O agronegócio do algodão: meio ambiente e sustentabilidade
De Yamê Reis
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Sobre este e-book
A Designer de Moda e mestre em Sociologia Política, Yamê Reis aborda de forma objetiva temas como transparência, rastreabilidade e práticas de menor impacto sócioambiental na indústria da moda.
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O agronegócio do algodão - Yamê Reis
Como o agronegócio construiu o discurso da
sustentabilidade para o produto algodão?
Copyright © 2021 by Yamê Reis
Copyright desta edição © 2021 by Livros Ilimitados / Another Hot Books
O selo editorial Another Hot Books é parte integrante do grupo
Another Hot Brand with an American Name.
A publicação da obra O agronegócio do algodão é fruto da parceria entre Editora Livros Ilimitados e Another Hot Books.
Conselho Editorial:
LIVROS ILIMITADOS
Bernardo Costa, John Lee Murray
Another Hot books: Rick Yates
Coordenação Editorial: Gisele Moreira
Revisão: Magda Reis
Diagramação: Larissa Luz dos Santos
Capa e ilustração: Joana Vieira
DADOS INTERNACIONAIS PARA CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Reis, Yamê
O agronegócio do algodão: meio ambiente e sustentabilidade / Yamê Reis. – Primeira Edição – Rio de Janeiro: Livros Ilimitados, 2021.
ISBN: 978-6587041-34-6
1. Agronegócio - Brasil 2. Algodão 3. Meio ambiente 4. Moda - Aspectos ambientais 5. Sustentabilidade ambiental I. Título.
21-72356 CDD-304.2
Índices para catálogo sistemático:
1. Sustentabilidade ambiental : Ecologia 304.2
Aline Graziele Benitez - Bibliotecária - CRB-1/3129
Direitos desta edição reservados à
Livros Ilimitados Editora e Assessoria LTDA.
Rua República do Líbano n.º 61, sala 902 – Centro
Rio de Janeiro – RJ – CEP: 20061-030
contato@livrosilimitados.com.br, www.livrosilimitados.com
Proibida a reprodução, no todo ou em parte, através de quaisquer meios.
Este livro é dedicado à minha mãe, Leonídia
Gomes dos Reis, que desde muito cedo despertou em mim o amor pela Sociologia.
Às minhas filhas Tami e Maya, por todos os aprendizados e incentivos, e ao meu neto Leo, que me faz olhar para o futuro com esperança.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer em primeiro lugar ao Professor Rogerio Ferreira de Souza, coordenador do Programa de Pós-Graduação de Sociologia e Política do Iuperj, que me acolheu de volta à Instituição, para que eu pudesse enfim defender minha dissertação e obter o título de Mestre em Sociologia e Política.
Ao Professor Fernando Vieira, pela oportunidade de me fazer reler alguns clássicos da Sociologia brasileira e por aceitar me orientar nesse campo ainda pouco explorado da Sociologia Ambiental.
Ao Professor Alexandre Camargo, por sua disponibilidade e atenção à construção do meu objeto, sempre com interrogações precisas que muito me ajudaram a estruturar o pensamento.
Ao meu companheiro de jornada, Aloysio Castelo de Carvalho, com quem iniciei meus estudos de Sociologia e Política na PUC-RJ e, mais tarde, no Iuperj da rua da Matriz, e que agora teve a generosidade de me ouvir, contribuindo com sua visão sempre aguçada da Política.
Ao José Augusto de Pádua, meu colega no IUPERJ nos anos 1980, um dos precursores do estudo do Pensamento Ambiental Brasileiro, e que me indicou algumas leituras importantes para a contextualização histórica do meu objeto de estudo.
Agradeço também ao Beto Bina, fundador da Farfarm, que generosamente compartilhou suas pesquisas sobre a agrofloresta têxtil e a regeneração da terra por meio do manejo sustentável pelo pequeno agricultor familiar.
LISTA DE IMAGENS
Tabela 1: Área cultivada por hectare
Tabela 2: Comparativo da safra de algodão 2011/12.
Gráfico 1: Exportação de algodão brasileiro
Gráfico 2: Área cultivada por região
Gráfico 3: Produção de algodão por região
Gráfico 4: Evolução da cotonicultura: relação entre área
cultivada e produção da pluma
Figura 1: Fluxograma das relações com o campo político e de poder
Figura 2: Rede de relacionamentos estruturada pela Sou de Algodão
SUMÁRIO
PREFÁCIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I
MEIO AMBIENTE E SOCIEDADE
1.1. Parâmetros Teóricos
1.2. A Revolução Verde e os Agrotóxicos
1.3. Crescimento Econômico e Sustentabilidade
CAPÍTULO II
O NOVO HABITUS ESTRUTURANTE DO AGRONEGÓCIO DO ALGODÃO
2.1. A Expansão da Fronteira Agrícola do Cerrado
2.2. As Estruturas que Determinam o Campo
2.3. A Sustentabilidade como Princípio Organizador do Algodão Brasileiro: o Papel das Certificações
2.4. As Relações com o Campo Político
2.5. Os Antagonistas
CAPÍTULO III
A Hegemonia Cultural: a Conquista da Adesão do Mercado pela Campanha Sou de Algodão
CONSIDERAÇÕES FINAIS
APÊNDICE
BIBLIOGRAFIA
PREFÁCIO
Esse originalíssimo trabalho cria uma interseção necessária entre o mundo da moda, a produção do algodão, o consumo responsável, a questão dos agrotóxicos e as novas tecnologias agrárias.
Conheço Yamê Reis desde os tempos da fundação do Partido Verde no Brasil. Em meados da década de 1980 um grupo de ambientalistas como eu, Alfredo Sirkis, Fernando Gabeira, a atriz Lucélia Santos e a designer de moda Bia Saldanha, criamos o Partido Verde no Brasil. Yamê era uma entusiasta, como nós todos.
A entrada do mundo da moda na sustentabilidade é incipiente e recente, mas cria um alerta para todos nós que nos vestimos, nos encantamos com o design das roupas e que apreciamos a moda. Yamê Reis faz um mergulho no tema desde o início da produção do algodão no período colonial, passando pela sua expansão no Cerrado brasileiro e a questão da praga do Bicudo, com os vários agrotóxicos usados para combatê-la.
Yamê Reis vai beber na Sociologia de Pierre Bourdier e outros para encontrar modelos de análise de confluência das questões sociais e econômicas com os modos de produção territoriais englobando essas relações e esse exercício do poder. Dessa forma, descreve o modo pelo qual o grupo do agronegócio alcança sua hegemonia e se apropria do discurso da sustentabilidade como único.
Quando fui Ministro do Meio Ambiente do Governo Lula (2008-2010), o Brasil foi o primeiro país em desenvolvimento a ter metas de redução das emissões de gases de efeito estufa. A Embrapa foi fundamental com toda a discussão da tecnologia do Plantio Direto e o Brasil está muito avançado nesse sistema diferenciado de manejo, como também na integração Agricultura-Pecuária- Floresta. Portanto, a Embrapa é vanguarda nas ciências agrárias tropicais, embora esteja sujeita à disputa de vários setores econômicos sobre o direcionamento das pesquisas,
e esse ponto é bem desenvolvido nesse trabalho.
A certificação é outra questão relevante, mas ainda pouco debatida com profundidade. É necessário que ela leve em conta a questão de não usar trabalho infantil, não usar trabalho escravo, não praticar desmatamento, mas muitas vezes deixa de lado a questão dos agrotóxicos, que causam profundos danos não apenas ao meio ambiente como também à saúde e aos direitos dos trabalhadores. Quando agrotóxicos são usados na produção de alimentos tais como tomate ou agrião, todos nós consumimos a nossa dose diária de veneno. Quando usamos uma roupa de algodão produzida com produtos químicos provavelmente ninguém vai se contaminar, porém, aquele agrotóxico pode ter afetado trabalhadores da região, lençóis freáticos, e esse estudo iniciado aqui abre uma linha de pesquisa mais ampla para essa cadeia de produção que não é considerada pelos modelos de certificação.
Existe uma relação muito forte entre a monocultura e o crescimento das pragas: quanto mais um modelo agrícola é simplificado, menos diverso, maior a chance de existirem pragas. A praga não é um bichinho, mas um desequilíbrio da biodiversidade daquele território, e a solução para recuperar o ponto de equilíbrio não pode ser jogar venenos cada vez mais fortes.
Outro ponto relevante da indústria da moda está relacionado com o consumo e o pós-consumo, com a durabilidade dessas roupas e do descarte. A moda vive do apelo à substituição constante de produtos, como se diz criar moda
, e é preciso pensar também de que forma uma visão sustentável pode enfrentar todas essas questões. Então vemos como nesse mergulho pela sustentabilidade acabamos perpassando a própria questão da produção, o início da cadeia produtiva, a expansão da monocultura, que tem também reflexos na restrição da biodiversidade com o desmatamento e o uso dos produtos químicos.
Yamê Reis abre caminho também para futuras pesquisas e ações sobre a questão da saúde dos trabalhadores empregados na cultura do algodão, que pode e deve ser aprofundada pela Fundação Oswaldo Cruz, por exemplo, verificando nessas regiões do cultivo do algodão quais são os agrotóxicos utilizados e quais são as doenças que eles provocam, e os problemas de saúde encontrados nos trabalhadores que manipulam estes venenos. Então vemos que por detrás de lindos vestidos existem modos de produção que impactam diretamente na vida das pessoas e no meio ambiente.
O olhar da Sociologia combinado com uma prática já consolidada de militância ecológica e de sucesso no mundo da moda, levaram Yamê Reis a um conhecimento exato de como tudo isso funciona. Ela nos convida a um itinerário poucas vezes trilhado de pensar do que as roupas foram feitas, por quem elas foram feitas, que veneno foi usado na sua produção, quanto tempo elas duram e como fazer para descartá-las corretamente.
É muito animador ver trabalhos pioneiros como esse não só por tudo o que ele desvenda sobre a expansão do algodão, a questão da Embrapa e as certificações, mas pelo campo que se abre para outras pesquisas que tragam alternativas como, por exemplo, as cooperativas agroecológicas, que conseguem uma diversificação muito maior sem usar veneno no cultivo agrícola.
O Cerrado é a segunda área mais desmatada e a que mais emite carbono para a atmosfera depois da Amazônia. É no Cerrado que está a nossa caixa-d’água, onde nascem os rios do Brasil, e é também a área do país que mais usa agrotóxicos. Então, trabalhos como esse abrem a possibilidade para que surjam ainda mais estudos na área da saúde do trabalhador, da agroecologia e da sustentabilidade, rediscutindo a própria questão das certificações. Acredito que O Agronegócio do Algodão: meio ambiente e sustentabilidade deve ser discutido nas universidades e nos fóruns de sustentabilidade pois a Moda é um setor muito importante que emprega diretamente mais de um milhão e meio de pessoas no Brasil em toda a sua cadeia, que tem uma visibilidade midiática e social tão grande, e que até pouco tempo era de alguma forma alheio a essa discussão.
Yamê foge da superficialidade e faz um mergulho sociológico e propositivo. Considero que é uma leitura bem-vinda, saudável, sustentável e promissora.
Carlos Minc
Ecologista, Professor da UFRJ
Deputado Estadual, Ex-Ministro do
Meio Ambiente
INTRODUÇÃO
O estudo da cotonicultura brasileira se faz relevante por causa do peso e do valor econômico que adquiriu na indústria têxtil global. O algodão, enquanto a segunda fibra mais usada na indústria têxtil, tem sido tema recorrente em todos os fóruns de discussão da sustentabilidade, tanto pelo uso intensivo da água e pelo excesso de fertilizantes e pesticidas quanto pela extensão de terra usada em seu cultivo em monocultura. O tema é aqui abordado tendo em vista as importantes transformações que essa indústria vem sofrendo no sentido de maior transparência, rastreabilidade e práticas de menor impacto ambiental.
O Brasil está entre os quatro principais produtores mundiais do algodão, e espera-se, segundo o então secretário executivo da Abrapa, Marcio Portocarrero, que a safra duplique nos próximos anos por causa da demanda chinesa, que pretende substituir suas plantações de algodão por cereais¹. Essa mesma posição de liderança remonta ao início do século XIX, no período colonial, quando o algodão brasileiro disputava o mercado internacional com o algodão americano e perdeu, pois o mercado estrangeiro investiu em novas tecnologias para o aumento da produtividade.
Pelas condições climáticas propícias ao seu cultivo nas regiões tropicais, o algodão sempre foi uma cultura presente na agricultura brasileira. Os nativos já o conheciam: com ele, os índios fabricavam redes e algumas peças de roupa, ou mesmo tochas incendiárias presas às flechas. No entanto, foi somente após a consolidação da lavoura açucareira que ele passou a ser usado na fabricação de tecidos para as roupas dos escravos.
A Primeira Cadeia Global Capitalista
Com a Revolução Industrial na Inglaterra, na segunda metade do século XVIII, e o grande desenvolvimento da produção da indústria têxtil na Europa, o algodão passou a ser, no período seguinte, um importante produto de exportação, especialmente a partir do território do Maranhão. A partir de então, a cultura algodoeira tomou impulso no Pará, no Ceará, em Pernambuco e na Bahia. Essa configuração dominante do modelo de produção do algodão de monocultura exportadora, cujo território vai do Maranhão até Pernambuco, é um traço estrutural na formação socioeconômica brasileira.
A cadeia produtiva do algodão se constituiu desde o início no século XIX de forma longa e diversificada, forçando os comerciantes a especializações e atuação em diferentes territórios delimitados. Esses aspectos que marcaram sua gestação permanecem até hoje, reforçando o fato de que o algodão foi a primeira grande cadeia produtiva global capitalista. O império do algodão consistia em dezenas de milhares de laços. Nunca uma indústria conectou tantas atividades de tantos produtores, fabricantes e