Palavra E Fruição
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Palavra E Fruição - César ´pereira
Prefácio
Escrever é sair de dentro
Antonio Hohlfeldt
O Brasil parece ter tendências a manter seus poetas longevos, ainda que nem sempre a poesia e os poetas sejam muito valorizados em nosso meio. Manoel de Barros morreu com quase cem anos, Carlos Nejar está com 83 anos de idade, e César Pereira chegou aos 88 anos! Neste sentido, Palavra e fruição, que o leitor tem em mãos, se torna, inexoravelmente, uma espécie de balanço de vida e de obra. Aliás, há pelo menos dois poemas claramente datados, um alusivo à passagem dos 75 anos de vida, e outro, aos 85 anos de existência.
O poema dos 75 anos se chama Sofrendo poemas
(p. 90) e nele lemos: 75 anos/ sofrendo poemas// 75 anos/ e ainda movo/ escombros/ nesta fruição da palavra
. O poema pode ser lido como uma reflexão sobre aquela fase da vida, quando o poeta, embora reconhecendo a idade, revaloriza a força (fruição) da palavra, capaz de mover escombros, ou seja, de renovar a realidade. É significativo, aliás, que a referência à fruição da palavra
que encerra o poema seja a expressão – ainda que invertida – que batiza o novo livro, Palavra e fruição. O leitor precisa estar atento, já que, na maioria dos idiomas, o deslocamento espacial de um vocábulo pode – e quase sempre provoca – uma modificação de sentido. No poema referido, a fruição da palavra
permite ao poeta renovar-se. É, pois, uma ideia de ação a que encontramos. Na expressão palavra e fruição
, que intitula o novo livro, a ênfase se modifica: fruir é usar ou aproveitar com prazer, com deleite, com alguma vantagem. A palavra fruída significa que o poeta, ao manipulá-la, na confecção do verso, conscientiza que tal criação lhe é prazerosa. A ênfase está modificada: antes, ela recai na ação que a palavra provoca de mover escombros, renovando a realidade. Aqui, a ênfase está na fruição, isto é, no prazer. Se combinarmos as duas ideias, temos, talvez, aquilo que, de fato, alimenta a criação do poeta: ele sente prazer na criação do poema, na lide com a palavra, sobretudo se esta palavra é capaz de mudar a realidade, renovando-a e revitalizando-a.
O outro poema mencionado é alusivo aos 85 anos (uma década depois), e bem mais recente em relação ao momento em que este livro está sendo publicado. Apenas três anos separam os dois momentos. Trata-se de Equilibrista
(p. 86). O poema é mais seco, mais indireto, mas, talvez por isso mesmo, mais eficiente: 85 anos// Levo na lapela/ um resto de vida/ um poema na mala/ uma rosa partida/ um toque de ternura/ uma despedida/ e o sangue vertido/ nas veias do verso
. O poeta realiza um inventário, reconhece perdas, mas igualmente menciona possibilidades das quais não desistiu: ao lado da rosa partida, subsiste um poema na mala, esta mala que todo ser humano carrega ao longo da vida e onde se guardam as boas lembranças e as eventuais frustrações (que, obviamente, por sermos humanos, todos as temos).
Depois do inventário generalista do primeiro bloco de versos, o segundo