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Elementos do júri
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E-book559 páginas5 horas

Elementos do júri

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Sobre este e-book

A ideia de escrever um livro voltado para um instituto tão complexo como o Tribunal do Júri ocorreu justamente com estudantes e profissionais da área jurídica que gostariam de conhecer com detalhes como um advogado, promotor poderia sustentar com tranquilidade as teses numa tribuna com uma retórica consistente. Dentro dessa visão, o presente livro tem por finalidade demonstrar que é possível qualquer pessoa atuar no plenário do Júri desde que siga certos elementos fundamentais. Para isso, no escrito apresenta um pouco da história do Júri, uma abordagem jurídica, analise jurisprudencial, estudos de quesitos, escolhas de tese, como postar o corpo e voz no plenário – seguindo orientação clássica dos oradores gregos. Por fim, temos leves histórias de júris realizados, fazendo com que o leitor viva um pouco do cenário do tribunal. Elementos do Júri vêm demonstrar que nada há de impossível para a realização do plenário, bastando uma pitada de estudo neste livro, uma pitada de dedicação e uma grande porção de amor ao plenário, que certamente se atingirá com plenitude a eloquência na tribuna do Júri com sucesso.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento25 de set. de 2017
ISBN9788583383758
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    Elementos do júri - Marco Mejìa

    – 1 –

    INTRODUÇÃO

    1.1 Antecedentes históricos do júri

    O epicentro histórico do júri, na condição de plenário, debates, acusação e defesa da forma que conhecemos nos dias de hoje perde-se na história. Várias são as visões de nossos estudiosos quanto à sua origem propriamente dita. Tem-se conhecimento de que os antigos gregos, na sua sagacidade de publicitar fatos que diziam respeito a pessoas que infringiam a polis, levavam o assunto para julgamentos públicos. Da mesma forma, os próprios problemas políticos eram conduzidos a debate público. A história vem provar que, para os gregos irem à guerra, tinham que passar por vários debates e discussões que conduzissem a um conhecimento verdadeiro sobre o modo como deveriam agir. Não é de se estranhar que grande parte dos filósofos (pré-Socráticos) já tecia discursos pré-tribúnicos, situação em que a solução de algum problema estava na capacidade discursiva levada ao povo.

    A crença é de que os debates, as trocas de acusações, as várias formas de defesa, já estavam inseridos na Grécia antiga como fenômeno de crescimento cultural.

    O homem grego, antigo por excelência, deveria saber falar e discutir. Considerava-se impossível, para o ser humano daquela época, adotar o silêncio como forma de defesa. Era inaceitável permanecer inerte numa acusação. O homem heleno, na sua essência, era um ser de transformação. Nesse celeiro, é evidente que surgiram pensadores exponenciais que até hoje repercutem na nossa visão de mundo. Temos, então, o mais sábio dos homens, Sócrates, que, quando do seu julgamento, não usou defesas nem anátemas discursivos em favor de sua vida, nem qualquer forma de dialética: escolheu o suicídio, transformando a sua genialidade em figura mítica, influenciando pensadores até os dias de hoje.

    A figura de Platão surge logo depois, assim como a de Aristóteles. Este último, por sua vez, estuda a fundo os referidos debates em que os tópicos combatem os comezinhos caminhos da dialética.

    As contradições e o poder da linguagem vêm da cultura grega, fermentando grandes oradores. O pensamento filosófico criou esses homens – entre eles Demóstenes, um dos melhores da história –, mantendo as cidades (polis) unidas contra invasões. Tal figura, que vem ressaltar o espírito de eloquência, não ficaria restrita à tribuna, mas defenderia a própria sociedade, trazendo também grandes opositores com a mesma envergadura.

    Nesse aspecto, o júri, de forma remota, já está estabelecido. As discussões não ficaram restritas ao povo grego. As conquistas romanas fazem desses povos seres formidáveis, que absorvem a cultura grega como um todo. O estudo da eloquência, até então conhecimento restrito aos gregos, agora é capitaneado pelos romanos. Surgem grandes oradores – como Cícero, Marco Antônio e César –, todos, de uma forma geral, lançados na contenda do júri, na tribuna patrícia. A história acabou por fazer de Cícero expoente em eloquência e nos embates tribúnicos.

    Nascido raquítico, pequeno de estatura, quando jovem tomou a decisão de ser um dos maiores oradores de Roma. Sabia que deveria buscar em solo grego o conhecimento da arte da eloquência e da atuação frente ao plenário, bem como da mímica de tribuna.

    Com tais ensinamentos, transformou-se num grande orador e é considerado por muitos como um dos maiores advogados que existiram. Cícero, lançado em uma causa julgada como perdida, teve atuação realizada e, para o descrédito de todos, ganhou a contenda, sendo o melhor de todos os oradores surgidos.

    Ora, qual a relação desses homens com o júri? A imposição do contraditório, da legalidade de defesa instituída pelo Estado, do orador em defesa de um terceiro cidadão, tudo isso vem a ser o júri antes mesmo de ser balizado constitucionalmente. O júri é condição pétrea em nosso ordenamento constitucional porque já existe desde antes da própria Constituição.

    – 2 –

    ELEMENTOS ESTRUTURAIS PARA A DEFESA EM

    PROCESSO DO JÚRI

    Aanálise rigorosa que compõe toda a estrutura do procedimento do júri em nosso país em grande parte se baseia em dois grandes espíritos jurídicos. O primeiro deles é a análise dessa instituição sob uma visão histórico-romântica, em que os estudos se alavancam dentro de um contexto comparativo de várias ordenações pátrias. Temos o início do júri como instituição legal, baseado em posicionamentos históricos, valendo-se de sua importância para solução de vários delitos. Nisso temos exemplo de Rui Barbosa, com seus escritos literários, especialmente na obra Histórias dos júris nas Constituições. Logo, na sucessão, temos, ao longo de todos os estudos doutrinários, apanhados arqueológicos que retratam grandes vultos no estudo do júri e que, por sua vez, fizeram parte da história – como o juiz Margarino Torres, que, como operador duro e rigoroso em seus pensamentos, manteve, até os dias de hoje, a importância do júri.

    São de fato personagens que mostraram a importância do júri, e conseguiram evidenciar o caráter social e jurídico para o povo.

    Graças a homens como Evandro de Lins e Silva e Rui Barbosa, a defesa do júri ganhou contornos soberbos e fez com que suas atuações ecoassem para o futuro, levando o júri a sua valoração "ad perpetua" como norma constitucional.

    Porém, duas são as grandes fontes que consideramos de suma importância: a doutrina pura do júri, já determinada; e a percepção de que grande parte das obras são norteadas pela jurisprudência. São compêndios que retratam o júri e seus procedimentos processuais de forma positiva, dando sempre a impressão de que somos tão somente estudantes, não devendo esquecer as regras de condução do respectivo processo. São assim milhares de livros, cada qual apresentando alguma forma de novidade; porém, em sua maioria, perdem-se em um sempre estudo crônico. Somos, assim, na verdade, quase vítimas de tais conhecimentos, pois não sabemos onde, muitas vezes, está a efetiva novidade. Tudo não passa de um continuísmo viral que assim nos projeta ao futuro. Para aqueles que trabalham na Tribuna do Júri, a renovação deve ser um quadro necessário. As verdades muitas vezes apresentadas pela doutrinas já escritas devem ser refletidas.

    Novas diretrizes reforçam a importância daqueles que de fato atuam na área do júri, como também dos que tentam compreender a sua estrutura: o júri deve acompanhar o progresso e as súplicas do povo; entretanto, não podemos ver isso agora e ficar à mercê de uma intencionalidade de legisladores até que o rito do júri seja modificado pela imposição da mídia e do clamor social e novos regramentos.

    Temos assim, visto que o prazo do júri deve ser reduzido, e é bem crível que o número de testemunhas possa ser reduzido num futuro próximo. Por fim, temos notícias de que os réus perigosos devam ficar trancafiados em seu cárcere, e uma câmera com sua imagem ficará na tribuna junto a uma tela. É incrível imaginar-se um telão no qual possamos ver a face dos réus com toda a sua expressão.

    Tudo isso pode acontecer, porque a sociedade, os juízes, promotores e advogados temem os criminosos e o crime organizado.

    Essas não passam de medidas surreais. Esquecem os legisladores de certos princípios seculares, que não permitem, a nosso ver, essa panaceia. Seria então melhor que todos os elementos que compõem o júri fossem transferidos para o presídio. Esquecemo-nos do princípio da identidade física do juiz, uma vez que deve o juiz analisar e julgar – o todo consiste em observar o réu, desde seu pequeno nervosismo até uma breve mentira –, bem como aos jurados analisar a entonação da voz a fim de detectar se o réu está a mentir ou não. São condições necessárias tanto para a condenação como para a absolvição do acusado.

    Não podemos esquecer que o corpo de jurados é livre para decidir e produzir os questionamentos que bem entender. Com isso, não vejo uma aproximação para a solução de um julgamento em prol da segurança, mas sim, cada vez mais e mais, o afastamento do então jurado da análise criteriosa dos pares julgadores do povo.

    Logo, tais avanços acreditamos que sejam apenas uma análise efervescente de clamor social, nada mais do que isso. Mudanças no Tribunal do Júri devem ser sopesadas e muito bem analisadas. Nesse sentido, espera-se que o rigor processual se faça presente; as obliterações sociais devem ser respondidas com inteligência, com medidas duras no combate direto ao crime.

    O texto a seguir demonstrará certos elementos necessários e mínimos para a realização de uma boa atuação no júri. Elementos como estudo rigoroso do processo e das leis, teoria e prática da eloquência, estudos dos grandes oradores, análise das provas, estudo do cenário do crime, discursos de grandes tribunos, estudo dos jurados, são estruturais para a complexão de uma defesa de tribuna. Tudo isso pode ser visto em um espírito prático.

    – 3 –

    DOS CRIMES ADJUNTOS AO JÚRI E A POSIÇÃO NA DEFESA E ANÁLISE DO AGENTE ATIVO

    Ojúri tem a existência dentro de patamares constitucionais, estando de forma pétrea na Constituição, o que o torna quase impossível de ser modificado. A instituição do júri é reconhecida com a organização que lhe der a lei, assegurados:

    • a plenitude de defesa;

    • o sigilo nas votações;

    • a soberania dos veredictos;

    • a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.

    Trata-se, historicamente, de uma relativa segurança constitucional penal, que felizmente, até os dias de hoje, dentro da égide Constitucional, progride pela tradição histórica que foi e sempre será a tribuna do júri. Indispensável dizer, em breves traços, a nossa quase isolada colocação no cenário jurídico internacional sobre a tribuna. Hoje grande parte das nações, com raras exceções, como EUA e sua Grand Court, conseguiu manter a forma do júri. René David (1986, p 445) complementa:

    A instituição do júri foi mais acentuada nos Estados Unidos do que na Inglaterra. O fato acontece nas jurisdições federais em que a instituição do júri é garantida pela própria Constituição dos Estados Unidos (sete emendas): um cidadão pode exigir que a questão seja julgada por um júri, desde que o interesse do litígio seja superior a 20 dólares, com única condição de que não se trata de um processo em equipe. Não foi possível contornar esta regra constitucional e é somente por processos indiretos que se tem conseguido restringir, nos Estados Unidos, de fato, o emprego do júri. Nas jurisdições dos Estados Unidos, pois se a questão, de saber se em virtude da 14ª emenda, do direito do júri, não era garantida, igualmente, aos cidadãos. Foi uma resposta negativa a esta questão: a possibilidade de pedir à constituição do júri é contudo largamente admitida nos diversos Estados. Mais de 100.000 processos são assim julgados em cada ano com a participação dum júri.

    Em grande parte da América Latina, o júri já se extinguiu, não tendo resquício de retorno algum. Como exemplo, temos Argentina (apenas um estado argentino usa o instituto do júri), México, Peru, e ainda países que, historicamente, pouco tiveram ou onde jamais existiu, como Equador e grande parte da América Central.

    Fato é que somente os Estados Unidos conseguiram manter certos princípios inerentes, como o contraditório princípio da oralidade e da publicidade. Exemplo disso é a cultura televisiva, em que a imprensa faz, muitas vezes, a construção do veredicto; em outras, temos avanços de cunho particular de forma incontestável. Temos julgamentos de formas exemplares, que merecem atenção e estudo – além de certa sutileza na análise –, como o caso de O.J. Simpson, em que um negro rico e famoso mata uma mulher branca e acaba absolvido. O caso merece estudo das técnicas e abordagens utilizadas na defesa, pois há quem diga que a razão do seu brilhantismo estaria num conjunto de táticas defensivas, como a análise do corpo de jurados, inserida em um contexto científico psicológico na escolha e atuação, do ponto de vista acusativo e defensivo, no caso em questão.

    Com certeza veremos, mais adiante, a análise dos jurados, sua posição social e seu seguro juízo de convencimento, como também a importância da imprensa na absolvição do jurado.

    É evidente que os grandes crimes, de forma feliz ou infeliz, sempre tiveram o acompanhamento da imprensa. O Brasil não é diferente – vide caso de Zulmira Brandão e, no Rio Grande do Sul, o caso da morte de Daudt, um político e jornalista renomado, e ainda o assassinato do empresário Richthofen, cometido pelos irmãos Cravinhos, tendo o envolvimento da filha da vítima. Nesses casos vimos, desde o início, uma pré-condenação por parte da mídia. Justa ou não, essa imparcialidade prova o reflexo capital do poder da imprensa em casos de grande repercussão, e sua influência nos profissionais da acusação e defesa. Tais casos, sem sombra de dúvida, provam que nossa nação ainda ama o julgamento de grandes crimes. Somos uma sociedade criada nesse meio, vendo a justiça popular ser feita entre seus pares.

    Existem, em nossa doutrina e na história jurídica, grandes criminalistas. Entre tantos, Evaristo de Moraes, militante e defensor fervoroso do plenário do júri, que escreveu vários livros em que é possível apreciar suas defesas brilhantes – que mais tarde se tornariam documentos jurídicos (que mostram, também, como um profissional deve se portar em plenário).

    Suas defesas repercutiram em nosso país; ele despertou a população e trouxe a compreensão de que esta faz parte atuante do plenário, seja relacionada à vítima, seja relacionada ao réu.

    Não obstante, nesse contexto em que o povo vê, analisa e participa no julgamento, vemos que a imprensa age não como mera operadora de informação, mas sim como operadora moral. É um agente que tenta, já no primeiro momento, deliberar sobre o certo e o errado no contexto do acontecido.

    A nossa história de júri está baseada em grandes julgamentos nos quais está contida a presença latente da imprensa. Citamos como exemplo o julgamento do guarda-costas de Getúlio Vargas, Gregório Fortunato Matos, o Anjo Negro. O julgamento de Gregório Fortunato tinha cunho político. O jornalista Carlos Lacerda atacava, via imprensa, Getúlio, com atentados à sua pessoa. O suspeito principal passava a ser Gregório e mais outros réus, que foram logo mais condenados injustamente. A imprensa estava presente nisso, e a população cada vez mais clamava por informação. Por fim, o julgamento foi político, e condenou-se um inocente – Gregório Fortunato –, que veio a falecer durante o cumprimento da pena.

    A história está aí para mostrar que a mídia é um elemento de forte composição condenatória ou absolutória. Basta estarmos atentos às várias publicações jornalísticas existentes. Exemplo que não podemos deixar de alegar é o caso referente à morte do jornalista José Antonio Daudt, membro renomado da sociedade gaúcha, que acabou assassinado na porta do prédio onde morava. Tanto a defesa quanto a acusação foram complexas, haja vista que Daudt era deputado federal e poucos políticos eram processados a época. Destaca-se, nesse caso, além do processo em si, que o julgamento foi transmitido ao vivo, num dos primeiros exemplos de que a mídia tem interesse inconteste de buscar de forma premente a verdade, livre de escamoteios.

    No entanto, cabe ressaltar que os esforços da mídia de divulgar um fato à população muitas vezes em nada vêm a colaborar com a verdade dos fatos, criando uma falsa realidade do processo – daí a importância capital dos que defendem uma causa ou dos que acusam de saber utilizar-se do sigilo profissional. No entanto, diferentemente de épocas passadas, quando tínhamos uma visão de que os homens da imprensa parcamente conheciam o sentido do direito (mas tinham um breve conhecimento do mundo processual do crime, ou ainda, uma simples visão social), temos hoje profissionais de primeira linha. Alguns desses já cursaram faculdade de Direito e são técnicos na arte da informação e da contrainformação. Muitos têm fontes de informação mais capacitadas do que as da polícia judiciária. Mas, com prudência, deve o profissional, principalmente o que fará parte de uma tribuna, refletir sobre até que ponto a mídia deve ser operante no curso do processo extra-autos.

    Vejamos o exemplo notório dos irmãos Cravinhos, que nos oportuniza uma reflexão pertinente: até que ponto a mídia deve ser operante no curso do processo extra autos. No caso da entrevista de uma das filhas do casal morto, o repórter grava todas as instruções dadas pelos advogados à cliente, colocando o microfone junto a eles. O fato mostra, de um lado, a ingenuidade do defensor; de outro, a astúcia do jornalista, que queria todas as informações aguardadas pela população.

    Tal caso deve ser usado como exemplo para os operadores da tribuna, que devem primar por zelo e atenção. Muitas vezes, a arte de bem falar, por mais tenaz que seja o operador, não consegue se sobrepor à mídia, principalmente quando o crime foi executado de forma horrenda ou cruel. Veremos mais tarde nesse caso que os irmãos Cravinhos tiveram dificuldades defensivas decorrentes do juízo pré-condenatório contra os agentes do crime.

    Tais impressões deixadas neste mundo processual dos irmãos Cravinhos, desde a fase policial, passando pela fase instrutória, até a conclusão na tribuna do júri, deixam-nos a refletir sobre como deve ser a preparação do profissional em litígios dessa envergadura.

    Entende-se que a mídia age como um quarto poder, que atinge de forma direta a ampla defesa e, seguramente, o contraditório. Nos casos em que a mídia elabora um julgamento popular, segue-se, então, uma espécie de processo paralelo, com diretrizes próprias, ao fim do qual o réu já está ou condenado ou absolvido. Em grande parte desse julgamento, o redator-chefe é que tabula o dimensionamento da publicação. Certo ou errado, entendemos como um processo invisível em que pouco podemos fazer. Somente os meios do Tribunal do Júri e os tribunos podem, relativamente, analisar, por tratar-se de juízo de valoração, a partir de toda a instrumentalidade jurídica ao seu alcance ou, ainda, usando o poder da oratória.

    Nesse cenário, em que o advogado usa todos os meios pertinentes para a defesa de seu constituído, é que a preparação jurídica deve estar presente. Deve-se valer o advogado de uma análise criteriosa e verificar até que ponto as bases constitucionais estão preservadas.

    O direito à liberdade de informação deve ser contado seguindo um princípio pelo qual possam valer os elementos e a garantia dos indivíduos. A mídia deve ter, acima de tudo, cunho de interesse social, não podendo criar valores supinos, que transformam uma pseudoverdade em verdade absoluta.

    Dizia Afonso da Silva (2016, p248):

    É nesta que se centra a liberdade de informação. Nela concentra-se a liberdade de informar e é nela, ou através dela que se realiza o direito coletivo à informação, isto é a liberdade de ser informado.

    Por outro lado, salvo algum posicionamento jurisprudencial contrário que permita ao advogado contradizer a publicação jornalística que venha a atingir os interesses de um cliente em fase de julgamento, não há a possibilidade da adoção, também, de medidas contra a imprensa, haja vista que, de forma positiva, a Lei no 5250, principalmente na questão do abuso punível, alçado no artigo 15 e nos artigos 14, 16, e 17, não proporciona qualquer ponto confortável para a defesa.

    De forma dialética, acredita-se, tendo a Lei de Imprensa, já na sua formação histórica a presença do Júri, mantendo esse Tribunal para os crimes de jornalistas principalmente na Carta de Lei de 20 de Setembro de 1830 no seu artigo 20.

    Segundo Miranda (1995, p. 707/709):

    A instituição do júri surgiu com os seus primeiros albores na vida jurídica brasileira, exatamente com sua primeira Lei de Imprensa de 18 de julho de 1822, por mérito de José Bonifácio de Andrada e Silva. Como jurados eram escolhidos vinte e quatro cidadãos ‘dentre os homens bons honrados inteligentes e patriotas, os quais serão juízes de fato, para conhecerem da criminalidade os escritos abusivos’.

    O decreto de 22 de novembro de 1823 (nossa segunda lei de Imprensa), sancionador da Carta de lei de 2 de outubro votada pela Assembleia - Geral, Constituinte e Legislativa do Império do Brasil, instituía em seu inciso 21: ‘Em cada legislatura serão eleitos, para juízes de fato, 60 homens bons escolhidos pelos eleitores, da mesma forma que fizeram a eleição dos deputados, e remetida ao Juiz de Direito uma cópia autêntica desta eleição. Ele fará logo escolher uma urna, que se há de guardar no arquivo da Câmara da cabeça da comarca, tantas cédulas quantos forem os eleitos, cujos nomes se escreverão nelas para se extraírem as necessárias nas ocasiões de formar-se o Conselho.’

    O Júri era presidido por um Juiz de Direito sem voto. Da sua decisão só se admitia recurso para os ‘tribunais ordinários dos respectivos distritos’, em dois únicos casos de nulidade do processo: a) por falta de algum dos requisitos legais; b) por não ter o juiz de direito aplicado a pena correspondente.

    A carta de lei de 20 de setembro de 1830, que três meses após se engolfaria no âmbito do Código Criminal, manteve a instituição do júri para o julgamento dos delitos de imprensa, em seus artigos 14 e 15, sendo os jurados eleitos pelos vereadores e eleitores. Das ‘sentenças proferidas por meio do júri não haverá outro recurso senão o de apelação para a Relação do Distrito, quando não tiverem sido guardadas as fórmulas prescritas nesta lei, ou em qualquer outra em que esteja imposta pena de nulidade, ou quando o Juiz de Direito se não conformar com a decisão dos Juízes de Fato, ou não impuser a pena decretada na lei’ conforme o art. 70.

    Com a promulgação do nosso primeiro Código Criminal, em 18 de dezembro de 1830, os princípios contidos na Carta de Lei de setembro do mesmo ano foram incorporados, passando, assim, os delitos de imprensa, para a esfera dos delitos comuns. No entanto, até o ano de 1832, ao ser sancionado o Código do Processo, os delitos de imprensa, na parte referente à competência do júri especial, continuaram a ser julgados por este. Depois disso, houve vários decretos e avisos do executivo esclarecendo a forma e a competência para julgamento dos abusos da liberdade de imprensa.

    Somente em 1923, com a promulgação da Lei Odolfo Gordo (Lei 4.743), em plena era republicana, voltou a imprensa a possuir, de novo a sua legislação própria, desfalcada, porém, do júri especial, restaurado mais tarde pelo Dec. 24.776 e mantido pela Lei no 2085/53.

    Com advento da Constituição Federal de 1946, restabelecida ficou a soberania dos veredictos do júri, eclipsada pelo Dec.-lei 167/38, baixado em plena Ditadura.

    Dizia o § 28 do art. 141 da Constituição de 1946: ‘É mantida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, contanto que seja sempre ímpar o número de seus membros e garantido o sigilo das votações, a plenitude da defesa do réu e a soberania dos veredictos. Será obrigatoriamente da sua competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.’

    Em face desse preceito, alinharam-se de pronto duas correntes - uma sustentando a sua inaplicabilidade ao júri de imprensa previsto no Dec. 24.776/34, outra que não via distinção entre o júri popular e o de imprensa para efeitos da soberania. A jurisprudência, vacilante a princípio, acabou tendendo para a primeira corrente.

    Mesmo depois de promulgada a Lei no 2083, em 11 de novembro de 1953, em plena vigência da Constituição, a maioria dos julgados do Tribunal de Alçada do Estado de São Paulo, que é o competente para conhecer dos recursos, em matéria de abusos da liberdade de imprensa, como os de outros tribunais, e até do STF, vêm se orientando no sentido de negar soberania aos julgamentos do júri de imprensa. Admitem, assim, esses julgados, com apoio em doutos intérpretes, que as decisões desse júri especial são reformáveis pela segunda instância, o que a nosso ver, não tem procedência, uma vez que a Constituição não distingue entre um júri e outro, ubi lex non distinguit, nec interpres distinguere debet.

    Dizia ela: ‘É mantida a instituição do júri’; e mantida como? ‘Com a organização que lhe der a lei’, esclarecia o texto. E como se devia entender aquela expressão?

    Ninguém melhor que Rui Barbosa, o maior de nossos juristas, para defini-la. E ele o fez, referindo-se ao Dec. 1.030, de 14 de novembro de 1890, que organizou a justiça no Distrito Federal, e à Constituição de 1891, de modo lapidar, versando sobre a teoria e a prática da instituição, no seguinte trecho:

    Eis a situação, no tocante a essa parte das nossas instituições, quando o pacto republicano (1891) encerrou a sua declaração de direitos com este fecho: ‘É mantida a instituição do Júri.

    Como forma de garantia constitucional, somente com a Constituição de 1891 que o júri foi inserido no contexto dos direitos e garantias e, em 1934, ingressa aquela instituição de julgamento nas disposições da Secção do Poder Judiciário, tipificado no seu artigo 72. É mantida a instituição do júri, com a organização e as atribuições que lhe der a lei, sem valoração alguma, já que em 1937 foi retirada da Constituição Federal, e volta como forma de lei processual, não merecendo fundamento constitucional. No entanto, em 5 de janeiro de 1938, foi promulgado o Decreto-Lei no 167, instituindo a necessidade do instituto do júri e sua regularização. Evidente

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