Angola Cinco Séculos de Guerra Econômica: [Angola Cinco Séculos de Guerra Económica]
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Sobre este e-book
Este livro é o primeiro no projeto de estudo sobre Guerras Econômicas, conduzido pelo autor.
O segundo focará o Brasil perante efeitos do mesmo problema no século XXI. A escolha dos dois países decorre da ligação entre ambos na criação de economias sob várias formas de violência, como aliás fica patente no presente texto.
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Angola Cinco Séculos de Guerra Econômica - Jonuel Gonçalves
Este livro é o primeiro no projeto de estudo sobre Guerras Económicas, conduzido pelo autor.
O segundo focará o Brasil perante efeitos do mesmo problema no século XXI. A escolha dos dois países decorre da ligação entre ambos na criação de economias sob várias formas de violência, como aliás fica patente no presente texto.
Título
ANGOLA CINCO SÉCULOS DE GUERRA ECONÔMICA
Autor
Jonuel Gonçalves
Edição Digital
2024
Copyright 2024:
Jonuel Gonçalves | Perfil Criativo - EDIÇÕES
ISBN
978-989-35368-2-7
DIRECÇÃO e design
João Ricardo Rodrigues
SECRETARIADO
Luísa Graça
LOJA ON-LINE
www.AUTORES.club | info@autores.club
EDITOR
PERFIL CRIATIVO - EDIÇÕES
Avenida Rio de Janeiro, nº 27 C
1700-336 Lisboa - UE-Portugal
Tel: (+351) 214.001.788 | info@autores.club
www.AUTORES.club
Capítulo I
INTRODUÇÃO
Este trabalho é consequência do livro publicado em 2011 sob o título A Economia ao Longo da História de Angola
, voltado para o factual e cronológico, com base nos elementos econômicos de grande porte, mencionados em textos de História ou pesquisados em estatísticas oficiais. O aprofundamento da pesquisa, entre 2016 e 2022, revelou a existência de uma constante guerra econômica, o que alterou as intenções iniciais de segunda edição no mesmo estilo factual-cronológico da economia angolana, para a perspectiva de uma economia sob várias formas de assalto aos seus recursos naturais, financeiros e humanos, onde nenhum poder se empenhou na construção do desenvolvimento. Grande parte dos parágrafos factuais da edição de 2011, mantem-se até essa data, acrescentando-lhe correções em muitas passagens, novos dados relativos ao período 2012/2022 e um foco específico.
Assim, em vez de segunda edição revista e aumentada surge um novo livro.
Em virtude da constante insegurança vivida pessoalmente desde a década de 1960 até meados da de 1990, muitas anotações e recolha de dados perderam-se ou tiveram de ser eliminadas, pois representavam risco suplementar em eventuais buscas policiais contra atividades de resistência. Esta insegurança atingia toda a sociedade em presença de regimes ditatoriais. Era muito perigoso – e risco desnecessário para o desenrolar dessas atividades - fazer arquivos documentais em discordância com tais regimes que limitavam ou manipulavam a publicação oficial de estatísticas. Assim, sempre que me ocorram elementos em tal situação com grande importância, farei citação de memória. Serão referidos como Observações e Vivências Pessoais (OVP). Outros colegas passaram pelos mesmos constrangimentos, tornando as OVP fonte de informação e reflexão de grande valor.
Estarão neste caso situações vividas, alguns elementos recolhidos que puderam ser conservados, comportamentos e orientações verificadas, conversas informais com atores de primeiro ou segundo plano na vida política e econômica, de 1960 até perto do ano 2000, ou pessoas sem essas funções mas possuidoras de dados relevantes sobre aquelas quase quatro décadas ou ainda com vivência anterior, testemunhas do contexto desde início dos anos 1930.
Uma atitude social verificável em toda a História de Angola consiste na crítica clandestina constante. Revela alto nível de consciência expressa por via oral ou escrita, de forma organizada ou espontânea, às vezes dissimulada em obras literárias, devido à História de Angola ter decorrido sob regimes repressivos, salvo em escassos anos. Importante aqui pelo impacto mobilizador e papel na guerra de narrativas, companheira inseparável de qualquer tipo de guerra – pode até fazer a diferença entre vencedor e vencido – usaremos a sigla provisória de 3C para facilitar referências.
A bibliografia tem função capital neste livro que combina estudo econômico com estudo estratégico. Trabalhos de diversos autores, mesmo fora destas duas disciplinas, terão aqui importância acrescida porque o livro é concebido também como diálogo com o que se escreveu e expôs relacionado ao tema, a meu conhecimento. Diálogo crítico acompanhado de interpretações pelas quais sou o único responsável.
As datas dos livros citados serão relativas às edições consultadas. Vários elementos sobre a história da implantação em Angola de produtos como café, milho e mandioca, têm a oralidade como base, mesmo tendo sido, em alguns casos, referidos em livros que também mencionaremos.
Para momentos dos séculos XIX, XX e XXI, o recurso à mídia é indispensável por ser a única fonte documental existente. Nesses casos os dados completos sobre citações figurarão no próprio texto.
O texto é, naturalmente, redigido segundo as normas do Acordo Ortográfico de 1990, porém, citações de trabalhos anteriores a esse acordo respeitarão a ortografia das épocas de publicação.
Na vertente íngreme dos conceitos
Não há nenhuma definição aceite por unanimidade, sobre guerra econômica, nos meios universitários, políticos, empresariais ou militares. Como também não há nenhuma definição consensual sobre guerra ou conflito. No entanto, tem avançado, em função de acontecimentos deste século XXI, uma noção adotada por Ali Laidi que coincide com a análise deste livro, inclusive porque dá um exemplo diretamente ligado ao ambiente em que ela decorre. Por isso, vale citar por extenso:
A guerra econômica é a utilização de violências, imposições e meios desleais ou ilegais, para proteger ou conquistar um mercado, ganhar ou preservar uma posição dominante que permita controlar abusivamente um mercado. A guerra econômica é exercida em tempos de guerra como em tempos de paz. É praticada pelos Estados, as empresas, as associações e mesmo os indivíduos (...) aplica-se tanto a produtos e serviços como a bens imateriais, por exemplo, o pensamento (guerra das ideias) ou a crenças (guerra de Igrejas)
. (Laidi:2020)
Neste ponto, sublinho que a expressão guerra das ideias
é, neste meu trabalho, parte da guerra de narrativas
, sendo a parte realmente construtiva nas narrativas quando se trate de ideias promotoras de liberdade, desenvolvimento e confiança nas relações humanas. Por outro lado, em vez de guerra das Igrejas
, prefiro guerra de religiões
, muito utilizada para mobilização político-militar ou obter preferência de produtos e marcas.
Gaston Bouthoul, pensador da guerra, define-a como a ‘luta armada e sangrenta entre agrupamentos organizados’ e enfatiza que o sangue ‘permite distinguir a guerra de outras formas de oposição ou competição, como a concorrência econômica’
(ibidem).
A este propósito, constato que a diferença entre dumping como concorrência (ilegal) e sua presença na guerra econômica, decorre de estar ou não ligada a agressividade política. No entanto, é certo que "para reunir as palavras guerra e economia num mesmo conceito, seria necessário correr sangue. Os numerosos exemplos históricos relatados nestas páginas mostram que em nome das trocas econômicas os homens têm efetivamente derramado sangue. No século XV, os Portugueses partiram à conquista de especiarias fazendo aquilo que eles próprios chamavam de ‘comércio na ponta da faca’! (à couteaux tirés, em francês) (ibidem).
Na sua citação-diálogo com Bouthol, Laidi refere a interrogação sobre a partir de que nível de pobreza um indivíduo ou um Estado entra em guerra econômica
. Este aspecto é central no caso angolano e em muitos casos semelhantes. Na minha abordagem, a interrogação é não só sobre os níveis de pobreza mas também sobre níveis e métodos de enriquecimento, a partir dos quais se pode falar em guerra econômica interna ou guerra interna sobre recursos financeiros públicos.
O colonialismo e a cleptocracia são dois regimes de guerra econômica permanente. Ambos visam a captura de recursos com base em posições de privilégio ou de força nos centros de poder, mantendo-se pela repressão. Angola teve três séculos da sua construção como território sob regime de captura de escravos. A sua construção como país independente tem sido marcada pela captura de recursos financeiros do Estado, tanto das reservas em moeda convertível, como em favoritismo estrutural no acesso a contratos públicos e comissões para concessão dos mesmos.
Na África do Sul popularizou-se o conceito de captura do Estado
– sem sabermos exatamente sua autoria, na medida em que emergiu, no que parece simultâneo, em meios políticos, jurídicos e Acadêmicos – significando entrada de interesses privados nos circuitos estatais e desvio destes em seu benefício. Em Angola, os previamente detentores do poder de Estado ou de poder militar na guerra pelo poder político, usaram essas posições e meios no sentido de conquistar recursos financeiros de forma ilegal e abusiva, fosse para enriquecimento pessoal ou de grupo. Posteriormente, lobbies estabeleceram vias de acesso a privilégios estatais ou em empresas estatais, porém, a captura do Estado tinha sido feita politicamente e, a junção dos componentes iniciais e posteriores, conduziu à criação – em termos de rendimentos e influências – de uma classe alta e escalão superior das classe médias, após passagem pela fase que no texto designaremos por classe-Estado
, conforme formulação de J.P. Bayard.
No caso das classes médias, o próprio plural indica desigualdades de rendimentos e, é importante acentuar, desigualdades na construção dos níveis que os seus segmentos conseguem alcançar. Ou seja, grande parte destes não participaram na captura de recursos financeiros públicos.
O texto não é sobre classes, camadas, segmentos ou grupos de rendimentos, mas é impossível não lhes fazer referência, ainda que breve.
O colonialismo e a cleptocracia, obviamente impedem desenvolvimento socio-econômico e mantêm subalternidades internas e externas. Neste sentido são as formas mais agressivas de guerra econômica, pois não se limitam a pressionar através de mecanismos de mercado ou de protecionismos, agridem e ocupam pela força, seja territórios seja poder dentro desses territórios.
Qualquer confronto, desde a política à economia, à cultura e ao desporto, é acompanhado de diferenças de foco ou opinião e relevância dos fatos. Em situações de disputas duras – eleições, decisões de arbitragem com influência nos resultados, conduta na condução da gestão pública ou privada, luta armada ou através de assalto a meios financeiros – o confronto de narrativas radicaliza-se. Porém, nem todas as narrativas são mentiras ou manipulação. O combate a estas duas posturas é, com frequência feito na base de valores e princípios, dando lugar a choque de ideias que tem movido o mundo. Portanto, em muitas guerras de narrativas há um lado justo. Em Angola, as campanhas de panfletagem contra o sistema colonial e as ditaduras ou abuso de bens sociais, bem como as campanhas mundiais contra as fake news, representam trabalho objetivando tomada de decisões bem informadas, coletivas ou individuais, e prevalecimento dos direitos inerentes à condição humana. São auto-defesa social.
A criação de colônias é uma prática tão antiga que se torna difícil localizar as origens. Porém, dois elementos base em todas elas são produto de guerra diretamente econômica ou transformada em ocupação para exploração econômica, incluindo captura de seres humanos para uso nas principais atividades econômicas dos colonizadores, durante séculos. Suas características principais têm fortes semelhanças desde essa antiguidade até à dissolução do último império colonial em 1975. Foi no quadro desse império que Angola se constituiu e foi em Angola que ele terminou. Nesse longo período, as colonizações foram sistematizadas à escala mundial, mostradas como prova de poder e seu desenvolvimento criou o regime colonialista, regime de guerra econômica permanente.
O regime pós colonial prosseguiu a guerra nessa frente em conexão com componentes políticos ligados à guerra fria, às lutas para remoção de regimes de dominação racial branca e estabeleceu espaço para guerra econômica interna, em favor de segmentos sociais do país com acesso aos grandes recursos nacionais. A guerra civil armada, foi também guerra civil econômica, nos dois casos tendo ligações a estruturas e centros de poder no exterior.
Nessas condições é duplamente importante abordar o perfil geral do regime colonial e do significado de pós colonial, antes de entrar no caso angolano.
Georges Balandier num texto famoso de 1951 reproduzido em 2001, descrevia a situação colonial como a expansão dos povos europeus (que) conduziu ao jugo – quando não à desaparição – de quase todos os povos ditos em atraso, arcaicos ou primitivos
e condiciona não apenas a reação dos povos ‘dependentes’ mas explica, ainda, certas reações de povos recentemente emancipados
.
O colonialismo moderno – escreveu Balandier – é construído sob regras estritas em matéria racial ou civilizacional, aplicadas politicamente e legalmente para impedir o Outro colonizado de obter a cidadania ou um estatuto igual ao dos representantes do colonizador
. (ibidem)
No mesmo texto ele assinala que poucos anos antes da data da sua publicação – ou seja no imediato pós segunda guerra mundial – uma estimativa aproximada apresentava cerca de um terço da superfície da terra sujeita a essa situação.
A questão colonial esteve sempre ligada à formação de impérios e contribuiu para a formulação das várias teorias do imperialismo.
A noção de império vem do romano imperium significando comando e potência, passando a implicar, em definições históricas mais recentes:
— dominação por um grupo racial ou nacional diferenciado em relação à maioria dos súbditos num território vasto, de preferência transcontinental;
— existência de poder central com meios políticos, militares e financeiros de envergadura em termos comparativos internacionais e presença direta nos territórios dominados.
Muitas vezes, esta soma de atributos não esteve reunida e mesmo assim, as designações de império, foram atribuídas. O caso mais recente foi Portugal, apresentado por Richard Hammond (:1975) como imperialismo não econômico no período 1815/1910 e que eu tenho tratado em aulas e textos como império dependente até final da primeira guerra mundial, em virtude da determinante britânica e, após cerca de duas décadas de transição, como império ultra-colonial (Anderson: 1966) para designar o prolongamento da situação colonial como a descrita por Balandier, após esta ter sido alterada pelos outros países colonialistas.
A noção de imperialismo não econômico é invalidada pelos constantes esforços dos regimes portugueses dessa época em dar conteúdo econômico às suas colônias, dificultados pelo próprio atraso econômico-financeiro português, porém, ao mesmo tempo imaginado como solução a esse atraso e única via de afirmar relevância internacional.
As noções de império dependente e ultra-colonialismo não são incompatíveis com a guerra econômica permanente. Pelo contrário, inserem o colonialismo português no contexto mundial de poder e levaram-no alguns anos para além dos limites temporais dos outros, sempre perseguindo o objetivo de rentabilização através da tirania.
A expressão imperialismo surgiu no final do século XIX, para designar a tirania no Segundo Império francês e na Rússia czarista (Th. Muret e Lord Clarendon citados por Steinmetz: 2010) mas rapidamente se aplicou ao expansionismo colonial, no sentido dos esforços desenvolvidos por um Estado para estender sua potência pela conquista de territórios
(Arthur Salz citado por Steinmetz: ibidem). Autores como Vladimir Ilich Lénine definiram-no como etapa de desenvolvimento do capitalismo, sem obrigatoriedade da posse direta de territórios, gerando críticas de Salz, para quem o imperialismo existe antes do capitalismo.
No começo do século XX surge a sub-divisão entre imperialismo antigo e moderno, considerando Steinmetz que esta segunda divisão corresponde ao que consideramos hoje como colonialismo
.
A queda do império português pôs fim aos impérios, entendidos como entidades inspiradas pelo modelo romano. Porém, com base nas teorias leninistas, alguns cientistas sociais mantiveram a designação de imperialismo para poderes sem impérios no sentido original, ou seja, os dois principais poderes da guerra fria – Estados Unidos e URSS – e, após a queda desta, ainda os Estados Unidos em companhia da China, da Rússia sucessora da URSS com poder renovado e da União Europeia. Este quadro de potências é também definido como multipolaridade, ou seja, a multipolaridade, nesta definição, teria base apenas nos polos dominantes.
Esta formulação parece considerar Império como a mais completa das situações internacionais de opressão, controle ou comando. Porém, permanece aberto o debate sobre se não se trataria de definição preguiçosa, na medida em que o mundo atual produz formas de dominação, por vezes até mais completas que em épocas anteriores, justificando desde já outra designação. Hegemonia define melhor essas novas formas.
Sub-divisão muito referida para a época colonial, dizia respeito ao perfil das colônias: de povoamento e de exploração, embora as colônias de povoamento tenham sido ao mesmo tempo de exploração também. Além disso, a definição de Marx sobre colónias de povoamento exigia que tivesse havido (quase) supressão de uma população e sua substituição por outra – casos em países das Américas ou na Austrália – mas deixava de fora o caso da África do Sul, colónia de povoamento onde não houve tal supressão.
O colonialismo português criou uma colónia de povoamento e exploração no Brasil, com base na emigração de seus setores populacionais mais pobres, tráfico de africanos e submissão ameríndia. Em geral os historiadores referem a existência de três impérios portugueses, consoante o continente, (o asiático, o africano e o brasileiro). Porém, a estreita interdependência colonial entre o Brasil e Angola indica existência, de final do século XVI ao começo do XIX, de um império Sul Atlântico.
Para além desta característica, a presença portuguesa na África tropical foi semelhante à das demais potências colonizadoras. Enclaves costeiros, muitas vezes em ilhas, até quase final do século XIX, inspirando em Frederic Mauro a designação de Portugal como criador de talassocracias
. Em seguida ocupação do interior, nos termos dos acordos europeus e numa situação em que a dependência do Reino Unido mais se manifestou, tanto nas pressões para encerrar a escravatura como para fixar fronteiras coloniais.
Até ao século XIX, pensadores do sistema colonial português em Angola resumiam-se a dois historiadores que viveram respectivamente nos séculos XVII e XVIII: António de Oliveira Cadornega e Elias Alexandre Corrêa da Silva, ambos oficiais do exército, o primeiro nascido na metrópole portuguesa e o segundo no Brasil. As informações históricas que fornecem são incontornáveis e, ao mesmo tempo, elaboraram bases de dados geográfico-naturais importantes. Por vezes comentam acontecimentos. Mas não há um teórico como foi o Padre António Vieira no Brasil, aliás, incidindo em Angola num período crucial: a recuperação portuguesa – com forças procedentes do Rio de Janeiro – após sete anos de presença holandesa, consequência de sua própria presença em parcelas do Brasil, com o mesmo objetivo estratégico do poder português: escravização e encaminhamento para o Brasil.
Sensivelmente a meio do século XIX, uma figura emergiu na governação colonial portuguesa, com várias funções ministeriais e formulações teóricas: visconde de Sá da Bandeira. Como governante inspirou a muito gradual extinção da escravatura, ganhou tempo para tal gradualismo nas negociações com Londres e defendeu a tese do império colonial como requisito para alguma relevância política de Portugal e fator de vantagens econômicas. Inspirou também tentativas de colónia de povoamento em Angola e de codificar o que mais tarde se chamaria trabalho indígena, no qual seria inserido o trabalho forçado, em vigor, com maiores ou menores efetivos, até à insurreição angolana de 1961. Sobre o povoamento, os esforços de Sá da Bandeira produziram resultados muito limitados. Embora Portugal fosse um país de emigrantes, o fluxo principal continuou a dirigir-se ao Brasil e não a África. A comunidade portuguesa no Brasil era importante a ponto de suas remessas em dinheiro assumirem valor estratégico no equilíbrio das contas de Portugal.
Em 1864 foi criado o primeiro banco para o conjunto da África sob dominação portuguesa, o Banco Nacional Ultramarino (BNU) – de certa forma uma consequência tardia de ideias de Sá da Bandeira – com funções de instrumento de crédito e banco emissor - mas a crise financeira permaneceu no espaço colonial português como dado de primeira grandeza nesse período, correspondente a economias baseadas num comércio entre negociantes europeus e africanos, de dimensões reduzidas e recorrendo largamente à troca direta.
O coronel Paiva Couceiro, comandante de forças de ocupação do Sul de Angola e mais tarde Governador-Geral, escreveu em relatório de 1907/1908 que a situação econômica de Angola estava como se os padrões de Diogo Cão (que chegou à foz do Congo em 1482) tivessem sido colocados ontem
. Nessa fase, as personalidades mais marcantes da política africana de Portugal tiveram funções de governantes das colónias, fosse com o título de Governador-Geral ou de Alto-Comissário. Em Angola, o nome mais citado é Norton de Matos, na linha da afirmação imperial de Sá da Bandeira, visando povoamento europeu como via de rentabilização e, ao mesmo tempo, solucionar o problema da extrema pobreza em Portugal.
Do ponto de vista do relacionamento racial, o sistema português conduziu-se dentro dos parâmetros enunciados por Georges Balandier para definir a situação colonial.
Richard Hammond (:1975) cita o Alto Comissário em Angola, Vicente Ferreira, sucessor e continuador de Norton