples, como distribuir um livro de história durante uma consulta de puericultura, bem como explicar aos pais a importância da leitura, têm se mostrado benéficas no estímulo ao aprendizado e ao desenvolvimento da linguagem. Ao ler histórias regularmente com seus filhos, por exemplo, pais estimulam o desenvolvimento da linguagem ao expor a criança a uma maior diversidade de estímulos fonéticos e de vocábulos. Este estímulo precoce, quando realizado em adequada quantidade e qualidade, tem se mostrado como principal fator de influência na alfabetização infantil, acima de fatores parentais como nível educacional, socioeconômico e etnia. Tamanho impacto é proporcionado pelo estímulo precoce à alfabetização que a Academia Americana de Pediatria, desde 2014, recomenda que profissionais de saúde envolvidos na Atenção Pediátrica ofereçam orientações sobre o tema aos pais em todo atendimento, no mínimo, durante os três anos iniciais de vida da criança.
Visitas domiciliares para orientações sobre cuidados na primeira infância, tanto por profissionais médicos quanto não-médicos, tiveram resultados positivos sobre a postura dos pais em relação a cooperatividade, estímulo cognitivo e sensibilização às necessidades da criança. Cultivar um ambiente de convivência agradável também tem se demonstrado benéfico em relação a saúde mental de pais e filhos, ao reduzir sintomas depressivos e estresse, além de promover relacionamentos de melhor qualidade e mais harmoniosos. Métodos de orientação a pais como aprendizado com pares e discussão em grupos, simulações, orientação e feedback durante consulta médica, observação e correção de atitudes por vídeo e reforço de comportamentos adequados tiveram impacto significativo em relação a satisfação, resiliência e redução de estresse dos pais, além de beneficiar indiretamente o desenvolvimento cognitivo da criança de 0-3 anos. Embora os resultados na literatura ainda sejam heterogêneos em função de divergência entre escalas de avaliação (Preschool Language Scale, Achenbach Child Behavior Checklist, Bayley Scales of Infant Development) e desfechos adotados em cada estudo, estas intervenções têm demonstrado impacto positivo. Grandes limitadores da disseminação destas práticas na atenção primária, no entanto, envolvem logística, custos e falta de profissionais habilitados. Neste contexto, torna-se essencial a integração do cuidado na atenção primária entre médico generalista, pediatra, médico de família, fisioterapeuta, fonoaudiólogo, dentre outros profissionais envolvidos com a saúde da criança, a fim de possibilitar que as melhores práticas em puericultura possam se difundir, principalmente, entre aquelas que compõem grupos de risco e vulnerabilidade social.
CONCLUSÃO
A vigilância do desenvolvimento neuropsicomotor infantil tem sido um elemento fundamental na atenção primária pediátrica. Intervenções precoces, especialmente durante os 3 primeiros anos de vida, tem se demonstrado de notável impacto e com melhores desfechos, não somente no comportamento, mas também em habilidades psicomotoras e no bem-estar familiar. Promover o desenvolvimento neuropsicomotor e cognitivo adequado nos primeiros 1000 dias de vida é também promover o futuro sucesso educacional e profissional desta população.
REFERÊNCIAS
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