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Chaves para Tetuan
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E-book141 páginas1 hora

Chaves para Tetuan

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Sobre este e-book

O primeiro romance publicado por Mois Benarroch e o início da Saga Benzimra da Trilogia de Tetuan

O romance conta a história da cidade de Tetuan, situada no norte de Marrocos, perto de Espanha. Esta é a cidade mais próxima em que os judeus sefaraditas se estabeleceram depois de serem expulsos de Espanha, em 1492.

Os personagens são a Família Benzimra. A trama do romance começa em 1860 e termina em algum momento do século 21 na Louisiana, Estados Unidos.

Os Benzimra começaram a deixar a cidade em meados do século XIX, porque a "Juderia" não podia mais ser expandida e havia epidemias e falta de possibilidades econômicas. Eles partem para Tanger e depois para o Brasil, onde têm a chance de ganhar dinheiro e voltar para a rica Tetuan, ir para Argentina, Venezuela, Espanha e depois para Israel.

Em suas viagens, eles escrevem sobre Tetuan, voltam, saem novamente e, gerações depois de sair de lá, ainda têm relacionamentos com a cidade.

O capítulo mais longo é a estória de Mimon Benzimra, que emigrou aos 50 anos para Israel, mas após a morte de sua esposa, ele decide recomprar sua própria casa em uma viagem a Tetuan e se muda para lá, onde ele escolhe ficar para morrer. Seus cinco filhos vêm visitá-lo, pensando que ele está louco e tentam convencê-lo a ir para outro lugar, e não morar com os árabes.

Em outro capítulo se fala de outro Benzimra (Moises Benzimra) que deixou Tetuan no século XIX e decidiu morar no Amazonas, onde criou uma tribo de Benzimra, de não judeus, que se autodenominavam a Tribo Benzimrão. (Por mais que isso pareça incrível, é baseado em fatos reais).

Entre cada capítulo do livro, há um diálogo (num total de 22) entre uma criança e sua mãe, desde o momento em que eles falam em sair, através de sua Aliá (migração para Israel), a grande decepção, até suas mortes e descanso no paraíso.

IdiomaPortuguês
EditoraMoben
Data de lançamento26 de mar. de 2021
ISBN9781393612087
Chaves para Tetuan
Autor

Mois Benarroch

"MOIS BENARROCH es el mejor escritor sefardí mediterráneo de Israel." Haaretz, Prof. Habiba Pdaya.

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    Chaves para Tetuan - Mois Benarroch

    A ALIANÇA – CARACAS 1995

    Isso não é um testamento. Você é meu único filho e é herdeiro de tudo. Não há dinheiro escondido que você não saiba e não há dinheiro que eu tenha doado a qualquer outra instituição.

    Apesar de nossa relação não ter sido das mais fáceis, parece que isso é da natureza da relação entre um pai e seu único filho. Eu também não fui fácil, guardei dentro de mim um grande segredo, grande demais para mim. O carreguei por anos e não pude dizer nada a você. Talvez sim eu pudesse talvez eu devesse ter feito isso quando você tinha quinze anos, mas tua mãe foi contra, e talvez ela tivesse razão. Aquilo não era fácil, e talvez tenha sido mais fácil na Venezuela do que em Madrid, mas não foi. O que não foi fácil? Ouça na continuidade. Na verdade era mais de um segredo em todo esse assunto, e tua mãe não era exatamente a mãe que você conhecia. Se vivêssemos num país menos louco que a Venezuela talvez você tivesse prestado atenção que teu nome é um pouco diferente dos outros nomes, Benzimra. Este é um nome diferente de todos os Lopes, de todos os Hernandez, mas você teve o privilégio de viver num país onde o racismo quase que não existe e especialmente também não o antissemitismo. Então é isso. Eu já tinha dito a você que eu sou judeu, eu não sei se isso te surpreenda ou não. Talvez você já soubesse, ou talvez tua mãe tenha te contado em segredo e você tenha ido verificar isso numa sinagoga encontrando o nome de meus parentes distantes, ter encontrado o nome na lista telefônica. Um daqueles parentes distantes é meu irmão gêmeo, e eu o vi esta semana na sinagoga. Eu o vi e ele não me reconheceu, assim como eu também. Só olhamos um para o outro. Eu dizia a todos que sou de Miami, conversei em inglês. Por anos tive vergonha de ir à sinagoga, tive vergonha já que toda minha estória ficou conhecida em Tetuan. A vergonha da cidade. Certamente todos se aborreceram por lá. Ele se casou com uma góya (gentia) de Madrid, e não somente góya, disseram. Ele se casou com uma mulher da vida (prostituta). Puta... Isso seguramente tua mãe não te contou, ou talvez sim. Eu sei que a tua relação com ela é profunda e especial. Talvez prostituta não seja exatamente a palavra, havia muitas jovens de boa família na Espanha que depois da guerra civil e da II Guerra elas se prostituíram, a comida era muito escassa. Elas sustentavam às vezes famílias inteiras. Pergunte-me, como eu cheguei até ela? Bom, você já sabe. A encontrei em Madrid ao lado da Universidade de Madrid. Não foi em nenhuma cafeteria como já contamos, e não foi tão romântico. Eu precisava de uma mulher, como um homem precisa de uma mulher. Eu estava sozinho, jovem e cheio de testosterona lá em Madrid, estudando medicina, distante de casa, distante de minha mãe, distante de tudo que conhecia de bom. Então foi possível comprar uma mulher com o pouco dinheiro que eu tinha. Não, ela não foi a primeira, e também não seria minha última, como você já sabe. Ela era única, única e depois muito especial, uma Vênus, que me enchia de saudade. Só de pensar nela me causava palpitação. Sim, meu filho, nunca fomos muito puritanos aos olhos dessa casa. Mas, por que começaremos isso agora? Depois de minha morte, quando você ler sobre isso, poderá dizer que a atração por ela era pura e simplesmente corporal, física, necessidade biológica. Correto, era muito calor na relação e as conversas com ela eram muito, muito mais especiais.

    Eu espero que essa descoberta não provoque em você mudar sua opinião sobre sua mãe. Entenda que ela foi uma mulher maravilhosa e ela amou a mim e a você até o dia de sua morte há cinco anos. Eu sei que ela sofreu por minha causa, das minhas escapadas, ela sofria da falta de relação entre mim e você. Mas ela nos amava muito. Ela amava demais, era a oitava filha de uma família abençoada com muitas crianças. De cidade pequena chamada Benirus, não muito distante de Valencia. Talvez queira ir lá visitar, talvez queira visitar à caminho de Tetuan, pois eu quero te contar sobre essa cidade, Tetuan. Cidade que só o nome me enche de saudades tão duras, até que tentei e consegui não pensar sobre ela durante anos. Minha cidade natal, as saudades não são só lágrimas, eu posso agora quando eu digo o nome, quando eu o escrevo. Eu posso sentir Tetuan exatamente no joelho direito, em seu interior. Eu sinto nele a dor, lá todo o tempo, quando eu penso sobre minha mãe, Simi Benzimra. Talvez deva ir até seu túmulo. Quando eu penso nela eu sinto a dor exatamente no dedão do pé direito, uma dor tão forte, como se me cortassem agora o dedo sem anestesia, é claro. Meu filho Fernando Benzimra, quem acreditaria algum dia que meu filho teria um nome desse, Fernando Benzimra, cristão, talvez me diga sem religião. Mas, eu sei que tua mãe católica transmitiu a você todo o catolicismo dela sem dúvida. Passado pela mãe, talvez nunca tenha ido à uma igreja, mas de qualquer forma foi batizado no cristianismo. Não me pergunte como eu sei, mas eu sei que você não foi batizado. Assim nós decidimos, tua mãe e eu, que não haveria qualquer religião em casa e também por causa disso nos mudamos para Venezuela, e não ficamos em Madrid. Mas eu sei que o teu filho, você e tua mãe o levaram à igreja sem meu conhecimento. Ela não me disse nada e você também não. E também não, eu não persegui vocês, de forma alguma. É o tipo de coisa que uma pessoa sabe, quanto que ele tente negar, ele sabe das coisas por dentro.

    Sim, eu quero te contar sobre Tetuan...

    Você inclusive não sabe onde fica. Sim, é um pouco distante, não só geograficamente, mas tem uma distância espiritual profunda. Tetuan se encontra no norte do Marrocos, muito próximo à Espanha, vinte quilômetros do golfo de Gibraltar. O que é esse lugar? É o lugar mais próximo para onde vieram os judeus, no século XVI, após a expulsão da Espanha. Essa aproximação ocultou uma distância profunda, distância profunda entre expectativa e realidade. Aqueles judeus sempre pensavam que eles eram espanhóis e que saíram de passeio um pouco longe de casa, e que logo voltariam à suas cidades, para Granada, para Sevilha, para Toledo, para Beniros, para Vadalona, em mais alguns dias. Eles assim pensaram por longos anos, e continuaram falando um antigo e erudito espanhol por centenas de anos, sobre a casa maravilhosa na Espanha, sobre as chaves que guardaram, sobre tudo. Eu sei que houve aqueles que voltaram para Espanha. Eles se converteram, e voltaram para suas casas e suas cidades. Talvez tua mãe seja descendente de uma dessas famílias, e se não for, sim é difícil compreender entre nós o forte relacionamento quando eu abandonei tudo e também ela abandonou tudo para estarmos juntos. E você sabe o que, Fernando, a idade não dá mais respostas a estas perguntas. Ela só afina as perguntas, afina como lápis até que a ponta se torna bem afiada que ele poderia matar se fosse penetrar no coração. Não tenho resposta, eu espero que sim. Meu primo, Mimon Benzimra, que você encontrou aqui em 1977, talvez dele você se lembre. Ele viu o filho ficar doente, ele alegava que quando foram expulsos os judeus da Espanha eles representavam de dez a vinte por cento da população do país, e parte expressiva deles se converteu. Então assim que a maioria dos espanhóis cristãos de hoje devem ser descendentes de judeus, que na verdade é um país judeu. Então talvez tua mãe também seja, Marisol. Talvez ela descenda de judeus. Ela nunca disse nada, mas o pai dela sempre me chamava para um canto e começava me contar um segredo e depois começava a falar sobre a guerra civil e sobre seu grande orgulho na guarda civil, a polícia de Franco. Talvez ele quisesse me dizer algo, talvez ainda tivesse medo e talvez isso seja só minha imaginação e desculpas de algum familiar religioso que abandonou o judaísmo, que abandonou definitiva e repentinamente por causa de uma mulher. Eu não sei. De qualquer forma teu avô ficou muito feliz que nós casamos, e a mãe dela menos. Ela era simplesmente antissemita, racista como muitos católicos das cidades espanholas. Eles realmente pensavam que os judeus tinham rabo. Assim diziam para eles por centenas de anos. Ela certamente também não ficou feliz em ver a mãe viajar para outro país. Mas, ela não era idiota, ela sabia o que sua filha fazia em Madrid e de onde ela enviava o dinheiro. E era preferível uma filha casada com um judeu do que ela ser uma prostituta envelhecida que ninguém a quer. Bom, eu lamento de novo se a palavra prostituta te fere, mas eu ainda espero que você seja suficientemente adulto a fim de entender os motivos, a história e as fraquezas do homem.

    Muitas vezes perguntei a mim mesmo se Deus me castigaria após minha morte. Se é possível castigar alguém por causa de amor. Parece romântico, mas não pude inclusive pensar sobre outra mulher do que sobre Marisol e não sobre qualquer outra coisa durante anos. Preparei milhões de respostas, mas quando eu tento eu sei que eu não posso dar respostas, talvez precisasse sofrer a falta dela toda minha vida a fim de estar completo comigo mesmo, minha mãe me enviava para Espanha carne seca dentro de latas de óleo para que eu comesse Kasher, já que nada era Kasher. O que é Kasher? Eu preciso agora explicar a

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