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Don Juan Don Giovanni: Peça em dez jornadas
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Don Juan Don Giovanni: Peça em dez jornadas
E-book356 páginas2 horas

Don Juan Don Giovanni: Peça em dez jornadas

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Sobre este e-book

"Don Juan-Don Giovanni - Peça em dez jornadas" foi escrito por Marcus Accioly à exaustão, já que ele imaginara esta obra como sua última. Nela, percebe-se a grandeza épica e trágica – a par com o burlesco –, de grande beleza verbal, característica marcante da poesia do autor. Durante a leitura deste livro é possível ver o resgate da figura de Don Juan, cujos jogos de erotismo e sedução, em debates com as mulheres e com o diabo, revelam as inconsistências da condição humana e recusa/atração da morte.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento12 de dez. de 2018
ISBN9788578587352
Don Juan Don Giovanni: Peça em dez jornadas

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    Don Juan Don Giovanni - Marcus Accioly

    Ficha catalográfica

    Copyright © 2018 Marcus Accioly

    Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, que entrou em vigor no Brasil em 2009.

    Direitos reservados à

    Companhia Editora de Pernambuco — Cepe

    Rua Coelho Leite, 530 — Santo Amaro

    CEP 50100-140 — Recife — PE

    Fone: 81 3183.2700

    A171d

    Accioly, Marcus, 1943-2017

    Don Juan-Don Giovanni : peça em dez jornadas/Marcus Accioly ; prefácio Carlos Nejar. – Recife : Cepe, 2018.

    1. Poesia épica brasileira – pernambuco.

    I. Nejar, Carlos, 1939-. II. Título.

    CDU 869.0(81)-1

    CDD B869.1

    PeR – BPE 18-715

    ISBN: 978-85-7858-735-2

    Para Glória

    Necessito um herói, necessidade pouco comum nestes tempos, em que, a cada ano, a cada mês, surge um novo até que, cheias de seus elogios as gazetas, o século averigua que aquele não é um herói verdadeiro. Nenhum destes me convém. Cantarei, pois, a nosso amigo Don Juan, a quem todos temos visto, na pantomima, ir-se com o diabo, pouco antes que lhe chegasse a hora.

    Lord Byron

    Amanhã numa taverna poderás achar Romeu com a criada da estalagem, verás D. Juan com Julieta, Hamlet ou Faust sob a casaca de um dandy. É que esses tipos são velhos e eternos como o sol.

    Álvares de Azevedo

    Aquele que busca não tem, ainda não conhece o que busca e, por outro lado, buscar é já ter de antemão e presumir o buscado. Buscar é antecipar uma realidade ainda inexistente, predispor sua aparição, sua representação. Não compreende o que é o amor aquele que, como é comum, repara só no que desperta e dispara.

    Ortega y Gasset

    Desde que surgiu sobre a Terra — ou porque foi expulso do paraíso ou porque é um momento da evolução universal da vida — o homem é um ser incompleto. Nasce e logo foge de si mesmo. Aonde vai? Anda em busca de si próprio e se persegue sem cessar. Nunca é ele e sim o que quer ser, o que busca; e ao se alcançar, ou acreditar que se alcançou, desprende-se novamente de si, desaloja-se, e prossegue sua perseguição.

    Octavio Paz

    Eu confesso a minha concessão. Tirar a rolha a esta garrafa de champagne é também uma concessão, e agora que já estou a beber — concedo. A garrafa está vazia; acabou-se a concessão. O mesmo com as mulheres.

    Sören Kierkegaard

    Nisso minha ambição é igual à dos grandes conquistadores, que voam eternamente de batalha em batalha, jamais se resignando a limitar sua ambição. Também não faço nada refreando a impetuosidade dos meus desejos. Minha vontade é seduzir a Terra inteira. Como Alexandre, lamento que não haja outros mundos para estender até lá minhas conquistas amorosas.

    Molière

    Há três coisas formosas: o mar,

    o Hamlet e Don Giovanni.

    Flaubert

    O padre franciscano — Então o senhor não acredita em nada, Don Juan?

    Don Juan — Sim, padre, em três coisas.

    O padre — Pode-se saber quais?

    Don Juan — Acredito na coragem, na inteligência e nas mulheres.

    .......................................................................................

    Por fim, exclama uma delas, te dei o amor. Não surpreende que Don Juan ria dela: Por fim? Não, diz ele, Outra vez.

    Albert Camus

    Ao pisarmos, no fundo, o firme leito,

    vimos acima os diabos assomando;

    mas de descer não tinham eles jeito.

    Dante

    Que o teu espírito esteja bem persuadido de que todas as mulheres podem ser tomadas; tu as tomarás; apenas lança a tua rede […] Até aquela que tu poderás crer que não quer, vai querer. […] Portanto, vai, não hesites em esperar triunfar sobre todas as mulheres.

    .......................................................................................

    É a experiência que me dita esta obra: escutem um poeta ensinando pela prática.

    Ovídio

    É que, através da vida, arrasto milhares de enormes e puros amores e milhares de milhares de amorzinhos pequenos e sujos. Não temas que de novo na desgraçada infidelidade me aproxime de mil caras bonitas amantes de Maiakovski

    Maiakovski

    Tornais, vós, trêmulas visões que outrora

    Surgiram já à lânguida retina.

    Tenta reter-vos minha musa agora?

    Inda minha alma a essa ilusão se inclina?

    À roda afluis! reinai então nesta hora

    Em que assomais do fumo e da neblina;

    Torna a fremir meu peito com o bafejo

    Que vos envolve em mágica o cortejo.

    Goethe

    Mulheres que eu amei! Anjos louros do céu! Virgens serenas! Madonas, Querubins ou Madalenas! Surgi! aparecei!

    ..................................................................

    Serei… Que importa? o D. Juan da morte Dá-me teu seio e tu serás Haideia!

    Castro Alves

    Conquista a morte com todos os teus apetites, com teu egoísmo e todos os pecados capitais.

    Rimbaud

    Don Juan-Don Giovanni, de Marcus Accioly

    Carlos Nejar*

    Marcus Accioly, o grande poeta de Pernambuco e do Brasil, nasceu em Aliança, faleceu no dia 21 de outubro de 2017, na sua casa em Itamaracá. E agora publica seu livro póstumo, o que também imaginou como sua última obra. Escreveu-o à exaustão, para não deixá-lo inacabado, já sentia rondá-lo a Indesejada das Gentes, não querendo imitar Byron, que morreu na Grécia e não pôde concluir o seu Don Juan. Assim, Marcus Accioly buscou, febrilmente, um livro que o terminasse. Conseguiu. E os leitores perceberão a grandeza épica e trágica deste texto. Que o fôlego e a beleza verbal sempre foram características de sua Poesia, desde Sísifo, Narciso, Íxion, Latinomérica e outros, com substancial vocação aos mitos, esses que são arquétipos do inconsciente coletivo, por ser ele coletivo, intenso, inventivo. Visceral.

    O caminho de Don Juan-Don Giovanni começou com o herói de Tirso de Molina, O burlador de Sevilla, continuou com Molière (Le festin de Pierre), Don Giovanni, de Mozart, através do livreto de Lorenzo da Ponte, Don Juan Tenório, de José de Zorilla e as famosas Memórias de Casanova.

    Entretanto, a criação de Accioly é tão pessoal, arrebatadora, entre tragédia e comédia, que demarca singular ludismo, desatado no afeto entre homem e mulher. Ou da condição humana consigo mesma, até o paroxismo. E curiosamente, as epígrafes, que parecem longas, são básicas para traçar o roteiro de seu portentoso livro. E o fruto da palavra não é proibido, é denso de descobertas, fazendo com que a natureza seja cúmplice e a árvore do paraíso, chancela.

    Não sei se um povo é feliz ou infeliz ao precisar de heróis por serem os heróis ainda a resistência da bravura ou da alteza, ou da lucidez subjacente de terrestre estirpe. Mas os poetas, ao criarem seus personagens, ou serem criados por eles, põem nisso o gênio da admiração. E observou bem Kierkegaard que o poeta não pode realizar o que realizou o herói. Basta cantá-lo e admirá-lo, logrando assim, na empreitada, ser o próprio herói. E em se tratando de mitos, ou matéria escondida no esquecimento de um povo, versa, do mesmo modo, sobre a comburente matéria da memória, que vai no fogo das gerações, como um cometa. E Marcus possuía esse fogo, a imagética de um sonho misturado ao ato de gerar o futuro, o que é raro, sendo a palavra: futuro.

    Seu livro se divide em Jornadas (da Primeira à Décima), entrelaçando com Don Juan-Don Giovanni, a Estátua de Pedra, o Diabo, criados e as mulheres, entre elas, bruxas e a Morte. Com homens, juiz, promotor, advogados, jurados, testemunhas, depoentes, tendo a representação de Vozes, Ecos, Sombras. Por trabalhar o silêncio no arcabouço da fala.

    Marcus Accioly alcança o maravilhoso, tecendo diálogos vivos, aliciantes, onde os versos se alçam com toque altamente encantatório, mas real, definido. Sendo o vivo, decisivo sempre. Sem perder o visionário e o direito à alucinação, com amor, humor, riso, o cantochão do limite humano. A arte do poeta e do teatrólogo, a arte do ficcionista e do historiador do sonho. E vez e outra, encontra Íxion, Sísifo (não seria a despedida de suas criaturas?), ou Ulisses, Édipo, ou habitantes do Averno.

    E é audível o clamor das mulheres: A ele tudo eu daria,/ como tudo dei a ele:/ alma, coração e pele./ Não sei se mais poderia (Hercília). Ou Ele olhava e não me via,/ me atravessava com o olhar,/ eu deixei-me atravessar./ Não sei se mais permitia (Heloísa). Ou a voz de Eliane: Disse que eu o possuía/ e me possuiu, ai, quando/ foi entrando, foi entrando./ Não sei se mais entraria. Esse entremear de mulheres engendra o fio da sedução e da aceitação, o erótico no casulo da metáfora, mostrando de forma veraz o jogo de idas e voltas do regato amoroso. E o ritmo vai mudando conforme as circunstâncias, um ritmo ora inquietante, ora coloquial, ora vibrante, ora obsequioso. O ritornelo da conquista e da entrega. E o fascínio vocabular: […] a noz estava no dentro/ da nogueira e, ambas no centro/ da fala e silêncio. Não permitindo jamais que o tino crítico esmorecesse. Era a paixão meu limite/ e ultrapassou a loucura/ do coração. Acredite:/ sou aquém da sepultura/ e além da morte. Ou […] do amor com que me prendes,/ e, fósforo em mim, me acendes.

    Marcus Accioly guarda neste livro correnteza de imagens que se completam, que se atraem e se juntam no equilíbrio de sua própria e impositiva maré. Numa nova épica-lírica-

    -burlesca, em novo Simbolismo. Porque nada o segura, com uso de verbos de ação, verbos solidários no repuxo, onde o mover das bruxas e a discussão de Don Juan com o Diabo, convivem, dialogicamente, com o último Fausto de Goethe, pois faustiano é o drama do amor e da salvação, pacto acontecido no Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. Mais sutilmente em Mon Faust, de Paul Valéry. Aliás, é esse notável poeta francês que exclama: No topo da natureza viva encontrei o terror. E o que vai subterrâneo neste drama em versos é o terror. Na alegoria do amor, a explosão da morte, em quem quer viver. Pois, adverte a Morte no texto de Accioly:

    Guardo, amado, a minha foice/ e a capa negra da noite/ sacudo dos ombros, vem!/ […] Mas a mim já não convém/ te levar e sim ficar/ contigo. Estavas no mar,/ na terra, no ar e no fogo/ e contigo estou. Vem logo/ e sê meu amante, vem,/ que a morte é amante também!

    E, aqui, não se revela apenas alta poesia, há uma carnavalização, a que alude Bakhtin, ao estudar a obra de Rabelais. No absoluto, a limitação; no amor, o desespero de as coisas findarem; e nas coisas, a certeza camoniana de que tudo se dissipa como nas folhas o pó.

    O que não desaparece na leitura deste drama é sua música, o prazer do amor no prazer do verso. E se amargura contém, traz certo laivo de bondade, que é a irrupção do humor, o riso de que é feito o homem, segundo o autor de Pantagruel.

    Por sinal, paira um gigantismo na poesia de Accioly, a força de reconhecer-se Terra, de ser um Nordestinado. Difícil é valorizar a genialidade de um contemporâneo, difícil é a constatação de uma grandeza que foge das regras do saber fazer. Marcus Accioly levantou voos certeiros quando ainda entre nós. Se a inveja e certo despeito da mediocridade o cercaram, ou a volúpia da simplicidade do ser generoso e forte o encobriram, agora maior glória lhe preparam. E Glória, sua companheira e musa, se entrelaça para sempre, ao seu destino. E eu, de sua geração, desde o pampa, que gozei sua amizade, com saudade que não envelhece, tive, emocionalmente, dificuldade para escrever este prefácio, como ele desejava. Mas póstumo é o que jamais morreu.

    Regista, leitores, finalmente, sobre a obra de Marcus Accioly, o que gravou o já mencionado Paul Valéry: "Reconhece-se o poeta — ou, pelo menos, cada um reconhece o seu pelo simples fato de que ele transforma o leitor em inspirado".

    E a inspiração é a verdade que se rende. E nos revela.

    Esconderijo da Nuvem, Urca, Rio de Janeiro,

    em 9 de abril de 2018.


    *1 Carlos Nejar é escritor. Da Academia Brasileira de Letras e da Academia Brasileira de Filosofia

    Introdução

    O Don Juan que eu imaginava, e que em mim viveu durante os anos, seria o meu último livro. Pretendia escrevê-lo à exaustão ou deixá-lo inacabado. Byron, que morreu em Missonlongi, na Grécia (1824 — aos 36 anos), deixou o seu Don Juan, com cerca de 1500 páginas, ainda inacabado. Logo, qual melhor personagem a ser seguido, senão Don Juan que, desde 1630, de Tirso de Molina (pseudônimo do frei Gabriel Telléz), retomado por quase todos os poetas e escritores, sempre reaparece como novo e não tem fim? Byron (citado na epígrafe) diz: Necessito um herói. Bertolt Brecht disse: Infeliz da nação que precisa de heróis. Contudo, não se trata de uma nação que precisa de heróis, para salvá-la, mas de um poeta que precisa de um herói, para cantá-lo. Byron não encontrou um herói verdadeiro, tampouco um novo, porém um velho herói para cantar: Cantarei, pois, a nosso amigo Don Juan. Eu esperava o seu mesmo herói. Daí que não encontrei, reencontrei o velho herói de Tirso de Molina — o mesmo herói de Byron e de tantos outros — já com seus quase quatrocentos anos — que, para mim, seria, em vez de herói, um anti-herói que fosse nosso amigo.

    Eu não queria começar um livro que devesse terminar, porém um livro que me terminasse: a reticência do final da vida. Comecei a fazer, como de hábito, uma pequena biblioteca com as obras do gênero, começando com El burlador de Sevilla, do citado Tirso de Molina, seguido por Moliére — Le festin de pierre (1683) —, Mozart — Don Giovanni, a opera buffa com libreto de Lorenzo

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