Encontre milhões de e-books, audiobooks e muito mais com um período de teste gratuito

Apenas $11.99/mês após o término do seu período de teste gratuito. Cancele a qualquer momento.

O Samba no Rádio
O Samba no Rádio
O Samba no Rádio
E-book340 páginas4 horas

O Samba no Rádio

Nota: 0 de 5 estrelas

()

Ler a amostra

Sobre este e-book

O livro aborda de forma inédita a história do samba no rádio no Rio de Janeiro, analisando momentos relevantes, programas pioneiros e representações fundantes do imaginário coletivo sobre o gênero musical que é "a cara do Brasil" e que, por mais que agonize, nunca morrerá, resistindo pela força de sua tradição e de suas novas gerações às barreiras do mercado radiofônico e musical.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento9 de fev. de 2018
ISBN9788547307639
O Samba no Rádio

Relacionado a O Samba no Rádio

Ebooks relacionados

Métodos e Materiais de Ensino para você

Visualizar mais

Artigos relacionados

Avaliações de O Samba no Rádio

Nota: 0 de 5 estrelas
0 notas

0 avaliação0 avaliação

O que você achou?

Toque para dar uma nota

A avaliação deve ter pelo menos 10 palavras

    Pré-visualização do livro

    O Samba no Rádio - Lena Benzecry

    Editora Appris Ltda.

    1ª Edição - Copyright© 2017 dos autores

    Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.

    Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.

    Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores.

    Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO

    Para minha família, que resolve todas as diferenças cantando samba ao redor do piano percussivo de meu pai, José.

    E a Kelly Martins (em memória).

    AGRADECIMENTOS

    Em primeiro lugar, agradeço a todas as pessoas com quem trabalhei, estudei e aprendi ao longo dos quatro anos de doutorado no Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura da ECO/UFRJ, a começar pelo meu orientador Micael Herschmann e co-orientadores: Marcelo Kischinhevsky (UERJ) e Luís Albornoz (UC3M). Aos colegas do programa de pós, em especial à tchurminha formada por Aline Junqueira, Camila Calado, Daniel Fonseca, Jhessica Reia, Lia Carreira, Luiz Henrique Coletto, Sarah Quines, Tarcísio Bezerra e Thiago Meneses Alves. Desde que ingressamos no programa, em 2011, estabelecemos um elo que permanece até hoje, mesmo com os diferentes caminhos que cada um tomou na vida. Apesar das alegrias vividas, infelizmente sofremos uma perda irreparável no dia 19 de setembro daquele ano, quando nossa colega e amiga, Kelly Cristina Martins da Cruz, nos deixou abruptamente. Mas a oportunidade de ter convivido com pessoa tão humana, dedicada e perseverante, mesmo que por um período tão curto, marcou a todos nós e, em respeito ao amor que Kelly tinha pelo samba, dedico este livro a ela também. Aos professores do PPGCOM, também ressalto meu agradecimento, assim como ao funcionário Thiago Couto, pela presteza com que sempre atende aos alunos enlouquecidos com suas dissertações e teses.

    Às instituições CNPq e Capes, agradeço pelas condições de poder estudar aqui no Brasil e na Espanha, onde cursei o sanduíche na Universidade Carlos III de Madrid, ao lado de profissionais generosos, em especial: Nacho Gallego, Alejandra Val, Asier Aranzubia, Francisco Utray (Paco), Peilei Ye e Fernando Silva. Ainda entre as pessoas queridas com quem convivi em Madrid, agradeço à minha cicerone Isabelle Sakena e aos amigos Luciana Noronha, Rodrigo da Mata, Rafaela Marques, Ariel D´Avila, Paulinha Albuquerque, Rafaela Ventz, Aninha Rodrigues, Fernando Abdalla, Kátia Pataro, Diana Chamma, Fernando e Ricardo Perez, que não deixaram o samba morrer em solo espanhol.

    Agradeço de coração a todos os entrevistados que aparecem nas próximas páginas deste trabalho, em especial, ao radialista Adelzon Alves, que manteve a porta de seu estúdio na Rádio Nacional do Rio de Janeiro aberta para me receber sem nenhum tipo de burocracia, todas as vezes em que precisei. Agradeço também à própria emissora, na pessoa do coordenador Marcos Gomes, e toda equipe do programa Adelzon, o amigo da madrugada: Carlos Alberto Oliveira, Soraya Alves, Gabrielzinho do Irajá, além dos técnicos de som, Ernani, Rui e Luís. Agradeço imensamente também à emissora MPB-FM, lamentavelmente extinta, pouco tempo antes deste livro ser publicado. Mais diretamente, agradeço ao gerente de programação Luciano Gomes, à gerente de marketing Viviane Groisman e toda equipe do programa Samba social clube, principalmente, à radialista Valéria Marques, ao programador musical Bruno de Paula e à produtora Bárbara Vianna, pela gentileza e presteza com que me receberam e contribuíram com esta pesquisa.

    Agradeço também aos músicos do Samba do trabalhador, Álvaro Santos, Gabriel Cavalcante, Luiz Augusto e Moacyr Luz, pelos depoimentos prestados, e ao produtor do grupo, Nano Ribeiro, por ter intermediado a nossa aproximação. Agradeço também ao cantor e percussionista Pedro Miranda, pelo longo papo que batemos e, embora não apareça na íntegra aqui neste livro, certamente irá inspirar outros textos sobre música, samba e Rio de Janeiro. Ao músico Luís Filipe de Lima e ao radialista Robson Aldir sou grata pela oportuna conversa sobre samba, pagode e outras bossas no rádio contemporâneo. Um papo que apesar de ter ocorrido já no final da pesquisa, inspirou (e muito) as considerações finais.

    Além das vozes que falaram diretamente para esta pesquisa, precisei contar com a colaboração dos funcionários do Museu da Imagem e do Som do Rio de Janeiro, Luiz Antônio Almeida e Yuri Baptista Menezes, para acessar os acervos sonoros pesquisados. Sem a ajuda deles, a pesquisa histórica não teria tido a menor graça.

    Por fim, agradeço aos amigos da vida e do samba e aos colegas dos Grupos de Pesquisa em Rádio e Mídia Sonora que participo (Intercom, Rede Alcar e Audiolab UERJ), pelo acolhimento e aprendizado a cada encontro.

    APRESENTAÇÃO

    Sobre o samba, em nome do rádio e pelo campo da Comunicação

    Tudo começou a partir de um desejo pessoal de estudar o samba no rádio. De imediato, dezenas de perguntas rondaram meus pensamentos ou foram colocadas por pessoas com quem conversei a respeito. Que samba? Em que rádio? Por que fazer isso? Como fazer isso? Focar no momento presente? Mas como não referenciar ou até mesmo, reverenciar, o passado? Qual o recorte possível para a realização de um estudo sobre o samba no rádio: geográfico, temporal, biográfico?

    Basear-me na trajetória do rádio brasileiro para, a partir daí, observar o percurso do samba era o método que me parecia mais viável e, ao mesmo tempo, o prenúncio da maior das loucuras. Afinal, enquanto o gênero acaba de completar cem anos de vida, o rádio está quase lá, e pesquisadores da área apontam que, desde os primórdios da radiodifusão sonora no país, o samba era executado em programações musicais sazonais, como aquelas realizadas em meados da década de 1920 pela Rádio Clube do Brasil (FERRARETTO, 2001).

    Por outro lado, falar do presente sem antes lembrar o passado e de como tudo começou seria, no mínimo, frustrante. Parecia imprescindível, desde o início, estudar toda a jornada do samba no rádio. O desafio, então, passou a ser encontrar uma forma de contar, ou de pelo menos, começar a contar, a história do samba no rádio.

    Inserida no campo da Comunicação e apaixonada por História, procurei na interlocução entre esses dois campos, montar a minha versão dos fatos. Para dar o pontapé inicial, era preciso pensar numa forma de recortar a pesquisa para torná-la exequível, mesmo que, mais adiante, ela viesse a ser continuada de alguma outra maneira.

    Na tentativa de encontrar uma solução, busquei apoio em perspectivas teóricas para as quais importasse o processo histórico dos meios de comunicação, das indústrias culturais e da música popular. A partir daí, o trabalho estabeleceu um diálogo entre a Economia Política da Comunicação e os Estudos Culturais, embasando uma escrita da história inspirada na História Cultural (BURKE, 2008) e em sua inserção no campo da História da Comunicação (RIBEIRO; HERSCHMANN, 2008).

    Como resultado, o leitor encontrará aqui um primeiro esforço rumo à escrita da história do samba no rádio e a certeza de que este é um trabalho para toda a vida, porque samba e rádio são temas de tamanha riqueza, que mesmo que agonizem, nunca morrerão. Boa leitura!

    Lena Benzecry

    PREFÁCIO

    Pontes necessárias

    O rádio, obrigatoriamente, vive de seu público e do que oferece a ele. Apesar das pesquisas de opinião e do enorme cabedal de recursos disponíveis, há, no entanto, uma diferença considerável entre o que, para a sobrevivência comercial de uma estação, tem de ser ofertado e o que, em função de se tratar de uma outorga pública, deve ser ofertado. No primeiro caso, reduz-se o meio à quantidade de ouvintes passível de ser obtida por meio da programação, uma audiência que se converte em faturamento ao ser usada como base da comercialização de anúncios e patrocínios. No segundo, considera-se a existência de uma espécie de dever do rádio, que, por trás da estação em si – na maioria das vezes, um negócio –, ampara sua existência no poder público, como representante da sociedade, a obrigar um uso para além dos cifrões. O rádio, nesse sentido, deve – tem a obrigação de – valorizar a cultura nacional, difundindo-a junto ao público. E, por óbvio, não há ritmo mais associado ao Brasil do que o samba. É essa ponte entre o meio e a musicalidade a proposta básica deste O samba no rádio: do Rio para o Brasil, um estudo que procura dar conta também do que, ao longo do tempo, o negócio rádio tem de oferecer e do que deve ser ofertado ao público.

    Há outras pontes construídas nesta obra, originalmente a tese de doutorado de sua autora no curso de pós-graduação em Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro e que, agora, ganha maior amplitude ao ser publicada em livro. Há a ponte quase natural ao relacionar o conteúdo e o público, as necessidades de quem produz a programação – a emissora em si – e quem vai recebê-la. A análise em si, ao olhar da universidade para o mercado, já apresenta outras pontes relevantes. Ao construí-las, Lena Benzecry aproxima a economia política da comunicação dos estudos culturais. O que poderia soar algo estranho para pesquisadores mais ortodoxos tem plena sustentabilidade na própria origem dessas bases teóricas: o campo crítico. Na linha de outros estudiosos que a precedem, onde pensar apenas o mercado, sua mecânica e suas relações não dá conta da problematização buscada, a autora lança mão, desse modo, de formulações como a do circuito cultural, buscando complementações e mesmo contrastes.

    Nesse sentido, Lena Benzecry caracteriza adequadamente o momento das emissoras em relação aos programas escolhidos para a análise – rádio espetáculo, rádio pós-televisão e rádio pós-internet –, fazendo o mesmo no que diz respeito às transformações ocorridas no gênero musical que toma também como objeto de estudo, construindo classificações – samba como símbolo nacional, samba como música de resistência e samba como música de raiz. São muitas pontes com propostas para várias interlocuções interessantes e procedentes: rádio e samba, comunicação e história, comunicação e música, mercado e academia, relações econômicas e culturais, o radialista e o artista...

    Não se trata de tarefa simples ou fácil. Por exemplo, a autora precisou enfrentar o desafio metodológico representado pela ausência de registros sonoros mais adequados à pesquisa no que diz respeito ao Programa César de Alencar e ao Adelzon Alves, o amigo da madrugada, este último em sua fase na Rádio Globo. Em realidade, Lena Benzecry recupera histórica e analiticamente a relação do samba com esses dois programas fundamentais na trajetória do rádio brasileiro. Ao incluir em seu trajeto de pesquisa o Samba Social Clube, aborda o tema na contemporaneidade. Contempla, desse modo, as várias fases em que, dentro da história do rádio brasileiro, dá-se a hegemonia das emissoras comerciais.

    Em realidade, indo do rádio para o samba e do samba para o rádio, este livro lança luz sobre parcela significativa da produção cultural brasileira. Deve-se observar que um programa de rádio não se restringe ao seu universo próximo, a cidade ou a região em que se dá a sua irradiação em amplitude ou frequência modulada. Mesmo quando o meio tomava, mercadologicamente, a sua audiência sem segmentá-la ou já dividia esse público em parcelas – o que busca notícia ou entretenimento, o mais elitista ou o mais popular, o de determinado tipo de gosto –, formatos de atrações de sucesso como o do Programa César de Alencar e do Adelzon Alves, o amigo da madrugada eram copiados por outras estações brasileiras. Na atualidade, graças à rede mundial de computadores, a associação por empatia proposta no próprio título de um Samba Social Clube ultrapassa os limites geográficos do Rio de Janeiro.

    Talvez a melhor definição da importância do que aparece registrado aqui esteja, quebrando certa sisudez acadêmica, no subtítulo deste livro: As representações que marcaram o gênero musical que é a cara do Brasil, ao longo de sua trajetória radiofônica. Rádio e samba são, sem dúvida, a cara do Brasil, duas faces da autenticidade cultural do país que aparecem desveladas em suas relações nas páginas seguintes.

    L

    uiz

    A

    rtur

    F

    erraretto

    Professor do Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Informação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGCOM/ UFRGS)

    SUMÁRIO

    CAPÍTULO 1

    A representação do samba urbano carioca no rádio do Rio de Janeiro

    1.1 Radiodifusão e produção de sentidos: o que fica para a história?

    1.2 Métodos e visões acerca da periodização da história do rádio: um norte para a pesquisa

    1.3 Métodos de pesquisa: problemas e soluções

    1.4 Conceitos e teorias para se entender a representação do samba

    1.5 Por que estudar as representações do samba urbano carioca no rádio do Rio de Janeiro?

    1.6 O samba para além do gênero...

    1.7 De que samba trata-se aqui?

    1.8 De que rádio trata-se aqui?

    CAPÍTULO 2

    A consolidação da radiodifusão sonora no Brasil e a escalada do samba no rádio do Rio de Janeiro

    2.1 Programa César de Alencar: o rádio espetáculo e a ascensão do samba na radiodifusão sonora do Rio de Janeiro (1945-1964)

    2.2 A César o que é de César

    2.3 As rainhas do rádio e o rei dos ritmos brasileiro

    2.4 Rádio espetáculo: da popularização excessiva à busca pela reelitização

    2.5 O declínio do rádio espetáculo e do samba na programação radiofônica

    CAPÍTULO 3

    O rádio pós-televisão: Adelzon Alves e a contra-hegemonia musical no rádio carioca

    3.1 A fase comercial de Adelzon Alves e a sua atuação como porta-voz do samba na radiodifusão sonora do Rio de Janeiro (1966-1990)

    3.2 O combate ao colonialismo cultural marca o caráter de resistência do samba

    3.3 Resistir é preciso: marcas do samba na indústria da música dos anos 60

    3.3.1 Da clandestinidade à preferência nacional: o fenômeno Adelzon Alves

    3.4 O tempo presente de Adelzon Alves, o amigo da madrugada

    3.4.1 Espaço do sambista: microfone a postos para os artistas não midiáticos

    3.5 O samba no rádio após Adelzon Alves, o amigo da madrugada

    CAPÍTULO 4

    O samba no rádio comercial hoje: as consequências do passado

    4.1 Samba social clube, início, meio e recomeço

    4.2 Um discurso uníssono dá identidade ao programa

    4.3 Samba social clube: modus operandi, programação musical e construção de sentidos

    4.4 O Camarote do samba: identidade e representação do sambista em foco

    4.5 Alguém sempre te socorre...

    CONSIDERAÇÕES FINAIS

    Um novo ciclo para o samba no rádio, ou um novo rádio para o samba?

    REFERÊNCIAS

    CAPÍTULO 1

    A representação do samba urbano carioca no rádio do Rio de Janeiro

    Não é de hoje que as noções do samba urbano carioca como música símbolo do Brasil, música de resistência e música de raiz são incorporadas pelo senso comum sem grandes questionamentos. Podemos ouvi-las em discursos ora mais, ora menos apaixonados, sem que, no entanto, as pessoas se perguntem: mas por que o samba se consagrou como o primeiro gênero musical ligado à identidade cultural brasileira? Não seria o caso do jongo ou do choro terem recebido essa coroação? Afinal, são gêneros reconhecidos como seus antecessores. Ou por que não o frevo, nascido no coração do Nordeste brasileiro e mais velho alguns anos, não recebeu tal consagração?

    Paradoxalmente, mesmo atingindo tamanha valoração, o samba urbano carioca voltou a sofrer preconceito, ficando marcado como um ritmo perseguido que tanto agoniza, mas nunca morre. Convém ainda questionar de onde vem a necessidade de se distinguir, dentro do vasto universo musical do samba, aquele que é de raiz, associando-o a uma tradição de valor superior aos demais estilos existentes.

    Todas essas formas de representar o samba urbano carioca, tão naturalizadas na atualidade, não se deram da noite para o dia. Ao contrário, conforme este livro procura mostrar, foram construídas durante anos e anos, em sintonia com os cenários políticos, econômicos e socioculturais vigentes no país, tendo encontrado na capacidade de difusão dos meios de comunicação de massa uma contribuição arrebatadora.

    O exercício de investigar o rádio e o samba brasileiros remete imediatamente a um local específico do mapa nacional: o Rio de Janeiro. Nem o mais crítico dos críticos poderia negar, hoje em dia, que a cidade se consagrou como palco referencial da radiodifusão sonora no país e como berço do samba, mesmo que esse samba tenha vindo lá da Bahia. Por isso, este trabalho foi pensado a partir do Rio de Janeiro e da forma de se fazer rádio e de samba produzidos na cidade. Como resultado, a pesquisa desenvolvida enfocou o papel da radiodifusão sonora do Rio de Janeiro no processo de significação do samba, a partir do estudo da influência de determinados programas de rádio que fizeram e ainda fazem muito tanto pelo samba, quanto por seus personagens.

    Graças ao seu pioneirismo, o rádio carioca experimentou e estabeleceu padrões para formas de financiamento, linguagem e programação que acabaram predominando em todo o território nacional, especialmente no âmbito das emissoras musicais, que a propósito e não por acaso, herdaram os padrões do rádio musical estadunidense, sempre em sintonia com o quê e como se criavam as atrações daquele país (SHWOCH, 1990; KISCHINHEVSKY, 2007).

    O samba urbano carioca, como se sabe, nasceu na zona portuária da cidade do Rio de Janeiro e, embora tachado em sua origem como uma cultura marginal, com o passar do tempo alcançou instâncias de consagração, dentre as quais se inclui o rádio, que o elegeram como um tipo de música e, mais ainda, um tipo de samba representativo do país, interna ou externamente (VIANNA, 1995; SANDRONI, 2001; FROTA, 2003, entre outros). Em virtude disso, a história do samba urbano carioca, no rádio do Rio de Janeiro, não é uma temática essencialmente local, como a maioria das pessoas deve imaginar, mas sim global, e deve ser pensada de forma macro, a partir da relação que se estabeleceu entre o rádio e a música popular em todo o mundo, sobretudo nas sociedades modernas capitalistas.

    Para iniciar a escrita dessa história foram selecionados três programas específicos, produzidos a partir de emissoras do Rio de Janeiro, e dedicados à execução do samba em suas programações. São eles: o Programa César de Alencar, transmitido pela Rádio Nacional do Rio de Janeiro entre os anos de 1945 e 1964; o programa Adelzon Alves, o amigo da madrugada, transmitido desde 2009 pela mesma emissora, porém historicamente consagrado na Rádio Globo AM, onde permaneceu interruptamente no ar entre os anos de 1966 e 1990; e o programa Samba social clube, transmitido entre 2006 e 2017 pela emissora comercial MPB-FM.

    A seleção desses três programas foi o primeiro grande desafio para a realização deste livro, mas se justifica pelo fato de cumprir um percurso cronológico que permitiu alcançar três resultados essenciais para a pesquisa. Em primeiro lugar, destaca-se a vantagem de ter sido possível, a partir desses programas, caracterizar três momentos fundamentais da história do rádio brasileiro, aqui chamados de: época do rádio espetáculo, baseada em nomenclatura sugerida por Ferraretto (2001); época do rádio vitrolão (pós-televisão); e época do rádio convergente (pós-internet). Em relação a essa última época, deve-se frisar que o rádio sobre o qual se trata é o dito tradicional, transmitido por ondas hertzianas, mas que passou a coexistir com o rádio feito na e pela internet¹.

    Em segundo lugar, os programas selecionados permitiram que se traçasse um panorama a respeito do espaço ocupado pelo samba urbano carioca no rádio do Rio de Janeiro durante esses três momentos significativos. Finalmente, em terceiro lugar, permitiu uma reflexão crítica acerca das estratégias de construção de sentidos adotadas por tais programas e seus apresentadores que, ao atuarem como porta-vozes do samba no rádio, serviram de maneira essencial ao processo de construção das principais representações que envolvem o samba urbano carioca. Entre as quais, destacam-se neste trabalho: o samba como símbolo nacional; o samba como música de resistência e o samba como música de raiz, ou, simplesmente, como samba de raiz.

    Ao longo da pesquisa, pretendeu-se comprovar que essas três formas de significar o samba foram amplamente disseminadas e fortalecidas pelo rádio do Rio de Janeiro, até serem incorporadas pelo senso comum. Ao longo do trajeto, nota-se, porém, que a ação de tais programas e de seus respectivos apresentadores esteve ora em consonância, ora em dissonância com os projetos de hegemonia cultural que se pretenderam para o Brasil, e que contaram com forte apoio da indústria do rádio e da música em geral.

    O Programa César de Alencar é reconhecido pela bibliografia especializada como referência de uma época em que o rádio brasileiro era concebido como espetáculo, e o próprio César é frequentemente mencionado como um animador de auditórios e homem de negócios exemplar. Sua atuação no âmbito radiofônico marcou a consolidação do rádio brasileiro em sua vertente comercial, voltada para o entretenimento (VIEIRA, 1993; SAROLDI; MOREIRA, 2006, entre outros).

    Já o programa Adelzon Alves, o amigo da madrugada, que também leva o nome de seu apresentador no título, marcou a estreia do rádio 24 horas na Rádio Globo (1220 AM), numa época em que o meio passava por contundentes transformações para lidar com a perda de sua centralidade como meio de comunicação de massa, diante do surgimento da televisão. Atualmente, o programa compõe a grade da Rádio Nacional do Rio de Janeiro (1130 AM), sendo ainda, bastante fiel ao seu formato inicial. Seu eterno apresentador, Adelzon Alves, é uma figura reverenciada no mundo do samba, tanto como radialista quanto como produtor de discos, tendo sido o responsável pela produção dos primeiros discos de carreira de artistas como Clara Nunes e Roberto Ribeiro, e dos primeiros sucessos em nível nacional de Martinho da Vila e Paulinho da Viola.

    Por último, mas não menos importante, o programa Samba social clube ocupou, desde 2006 até princípios de 2017 o horário nobre dos finais de

    Está gostando da amostra?
    Página 1 de 1