Sobre palavras e pedras
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Sobre palavras e pedras - Atevaldo Rodrigues da Silva
Atevaldo Rodrigues da Silva
Sobre palavras
e
pedras
Viagem
Quando eu viajo para a cidade onde nasci,
Eu não viajo para um lugar.
Eu viajo para um tempo.
Meus tios jogavam damas no terreiro de casa.
As peças da dama eram feitas da coluna vertebral de um peixe.
Minha mãe fazia chá com folhas de marmeleiro
Para menino que adoecia de bucho inchado.
Havia uma pedra de corisco que minha mãe usava para pisar pimenta e alho.
Para espantar os mosquitos queimava-se bosta de vaca.
Menino com tosse curava-se com banha de galinha quente.
Quando eu viajo para a cidade onde eu nasci,
Eu não viajo para um lugar.
Eu viajo no tempo e vejo tudo de novo.
Vida e Morte
Não se escuta som de tiro,
Não existem aviões no céu.
Olhando assim, sem cuidado,
A vida é quase normal.
Os raios de sol aquecem,
A chuva fina refresca,
No entanto, olhando direito,
Vê-se um peso que aniquila.
Pedra engasgada no peito,
Ponte que não aproxima,
Tristeza que invade a alma.
É uma dor que não tem fim.
A dor é a falta de amor,
A morte é falta de amor.
Visão
O que eu posso fazer é ver.
Então, eu vejo.
Eu vejo os pássaros que voam,
Eu vejo as flores que cantam como se fossem pássaros,
Eu vejo o homem que passa.
Eu vejo a nuvem, o céu, o sol e os soldados
Que me fazem lembrar que o tempo é de guerra.
Eu vejo o infinito que se coloca no fim dos meus olhos.
Eu também posso sentir.
Sinto que algumas vontades passam por mim.
São vontades íntimas, pequenas angústias.
Como sentir o cheiro de lama do manguezal ao lado,
Sentir carícias de seios nas minhas costas cansadas.
Também sinto vontades universais.
Levar cobertor para os que tremem de frio,
Levar a minha voz para as bocas emudecidas,
Levar a minha respiração para os sufocados do mundo.
Sentir é o que posso fazer, então eu sinto.
Porém, sei que tudo isso não é suficiente.
Ainda há um espaço vazio no meu coração.
Então, faço poesia.
Não faço poesia, porque estou triste,
Também não é por ser alegre que decido cantar.
Quando faço poesia não acumulo eternidades em mim.
Vejo apenas brilhos azuis que