Cláusula Arbitral nos Contratos de Adesão: Contratos de Adesão de Consumo – Contratos de Adesão Civis – Contratos de Adesão Empresariais
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Cláusula Arbitral nos Contratos de Adesão - Thiago Rodovalho
Cláusula Arbitral
nos Contratos de Adesão
CONTRATOS DE ADESÃO DE CONSUMO – CONTRATOS DE ADESÃO CIVIS – CONTRATOS DE ADESÃO EMPRESARIAIS
2016
Thiago Rodovalho
logoalmedinaCLÁUSULA ARBITRAL NOS CONTRATOS DE ADESÃO:
CONTRATOS DE ADESÃO DE CONSUMO, CONTRATOS
DE ADESÃO CIVIS, CONTRATOS DE ADESÃO EMPRESARIAIS
© Almedina, 2016
AUTOR: Thiago Rodovalho
DIAGRAMAÇÃO: Almedina
DESIGN DE CAPA: FBA
ISBN: 978-858-49-3112-5
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Santos, Thiago Rodovalho dos
Cláusula arbitral nos contratos de adesão: contratos de adesão de consumo, contratos de adesão civis, contratos de adesão empresariais / Thiago Rodovalho dos Santos. -- São Paulo: Almedina, 2016.
Bibliografia.
ISBN 978-858-49-3112-5
1. Cláusula arbitral 2. Contratos de adesão 3. Contratos de consumo 4. Hipossuficiência 5. Relações empresariais 6. Vulnerabilidade I. Título.
16-00194 CDU-347.44
Índices para catálogo sistemático:
1. Cláusula arbitral em contratos de adesão
empresariais: Direito 347.44
Este livro segue as regras do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (1990).
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro, protegido por copyright, pode ser reproduzida, armazenada ou transmitida de alguma forma ou por algum meio, seja eletrônico ou mecânico, inclusive fotocópia, gravação ou qualquer sistema de armazenagem de informações, sem a permissão expressa e por escrito da editora.
Fevereiro, 2016
EDITORA: Almedina Brasil
Rua José Maria Lisboa, 860, Conj.131 e 132, Jardim Paulista | 01423-001 São Paulo | Brasil
editora@almedina.com.br
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"A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade [...] Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real".
(Rui BARBOSA. Oração aos moços, 3.ª ed., Rio de Janeiro: Organização Simões, 1949, p. 31).
"Os conceitos, categorias e institutos só fazem sentido se visarem à decidibilidade dos conflitos. Inovar por inovar não contribui para esse objetivo nem desenvolve a ciência. Tampouco é produtiva a tendência de tantos em subsumir problemas novos nas categorias já assentadas, elevando-se o grau de abstração e generalidade".
(Paulo Luiz Neto LôBO. Condições gerais dos contratos e cláusulas abusivas, São Paulo: Saraiva, 1991, p. 3).
À minha esposa PATRÍCIA e ao pequeno LUCA, significado maior de nossa existência e de nosso amor.
AGRADECIMENTOS
A DEUS, por ter me permitido chegar até aqui.
Agradeço, do fundo do meu coração e com minha eterna gratidão, a orientação e o incentivo que recebi do muito estimado Professor FRANCISCO JOSÉ CAHALI, jurista brilhante e pessoa de caráter ímpar, a quem muito devo. Sem seu inestimável apoio, a conclusão dessa tese certamente não teria sido possível. Nossa amizade e parceria acadêmica são motivos de muita honra para mim.
Agradeço, ainda, de modo especial, ao Professor FABIO NUSDEO, jurista notável e verdadeiro gentleman, com quem sempre aprendo e por quem nutro especial admiração e carinho.
À PATRÍCIA, minha eterna companheira, e ao nosso tão amado Luca, o anjo que transformou o nosso mundo.
Ao meu querido pai, JOSÉ LUIZ PAZELLI DOS SANTOS (in memoriam), sempre.
À minha mãe, MARIA CLARA, aos meus irmãos, SOPHIA e LUIZ ALBERTO, aos meus sogros, DONIZETH e GÊ, e aos meus cunhados, RAFAEL e ULISSES.
A todos os meus familiares, em especial, às minhas avós MARIA DE LOURDES e MARIA LUÍZA (in memoriam), aos meus tios CRISTINA e EDUARDO, e aos meus tios GERALDO e ALZIRA.
A todos meus amigos e colegas de docência na PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS (PUC|CAMPINAS), agradecimento que faço na pessoa do estimado amigo e Diretor da Faculdade de Direito, Professor PETER PANUTTO.
Aos amigos e colegas de IASP – Instituto dos Advogados de São Paulo, na pessoa de seu Presidente, Dr. JOSÉ HORÁCIO HALFELD REZENDE RIBEIRO.
Às amizades que a vida acadêmica tem me proporcionado, em especial, GERALDO VILAÇA NETTO, FABIANA DOMINGUES CARDOSO, EDSON BONFIM SOARES, LEANDRO TRIPODI, JOSÉ LUIZ DE ALMEIDA SIMÃO, JUAN CARLOS PANEZ SOLÓRZANO, ROGER VIDAL RAMOS, CESAR MORENO, EDUARDO SILVA DA SILVA, FABIANO MENKE, MARCEL SIMÕES, DIOGO MACHADO DE MELO, ALEXANDRE FREIRE, ALONSO FREIRE, ANDRÉ ROQUE, BENTO DUARTE, FERNANDO GAJARDONI, LUIS SIMARDI, LUIZ DELLORE, MARCELO PACHECO MACHADO, RENATO MONTANS, RICARDO MAFFEIS, RODRIGO DA CUNHA LIMA FREIRE, ZULMAR DUARTE, VITOR FONSECA, TICIANO ALVES, PAULO NASSER, ANA MARCATO, MARIA HELENA CAMPOS DE CARVALHO, WALTER POLIDO, LUCAS MOCHI, MARCELO FONSECA SANTOS, MARCELO BARBOSA, DANIEL BUSHATSKI, ALEXANDRE JAMAL BATISTA e THOMAS GEORGE MACRANDER.
Aos amigos de MPI: Professor JAN PETER SCHMIDT, MINISTRO SIDNEI BENETI, ANA CAROLINA BENETI, DANIEL BUCAR, DANIELE TEIXEIRA, GABRIELA HECKLER, GLORIA PRADO e LUÍS ANDRÉ DE MOURA AZEVEDO.
A todos os meus amigos, em especial, LUCIANO CARTELA, LUCAS COSTA, MARCOS FONTAINHA, THIAGO COLUCCI, KLEBER GRAF, CÉSAR ALCKMIN JACOB, FERNANDO RODRIGUES PINTO, RODOLFO LENCI, MELFORD VAUGHN NETO, MARTA FREIRE, GUILHERME MOURA, ANDRÉ e ANDIRÁ BONINI, LEONARDO GRECCO, ALEXANDRE GINDLER DE OLIVEIRA, MARCO AURÉLIO COSTA JUNIOR, MARCO ANTONIO FEITOSA, BRUNO ARCARO, CLAUDIO FERREIRA DI MARCO, MARCELO GUARITÁ, VANESSA PANCIONI, LYGIA YOSHIKAWA, RENATA GODOY, MARA IGLESIAS, DARTHAGNAN e QUEZIA FARINA, GUSTAVO DIEAMANT, GABRIELA SASSI, ANTONIO SIMONI, DIMAS MALUF, DIMAS HILÁRIO, VAGNER DEZUANI, CARLOS EDUARDO SANCHEZ, SILVIO DE SOUZA GARRIDO JR., FRANCISCO FOCACCIA NETO e RAFAEL PALMA.
Aos meus antigos amigos e colegas do escritório BASILIO ADVOGADOS, em especial, no Rio de Janeiro, nas pessoas de ANA TEREZA BASILIO, JOÃO AUGUSTO BASILIO, BRUNO DI MARINO e MARCIO NOTINI, e, em São Paulo, na pessoa do amigo VAGNER DEZUANI, pelo apoio e compreensão nos momentos de ausência.
Agradeço à Professora CLÁUDIA ELISABETE SCHWERZ CAHALI, pelo auxílio na jurisprudência nacional, e aos caríssimos QUINN SMITH e MAURICIO GOMM, pelo auxílio sobre o tema no direito estadunidense.
Aos Professores ERIK FREDERICO GRAMSTRUP e OSWALDO PEREGRINA RODRIGUES, pelas críticas e sugestões feitas na banca de qualificação, imprescindíveis para o aprimoramento deste trabalho.
Aos PROFESSORES ERIK FREDERICO GRAMSTRUP, OSWALDO PEREGRINA RODRIGUES, FERNANDA ROCHA LOURENÇO LEVY e DANIEL BLIKSTEIN, que muito me honraram aceitando o convite para integrar minha banca examinadora.
And last, but not least, a todos os Professores que, cada um à sua maneira, na graduação, mestrado e doutorado, influenciaram e marcaram minha trajetória acadêmica: JOSÉ MANOEL DE ARRUDA ALVIM NETTO, RENAN LOTUFO, TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JÚNIOR, FRANCISCO JOSÉ CAHALI (uma vez mais), GIOVANNI ETTORE NANNI, NELSON NERY JUNIOR, ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, PAULO DE TARSO BARBOSA DUARTE, JAMIL MIGUEL, MARCOS DESTEFFENI, EVERALDO CAMBLER, GABRIEL BENEDITO ISSAAC CHALITA, MÁRCIA ALVIM, REGINA VERA VILLAS BOAS e CARLOS EDUARDO DE ABREU BOUCAULT.
APRESENTAÇÃO
A obra Cláusula arbitral em contratos de adesão, de autoria de Thiago Rodovalho, que tenho a honra de apresentar ao público, representa relevante inovação no cenário jurídico, fruto de sua tese de doutoramento obtido perante a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), orientado pelo Professor Doutor Francisco José Cahali.
Conheci Thiago Rodovalho no primeiro semestre do ano de 2008, cursando as aulas ministradas pelo Professor Renan Lotufo – naquele que foi o último semestre em que tive a honra de atuar como assistente do estimado Professor no curso de mestrado –, quando o autor, jovem interiorano de Limeira, Estado de São Paulo, iniciava sua brilhante trajetória acadêmica.
Desde então pude acompanhar o seu empenho, evidenciado pela publicação do livro Abuso de direito e direitos subjetivos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, assim como de vários outros importantes textos, revelando uma vasta e qualificada produção bibliográfica.
Hoje é Professor Doutor da PUC-Campinas, tendo realizado estágio pós-doutoral perante o Max-Planck-Institut für ausländisches und internationales Privatrecht, além de sua atuação em arbitragem, em que é listado como árbitro em várias instituições.
O trabalho aborda um tema de grande importância, a despeito de ser pouco analisado pela doutrina pátria. Os contratos de adesão são celebrados em larga escala, mas a inserção da cláusula compromissória em tais pactos ainda é assunto comumente olvidado.
Na realidade, o estudo da cláusula arbitral é geralmente ligado aos negócios empresariais, em que predomina o contrato negociado, paritário, alheio à figura em que sucede a adesão a cláusulas formuladas antecipadamente por uma das partes.
Quando assim não ocorre, examina-se a matéria com enfoque nas relações de consumo, sob o manto do Código de Defesa do Consumidor, remanescendo em segundo plano a conjugação entre cláusula compromissória e contrato de adesão em relações empresariais.
Justamente para suprimir tal lacuna na doutrina brasileira é que surge a obra de Thiago Rodovalho.
A análise primordial do trabalho é centrada nos contratos de adesão empresariais, que certamente é o âmbito – referindo-se aos contratos de adesão – em que a cláusula compromissória encontra melhor emprego.
O trabalho é permeado de qualidades do início ao fim, perpassando o viés do ineditismo.
Não se limita a enfrentar o tema sob a vertente da arbitragem, eis que apresenta proeminente releitura do Direito Civil, notadamente ao versar sobre o contrato de adesão sob a perspectiva de sua função social.
Por fim, discorre acerca da necessária presunção de simetria nas relações negociais entre empresários, propondo inovadora interpretação da regra protetiva contida no parágrafo 2º, do artigo 4º da Lei nº 9.307/1996, a Lei de Arbitragem brasileira.
A Editora Almedina Brasil, assim como o autor merecem aplausos pela valiosa contribuição doutrinária, que muito enriquece a cultura jurídica na matéria.
GIOVANNI ETTORE NANNI
Mestre e Doutor em Direito Civil pela PUC/SP
Professor de Direito Civil nos Cursos de Graduação
e de Pós-Graduação Stricto Sensu na PUC/SP
Presidente do Instituto de Direito Privado – IDiP
Vice-Presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem – CBAr
Advogado em São Paulo
PREFÁCIO
Ampliando seu já respeitado acervo de obras entre livros, exclusivos ou em coautoria, artigos ou capítulos, em mais uma produção, o Professor Thiago Rodovalho apresenta seus alentados conhecimentos à comunidade jurídica.
Desta vez, sem dúvida, com um sabor especial, pois Cláusula arbitral em contratos de adesão foi o tema objeto de seus dedicados estudos acadêmicos que levaram o Autor ao júbilo de merecer o título de Doutor pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP, obtendo a nota máxima após o exame por exigente e qualificada Banca formada pelos Professores Erik Frederico Gramstrup, Oswaldo Peregrina Rodrigues, Fernanda Rocha Lourenço Levy e Daniel Blikstein, e que integrei na qualidade de orientador.
Tive a satisfação e honra pela oportunidade de acompanhar esta etapa gloriosa de sua profícua trajetória acadêmica como orientador, e assim, recebi o privilégio de, por primeiro, conhecer e reconhecer os talento méritos de seu trabalho agora oferecido a público.
A obra traz os conceitos e aspectos relevantes tanto do contrato de adesão como da arbitragem, para, em base sólida, enfrentar as intrincadas e complexas questões jurídicas na intersecção destes dois temas – contrato de adesão e arbitragem. Nesta linha, trata o Autor, com sabedoria, das relevantes polêmicas a respeito do tema, com análise crítica tanto da doutrina como da escassa jurisprudência a respeito. E não se furta a enfrentar casos emblemáticos (o Caso Jirau, p. ex.), e o caloroso e inflamado debate a respeito de temas como o contrato de adesão empresarial, função social do contrato de adesão e, claro, a cláusula arbitral inserida nesses contratos.
Ainda visita, com qualidade o direito estrangeiro (o sistema estadunidense, p.ex.), as inovações legislativas, e chega a apresentar proposta legislativa para adequação do sistema.
Quanto ao autor, sua prodigiosa capacidade intelectual, agora retratada na tese, foi percebida quando de nossa convivência na academia, razão pela qual, inclusive, nos aproximamos em diversas parcerias e projetos comuns, tanto editoriais como acadêmicos e profissionais.
E a crescente admiração pessoal, a cada instante renovada pela ilibada postura do amigo diante das situações que se apresentam, temperam estas singelas palavras com a alegria de ver o caminho tão bem trilhado.
Thiago, é um privilégio poder apadrinhar esta sua criação, a merecer, sem dúvida, local de destaque no cenário jurídico.
FRANCISCO CAHALI
Mestre e Doutor pela PUC-SP onde leciona na
graduação e pós-graduação, em especial na disciplina de arbitragem e mediação.
Professor Convidado da USAL – Universidade de Salamanca,
para período de investigação como pós-doutorado em Arbitragem.
Vice-Presidente da Comissão de Mediação e Arbitragem da OAB-DF.
Membro das Comissões de Direito Civile de Arbitragem e Mediação da OAB-SP.
Líder do Grupo de Pesquisa em Arbitragem
junto à PUC-SP.
Advogado e Consultor Jurídico.
ABREVIATURAS
AGBG – Gesetz zur Regelung des Rechts der Allgemeinen Geschäftsbedingungen (Lei de Cláusulas Contratuais Gerais da Alemanha)
AgReg – Agravo Regimental
Ag – Agravo
AI – Agravo de Instrumento
ApCív – Apelação Cível
art. – artigo
arts. – artigos
Câm. – Câmara
BGB – Bürgerliches Gesetzbuch (Código Civil alemão)
Cap. – Capítulo
CC – Código Civil brasileiro (Lei nº 10.406/2002)
CC/1916 – Código Civil brasileiro de 1916 (Lei nº 3.071/1916)
CCI – Câmara de Comércio Internacional
CDC – Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990)
CF – Constituição Federal brasileira de 1988
CC fr. – Código Civil francês
CC ita. – Código Civil italiano
cfr. – confira ou conferir
CLT – Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-lei nº 5.452/1943)
coment. – comentário
coments. – comentários
Coord. – Coordenação ou Coordenador (a)
Coords. – Coordenadores
Des. – Desembargador (a)
DJ – Diário da Justiça
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069/1990)
ed. – edição
et seq. – et sequentes ou et sequentia
inc. – inciso
incs. – incisos
j. – julgado
L. – Lei
LArb – Lei de Arbitragem brasileira (Lei nº 9.307/1996)
LCCG port. – Lei sobre Cláusulas Contratuais Gerais
LCGC es – Ley sobre Condiciones Generales de la Contratación
Min. – Ministro (a)
m.v. – maioria de votos
n. – número
Org. – Organização ou Organizador (a)
Orgs. – Organizadores
p. – página
pp. – páginas
par. – parágrafo
p. ex. – por exemplo
Priv. – Privado
RE – Recuso Extraordinário
reimp. – reimpressão
rel. – relator
REsp – Recurso Especial
STF – Supremo Tribunal Federal
STJ – Superior Tribunal de Justiça
t. – Tomo
T. – Turma
TJSP – Tribunal de Justiça de São Paulo
ún. – único
v. – ver ou vide
vs. – versus
vol. – volume
v.g. – verbi gratia
v.u. – votação unânime
ZPO – Zivilprozessordnung (Código de Processo Civil alemão)
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
1. O CONTRATO DE ADESÃO
1.1. Revolução Industrial, Sociedade de Massas e o Surgimento do Contrato de Adesão
1.2. A Transformação e Revisão do Conceito de Contrato
1.3. A Transformação do Contrato e o Contrato de Adesão
1.4. A Face Perversa do Contrato de Adesão. Os Abusos Inicialmente Perpetrados
1.5. A Outra Face da Mesma Moeda. A Função Social do Contrato de Adesão
1.6. O Contrato de Adesão e os Contratos de Consumo
1.7. O Contrato de Adesão e a Parte Vulnerável
1.8. Empresários devem ser tratados como Empresários
1.9. Quando deve haver Intervenção Judicial
1.9.1. As Hipóteses previstas no Código de Defesa do Consumidor
1.9.2. Quando houver Hipossuficiência e a Cláusula gerar Desequilíbrio Significativo
1.9.3. Independentemente de Vulnerabilidade ou Hipossuficiência: quando a Cláusula Contratual se Traduzir em Vantagem Manifestamente Intolerável
1.9.4. A Proteção do Código Civil: regras de Interpretação e Cláusula Geral de Nulidade ou Abusividade
2. A LEI DE ARBITRAGEM BRASILEIRA E A FUNÇÃO SOCIAL DA CIÊNCIA DO DIREITO
2.1. O Parágrafo 2º do Artigo 4º da Lei de Arbitragem Brasileira e sua Ratio Essendi
2.2. Os Contratos Internacionais Estandardizados e a Compreensão do Parágrafo 2º do Artigo 4º da Lei de Arbitragem Brasileira em Conjunto com a Lex Mercatoria (os Usos e Costumes Empresariais) e com a Boa-Fé que deve Pautar o Intercâmbio Comercial
2.3. O Direito Estrangeiro – O Sistema Estadunidense
2.4. A Vetada Tentativa de Alteração do Art. 4º § 2º da LArb através do Projeto de Reforma da Lei de Arbitragem
2.5. Uma Proposta De Lege Ferenda
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
INTRODUÇÃO
¹
No atual contexto econômico-social, a formação dos contratos se dá de forma muito mais célere e menos formal, inclusive com relação à pactuação de cláusula arbitral.
Não obstante isso, a Lei de Arbitragem brasileira, em seu artigo 4º, dispõe que:
"Art. 4º A cláusula compromissória é a convenção através da qual as partes em um contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios que possam vir a surgir, relativamente a tal contrato.
§ 1º A cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar inserta no próprio contrato ou em documento apartado que a ele se refira .
§ 2º Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula" (destacamos).²
Interessa-nos examinar mais detidamente o quanto disposto no citado parágrafo 2º do artigo 4º, que determina que, em contratos de adesão, a cláusula arbitral somente terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa clausula.
Assim, temos por escopo enfrentar e discutir a questão relativa à compreensão do parágrafo 2º do artigo 4º da Lei de Arbitragem brasileira e suas repercussões na prática.
A esse propósito, recentemente, em um rumoroso caso, envolvendo, de um lado, Energia Sustentável do Brasil S/A [Sociedade de Propósito Específico – SPE composta por GDF Suez (40%), Eletrosul (20%), Chesf (20%) e Mizha Participações S/A (20%)],³ Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A, e Enesa Engenharia S/A, e, de outro, Sul América Companhia Nacional de Seguros S/A, Mapfre Seguros S/A, Allianz Seguros S/A, Companhia de Seguros Aliança do Brasil S/A, Itaú-Unibanco Seguros Corporativos S/A, e Zurich Brasil Seguros S/A (doravante denominado simplesmente Caso Jirau
), entre outras questões jurídicas, esse tema foi abordado.
O julgamento dizia respeito a vultoso contrato de seguro e resseguro envolvendo complexa obra de engenharia (uma usina hidrelétrica), no qual havia partes nacionais e partes estrangeiras.
Nesse contexto, o orçamento original da obra era estimado em 8,7 bilhões de reais, sendo que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES aprovou, em fevereiro de 2009, um financiamento de 7,2 bilhões de reais para essa obra, o que representou na época o maior valor da história do banco para o financiamento de um único projeto. Deste modo, o BNDES foi o maior financiador da obra, combinando financiamento direto com repasses através de outras instituições financeiras, quais sejam: Banco do Brasil, Banco do Nordeste, Caixa Econômica Federal, Banco Bradesco e Banco Itaú-Unibanco.⁴
Em caso de controvérsia entre as partes, havia cláusula arbitral elegendo Londres como sede, e devendo ser conduzida de acordo com as regras da The Insurance and Reinsurance Arbitration Society – ARIAS/UK.⁵
Não obstante isso, quando a controvérsia efetivamente surgiu entre as partes, as construtoras-seguradas insurgiram-se contra a cláusula arbitral, impugnando-a.
Entre outros argumentos, alegaram que a referida cláusula violava a Lei de Arbitragem brasileira, especificamente o parágrafo 2º do artigo 4º, ao argumento de que se trataria de contrato de adesão e que a cláusula não estaria em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para ela.
Ao analisar a questão, o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO – TJSP,⁶/⁷ por maioria de votos, deu provimento ao recurso interposto pelas construtoras-seguradas, afastando a obrigatoriedade da cláusula arbitral, sob o fundamento, entre outros, de que ela efetivamente violaria o aludido parágrafo 2º do artigo 4º da Lei de Arbitragem brasileira.
Afora as especificidades do caso concreto, o fato é que esse dispositivo da lei brasileira de arbitragem tem suscitado conflitos acerca da validade da cláusula arbitral, mesmo em contratos complexos e celebrados entre grandes empresas.
A maior discussão nesse caso e em outros assemelhados, especialmente os envolvendo seguradoras (esse caso é o mais rumoroso, mas não o único), diz respeito à própria cláusula arbitral.
Tem havido uma leitura de que se trata de contrato de adesão e que, portanto, a lei brasileira exigiria negrito, cláusula destacada e assinatura específica.
O problema é que muitas vezes no país de origem, onde esses contratos costumam ser celebrados, em regra não há essa exigência da lei brasileira, sendo suficiente a assinatura do contrato onde a cláusula arbitral está inserta.
Deste modo, especialmente em contratos internacionais ou que envolvam partes estrangeiras, esses conflitos têm ocorrido mais frequentemente, haja vista a inexistência de exigência similar em boa parte dos demais países.⁸
Além disso, a velocidade do tráfego contratual moderno nem sempre se compatibiliza com a exigência formal de confecção da cláusula arbitral por escrito, em negrito e com a assinatura ou visto especialmente para ela.⁹ Importante lembrar, a esse respeito, que nossa LArb, modernamente, é flexível na celebração da cláusula arbitral (à exceção do contrato de adesão, em que é «excessivamente restritiva»), não exigindo sequer a assinatura como formalidade para sua validade,¹⁰ admitindo-se, inclusive, manifestação de vontade tácita, conforme o comportamento concludente das partes.¹¹
Assim sendo, a modernidade e complexidade das relações contratuais (especialmente as de vulto expressivo e celebradas entre partes de grande porte)¹² impõem uma releitura do dispositivo legal, a fim de adequá-lo à realidade do cotidiano e prestigiar a boa-fé nas relações comerciais, especialmente as internacionais ou que envolvam partes estrangeiras, evitando desnecessários conflitos acerca da validade da cláusula compromissória, frutos de um excessivo formalismo.¹³
Portanto, o problema que se coloca é o seguinte: qual a « razão de ser» do parágrafo 2º do artigo 4º da Lei de Arbitragem brasileira? Ele se aplica indistintamente às relações comerciais complexas e de grande porte?
As discussões centram-se, pois:
(i) na compreensão da natureza jurídica desses contratos de adesão «empresariais»; e
(ii) se mesmo assim a proteção ao aderente prevista na LArb 4º § 2º se aplicaria também a contratos complexos, envolvendo grandes players que se assessoraram juridicamente.
Sendo que os debates jurídicos a respeito do tema não se resumem ao denominado Caso Jirau. Ao contrário, ele foi citado apenas pelo fato de tratar-se de caso rumoroso.
Contudo, as discussões sobre a validade de cláusula arbitral têm ocorrido em outros complexos, não se limitando a contratos de seguro e resseguro.
Mais do que isso, não se limitam a questões securitárias, há outros negócios jurídicos nacionais e internacionais igualmente complexos que, em razão de contrato estandardizado (contratos de franquia, v.g.), também suscitam controvérsia acerca da validade da cláusula arbitral.¹⁴
Esses fatos por si sós justificam a necessidade de maior estudo sobre o tema, a fim de encontrar interpretação que não nulifique o dispositivo legal, que tem sua razão de ser, mas que, ao mesmo