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Os direitos sociais e a normatização da ideia de justiça
Os direitos sociais e a normatização da ideia de justiça
Os direitos sociais e a normatização da ideia de justiça
E-book140 páginas1 hora

Os direitos sociais e a normatização da ideia de justiça

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Sobre este e-book

A emergência dos Direitos Humanos Fundamentais, resultado de movimentos de ruptura política e social e responsável por projetar novos princípios informadores da juridicidade contemporânea, e o fundamento da dignidade da pessoa tornam imperativa a necessidade de concretização de valores incorporados ao Estado Constitucional de Direito que promovam, no ambiente da vida, o suprimento dos bens imprescindíveis à plenitude do conteúdo que evocam. Isto sobretudo quando considerada a revisão dos postulados de matriz individualista do constitucionalismo moderno e a alteração paradigmática responsável pelo estabelecimento do Estado Constitucional de Direito. Como ideal constituído historicamente, a ideia de justiça alberga o valor-fim do direito. O texto resgata a trajetória histórica, as concepções filosóficas e a sua integração ao Direito, desde os pressupostos da antiguidade à positivação nos sistemas jurídicos do século XX, nos quais emerge a ideia de justiça social como finalidade pública e objetivo do ordenamento constitucional vigente no Estado brasileiro.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento27 de mai. de 2021
ISBN9786559566556
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    Os direitos sociais e a normatização da ideia de justiça - Sandra do Carmo Resmini

    justiça.

    1. CONCEPÇÃO DE JUSTIÇA E SUA INTEGRAÇÃO AO DIREITO

    NO PRIMEIRO CAPÍTULO ABORDA-SE A IDEIA DE JUSTIÇA NA PERSPECTIVA da historicidade da qual é resultante. Para tanto, retoma-se sua concepção valorativa originada na antiguidade até a sua incorporação ao direito, como norma e paradigma a ser concretizado através da esfera da justiça social.

    1.1 A COMPREENSÃO HISTÓRICA E FILOSÓFICA DA JUSTIÇA

    A inclusão de princípios nos sistemas jurídicos contemporâneos é produto de um processo histórico, que, embora nem sempre partilhado por todos os povos de maneira equânime, produziu uma conformação da prática jurídica atual a sistemas de princípios de indiscutível relevância para a sociedade e para a própria permanência da ideia de Direito. Tendo sido tratada como elemento da consciência humana, as demandas por justiça enraizaram-se em uma esfera pré-existente de percepção sobre o ser e o agir, tornando-se objeto de estudos da filosofia grega e evoluindo de uma percepção aferível por sentimentos para a expressão daquilo que se pretende realizar socialmente.

    No mundo grego, a concepção de justiça nem sempre ocorreu sob um mesmo prisma, do aspecto mítico da Justiça (Diké), filha de Zeus e Thêmis, a partir do sec. V a. C. a incorporação de processos de racionalização do pensamento e a importância assumida pela vida coletiva na pólis a transformaram em virtude cívica relacionada ao Estado. A materialização simbólica do Direito para os gregos conflui para a deusa da Justiça, responsável por segurar pela mão esquerda pratos perfeitamente alinhados em uma balança sem o fiel ao meio, ao mesmo tempo em que na mão direita empunha a espada: declara-se o justo ou o direito quando a igualdade é obtida. (FERRAZ JÚNIOR, 1994)

    Embora a vida em sociedade e sua consequente regulamentação tenham ocorrido em momentos primitivos da vida humana, datando as primeiras circunstâncias em cerca de doze mil anos presentes, a inserção de valores no ambiente do Direito situa-se em momentos históricos posteriores decorrente de características específicas da história dos povos.

    Na antiguidade remota, oriental e egípcia, por volta do quarto milênio antes de Cristo, encontra-se referências a regras de vida, tidas atualmente como o nascedouro dos direitos, dentre estes, citam-se os relativos à sucessão de bens e ao comércio marítimo, além de uma propensão de regras com conteúdos garantidores da estabilidade e da integridade dos primeiros agrupamentos humanos. Identifica-se o direito com a aplicação de penas cruéis, utilizadas como forma de amedrontar os membros da sociedade e proclamar no poder real uma força indelével, por vezes associada a divindades. Tal correspondência é confirmada pelos direitos de tradição cuneiforme, suméria e hitita, dos quais o Direito babilônico, representado pelo Código de Hamurábi (1726-1686 a. C), constituiu-se em exemplo paradigmático. (PALMA, 2011)

    Neste conjunto de leis as penas envolvem práticas de extrema severidade, onde as punições notabilizam-se pela crueldade na sua aplicação e as condenações como morte, mutilações e degredo são integrantes regulares do texto, assim como sua aplicação era produto de um escalonar derivado da posição social do infrator e do ofendido, instituindo um processo de seletividade no direito punitivo.¹ (PALMA, 2011)

    O direito indiano, representado pelo Código de Manu, aproximou-se de preceitos valorativos através do conceito de dharma, o qual, segundo Rodrigo Freitas Palma, é entendido como a correta e boa ação de todos os indivíduos em qualquer momento de sua vida. Este preceito, no entanto, não correspondia à integralidade do conceito de Direito, o qual se associava também ao vyavahara, considerado o direito como se pratica no ato de julgar uma ação, ou, para esta tradição, a expressão do próprio direito: o direito como é (PALMA, 2011).

    Neste contexto histórico remoto, o Direito do povo hebreu apresenta-se como uma composição formada por um conjunto de regras sistematizadas na Torah, o livro do Antigo Testamento, dividindo-se em várias seções que codificam aspectos a serem seguidos pelos descendentes de Abraão. Para a cultura hebraica, a síntese da justiça residia unicamente em Deus, longe das possibilidades humanas, podendo, no entanto, ser atingida mediante a prática de atos relacionados ao próximo. A Justiça incorporava-se à prática humana para além da ideia de benevolência, virtude possível de ser atingida:

    ...a noção hebraica de justiça esteve sempre associada à caridade e ao amor ao próximo (hessed). Nesse ínterim ser justo é dar o melhor de si para o progresso da humanidade, agir em conformidade com os mandamentos e, principalmente, não se descuidar jamais do clamor dos pequenos; tomar a iniciativa de ir ao seu socorro; prover ao seu sustento; defendê-los com nobreza de caráter e manter uma atitude sóbria e de respeito para com o próximo e o mundo que nos rodeia. (PALMA, 2011, p. 95)

    Nesta tradição que acena para as origens do monoteísmo, a atenção e proteção dadas a determinados grupos como estrangeiros, viúvas, órfãos e pobres, tidos como sujeitos a agruras, encontra-se expressa no Deuteronômio, o mais importante conjunto de leis hebraicas integrante da Torah, e traz uma percepção do valor da justiça em uma perspectiva do outro, motivo pelo qual deveria ser seguido por todos os membros integrantes de suas tribos (Palma, 2011).

    1.1.1 A filosofia ocidental e a concepção de justiça estruturante do pensamento jurídico atual

    As primeiras considerações sobre a justiça associada a uma vertente elaborada de pensamento derivam da Grécia antiga, berço da filosofia e do racionalismo, na qual as discussões sobre sua natureza a identificavam com uma condição de virtude individual e pública, ou seja, dirigida ao homem e ao Estado. A associação entre concepções de virtude e moral social atrelava os legisladores das cidades de tal modo que alcançava as suas práticas e os atos políticos, podendo significar a apreciação de uma constituição como boa ou má pela apreciação da vida de seus prolatores. Antes mesmo do direito convergir para a virtude da justiça, sua exteriorização era concebida através da relação entre a pessoa e seus atos havidos no meio social, logo, a atribuição de justo ou injusto derivaria de uma avaliação do agir no ambiente regular da vida civil.

    Estabelecer uma concepção de justiça vinculada à pólis, ambiente notabilizador do convívio, onde a percepção da existência ou não desta virtude transpareceria no plano da vida concreta e social, tornou-se um dos principais alicerces da filosofia política grega, cujos notórios expoentes são o filósofo Platão e seu discípulo Aristóteles.

    A primeira referência de escritos pautada na apreciação da justiça encontra-se nos diálogos de Platão (2007). Na obra, A República torna-se a grande questão levantada nos primeiros títulos. Em seus escritos, o filósofo identificou a justiça com um bem desejado por ser a base de todas as virtudes; a vida justa é apresentada como um alicerce da cidade ideal. Nestes diálogos iniciais, a justiça é apreciada a partir de um discurso de contraposições e é defendida sem que se extraiam conceitos definidores de seu conteúdo.

    Aristóteles (2002) em Ética a Nicômaco promoveu uma sustentação da concepção de justiça de modo a lhe atribuir conteúdo e promover uma série de referenciais sobre o tema. Ao dissociar as virtudes da justiça e da temperança daquelas necessárias às artes, identificou condições consideradas requisitos para a prática do justo, dentre as quais a escolha dos atos em razão do que os caracteriza (BODÉÜS, 2007).

    Segundo o filósofo, os atos e a determinação inabalável em proceder de acordo com a virtude estariam cingidos pela condição de serem virtuosos por si; a escolha e os próprios atos formariam uma única circunstância, evidenciando a relação entre ética e moral. Algumas condições do próprio agente, no entanto, são mencionadas como necessárias para que da sua atuação provenham atos justos, quais sejam o conhecimento do que é feito, a escolha dos atos em função deles próprios e uma firmeza moral inabalável, ou, uma disposição moral firme e imutável. (Aristóteles, 2002, Livro II, 4. p.45)

    Aristóteles firma um modelo de justiça e temperança baseado em elementos de moral, os quais seriam promotores indubitáveis do caráter de ser bom. Esta lógica de correção é uma opção do homem pela virtude, denominada por ele de definição, ou seja, é produto decorrente de uma escolha. O aspecto moral reside na responsabilidade do praticante do ato sobre a qualidade das suas ações. Segundo o filósofo,

    as ações são ditas justas e temperantes quando são tais como as que praticaria o homem justo ou temperante; mas o homem que a pratica não é justo ou temperante apenas por praticá-las, mas sim porque as pratica tal como o fariam os homens justos e temperantes. (ARISTÓTELES, 2002, Livro II,p.46)

    No Livro 5 da obra Ética a Nicômaco, Aristóteles (2002) se atém sobre a questão da justiça mantendo a ideia de que ela é uma "disposição de caráter", ou seja, uma escolha baseada em postulados já firmados, os

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