A Educação Ambiental na Cidade Educadora
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A Educação Ambiental na Cidade Educadora - Roberto Martinez
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO SUSTENTABILIDADE, IMPACTO, DIREITO, GESTÃO E EDUCAÇÃO AMBIENTAL
Dedico este livro aos meus netos, Paulo Roberto, Lucas Gabriel,
e às minhas netas Lia e Laís, viventes
em uma geração que, certamente, necessitará de uma educação mais humana e diferenciada
para enveredar nos caminhos de um viver com sabedoria e dignidade.
APRESENTAÇÃO
A vivência construída em educação, por meio das múltiplas relações com os educandos, gestores educacionais, funcionários em geral dos estabelecimentos de ensino, autoridades políticas e educacionais, e, principalmente, com a comunidade, bem como a prática adquirida em sala de aula, ao serem repensadas, levaram-me à percepção de que a cada momento novos conhecimentos seriam necessários para dar conta das mudanças ocorridas em nosso cotidiano, frutos da dinâmica que permeia a atividade humana e o meio em que esta se realiza.
Ao ministrar aulas de Ciências e Biologia para o ensino básico e magistério – público e particular – por mais de trinta anos, e trabalhar como gestor em unidades escolares públicas municipais de ensino básico, tive a oportunidade de acompanhar as diversas mudanças ocorridas quanto aos modelos e às metodologias aplicadas nesse período.
Num primeiro momento, final dos anos 1970, pouco se falava a respeito das questões ambientais, pois os livros didáticos de Ciências e Biologia, quando abordavam o assunto, abordavam-no como ecologia
, sem o necessário debate crítico. Era o aprendizado voltado apenas para os conceitos básicos de ecologia, e quando muito, a preservação do meio ambiente era abordada pelo método naturalista. O Brasil vivia o período governado pelos militares, num modelo de educação determinado, muitas vezes, pelo Banco Mundial.
Os programas eram gessados
e tudo girava em torno do livro didático, e por falta de experiência ou comodismo, copiava-se o que os antecessores haviam feito, ou modelos tecnicistas americanos. Isso já vinha ocorrendo a muito, decorrente de uma escola autoritária e conteudista.
A partir dos anos 1970, alguns movimentos ambientalistas surgiram no mundo e o Brasil, com algum atraso, posteriormente, acabou sofrendo influência desses movimentos, os quais apontavam para uma inevitável mudança em alguns setores.
A relativa liberdade de expressão, que surgiu após o encerramento do ciclo dos governos militares no Brasil, e, consequentemente, as reformas ocorridas na educação permitiram algum avanço, observando-se uma maior flexibilidade quanto à elaboração dos Projetos Políticos Pedagógicos das escolas e das propostas curriculares, embasados legalmente pela Constituição Federal de 1988, caso específico em Educação Ambiental (EA), (Art. 225 – cap. VI) e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9394/96). Nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) do MEC¹, os educadores encontraram algum apoio teórico crítico para a elaboração de seus programas relacionados à EA, pois, de uma forma interdisciplinar, passou a exibir em seu bojo a proposta de que o meio ambiente deveria ser tratado como tema transversal no currículo escolar, articuladamente entre as diversas áreas de conhecimento. Especificamente, no que concerne à EA, a Lei 9795/99, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental, ao ser aprovada, definiu que tal modelo de educação deveria ser implantado em todos os níveis da escolarização no Brasil, desde a educação infantil até o ensino superior. Concomitantemente, diversas entidades e instituições, entre elas ONGs (Organizações Não Governamentais) que se dedicavam exclusivamente à EA, passaram a oferecer cursos, desenvolver projetos e assessorar órgãos públicos e empresas privadas nesse setor.
Nesse contexto, participando ativamente na área de educação, muitas perguntas surgiram: Como, por que, para quem e com que intenção esses programas ou projetos, independentemente de serem elaborados pelo ensino formal ou não formal, eram desenvolvidos? Todas essas perguntas, muitos pesquisadores e autores buscaram responder por meio de diversos trabalhos publicados, muitas vezes seguindo as orientações teóricas ideológicas de seu meio, buscando marcar posição ou justificar a forma como se relacionavam com o meio ambiente.
Minhas angústias e questionamentos surgiram, não só especificamente da atuação na educação, mas, também, principalmente, a partir do momento em que ela ocorria junto a pessoas humildes, exploradas e esperançosas por uma vida melhor.
Por muitos anos trabalhei em escolas públicas e junto às comunidades em Diadema, São Paulo, onde acompanhei, literalmente, a invasão dos vinte e quatro quilômetros quadrados de área desse município, por pessoas de baixa renda, atraídas pela esperança de um emprego, visto a desenfreada industrialização ali ocorrida, projetada por especuladores imobiliários que se instalaram no poder, a partir de sua emancipação. Inicialmente, o sentimento que se apossou de meu ser foi o de perplexidade, e, com o passar do tempo, o de tristeza, ao ver como uma região quase que provinciana, bucólica, se transformou quase que instantaneamente em um aglomerado urbano com aproximadamente quinhentos mil habitantes, em sua maioria vivendo em condições precárias, em aproximadamente cento e quarenta favelas.
Foi nessa época que assisti de forma estarrecedora à poluição de todo o manancial de água, não só de Diadema, mas, de toda a Região do ABCD Paulista (Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul e Diadema), a qual se reflete na falta de água, atualmente.
As pessoas moravam em núcleos, muitas vezes sem nenhum saneamento, com esgoto a céu aberto sendo jogado nos córregos que desembocavam nos rios e represas da região.
Atualmente, Diadema, apesar de ainda apresentar muitos problemas relacionados à urbanização, conseguiu, por meio de ações comunitárias e de alguns projetos sociais desenvolvidos por administrações mais populares, urbanizar esses núcleos habitacionais, instalando água, esgoto, pavimentando os acessos e ruas, formando uma rede escolar e de saúde de razoável nível. As dificuldades foram amenizadas com essas ações, porém, a alta densidade populacional que se instalou nesse município, o alto índice de desemprego – apesar das mais de mil e duzentas indústrias ali instaladas – ainda apresentam problemas sociais e de segurança muito altos.
Esse foi o cenário formado a partir da irresponsável ganância de alguns, coniventes com o sistema de exploração da mão de obra barata para a indústria.
A meu ver, a indústria ganha muito com isso, porém, a sociedade paga muito caro, às vezes com a vida de pessoas muito jovens.
Essa experiência moldou o que seria minha busca na área de educação e o modelo de educação que mais estaria condizente com os meus anseios. Essa experiência, em especial, projetou-me para a Educação Ambiental.
Ao mudar a residência de minha família para a cidade de Sorocaba, deparei-me com um município industrializado, relativamente organizado. Ao fazer a comparação entre as duas realidades sociais – a vivida anteriormente em Diadema e a ser vivida a partir daquele momento – surge, então, a primeira indagação: Esse município, apesar da alta industrialização que apresenta, conseguiria seguir seu caminho sem se perder nas nuances que os municípios de outras regiões industrializadas caíram?
Certamente a resposta estaria bastante relacionada com a educação, por isso, aprofundei-me um pouco mais, buscando uma relação da proposta de educação desse município com a Educação Ambiental (EA).
A partir de 2004, a proposta de Cidade Educadora passou a ser inserida no município de Sorocaba, com vistas a uma educação mais condizente com o meio urbano predominante.
Essa proposta educacional chamou minha atenção, pois, em sua essência, abrange uma gama enorme de ações, permitindo que brotem projetos para atender aos anseios educacionais, permanentemente, em todas as faixas etárias da grande diversidade social alojada na cidade.
Por se tratar de uma proposta de aprendizagem, envolvendo a educação formal, não formal e informal, utilizando-se de todos os espaços oferecidos pela cidade, de forma democrática, abrindo lugar para todas as vozes, entendi que esse espaço educativo seria muito fértil para uma Educação Ambiental que permitisse a sustentabilidade da vida, de forma harmoniosa, garantindo qualidade de vida a todos que neste momento a habitam, respeitando-se a necessidade das futuras gerações.
Imediatamente, surgiram algumas questões relacionadas à EA, praticadas nesse contexto educacional. De que forma a EA poderia ser tratada em uma cidade educadora? Será que as ações planejadas e praticadas pelos órgãos oficiais, principalmente a Secretaria de Educação e a Secretaria do Meio Ambiente, municipais, isoladamente ou em parceria entre si ou com instituições e ONGs do município, estariam condizentes com essa proposta educacional?
Estava delineada, portanto, a proposta de estudo a ser apresentada neste livro.
No primeiro capítulo e em seus subtítulos, apresento um estudo, o qual embasará teoricamente a ideia do ser humano como elemento de transformação dos diversos ambientes, por meio das suas múltiplas ações, desde que surgiu na Terra – Evolução Biológica da Espécie Humana; Evolução Social e a desumanização das relações. Ampliando a pesquisa, serão delineados suficientes recursos teóricos para discussão, no segundo capítulo, sobre a evolução do ambientalismo no mundo e no Brasil e Ecologização das Sociedades, para, no terceiro capítulo, abordar o histórico sobre o desenvolvimento da ecologia e das diversas correntes ou concepções de Educação Ambiental (EA), sua evolução no mundo e no Brasil. No quarto capítulo, apresentarei um estudo teórico sobre Cidade Educadora, partindo do conceito básico de cidade, passando pelos diversos modelos de aglomerações, até chegar ao modelo civilizacional atual, a proposta de Cidade Educadora, para discutir no quinto capítulo qual o perfil de EA mais adequado ao projeto Cidade Educadora.
A Educação Ambiental na Cidade Educadora abre mais um espaço à reflexão e à construção de novos projetos, marca que a intervenção educativa sociocomunitária permite. Nesse caso, focarei especificamente EA, a qual interfere no dia a dia de todos, e pela sua característica inter e transdisciplinar, envolve toda comunidade.
Entendo, portanto, que a EA a ser vivenciada no contexto da Cidade Educadora, a partir desta proposta, certamente, vislumbrará o debate das questões ambientais num clima democrático, de justiça e equidade, apresentando claramente os elementos de poder e intencionalidade conotativos ao desenvolvimento sustentável, para que, efetivamente, sejam salvaguardados os mais vulneráveis da ação predadora dos mais poderosos.
PREFÁCIO
Se entendemos a educação como a passagem de um estágio de menor conhecimento para um estágio mais ampliado e que se desdobra por meio de contextos específicos, desde as linguagens iconográficas e gestuais até as mais elaboradas, concluiremos que esse processo não pode ser reduzido ou compreendido simplesmente como a transmissão de conhecimentos
daqueles que sabem para aqueles que pouco ou nada sabem, e, ao mesmo tempo, não poderemos excluir o termo transmissão
, mas ressignificá-lo como legado, portanto, como contribuição aos atores que sabem e vivem a experiência humana com maior ou menor visão sobre sua complexidade.
O trabalho do professor Roberto Martinez tem essa característica, uma vez que, como ele mesmo afirma, o presente livro procura contribuir para a ampliação sobre a visão e importância da "[...] aprendizagem envolvendo a educação formal, não formal e informal, utilizando-se de todos os espaços oferecidos pela cidade,