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As Aventuras De Pipa Vogel E O Canário Felix
As Aventuras De Pipa Vogel E O Canário Felix
As Aventuras De Pipa Vogel E O Canário Felix
E-book529 páginas7 horas

As Aventuras De Pipa Vogel E O Canário Felix

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Sobre este e-book

Pipa Vogel era uma garota alemã que teve de se mudar de Berlim recém-nascida, pois sua mãe faleceu após o parto. O pai da garota precisou ir morar com seus pais e irmãos, que haviam imigrado para o Brasil há muitos anos, para recomeçar a vida — era um plano do casal bem antes do evento fatídico. Todavia, sua filha cresceria bastante diferente dos demais parentes. Pipa se tornaria uma jovem inteligente, curiosa e destemida e, em um desses dias de aventura, conheceu um Canário Amarelo falante que tinha o poder de abrir portais interplanetários. Após ter tido bastante contato com a garota, o Canário decidiu levá-la para seu mundo chamado Famiz para ela conhecê-lo. Ele vivia em um império constituído apenas por aves enormes, de proporções humanas, e também falantes, e lá Pipa faria algumas descobertas que poderiam mudar o rumo daquela monarquia.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento2 de mai. de 2024
As Aventuras De Pipa Vogel E O Canário Felix

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    As Aventuras De Pipa Vogel E O Canário Felix - Moisés De Poetástro

    AS AVENTURAS DE PIPA VOGEL E O CANÁRIO FELIX

    Crônicas da Monarquia de ÓR

    POR

    Moisés de Poetastro

    (Jesse Olyvarbo ) Nova Candeias, Candeias – BA (71) 99712 9576 olyvarbo@ gmail.com

    Jesse Olyvarbo © 202 4

    Essa é a informação sobre os direitos autorais do romance.

    Capítulo 1

    Vamos começar esta crônica incrível de uma forma bem clichê?

    ERA UMA VEZ uma garota muito inteligente chamada Pipa Vogel, filha de Francisca e Antonin Vogel. De antemão digo que, para conhecerem sua história, suas aventuras, precisam conhecer a origem de Pipa e as conturbações da sua vida, que começaram antes do seu nascimento.

    A mãe dessa garota, a Francisca, era uma italiana que se mudou para Berlim aos 16 anos. Aos 20 anos conheceu Antonin, pai da sua filha, e com ele se casou.

    Será que está bom? Parece que precisam saber mais algumas coisas importantes sobre esse casal. Então vamos lá...

    Francisca era uma mulher alta, branca, tinha olhos castanho-claros e longos cabelos ondulados e caóticos —da mesma cor dos olhos. Era uma mulher elegante.

    Ela veio de uma família chamada Esposito que decidiu se mudar para a Alemanha no fim do ano de 1969, depois que mataram um policial chamado Antonio Annarumma numa manifestação da União dos Comunistas Italianos. A família previra que coisas más aconteceriam, e estava certa.

    Mal sabia essa família que a partir daquele ano a Itália passaria por um período sócio-político denominado Anos de Chumbo, marcado por uma onda de terrorismo. Sentiu-se aliviada ao saber que estava longe quando, anos mais tarde, receberam as notícias.

    Já o Antonin era magro, um pouco menor que Francisca, loiro e tinha olhos azuis. Ele veio de uma família bem-sucedida chamada Vogel, de Berlim. Possuía 22 anos quando conheceu Francisca e começaram a namorar. E casaram-se quando ele já tinha 29 anos. Ou seja, foram dois anos de namoro e mais cinco de noivado; e alguns meses de conúbio.

    Antes de a família de Antonin conhecê-la, havia se mudado para o Brasil, mas ele ficou na Alemanha porque tinha planos para ingressar numa faculdade, então passou a morar com seu tio solteiro, o Hans Köhler, irmão da sua mãe.

    Asua esposa fizera um pedido a ele na época: que quando tivessem o primeiro filho, o levassem ao Brasil para conhecer a família do pai.

    Antonin formou-se em Língua Alemã pela Universidade de Heidelberg e passou a lecionar por três anos em Berlim. Era um homem pacificador e a favor da democracia, o que atraiu o coração de Francisca que tinha os mesmos ideais políticos. Apaixonaram- se mutuamente um pelo outro .

    Era março de 1981, um mês chuvoso na Alemanha. Francisca estava grávida e sua bolsa havia estourado quando ela dormia no seu quarto. No entanto, algo subitamente preocupou o esposo.

    Não bastava Antonin não ter conseguido levar sua esposa a tempo para um hospital mais próximo, porque ela entrara em trabalho de parto instantaneamente. Teve que a deixar sozinha por uns instantes para chamar uma enfermeira que cuidava de uma idosa na casa vizinha, e também algumas parteiras.

    Poucos vizinhos aglomeraram-se na frente da residência do Tio Hans curiosos para saberem o que acontecia, mas não entraram porque o dono não permitiu. Tio Hans foi à casa da Família Esposito para lhe dar a grande notícia assim que a enfermeira chegara.

    Minutos de agonia se passaram e de repente Antonin não conseguia mais ouvir nenhum barulho, nem mais os gritos da sua mulher que havia dado à luz, menos ainda o choro do bebê, apenas a chuva que começou a cair lá fora.

    O pai de primeira viagem não aguentava mais de ansiedade. Enquanto não queria mover um músculo e ficar extremamente estático no seu lugar, também queria invadir o quarto e ver o que aconteceu. Não era possível que mais nenhum ruído vinha de lá de dentro. Mas assim que ele tomou coragem e deu o primeiro passo, a enfermeira abriu a porta do quarto e saiu para encontrá- lo.

    —E então, Sie Zimmermann —perguntou Antonin —, como estão minha mulher e meu filho?

    A enfermeira, chamada Magda Zimmermann, respirou fundo antes de responder a pergunta de Antonin. Ela não parecia nada contente.

    —Na verdade, Herr Vogel —respondeu a enfermeira —, não é um filho, é uma filha, uma linda menininha loira de olhos az uis...

    —Que maravilha! —comemorou o homem que mal ouviu a mulher descrever a recém- nascida.

    Ele sorriu e aplaudiu pela notícia. Apesar de estar empolgado com o nascimento da sua filha, logo Antonin teve que diminuir sua felicidade ao perceber pela expressão da enfermeira que nada ia bem com sua mulher.

    —Aneném parece saudável e curiosa —continuou a enfermeira, contudo, fez uma pausa dramática antes de falar sobre o estado da sua esposa. —Agora, sua mulher... Eu sinto muito, Herr Vogel. Ela não resistiu às complicações da gravidez.

    Magda torturava-se a cada palavra. Ela odiou ter que dar uma notícia daquelas. Francisca era uma mulher amada pela comunidade. Era altruísta, pensava no próximo. Todos a conheciam como uma mulher benigna e filantropa.

    O Sr. Vogel ficou pensativo por um momento.

    O som da chuva cessava gradualmente, mas era provável que fosse chover forte de novo. Aquele som ficaria para sempre na sua memória, pois o céu chorava, mas ele permanecia com o rosto seco. Não escorreu uma lágrima dos seus olhos, mesmo sentindo profunda tristeza .

    — Será que eu posso ver minha filha agora? — falou Antonin com a voz fraca, quase perdida.

    —É claro .

    Magna bateu na porta e em poucos segundos as duas parteiras que a ajudavam naquele momento saíram do quarto rapidamente. Não queriam que o Sr. Vogel visse o estado que ficou sua mulher na cama (completamente ensanguentada e inerte). Estavam acostumadas a ver a falta de vida num corpo humano. Era traumatizante.

    Uma das parteiras que segurava a bebê nos braços a entregou ao pai. Estava completamente enrolada num grande lençol branco. A bebezinha fazia alguns ruídos, mexia -

    se pouco, e quando o Sr. Antonin retirou uma parte do tecido do seu rosto, viu o quanto ela era linda como a mãe. Era muito parecida com ela, exceto os olhos que eram azuis e os cabelos que eram loiros, como os dele.

    — Já escolheu um nome para esta linda criança, Herr Vogel? — perguntou a parteira que lhe trouxera sua filha.

    — Sim — respondeu o homem a admirar a criança, que era exatamente como a parteira descrevera —, o nome dela será Pipa.

    —Um nome incomum para uma garota alemã —comentou a outra parteira, mas o Sr. Antonin encarou-a com os olhos sérios e um pouco avermelhados.

    —Talvez aqui, mas de onde minha esposa veio é bastante comum. Além disso, era o nome que ela queria colocar no bebê se fosse menina.

    A parteira ficou completamente envergonhada e logo retirou-se. Não teve a intenção de ser indelicada, mas entendia a reação do homem, pois ele acabara de perder sua esposa. Então, ambas as parteiras pediram licença e retiraram-se do local. Antonin as agradeceu pela ajuda.

    A enfermeira Magda Zimmermann ficou lá, assistindo ao homem ninar sua filha. Ele esperava pela família da recém-falecida esposa, o cadáver no seu quarto, chegar. Mas ele, ali sozinho, a preocupava, ainda mais naquele estado.

    —O senhor está bem, Herr Vogel? —perguntou ela com olhar de compaixão .

    — Estou, sim, obrigado por se importar — respondeu Antonin com a voz mais branda e equilibrada que pôde sustentar. —Eu amava minha esposa, Sie Zimmermann, mas agora é hora de permanecer forte. Terei meu luto no enterro. Serei eternamente grato à senhora pelo seu auxílio. Sempre me lembrarei da heroína que a senhora foi. Adeus!

    O modo como o Sr. Vogel falou fez a Enfermeira Magda entender que aquela era uma despedida definitiva, que ele iria ficar bem dali em diante. Então ela foi embora, decidiu não mais importuná-lo com questionamentos.

    A parte mais curiosa da vida é que a única certeza que temos dela é que no fim não a teremos mais, porém, nunca esperamos que esse fim chegue.

    A morte de Francisca Vogel foi uma fatalidade inesperada. A Família Esposito entrou na casa segundos depois que a enfermeira foi embora. Primeiro vieram os risos de alegria devido ao nascimento, e em seguida, os gritos de desespero devido à morte de um ente querido.

    No dia seguinte —o dia do velório —, todas e todos estavam reunidos no cemitério local. O clima continuava bastante chuvoso, mas a chuva tinha cessado quando o momento de enterrar o corpo chegou. Parecia que até o tempo contribuíra para que a família pudesse fazer um enterro decente.

    Algumas pessoas ao redor da cova choravam, outras lamentavam, mas a maioria já estava conformada com a perda. Contudo, a tristeza ainda reinava no ambiente. A mãe da

    finada, a Sra. Giuseppina Esposito, aproximou-se de Antonin que observava as tias da sua filhinha, irmãs mais novas de Francisca, mimarem-na no colo.

    —Quando irá partir? —perguntou a mulher.

    — Amanhã mesmo, Dame Esposito — respondeu Antonin. — Francisca teve o bebê antes do previsto, e agora aconteceu essa fatalidade. Vou precisar adiantar algum as coisas — ele voltou seus olhos para onde o caixão estava, agora soterrado, pois o coveiro terminava de encher a cova com terra.

    — Eu entendo que você não queira mais continuar a morar aqui, mas não seria melhor que a criança continuasse conosco? —Giuseppina era mulher dócil, mas forte. Ela queria, com todas as suas forças, cuidar daquela criança. Sabia que o pai não cederia tão fácil, mas apelaria para o discurso da maternidade. — Eu seria como uma mãe para ela. Na verdade, seria o mais próximo de uma mãe que ela teria.

    — O planejamento foi completamente da sua filha, Dame Esposito — disse Antonin sem receios de negar a proposta dela —, e eu jurei que iria ser cumprido. Além disso, a senhora sabe como se encontra o cenário atual da Alemanha. ..

    —Eu entendo. Sei das suas lutas pela paz e pelo ambientalismo. Sei que Francisca, minha filha, nunca gostou de morar aqui, mas agora ela está morta —Giuseppina não queria parecer insensível, e Antonin sabia que ela apelava para ter a tutela da criança, afinal, era a única pessoa que poderia tomar o espaço que Francisca, após vir a óbito, deixou.

    —Sinto muito, Dame Esposito, mas eu preciso ir embora e não posso ir sem minha filha.

    — Eu sei — nessa hora Giuseppina pôs-se a chorar. — Mas o Brasil é um país muito perigoso.

    —E aqui não, Dame Esposito?

    —Li nos jornais que lá está em crise econômica.

    —Aqui também. Além disso, minha família está muito bem estabelecida. Eles têm um negócio, e eu posso trabalhar, estou jovem ainda.

    —Mas você nem sabe o idioma deles.

    —Eu posso aprender. Sou professor, esqueceu?

    A Sra. Giuseppina não tinha mais argumentos para tentar fazê-lo ficar, ou então, deixar a menina sob a responsabilidade dela. Ela respirou fundo antes de fazer seu último pedido:

    —Pelo menos, prometa-me que quando for possível, traga-a para cá, para que eu possa ver o quanto ela será uma menina linda e forte como minha filha.

    — É uma promessa, Dame Giuseppina. Eu sei o quanto vai ser difícil para a senhora, acabou de perder a filha e agora a neta vai partir para longe. Mas eu sei que a senhora também me entende. Eu já perdi minha esposa, não posso ficar sem minha filha.

    A senhora apenas afirmou com a cabeça, não queria dizer mais nada porque, se dissesse, tentaria novamente convencê-lo do contrário.

    No fim, a Sra. Giuseppina ficou um pouco mais de tempo com sua neta nos braços. Ela via a própria filha na menina e preparou tudo o que um bebê precisava para uma viagem, ainda mais uma que não teria leite materno.

    Assim que o enterro acabou, voltou cada pessoa para sua casa. Antonin pegou sua filha e aprontou-se para que, no dia seguinte, pudesse partir. Faria uma grande viagem.

    A história de Pipa foi contada pela vizinhança, ficou conhecida como a garota que nasceu sem chorar. Também ficou conhecida por perder a mãe no momento em que nascera —fora sua mãe ter sido uma mulher que já era famosa pelas redondezas.

    A enfermeira que ajudara Francisca no momento da conceição relatou que Francisca conseguiu segurar a filha e dar um último sorriso antes de morrer.

    Filosófico, belo, mas igualmente triste.

    Essas histórias foram ouvidas ao longo do tempo, e Pipa ganhou fama num bairro simples de Berlim na década de 80.

    Capítulo 2

    Antonin fez uma viagem de, aproximadamente, dezesseis horas de avião para chegar até seu destino: América do Sul, Brasil, Estado do Espírito Santo. Primeiro, ele desembarcou no Aeroporto Internacional de Vitória – Eurico de Aguiar Salles, depois esperou encontrar-se com as pessoas que iriam buscá-lo, seus familiares que há muitos anos não via.

    Todas as pessoas olhavam admiradas para Antonin no terminal. Não achavam comum verem um pai solteiro (viúvo) viajar de avião com sua filha recém-nascida, que nem mesmo chorava.

    Pipa, que estava com seu rosto à mostra, ficava tão quieta que pensavam que se tratava de uma boneca. Até mesmo uma criança de cinco anos que estava com sua mãe apontou-lhe o dedo e disse:

    Olha, mamãe, um homem com uma boneca.

    Ohomem era uma pessoa bem reservada, não gostava de chamar a atenção. E para piorar a situação, o que mais chamou a atenção naquele exato momento foi o Ford Bronco que parou na frente do terminal. Seria o transporte de Antonin e quem o dirigia era seu irmão, dois anos mais novo, Adalbert Vogel. Era um pouco parecido com o irmão.

    —Pensei que todo mundo viria me buscar —disse Antonin alegremente.

    —Ué? —indagou o irmão mais novo assim que desceu do automóvel para ajudar o irmão mais velho com a bagagem. — Onde está sua esposa? — Adalbert falava alemão perfeitamente, do mesmo modo que falava português brasileiro, pois morava lá há muitos anos. — Foi por isso que papai e mamãe não vieram, para dar mais espaço para vocês. Francisca decidiu ficar na Alemanha?

    Ambos se abraçaram cuidadosamente por a menina estar nos braços de Antonin. Mataram a saudade que sentiram um pelo outro por um instante, mas fariam isso outra hora com mais afeto.

    — Eh! Irmão... Tenho uma péssima notícia para dar à família. Infelizmente, Francisca morreu no parto —disse Antonin com bastante firmeza, apesar de estar interna e profundamente abatido.

    Ele cobrava de si próprio resistência. Não poderia externar sua fraqueza. Agora, precisava trabalhar em dobro, ser pai e mãe simultaneamente. Obviamente, esperava que sua família fosse suprir mais tarde toda a necessidade de afeto familiar da sua filha.

    —Mentira! —Adalbert pôs as mãos sobre a boca para esconder seu espanto. — Irmão, eu sinto muito. Espero que você esteja bem.

    —Verdadeiramente, não estou, mas creio que vou melhorar com o tempo.

    —Como foi isso?... —ele hesitou. —Se não for um incômodo fazer esse tipo de pergunta...

    —Não! Não incomoda. Francisca sofreu de complicações na gravidez e não resistiu ao parto. Sinto que ela já sabia. Dava sinais, mas sempre se manteve firme. Creio que ela deu a vida pela nossa filha.

    —Sinto muito pela sua perda, irmão —Adalbert deu um leve abraço em Antonin, depois olhou para a sobrinha que dormia tranquilamente. —Mas estou feliz que a garotinha esteja bem. E qual o nome dessa coisinha linda do tio? —ele acariciou os cabelos da menina.

    —Pipa. É um nome italiano, foi a Francisca quem o escolheu.

    —Hum! —exclamou Adalbert como se tivesse entendido o porquê daquele nome. —Um lindo nome para uma linda menina.

    Os irmãos resolveram terminar a conversa no percurso para casa. Seria mais ou menos uma hora de viagem para chegar à cidade de Domingos Martins, então falaram sobre várias coisas.

    —Berth —era esse um apelido carinhoso que Antonin deu para seu irmão quando eram crianças —, de quem é este carro? Não sabia que vocês tinham tanto dinheiro assim. Chamou a atenção no aeroporto.

    Adalbert riu do comentário do seu irmão.

    —Eh! Eu vi. Este carro é do meu patrão, o Sr. Diniz. Ele é dono da transportadora qual eu trabalho. Eu fiz muita amizade com ele.

    —É muito difícil trabalhar lá?

    —Não. Por quê?

    — Porque você parece ser da minha idade, ou mais velho do que eu — Antonin riu da própria resposta e o irmão cedeu à jocosidade do momento.

    — Pode rir — disse Adalbert —, daqui a alguns anos você vai perceber que envelhecemos mais rápido no Brasil, exceto os negros. Eu conheci uma senhora negra de oitenta anos que, se eu comparar com os idosos de lá, parece ser trinta anos mais jovem.

    E seguiram caminho conversando mais. Antonin percebeu que o modo de falar do seu irmão estava completamente abrasileirado.

    Assim que chegaram à Domingos Martins, Antonin imediatamente se sentiu em casa. A cidade era tão alemã que ele quase pensou que não estava no Brasil.

    —Nossa! —exclamou o homem. —Estamos mesmo no Brasil?

    —Sim —respondeu Adalbert sorridente.

    —Como é possível, Berth?

    —Você não sabe? Há muitos emigrantes de outras nações no Brasil.

    —Eu não sabia.

    — E há outros lugares, sem ser neste Estado, onde outros emigrantes alemães se estabeleceram. O Brasil é muito louco, mas é muito legal.

    —Eu posso imaginar. E nossa mãe, como está?

    —Melhor do que eu, extremamente adaptada.

    —Sério? Eu jamais diria. Ela não mencionou isso nas cartas que trocamos durante anos. Tudo o que ela queria era que eu viesse para cá, e eu nunca quis. Só tomei essa decisão pela Francisca...

    —E mamãe vai passar isso na sua cara.

    Ambos riram daquilo. Eram homens que amavam a família acima de tudo. Adalbert parou o carro em frente a uma casa semelhante às casas da sua cidade natal —com algumas características um pouco diferentes. Quando buzinou, um pessoal saiu da residência para receber os recém- chegados.

    A família era composta por várias pessoas, a começar por um casal de senhores, chamados Norma e Albert Vogel, que eram seus pais. Antonin reconheceu suas irmãs mais novas: Elisabeth e Catharine. Uma tinha 25 anos e a outra tinha 22, ambas casadas e tinham filhos. Aprimeira era casada com Marcelo Freitas, e tinham dois filhos: André, de cinco anos; e o Caio, de dois anos. A segunda era casada com Paulo Vieira, e tinham uma filha de, também, dois anos, a Sofie. A mulher de Adalbert também saiu da casa para vê-lo, era Margarida Monte, e tinham uma filha de três anos, cujo nome era Beatrice.

    Eram todos casados, e juntos formavam a Família Vogel. Não era a única família alemã do local. Casar com brasileiros nativos era fundamental para que fossem naturalizados brasileiros e reconhecidos perante a lei.

    — Ó, meu filho lindo — disse Dona Norma ao abraçar delicadamente seu filho. —Você cumpriu mesmo o que prometeu —ela pegou a pequena Pipa cuidadosamente nos braços —e trouxe a menina para podermos conhecê-la. É uma criança linda.

    — Sim, mamãe — Antonin beijou a fronte da sua mãe, antes que seu pai se aproximasse para saudá- lo.

    —Eu sabia que você viria para cá se uma mulher te pedisse. Sua própria mãe não teve voz suficiente, mas... —esse comentário da Dona Norma fez os irmãos se olhares de maneira significativa e rirem sutilmente por lembrarem do diálogo que tiveram outrora. — E onde está a Francisca? Até hoje guardo as fotografias que me mandou pelo correio.

    Dona Norma procurava pela nora, nunca chegou a conhecê-la pessoalmente, e estava com o coração cheio de alegria, mas estranhou sua ausência.

    —Mamãe —disse Antonin com muito pesar —, eu tenho uma terrível notícia para dar.

    Com muita cerimônia, Antonin disse aos seus pais o que aconteceu com a Francisca e ambos choraram. Mas não fizeram muito drama por muito tempo, pois Antonin assegurou estar muito bem e pediu que não permitissem que aquilo deixasse o clima fúnebre. Tudo o que ele precisava agora era relaxar com os entes queridos e conhecer os, para ele, novos integrantes da família Vogel.

    A Sra. Vogel prometeu cuidar da pequena Pipa como se fosse a própria mãe dela. Jurou pela sua vida que nada faltaria para a menina.

    Até então, Pipa era a única criança de cabelos loiros e olhos azuis da casa. Era a que, segundo a avó, mais se parecia alemã, considerando que os outros netos tinham cabelos pretos. Exceto a filha de Adalbert, cujos cabelos eram da cor do cobre, apesar de a mãe ter

    cabelos pretos também. A mãe de Antonin costumava dizer que os brasileiros tinham uma genética forte.

    Todos entraram na casa, um banquete esperava por eles —eram bons na cozinha, abriram um restaurante muito requisitado na cidade que era o negócio da família .

    Antonin iria mudar de vida, sua filha seria brasileira e jamais conheceria a realidade da Alemanha, local onde nasceu. Cresceria numa zona serrana e montanhosa, num clima temperado, e viveria num cenário idílico pelo resto da vida.

    Capítulo 3

    Estava perto da última semana de março de 1997 quando Pipa, que já havia feito 16 anos, corria pela rua molhada de chuva para chegar ao colégio onde estudava. Sempre se atrasava.

    Apesar de estar o tempo todo com suas madeixas loiras soltas ao vento, eles permaneciam arrumadas. Havia dias que ela nem as penteava e continuavam bonitas.

    A garota estava no último ano letivo e seu pai, que agora era professor de língua portuguesa no colégio, disse que a castigaria se ela continuasse a se atrasar daquele jeito. Ameaças vãs. Falava o tempo todo para sua filha que não saberia dizer quando foi que ela começou ter a cabeça nas nuvens. Pelo menos, todos diziam que ela era muito inteligente. E era mesmo.

    Durante esses 16 anos morando no Brasil, Antonin dedicou-se aos estudos da língua portuguesa ao ponto de se formar em Letras e conseguir uma vaga como professor na própria cidade.

    Ser professor aos 45 anos não lhe trazia novidade alguma já que começou a dar aulas desde os 26. Há seis anos trabalhando no colégio estadual, acabou conhecendo uma nova professora de História chamada Núbia dos Santos, uma mulher negra muito linda e muito inteligente que encantou não somente a Antonin, mas a todos os homens da Família Vogel. Talvez, por ser muito diferente do que estavam acostumados a verem numa mulher.

    Antonin casou-se com Núbia, que era uma mulher viúva, como ele, e tinha uma filha de 18 anos chamada Amanda dos Santos. Elas não chegaram a morar na casa dos Vogel. As mulheres do lar ficaram cheias de ciúme da professora, exceto a matriarca, pois se sentia velha demais para se importar com algumas coisas. Então Antonin montou um plano para ir morar com sua esposa e Pipa o apoiou porque era apaixonada pela sua professora.

    Ele demorou dois anos planejando isso, porém, até aquele momento não conseguia tirar nada dos papeis visto que sua mãe implorou para ele não sair da casa, mas essa situação já estava insuportável. Não saberia mais sustentar a realidade de viver num lar onde sua esposa não vivia, e sem necessidade alguma. Ou ela morava com a família, ou ele se mudava para a casa dela. Antonin até mesmo deu a opção para sua filha de ficar na Casa Vogel, se quisesse, mas isso já ia longe demais.

    Pipa chegou ao colégio e foi imediatamente levada para a sala do Diretor Simon. Lá dentro ela foi bastante repreendida por ele.

    —Seu pai deve estar tão envergonhado. Como você consegue se atrasar todos os dias para as aulas, jovem? Você não era assim. Eu lembro de você tão pequena e era mais responsável. O que aconteceu com você? — o diretor olhava para Pipa a esperar que ela desse uma resposta plausível.

    O problema era que a garota pensou que se tratava de uma pergunta retórica.

    — Não é uma pergunta retórica? — perguntou a jovem depois de um incômodo silêncio.

    O diretor respirou fundo, havia desistido de tentar entendê- la.

    —Pipa, você é uma garota muito inteligente, talvez a mais promissora deste colégio, mas está deixando a desejar neste último ano. Está para se formar no ensino médio e parece que não dá mais tanta importância a isso como fazia antes.

    — Diretor, eu juro que me importo. É que... Eu tenho coisas para resolver nesta cidade.

    —O que uma garota de apenas 16 anos tem para resolver que é mais importante do que concluir o ensino médio?

    —Coisas —Pipa deu de ombros —, tipo: lixos no meio ambiente, moradores de rua passando fome, cães e gatos sem dono pelas calçadas, velhinhas desacompan hadas.

    — Eu não acredito que estou ouvindo isto. O que você pretende? Ganhar uma medalha?

    —Não, senhor, eu só quero ser uma pessoa melhor e ser a diferença que quero ver no mundo.

    A resposta de Pipa calou o homem por alguns segundos até ele decidir falar alguma coisa que não fosse sarcástica.

    — Olha — o Dir. Simon retirou os óculos —, Pipa, eu te admiro por você, tão jovem, se empenhar tanto para fazer coisas boas, mas não se esqueça das suas responsabilidades primárias. O colégio tem horário, tem regras, e você precisa estudar, precisa se formar. Mas não podemos te liberar sempre e não fazer o mesmo com outros alunos. Você não sabe o problema que isso gera para nós? Dois dos professores mais brilhantes desta instituição são seus pais.

    —Tecnicamente, só um. Mas, sim, eu considero muito a professora Núbia.

    Pipa tinha outra resposta na ponta da língua, mas ela decidiu não levar mais aquela conversa adiante — qual ela não teve a mínima intenção de participar — e aceitou a repreensão do diretor.

    —Diretor —continuou a garota —, me desculpe. Eu prometo que vou me esforçar mais para não cometer este mesmo erro... Outra vez.

    —Ok! Vá para a sala agora, antes que você perca o segundo horário da aula.

    A jovem saiu da sala do diretor e foi para sua turma alegremente. Naquele dia, a professora Núbia, sua madrasta, era quem daria aula à sua turma.

    Quando entrou na sala, não pegou ninguém de surpresa. Foi praticamente ignorada. Nem davam mais atenção a ela, pois estavam acostumados a verem-na chegar atrasada na s aulas.

    —Boa tarde, professora —saudou Pipa à mulher com o giz na mão.

    — Boa tarde, minha linda — a professora Núbia, que era uma mulher extremamente simpática, saudou a menina com um belíssimo sorriso no rosto e voltou ao quadro-negro para continuar a escrever.

    Pipa sentou-se na última carteira da sala. Ela percebeu os olhares de desdém de duas colegas de classe. Tinham inveja dela por ser da mesma idade que elas e ser mais evoluída, tanto física quanto intelectualmente. Aos 16 anos já era uma mulher feita, ainda assim, com um rosto estritamente jovial.

    Ao invés de pegar o caderno e copiar o assunto, Pipa admirava a beleza da sua madrasta. Núbia dos Santos era alta e magra, tinha uma cintura muito fina e quadris fartos. Parecia uma boneca. Usava um vestido justo ao corpo, estampado com cores vibrantes que lembravam a africanidade.

    Também usava adornos dourados que a deixavam com um ar de riqueza, além de o seu cabelo crespo estar muito bem ajeitado.

    Núbia era uma mulher negra tão retinta que sua pele brilhava no sol como ouro líquido. Ninguém dizia que ela possuía 37 anos e tinha uma filha de 18 anos. Quem não as conhecia, pensava que se tratavam de duas irmãs.

    A professora virou-se para a turma e perguntou:

    — Alguém pode me dizer até quando durou a Segunda Guerra Mundial? — ela ficou a esperar pelos seus discentes, mas não fizeram nem menção de levantar a mão. — Alguém? —nem mesmo um ruído fizeram para não correrem o risco de a professora fazer a pergunta diretamente.

    —1945 —respondeu Pipa.

    —Muito bem, Pipa —congratulou a professora.

    —Ah! —exclamou, descrente, a colega que outrora olhou para Pipa com desdém. —Não vale, Pipa é sua filha, ela recebe aulas particulares.

    —Maria, isso não é verdade —repreendeu a professora educadamente.

    — Óbvio que não — reforçou Pipa. — Eu estudei. Eu acho incrível como nós, descendentes de alemães emigrantes, não sabemos como nosso povo da Alemanha Nazista foi a causa dessa guerra. Eu sinto vergonha.

    —Eu não sou obrigada a saber —replicou Maria.

    —Claro que você é. Como vai explicar para as futuras gerações que você não fez parte desta vergonha mundial? A não ser que você concorde com o nazismo.

    —Que horror —disse Maria como se tivesse sido ofendida.

    —Pipa —disse a professora com toda a calma —, não seja tão radical. E Maria, Pipa tem razão. É extremamente importante saber sobre a história. Omundo está evoluindo e lá na frente saberemos o que não fazer para não causarmos danos às pessoas. Nenhum culpado será tomado por inocente.

    Núbia piscou um olho para Pipa que sorriu para ela de maneira sutil, e seguiu com a aula sobre a Segunda Guerra Mundial e a má influência dos alemães nazistas.

    A aula terminou e todos os alunos e alunas foram embora da sala até sobrarem apenas a Núbia e a Pipa. Era algo costumeiro. Antes de saírem juntas da sala, Núbia abraçou a Pipa bem forte e disse:

    —Você é uma garota muito necessária. Eu te admiro demais, minha linda.

    —Eu que te admiro, Núbia. Mal vejo a hora de a senhora e sua filha irem morar lá em casa, com a Família Vogel.

    Núbia, que antes estava cheia de ternura no olhar, agora ficou séria, chegando a franzir o cenho.

    —Co-como assim? —ela não soube nem formular a pergunta certa.

    —Ora! Eu ouvi uma conversa muito intrigante entre meu pai e minha avó sobre isso. Ela confirmou que já estava na hora de a esposa do seu filho querido ir morar com eles.

    Antes, justificaram que não fizeram a proposta à Núbia assim que casou com o Antonin porque ela já era uma mulher independente.

    —Mas seu pai não me disse nada sobre isso.

    — Ops! Acho que estraguei a surpresa — Pipa deu um sorriso amarelo, mas era pura falsidade. Ela tinha a mais genuína intenção de dar a informação antes do pai. Sabia que ele demoraria para fazer aquilo e faria com muita cerimônia.

    —Não se preocupe, será nosso segredo.

    — Achei vocês — disse Antonin, o pai da garota, assim que entrou na sala de supetão. —O que ainda estão fazendo aqui? Qual é o segredo ?

    Ele já tinha 45 anos. Agora, estava mais velho do que antes. Como disse Adalbert, seu irmão, que no Brasil eles envelheciam mais rápido.

    — Núbia finalmente vai morar conosco — respondeu Pipa pegando os dois de surpresa.

    —Pipa, eu não acredito que você contou antes de mim —falou o pai um pouco aborrecido. —Na verdade, nem acredito que você estava bisbilhotando minha conversa com sua avó.

    Pipa apenas deu de ombros.

    —E quando você ia me contar? Acho que nos vimos hoje umas 50 vezes — falou Núbia de braços cruzados.

    —Que exagero, meu amor...

    —Antonin —disse ela em tom de repreensão.

    —Eu ia contar assim que terminasse o expediente —ele olhou para Pipa e falou entre os dentes —, e já terminou.

    —Antonin, você sabe o que eu acho sobre isso.

    —Amor, agora não. Não na frente de Pipa.

    —Hei! —protestou a garota. —Deixa eu ouvir.

    — Não, você é muito abelhuda — disse o pai da garota. — Vamos embora, meninas, já está tarde.

    —Para a minha casa ou para a sua? —disse a professora ainda de braços cruz ados. Mesmo séria, Núbia não perdia a graciosidade de mulher que tinha.

    —Para a sua. Vamos conversar com calma, e Pipa, vá para casa.

    —A pé? —resmungou Pipa. —Não é justo. Vocês vão de carro.

    O carro era de Núbia. Antonin e ela juntaram dinheiro para comprá-lo, apesar de ele ter dado maior parte. Ele achou por bem passar para o nome dela, visto que ela era habilitada. Ela aprendeu a dirigir com o pai falecido que trabalhava dirigindo caminhão.

    —Eu posso deixá-la na frente de casa —sugeriu Núbia.

    —Não, precisa —disse Antonin. —A casa é perto e eu tenho pressa — Antonin a segurou pela cintura. — Hoje é um dia muito especial para mim. Por favor, fique feliz comigo.

    —Eu não prometo, mas vou tentar.

    — Eu te amo, minha vida — Antonin beijou sua esposa e Pipa fingiu ânsia de vômito.

    — Eca! Esperem eu sair. Desculpa, Núbia, você é maravilhosa — disse ela enquanto arrumava seus pertences —, mas mesmo depois de dois anos, não estou preparada para ver vocês se agarrando. Até logo!

    Pipa saiu da sala sem mais delongas. Ela sabia o motivo de Núbia não querer ir morar na casa da Família Vogel. Eram as mulheres que mandavam naquele lugar e elas não gostavam muito da professora, exceto a Dona Norma —estava velha demais para entender algumas coisas.

    E ainda, Núbia não sentia a menor necessidade de sair da sua casa própria qual conquistou graças aos esforços do seu pai e do seu falecido marido, que casou com ela quando ela tinha 18 anos.

    Antonin foi uma bênção na vida de Núbia. Ela reconhecia isso. Ele era bonito, inteligente, compreensível e pacífico. No entanto, não era um homem de atitude. Deixava que seus familiares mandassem nele. Mas ela mudou essa situação com a ajuda da própria enteada.

    Ao contrário do pai, Pipa era destemida, ousada, curiosa, além de ser bonita e inteligente também, mas tinha proatividade.

    Oatual marido de Núbia também compartilhou todas as suas finanças com ela, por isso era um homem bom, sem ambições. Ela preferia, mil vezes, que Antonin e Pipa fossem morar na casa dela. Tinha espaço suficiente.

    Como Antonin parou de aplicar todo o seu dinheiro na casa da Família Vogel e as mulheres da casa perceberam que foi por causa de Núbia, principalmente depois que compraram um carro, criaram uma certa antipatia por ela.

    Pipa nunca reclamou, era bem assistida, mas percebia essa exploração sobre o pai e queria ter forças para fazer alguma coisa. Porém, ocupava-se com coisas que ela julgava ser em mais relevantes.

    Pipa amou a Núbia desde a primeira vez em que a viu conversando com seu pai na escola. Principalmente, pela forma como ela cuidava dele. Sentiu que foi repartida a responsabilidade de o deixar feliz. Já tirou um peso das suas costas.

    Mesmo estando com a família, Antonin passou anos deprimido, e tudo mudou com a chegada de Núbia. O velho Antonin se foi, e sua antiga mulher, a mãe que Pipa nunca viu, passou a ser uma boa lembrança, e não mais uma memória dolorosa.

    Capítulo 4

    Pipa voltou para casa, o sol distribuía seus últimos raios de luz no horizonte. Ela sentiu o cheiro do banquete que era preparado para as boas-vindas de Núbia.

    Somente as mulheres trabalhavam na casa, até as meninas. Os homens assistiam à televisão na sala de estar e os meninos ficaram nos seus quartos.

    —Pipa —disse Dona Norma assim que viu a garota entrar —, onde está seu pai? —Papai está com a Núbia, vó —respondeu a menina.

    —Espero que quando eles chegarem, tudo já esteja pronto.

    —Daqui a pouco dá 18h, vó, fique tranquila. Vão chegar aqui em alguns minutos depois das 19h.

    — Você, que a conhece mais do que nós, sabe dizer se ela gosta de ensopado de frango?

    —Não. Ela não gosta.

    —Nossa Senhora... Cancelem o ensopado —gritou a senhora para as mulheres na cozinha que resmungaram, algumas reviraram os olhos.

    —Mas ela come frango, de preferência assado. Frito, jamais.

    —Quer me dizer mais alguma coisa?

    —Hum... Quanto menos comida frita, melhor.

    — Entendi.

    Dona Norma foi para a cozinha e Pipa seguia seu caminho para seu quarto no andar de cima. Lá, havia apenas dois banheiros para dividir com seus primos.

    Todos dormiam nos quartos do andar de cima, enquanto os casais dormiam nos quartos do andar de baixo .

    Apesar de ser um imóvel grande, a família só crescia e o espaço tornava-se cada vez menor, tanto que tiveram que dividir alguns quartos.

    Elizabeth, tia mais velha de Pipa, tinha dois filhos quando Pipa ainda recém- nascida chegou a Domingos Martins: André, de 21 anos, e Caio de 18 anos. Ambos não queriam mais morar naquela casa e tornaram-se um pouco antissociais. Nem mesmo desceriam para jantar com a família.

    Depois que Pipa fez um ano morando lá, Elizabeth tivera mais dois homens: Alexandre de 15 anos e Bruno de 13 anos.

    Já a Tia Catharine, que tinha apenas a Sofie, de 18 anos, também tivera outra menina, a Eduarda, de 14 anos.

    E o Tio Adalbert, que tinha a Beatrice, de 19 anos, tivera com sua esposa um filho por nome de Ivan, de 15 anos.

    De todos os primos e primas de Pipa, Ivan era o único que tinha mais afinidade com ela.

    A Vó Norma despertava ciúmes nos demais netos porque era bastante apegada a Pipa, e julgavam que a avó exercia o prediletismo por aquela neta ser a única loira de olho s azuis e também a única que nascera na Alemanha. Ivan não se importava com o prediletismo, era bem-amado pelos pais e focava muito em estudar sobre tudo, assim como a prima alemã.

    Enfim, Norma e Albert tiveram dois filhos e duas filhas que moravam com se us respectivos cônjuges. Também netos e netas, que deu um total de nove.

    Eram 18 pessoas numa casa, e seriam 19 se Francisca, ex-esposa de Antonin, ainda estivesse viva. Contudo, Dona Norma planejava fazer com que a nova esposa de Antonin e enteada fossem morar com eles. Ou seja, 20 pessoas.

    Ninguém suportava mais aquela realidade.

    Ninguém teve sua casa própria, mesmo com condições de investirem em uma, porque a matriarca não deixava. Vovó Norma era muito apegada à família. Dissera que somente morreria em paz se visse todos e todas reunidos num só lugar. Sendo assim, ninguém pretendia decepcioná- la.

    Perto das 19h, Antonin e Núbia foram para a casa da Família Vogel. Amanda decidiu não ir com eles.

    Pipa, durante dois anos, não soube quem era a Amanda, pois essa jovem morava em outro estado, mas passou a morar com a mãe já fazia alguns meses. Mesmo assim, viu- a poucas vezes. Nunca, nem mesmo, entrou na sua casa.

    Amanda trabalhava numa cafeteria bem perto de onde morava. Vivia somente para trabalhar, ou seja, não saía de casa, não tinha amigos, não conhecia ninguém. Pipa, apesar de ser uma amiga em potencial, tinha apenas 16 anos. Mesmo parecendo ser uma garota da idade de Amanda, seus assuntos eram bem opostos.

    Enquanto Pipa queria saber de estudar, Amanda queria saber de trabalhar. Enquanto Pipa queria leite, Amanda queria café. Enquanto Pipa falava sobre amizade, Amanda falava sobre namoros. Entre outras coisas.

    Núbia estacionou seu carro na frente da garagem da casa dos Vogel, onde havia uma placa de PROIBIDO ESTACIONAR. Ela havia se preparado psicologicamente para entrar nunca casa cheia de gente branca que não gostava dela. Antonin e ela conversaram bastante sobre esse evento, e ela não estava nada confiante.

    Mas ao entrar na casa, Núbia foi muito bem recebida. Foi conduzida à sala de jantar, foi apresentada a todos e todas da família, exceto os dois rapazes que estavam no quarto, e foi-lhe apresentado um belíssimo banquete. Também, o pai de Antonin, o Albert, não se reuniu com a família para o jantar, pois dormia tranquilamente nos seus aposentos. Era um homem velho e cansado.

    A convidada da noite, qual usava um elegantíssimo vestido branco justo ao corpo, percebeu que as mulheres agiam

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