Cultura, educação popular e transformação social: As formulações do MEB e do CPC entre 1961 e 1964
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Cultura, educação popular e transformação social - Jeferson Anibal Gonzalez
Copyright © 2014 by Paco Editorial
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Coordenação Editorial: Kátia Ayache
Revisão: Isabella Pacheco
Capa: Márcio Santana
Diagramação: Márcio Santana
Edição em Versão Impressa: 2014
Edição em Versão Digital: 2015
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Conselho Editorial
Profa. Dra. Andrea Domingues (UNIVAS/MG) (Lattes)
Prof. Dr. Antonio Cesar Galhardi (FATEC-SP) (Lattes)
Profa. Dra. Benedita Cássia Sant’anna (UNESP/ASSIS/SP) (Lattes)
Prof. Dr. Carlos Bauer (UNINOVE/SP) (Lattes)
Profa. Dra. Cristianne Famer Rocha (UFRGS/RS) (Lattes)
Prof. Dr. José Ricardo Caetano Costa (FURG/RS) (Lattes)
Prof. Dr. Luiz Fernando Gomes (UNISO/SP) (Lattes)
Profa. Dra. Milena Fernandes Oliveira (UNICAMP/SP) (Lattes)
Prof. Dr. Ricardo André Ferreira Martins (UNICENTRO-PR) (Lattes)
Prof. Dr. Romualdo Dias (UNESP/RIO CLARO/SP) (Lattes)
Profa. Dra. Thelma Lessa (UFSCAR/SP) (Lattes)
Prof. Dr. Victor Hugo Veppo Burgardt (UNIPAMPA/RS) (Lattes)
Prof. Dr. Eraldo Leme Batista (UNIOESTE-PR) (Lattes)
Prof. Dr. Antonio Carlos Giuliani (UNIMEP-Piracicaba-SP) (Lattes)
Paco Editorial
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Por respirar o mesmo ar, camarada!
Por comer o mesmo pão, companheira!
Por compartilhar os mesmos ideais e anseios, sem desistir nos momentos adversos e por persistir na busca de nossos sonhos, dedico este livro à Michele Cristine da Cruz Costa.
Aos meus pais, Maria Aparecida Gonzalez y Gonzalez e Annibal Araújo
"Todos os pedaços da minha vida têm algo teu
e isso de verdade não é nada extraordinário
pois tu sabes tão objetivamente quanto eu [...]"
Mario Benedetti
Sumário
Folha de Rosto
Página de Créditos
Dedicatória
Eígrafe
SIGLAS
Prefácio
INTRODUÇÃO
As fontes bibliográficas e documentais
CAPÍTULO 1: HISTÓRIA, HISTORIOGRAFIA E EDUCAÇÃO - PRESSUPOSTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
1. História e Historiografia
2. O Materialismo Histórico
3. Pressupostos Teórico-Metodológicos para a Pesquisa Histórico-Educacional
CAPÍTULO 2: OS DETERMINANTES HISTÓRICOS DA EDUCAÇÃO NO BRASIL ENTRE 1930 E 1964
1. Aspectos Histórico-Políticos e Econômicos
2. Instituições-Base: A Igreja Católica, o PCB e o ISEB
2.1 Igreja Católica
2.2 Partido Comunista Brasileiro
2.3 Instituto Superior de Estudos Brasileiros
3. A Educação entre 1930 e 1964
3.1 Expansão das Matrículas e Reorganização do Sistema
3.2 O Movimento Renovador e o Predomínio da Pedagogia Nova
3.3 As Disputas em torno da LDB de 1961: Escola Pública Versus Escola Privada
3.4 Campanhas Nacionais de Alfabetização
3.5 Paulo Freire e a Educação Popular
4. Movimentos de Educação e Cultura Popular: Apresentação Geral
CAPÍTULO 3: AS CONCEPÇÕES SUSTENTADAS PELO MEM E PELO CPC
1. O Meb e o CPC: Origem, Organização e Princípios Gerais
1.1 Movimento de Educação de Base
1.2 Centro Popular de Cultura
2. Cultura Popular: Conceito Hegemônico e Debates
3. Educação Popular
3.1 Educação: Conscientização como Princípio Comum
3.2 Alfabetização de Adultos: as Cartilhas como Materiais Didáticos
CAPÍTULO 4: ROMANTISMO REVOLUCIONÁRIO, REALISMO EM EDUCAÇÃO E NÃO DIRETIVIDADE: POSSIBILIDADES DE ANÁLISE
1. O Romantismo Revolucionário
1.1 O Romantismo como Visão de Mundo
1.2 A Tipologia do Romantismo
1.3 O Romantismo Revolucionário e os Movimentos de Cultura e Educação Popular
2. O Realismo em Educação
2.1 Entusiasmo pela Educação
e Otimismo Pedagógico
2.2 O Realismo em Educação
como Síntese Dialética
2.3 Os Movimentos de Cultura e Educação Popular e o Realismo em Educação
3. A não Diretividade na Educação
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
Paco Editorial
SIGLAS
ABE – Associação Brasileira de Educação
AP – Ação Popular
BNDES – Banco Nacional do Desenvolvimento
CAPES – Coordenadoria de Aperfeiçoamento Pessoal do ensino Superior
CEAA – Campanha Nacional de Educação de Adolescentes e Adultos
CEBs – Comunidades Eclesiais de Base
CEDI – Centro Ecumênico de Documentação e Informação
CEDIC – Centro de Informação e Documentação Científica Prof. Casemiro dos Reis Filho
CNBB – Confederação Nacional dos Bispos do Brasil
CNER – Campanha Nacional de Educação Rural
CPC – Centro Popular de Cultura
EJA – Educação de Jovens e Adultos
EUA – Estados Unidos da América
FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.
FFLCH – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
FGV – Fundação Getúlio Vargas
FMI – Fundo Monetário Internacional
IBESP – Instituto Brasileiro de Economia, Sociologia e Política
IESAE – Instituto de Estudos Avançados em Educação
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa
ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros
JAC – Juventude Agrária Católica
JEC – Juventude Estudantil Católica
JIC – Juventude Independente Católica
JOC – Juventude operária Católica
JUC – Juventude Universitária Católica
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LEC – Liga Eleitoral Católica
MEB – Movimento de Educação de Base
MEC – Ministério da Educação
MNEA – Mobilização Nacional de Erradicação do Analfabetismo
PCB – Partido Comunista Brasileiro
PCdoB – Partido Comunista do Brasil
PIB – Produto Interno Bruto
PSD – Partido Social Democrático
PTB – Partido Trabalhista brasileiro
PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
RENEC – Representação Nacional das Emissoras Católicas
SECAD – Secretaria de Alfabetização e Diversidade
SIRENA – Sistema Rádio Educativo Nacional
SIREPA – Sistema Rádio Educativo da Paraíba
SIRESE – Sistema Rádio Educativo do Sergipe
SNT – Serviço Nacional de Teatro
SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste
TFP – Tradição, Família e Propriedade
TPE – Teatro Paulista de Estudantes
UDC – União de Defesa Coletiva
UDN – União Democrática Nacional
UFBA – Universidade Federal da Bahia
UFF – Universidade Federal Fluminense
UFG – Universidade Federal de Goiás
UFPB – Universidade Federal da Paraíba
UFPR – Universidade Federal do Paraná
UFRGS – Universidade Federal do rio Grande do Sul
UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte
UFU – Universidade Federal de Uberlândia
UNB – Universidade de Brasília
UNE – União Nacional dos Estudantes
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
UNESP – Universidade do Estado de São Paulo
UNIOESTE – Universidade do Oeste do Paraná
USP – Universidade de São Paulo
Prefácio
A introdução que o autor do presente livro faz, ao seu texto como um todo, é muito esclarecedora. Não cabe, portanto, ao prefaciador antecipar o que virá muito bem dito a seguir.
De qualquer maneira, e por conta da estrutura com a qual o livro é apresentado ao público leitor, cabe ainda ressaltar aspectos que considero relevantes.
Em primeiro lugar, chamo a atenção para as discussões iniciais que se voltaram para alguns esclarecimentos sobre os conceitos de história e historiografia, em decorrência das várias escolas e tendências que a eles se dedicaram. Um objetivo destaque é dado ao materialismo histórico na sua diferenciação em relação às demais concepções.
Optando pelo materialismo histórico-dialético e assumindo o seu referencial teórico como instrumento da análise a ser construída, o autor claramente se posiciona. Postura louvável e menos frequente nos trabalhos acadêmicos da área nos dias de hoje, uma vez que as preocupações pouco ou quase nada se voltam para o aclaramento do lugar teórico de onde os seus autores estão a falar. Não raro, se indagados sobre a sua possível matriz, até se assustam com a pergunta ou a consideram não procedente.
Bem, mas o objetivo central do presente estudo não foi o de realizar embates sobre os temas acima indicados. O desafio maior se demonstrou outro, ou seja: compreender as concepções de educação, cultura popular e transformação social presentes nas formulações do Movimento de Educação de Base (MEB) e do Centro Popular de Cultura (CPC) com o olhar
materialista histórico e dialético.
Tendo bem definido o seu objeto de estudo, o autor se lança à construção do contexto histórico no qual aquele se desenvolveu. Muitas determinações de ordem econômica, política e social, dentre outras, são indicadas numa forma ampla de relações.
A dimensão histórica da sociedade brasileira dos anos 1930 aos 60 é evidenciada em vários dos seus componentes. Registre-se, em especial, os conflitos entre as oligarquias tradicionais e os setores urbanos emergentes, o processo de industrialização, a formação do proletariado, os trabalhadores agrícolas e as classes
médias em ampliação quantitativa. Houve ainda, de alguma forma e em diferentes escalas, rupturas nos blocos ideológicos vigentes. É dado destaque à Igreja Católica, ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) e ao Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) que por diferentes vias influenciaram os movimentos de cultura popular e educação popular que se projetaram no cenário em transformação.
As três instituições mencionadas são apresentadas pelas suas posturas face ao Brasil de então, suas inserções nos movimentos sociais e também com suas contradições intrínsecas.
O passo seguinte do estudo aqui prefaciado foi dado quando ele resenha
, com o auxílio de bibliografia especializada, o tema da educação nacional no período já delimitado. Da não democratização do ensino, das Leis Orgânicas da Reforma Capanema, à LDB (1961) e ao ideário do movimento renovador, com a urdidura do tecido histórico, tudo é parcimoniosamente apresentado com um olhar sempre crítico. Numa caminhada gradativa em direção ao foco central da pesquisa, há a mediação do mais geral para o particular, garantida pela análise das Campanhas Nacionais de Alfabetização, organizadas desde o pós-guerra, e da atuação destacada de Paulo Freire no referido campo.
É feita uma apresentação geral dos movimentos de educação e cultura popular nos governos dos presidentes Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart. Em decorrência do movimento histórico, teria ocorrido uma ressignificação do termo educação popular que deixou de significar somente uma instrução elementar para ser entendido também como instrumento de conscientização. Envolveram-se com os novos propósitos, e não pelas mesmas razões, sujeitos de posturas liberais, marxistas ou católicos.
Chegando à parte central da pesquisa, o MEB, um sistema de escolas radiofônicas da Igreja Católica, é apresentado desde as suas origens, estrutura, funcionamento e concepções de educação. O mesmo ocorre com o CPC, ligado à União Nacional dos Estudantes (UNE) e ideologicamente vinculado ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) e ao Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB). O atento leitor terá uma noção do alcance e da dimensão do MEB e do CPC naqueles anos 1960.
Utilizando-se de expressivos documentos produzidos à época e portadores de bases teóricas que sustentavam os vários conceitos de educação popular, o autor os decifra meticulosamente. É possível constatar as convergências e as divergências dos vários segmentos sociais e instituições envolvidos naquela dinâmica e profundamente interessados nas questões da educação e da cultura. Seguem-se, ainda, considerações sobre os recursos didáticos (cartilhas) e a influência do Método Freire nos movimentos.
Como toda pesquisa de qualidade, temos no trabalho de Gonzalez um forte exercício teórico, para além da parte empírica. Recorrendo aos conceitos de romantismo revolucionário, realismo em educação e a não diretividade em educação, o MEB e o CPC são lidos
e interpretados no seu contexto histórico e naquilo que incorporaram dos referidos conceitos nas suas concepções e ações. O recurso a textos filosóficos e histórico-educacionais foi de grande relevância. Revigora-se, à luz da teoria, a compreensão do objeto focado.
As conclusões do autor mais uma vez revelam a sua seriedade e comprometimento na produção do conhecimento. Ele não provou a sua hipótese principal de que a origem institucional diferenciada dos movimentos indicaria que suas concepções de transformação social tenderiam para o reformismo no caso do MEB/Igreja Católica ou para a revolução no caso do CPC/PCB
. A hipótese não se sustentou a partir da análise das concepções de cultura popular e educação popular presentes nas formulações dos movimentos e na sua prática educativa
. Os movimentos se formularam e agiram sob o manto
da ideologia nacional desenvolvimentista. Com o golpe do movimento civil-militar de 1964, muitos rumos da educação e da educação popular passariam a ser radicalmente alterados.
Todos os leitores se beneficiarão do presente texto, mas, em especial, os interessados em história e em história da educação. Com certeza poderão se certificar da qualidade da pesquisa realizada, do uso de forma pertinente das fontes primárias, da límpida e objetiva apresentação final, e da relevância da análise elaborada sobre os temas tão candentes da educação popular e cultura popular.
José Luís Sanfelice
Prof. Titular em História da Educação (UNICAMP), Pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas História, Sociedade e Educação no Brasil
– HISTEDBR.
INTRODUÇÃO
A primeira metade da década de 1960 no Brasil é marcada por uma efervescência política e cultural sob hegemonia da ideologia nacional-desenvolvimentista. Esse contexto é construído a partir da década de 1930 quando os ventos da industrialização impulsionam a ideia de um desenvolvimento nacional baseado na substituição de importações e na configuração de um país urbano-industrial. Os movimentos de cultura e educação popular surgem, assim, sob influência do momento histórico-político e teórico-filosófico que animava a defesa da independência do país em relação aos grandes centros econômicos do mundo, valorização da cultura nacional e a superação da educação como mera instrução do povo, ou seja, configurando um complexo de iniciativas no campo educacional que Saviani (2007) chamou de educação do povo, para o povo e pelo povo
.
Entre as diversas experiências de movimentos de cultura e educação popular organizadas no período, o presente estudo¹ toma como objeto de estudo as formulações do Movimento de Educação de Base (MEB), ligado à Confederação Nacional dos Bispos do