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Bárbara debaixo da chuva
Bárbara debaixo da chuva
Bárbara debaixo da chuva
E-book92 páginas1 hora

Bárbara debaixo da chuva

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Sobre este e-book

"Neste romance permeado de delicadeza e sensibilidade, Nilma Lacerda tece a poética história de uma menina do campo que, apesar de conhecer como a palma da mão os mistérios do dia-a-dia da vida no interior, tem dificuldades com a escola. Para que aprender a ler e a escrever quando se sabe quando as árvores dão frutos, Bárbara se pergunta.
Menina capaz de ler a poesia suspensa nos enigmas do mundo, Bárbara sabe a insuficiência das palavras para expressar as experiências diante das descobertas e surpresas do universo. Dona de um olhar perspicaz e refinado, compreende que sua alma lê mais e melhor do que o escrito pelo alfabeto pode lhe revelar.
Através do percurso de Bárbara pela existência, a poeta e educadora Nilma Lacerda suscita a reflexão sobre a importância do respeito às vivências do aluno como embasamento para a construção de sentido dos saberes escolares. BÁRBARA DEBAIXO DA CHUVA convida o leitor a viajar com Bárbara pelos múltiplos saberes e descobrir com ela os prazeres da leitura."
IdiomaPortuguês
EditoraGalera
Data de lançamento14 de jul. de 2011
ISBN9788501095589
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    Bárbara debaixo da chuva - Nilma Lacerda

    Para Vânia Osório, pelas tramas em comum;

    para Antônio Osório, pela dignidade.

    Para Ana Lúcia Espíndola, pela iluminação.

    Sumário

    A primavera, antes daquele verão

    O verão, em seu tempo

    O verão, um dia

    O verão, acabando

    Outono

    Inverno

    Inverno, ainda

    Primavera

    Antônio chegou de uniforme novo: calça de brim

    azul-marinho, camisa de fustão branco com bolso, trazendo

    na sacola de pano o estojo, apontador, caderno, caixa de

    lápis de cor. Com suas irmãs sentadas em outras mesas, Antônio se sentiu sozinho e com medo.

    Indez. Bartolomeu Campos de Queirós.

    ...tão logo voltava o bom tempo, voltava também, todos os

    dias, à casa do senhor Médouze. Nossos serões eram sempre

    iguais: dávamos umas corridinhas, acendíamos o fogo,

    vinham os longos silêncios preliminares, as adivinhações e as

    histórias interrompidas pelo chamado de mamãe Tine.

    Rua Casas Negras. Joseph Zobel.

    A primavera,

    antes daquele verão

    Na fazenda Quicés, ninguém era muito de reparar em flor. As pessoas prestavam mais atenção em fruta. Daí que só viam as flores pra pensar na fruta que viria depois, e ao se falar em flor era mais ou menos isso que se costumava ouvir:

    — O limoeiro lá de casa tá cobertinho de flor.

    — É, o pé de abacate começou a botar flor semana passada.

    — Ah, e o mamoeiro novo, perto da entrada da fazenda? Tá assim de flor. A laranjeira do seu Romão, acho que não vai aguentar o peso de tanta flor que botou.

    Como todo mundo, Bárbara gostava muito de fruta, mas, diferente de todo mundo, gostava mais ainda de flor, de ver florzinha miúda, dessas em que ninguém presta atenção pelo caminho. Plantinha rasteira, trepadeira vagabunda, matinho de flor em cacho ou de flor sozinha: ela vivia tomando conta pra ver a flor nascer, vivia investigando a beleza, esperando o tempo de ajudar o vento a semear de novo aquelas miudezas de cor.

    Estava desenredando a trepadeira de sininho roxo pra mudar de lugar, porque o pai não ia deixar subir pelo pé de acerola de jeito nenhum, quando apareceram seu Noca, seu Dirceu e umas pessoas que ela não conhecia. Mandaram chamar o pai dela, que veio meio envergonhado, convidou todo mundo pra entrar na casa pobre, disse à mulher que fizesse um cafezinho pras visitas.

    Seu Dirceu havia vendido a fazenda, aqueles eram os novos donos. Bárbara gostou logo de cara da dona Vânia, que começou a conversar com ela, perguntando o que estava fazendo — pra que ia tirar a planta dali? Quis ir ver onde é que ia plantar a trepadeirinha de novo — será que vai pegar? — desconfiou. Perguntou, ainda, tudo que era nome de florzinha e passarinho que podiam ver.

    Dona Vânia era cheia de ideias, Bárbara foi logo vendo — e gostando dela também por isso. Era o pai dela que havia comprado a Quicés, e ela ia ajudá-lo a cuidar de tudo. Começou a dizer que fariam casas decentes para os trabalhadores, com esgoto, água encanada e uma boa instalação elétrica, não esse amontoado de fio feito de qualquer maneira. Continuou dizendo que todo mundo ia ter situação de trabalho regularizada, e Bárbara achou essa palavra legal, embora não soubesse o que era. E depois chegou a um ponto que ia demorar um pouco pra acontecer, porque era setembro, e dona Vânia disse que escola começa em fevereiro.

    Pois é. As crianças da fazenda iam passar a ir à escola. Nada de criança passar o dia no terreiro, correndo pelo mato, crescendo sem instrução ou, pior ainda, trabalhando e deixando de ser criança. Ia ter condução pra levar pra escola, pra trazer da escola, ia ter uniforme e material, ia ter obrigação de estudo. Bárbara ficou de orelha em pé, mas ninguém levou muito a sério aquela montoeira de promessas. Na Quicés, como em toda aquela região, as coisas aconteciam de um mesmo jeito havia muito tempo: quem podia acreditar que viessem a mudar um dia?

    Antes de seu Dirceu ser o dono daquelas terras, teve seu Gusmão e seu Bartolomeu de patrão — o pai de Bárbara falou. E dessas três vezes em que a fazenda mudou de dono, cada um deles chegou, falou isso e aquilo, se mexeu para cá e para lá, mas foram como um vento que chega, levanta terra, carrega folha e pau leve pelo caminho e depois vai embora, deixa um pouco de sujeira, mas não troca árvore de lugar, nem bole em caminho de rio.

    A fazenda precisava de todos os braços adultos, e mesmo de braço de criança maior, muitas vezes. As mulheres saíam com os maridos para a plantação, para os afazeres do gado, os irmãos maiores olhavam os pequenos. Também podia ser que alguma das mulheres que não pudesse ir para a roça — por ter menino pequeno demais ou por estar já pesada de menino que vinha chegando (gozado, ninguém falava menina nessas horas, Bárbara pensava) — tomasse conta dos filhos das vizinhas mais próximas, juntando 12, 15 crianças, que acabavam soltas pelo terreiro, fazendo estripulia a torto e a direito.

    Mas escola era novidade, e novidade grande, porque era pra todo mundo, como dona Vânia

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