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Teologias e Ciências das Religiões: experiências, saberes e diversidade: Volume 1
Teologias e Ciências das Religiões: experiências, saberes e diversidade: Volume 1
Teologias e Ciências das Religiões: experiências, saberes e diversidade: Volume 1
E-book311 páginas3 horas

Teologias e Ciências das Religiões: experiências, saberes e diversidade: Volume 1

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Sobre este e-book

Nós - seres humanos [mortais] - somos seres condicionados, porque tudo aquilo com que entramos em contato torna-se, imediatamente, condição de nossa existência. Destarte, deparamo-nos diante da inevitável necessidade antropológica de o ser humano estabelecer um sentido global a partir do qual organiza cada uma das parcelas da realidade com a qual entra em contato, cotidianamente. Existencialmente, todo ser humano mendiga o sentido da existência, mesmo que em graus distintos de explicação: "[...] Todo ser humano tem um sentido para a vida, um eixo articulador para a existência, ao passo que nem todos os seres humanos possuem o mesmo eixo articulador [...]".
Nos últimos dias da humanidade, floresce no terreno da pluralidade religiosa uma diversidade de eixos articuladores, desvelando diversas opções de sentido. Que este escrito vos possibilite uma experiência - "[...] a face do pensamento que se volta para a presença do objeto [...]" - de leituras de sentido!
IdiomaPortuguês
Data de lançamento27 de mai. de 2022
ISBN9786525243139
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    Teologias e Ciências das Religiões - Everaldo dos Santos Mendes

    ESTADO, TEOLOGIA E RELIGIÕES: A SUPREMA ARTE DA EDUCAÇÃO EM EDITH STEIN¹⁵

    Everaldo dos Santos Mendes

    Doutor em Teologia, PUC-Rio; Doutorando em Psicologia, PUC Minas; Pós-doutorado em Teologia, PUC-Rio/ PUCPR; Pós-doutorado em Filosofia, UFS

    ies.istein@gmail.com.

    DOI 10.48021/978-65-252-4314-6-c1

    RESUMO: Neste estudo, objetivei pesquisar a educação em Edith Stein, a partir de imbricações latino-americanas entre Estado, teologia e religiões. No marco teórico-metodológico, delineei uma pesquisa qualitativa de impostação historiobiográfica, que reuniu os escritos — e a história pessoal — de Edith Stein, articulados com as pesquisas atuais sobre o objeto de estudo. Nas reflexões de Edith Stein, o ser humano — concebido como pessoa: um eu consciente e livre, que possui um corpo-vivente [Leib], uma psique [Seele] e um espírito [Geist] — é um ser em potência, aberto para entrar em ato na relação teológico-político-pedagógica com um mestre [experiente]. Não se constitui fundamento de si mesmo. Na condição humana de ser finito — ser criado — endereça-se ao ser eterno, no qual reside a sua finitude: Deus. Edith Stein observa que é algo misterioso a relação entre mãe e filho. Nos primeiros anos de vida da criança, a mãe autêntica — a mãe que está-para-a-criança, que se adapta às suas necessidades, atenta ao que Deus quer do pequeno ser — prepara os primeiros passos da mesma para a instituição escolar. Na etapa da idade escolar, a mãe autêntica e o mestre — de mãos dadas com a comunidade estatal — conduzem a pessoa à humanidade: a comunidade de todos os povos, culturas e religiões. Por fim, a humanidade une-se — em matrimônio nupcial — a Deus.

    PALAVRAS-CHAVE: Deus; mãe autêntica; pedagogia do exemplo vivo; educação para a comunidade estatal; humanidade.

    INTRODUÇÃO

    Ensinamento

    Minha mãe achava estudo

    a coisa mais fina do mundo.

    Não é.

    A coisa mais fina do mundo é o sentimento.

    Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,

    ela falou comigo:

    ‘Coitado, até essa hora no serviço pesado’.

    Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água [quente.

    Não me falou em amor.

    Essa palavra de luxo

    (PRADO, 2003, p. 118).

    Na obra de Edith Stein, o ser humano é declarado pessoa. "[...] Por pessoa concebemos um eu consciente e livre [...]" (STEIN, 1999, p. 397)¹⁶, que possui um corpo-vivente [Leib], uma psique [Seele] e um espírito [Geist]:

    O ser humano é um ser corporal vivo-anímico-espiritual. Enquanto o homem é espírito segundo sua essência, sai de si mesmo com sua vida espiritual e entra em um mundo que se lhe abre, sem perder nada de si mesmo. Exala não só sua essência — como toda elaboração real — de uma maneira espiritual, expressando-se ele mesmo de modo inconsciente: além disso, atua pessoal e espiritualmente. A alma humana enquanto espírito se eleva em sua vida espiritual por cima de si mesma. Mas o espírito humano está condicionado pelo que lhe é superior e inferior: está imerso em um produto material que ele anima e forma em vista de sua configuração de corpo vivo. A pessoa humana leva e engloba seu corpo vivo e sua alma, mas é, ao mesmo tempo, suportada e englobada por eles. Sua vida espiritual se eleva de um fundo obscuro, sobe como uma chama de vela brilhante, mas nutrida por um material que, ele mesmo, não brilha. E brilha ela sem ser absolutamente luz: o espírito humano é visível para si mesmo, mas não é de todo transparente; pode iluminar outra coisa sem atravessá-la inteiramente [...] (STEIN, 2019, p. 388).

    Por ocasião da semana da Páscoa de 1932, a filósofa e educadora contemporânea alemã Edith Stein — fenomenóloga, discípula de Edmund Husserl — proferiu duas conferências na Rádio Bávara de Munique [Alemanha], copiladas num escrito peculiar: A arte materna da educação [Mütterliche Erziehungskunst, 1990]. Partindo do método fenomenológico, Edith Stein refletiu nas duas conferências radiofônicas o caminho que ela propõe para a educação das crianças, da primeira infância à idade escolar.

    1. A EDUCAÇÃO NOS PRIMEIROS ANOS DE VIDA

    No dia 1 de abril de 1932, às 15h15min., Edith Stein falou sobre os primeiros anos da infância no programa Hora da mulher:

    [...] Com que direito pode uma mulher, que não é mãe, atrever-se a falar para mães sobre a arte da educação materna? Quiça vocês pensem que os estudos de psicologia e pedagogia lhe dão direito a isso. E isso é certo. Estes estudos, si se praticam de um modo correto, podem informar-nos sobre aquilo que só o instinto maternal não consegue. De todos os modos será sempre proveitoso se as questões das quais fala a ciência surgem da vida, e se somos capazes de distinguir a conexão entre as afirmações da ciência e os fatos da vida. E, assim, parece-me que, para ganhar sua confiança, é quase mais importante que o estudo científico o fato de eu ter vivido lembranças de infância ricas e estreitamente relacionadas; também o fato de que vi crescer muitas crianças em círculos de familiares e conhecidos e na escola, e que pude observar durante longo período seu desenvolvimento, e que muitos deles depositaram em mim a sua confiança.¹⁷

    Naturalmente, nenhum poder pode ser comparado — em sua importância — com a influência da mãe, em matéria do caráter e destino do ser humano. No tear do existir, [...] se encontramos pessoas que caminham aberta, direta e livremente, e que transmitem luz e calor, então podemos afirmar quase com segurança que tiveram uma infância soleada e que o sol dessa infância foi um são amor materno. Se encontramos pessoas tristes e retraídas ou que mostram desvios ou deformação de caráter, pode-se concluir, com não pouca probabilidade, que em sua juventude faltou ou se perdeu algo, e quase sempre se vê logo que falhou, senão exclusivamente, ao menos também por parte da mãe [...].¹⁸

    Do ponto de vista de Edith Stein, é algo misterioso a relação entre mãe e filho. Por vias intelectivas, nunca poderá o entendimento compreender totalmente como acontece que um novo organismo se desenvolva no organismo materno. Do mesmo modo, padece de explicação o fenômeno de que depois da separação entre mãe e filho, por ocasião do nascimento, permanece um laço invisível — uma força que a mãe pode sentir o que necessita a criança, o que a ameaça, o que lhe sucede —, um maravilho talento para conseguir o necessário e repelir o daninho e uma disposição de sacrifício até a morte. Por este motivo, é insubstituível. Na concepção de Edith Stein, uma criança da qual se arrebata a mãe — ou cuja mãe não é a mãe autêntica — não desenvolver-se-á nunca como aquela que cresce sob a custódia do autêntico amor materno (STEIN, 2003).

    No mês de abril de 1942, Olga Benário — judia militante comunista alemã —, um dia antes da sua morte na câmara de gás, despedindo-se do seu esposo Luís Carlos Prestes e da filha bebê Anita Leocadia, que, tendo nascido na prisão, fora entregue a uma organização humanitária, escreveu do campo de concentração de Ravensbrück [Alemanha]:

    [...] É totalmente impossível para mim imaginar, filha querida, que não voltarei a ver-te, que nunca mais voltarei a estreitar-te em meus braços ansiosos. Quisera poder pentear-te, fazer-te as tranças — ah, não, elas foram cortadas. Mas te fica melhor o cabelo solto, um pouco desalinhado. Antes de tudo, vou fazer-te forte. Deves andar de sandálias ou descalça, correr ao ar livre comigo. Sua avó, em princípio, não estará muito de acordo com isso, mas logo nos entenderemos muito bem. Deves respeitá-la e querê-la por toda a tua vida, como o teu pai e eu fizemos. Todas as manhãs faremos ginástica... Vês? Já volto a sonhar, como tantas noites, e esqueço que esta é a minha despedida. E agora, quando penso nisto de novo, a ideia de que nunca mais poderei estreitar teu corpinho cálido é para mim como a morte (BENÁRIO, 2017, p. 125).

    E, mais adiante, Olga Benário escreve:

    Querida Anita, meu querido marido, meu Garoto: choro debaixo das mantas para que ninguém me ouça, pois parece que hoje as forças não conseguem alcançar-me para suportar algo tão terrível. É precisamente por isso que esforço-me para despedir-me de vocês agora, para não ter que fazê-lo nas últimas e difíceis horas. Depois desta noite, quero viver para este futuro tão breve que me resta. De ti aprendi, querido, o quanto significa a força da vontade, especialmente se emana de fontes como as nossas. Lutei pelo justo, pelo bom e pelo melhor do mundo. Prometo-te agora, ao despedir-me, que até o último instante não terão porque se envergonhar de mim. Quero que me entendam bem: preparar-me para a morte não significa que me renda, mas sim saber fazer-lhe frente quando ela chegar. Mas, no entanto, podem ainda acontecer tantas coisas... Até o último momento manter-me-ei firme e com vontade de viver. Agora vou dormir para ser mais forte amanhã. Beijos pela última vez (BENÁRIO, 2017, p. 125).

    No Estado Novo [Brasil], Olga Benário — naquele que é considerado o mais covarde crime de Estado — fora oferecida numa bandeja ao Estado nazista, grávida, depois do fracasso da Intentona Comunista. Edith Stein observa que a união natural entre a mãe e o filho é o primeiro e mais importante fundamento do poder que outorgamos à influência da mãe; como segundo, a ductilidade da jovem alma nos primeiros anos de vida: [...] Muito antes do que opina o psicólogo laico, a alma da criança recebe suas primeiras impressões que podem permanecer gravadas e ser determinantes para toda a vida [...] (STEIN, 2003, p. 375).¹⁹

    Nas imbricações entre Estado, teologia e religiões, importa-me que do poder da mãe surgem obrigação e responsabilidade. Da mãe — mais do que qualquer outra pessoa — vai depender o que a criatura de Deus venha a ser: como desenvolve-se o caráter da criança e se será feliz ou infeliz (STEIN, 2003).

    [...] Minha mãe sempre foi uma patriota alemã. Casou-se em 1871, a música de seu casamento foi tirada do texto Es braust ein Ruf wie Donnerhall [Estronda um grito como um trovão], e não admitia, nem admite ainda hoje, ser contestada na sua germanidade (STEIN, 2018, p. 50).

    Nas reflexões de Edith Stein, a primeira obrigação que corresponde à mãe — constituindo-lhe como mãe autêntica — é a de ter que estar para a criança: sempre que as condições de vida permitam de algum modo, o que não se tenha que fazer representar por outra que nunca poderá substitui-la completamente. Porém, estar-para-a-criança não implicar estar-sempre-com-ela. Nos casos da mãe ter que se ausentar da criança, por motivos profissionais, de saúde etc., deve-se ter o devido cuidado a quem confiar a criança, para não a expor aos danos de alguém sem consciência ou insensato (STEIN, 2003).

    Na experiência da mãe autêntica, o amor-próprio materno — no qual a criança floresce como planta exposta ao suave calor do sol — é consciente de que não está aí para ela: nem como brinquedo para preencher o tempo vazio, nem para silenciar seu desejo de ternura, nem para satisfazer sua vontade e ambição. No seio da mãe autêntica, a criança revela o seu rosto de criatura de Deus, chamada por Ele à existência para participar da comunidade estatal [a comunidade dos indivíduos que vivem no Estado] e da humanidade [comunidade de todos os povos, culturas e religiões] (STEIN, 2003; 2022; MENDES, 2020).

    Na pedagogia de Edith Stein, identifiquei os princípios essenciais da educação: o conjunto da arte da educação tem que ser regido pelo amor, percebido em toda medida tomada, sem dar lugar ao temor. Na práxis político-pedagógica, o meio mais eficaz da educação revelado nos escritos de Edith Stein não é a palavra doutrinante, mas o exemplo vivo sem o qual toda palavra carece de valor. Para Edith Stein, uma mãe autêntica deverá — antes do início da etapa escolar — conduzir a criança a uma correta relação com os seres humanos e com Deus. Os fundamentos de toda vida comum humana são confiança e consideração. Logo cedo, surgem no espírito da criança as perguntas pelos mistérios da vida; um sem-fim de porquês" até que não lhe conduza à fonte necessária de todo ser e de toda verdade, onde toda pergunta encontra seu repouso (STEIN, 2003).

    No caso da mãe autêntica crente, Edith Stein recomenda-lhe que leve a criança a conhecer o Pai celeste o quanto antes, pois:

    [...] Sabe que não tem o poder de proteger seu filho de todos os perigos do corpo e da alma, que antes ou depois surgirão. Ela sabe também que não estará sempre ao lado do seu filho. Por este motivo ela tem que ensiná-lo, logo que ele seja capaz de entender, a colocar-se nas mãos de Deus, a buscar nEle consolo e ajuda e a ver nEle o critério de seu agir. Se ela consegue isto, pode ficar tranquila sobre o futuro de seu filho (STEIN, 2003, p. 380).²⁰

    2. A EDUCAÇÃO DA CRIANÇA NA IDADE ESCOLAR

    No dia 3 de abril de 1932, Edith Stein refletindo sobre as crianças durante a idade escolar, pronuncia as seguintes palavras:

    Quando uma mãe leva a criança pela primeira vez para a escola tem que ter clara a ideia de que para os dois começa uma nova etapa na vida. Um mundo totalmente novo se abre diante da criança. Entra em um círculo de companheiros da mesma idade. No lugar da mãe surge, durante umas quantas horas do dia, outra grande pessoa, que lhe quer guiar e formar e à qual tem que se acomodar. Cada dia e cada hora uma grande quantidade de novas impressões e estímulos se acumulam na jovem alma e têm que ser assimiladas (STEIN, 2003, p. 380).²¹

    Na etapa escolar, a criança não está somente nas mãos da mãe autêntica. Porém, se esta mãe inculcou no filho os fundamentos para um posterior desenvolvimento e trabalho educativo, deve-se pensar que ela preparará com todo cuidado o passo da criança para a educação formal, apresentando-lhe a instituição escolar como algo belo sobre o qual pode alegrar-se. No entanto, os pais — poucos preocupados e reflexivos — tendem a usar a escola e os mestres como ameaça, produzindo na criança temor e receio (STEIN, 2003).

    Edith Stein — sobre sua história pessoal — escreve:

    [...] Quando os dias eram bons, podíamos brincar no depósito de madeira. Era um paraíso para as crianças, e nós nos reuníamos lá quando não estávamos na escola [não somente nós, os filhos, mas também as outras crianças de nossa casa, os amigos de escola e os filhos dos parentes]. Minha mãe dava a regra: Obedecer e não perturbar! Para além disso, vocês podem fazer o que quiserem! Com muita alegria, fizeram uma gangorra, colocando uma tábua sobre um cavalete de madeira: uma criança se sentava numa extremidade e rapidamente estava no alto. Ficávamos brincando horas a fio, sem nos cansar dessa brincadeira. Também brincávamos de esconde-esconde entre as numerosas pilhas de tábuas, umas mais baixas e outras mais altas. Dentro do depósito ficavam as tábuas ou pranchas sensíveis às intempéries. Elas eram empilhadas de modo a formar verdadeiros andaimes, o que exigia escadas para alcançar o topo, que era escuro. Nessa penumbra era possível se esconder, sonhar e contar histórias [...] (STEIN, 2018, p. 61).

    Edith Stein reflete — assombrosamente — sobre o descuido na eleição da escola, por parte dos pais e responsáveis: matriculam-se as crianças sem nenhuma preocupação de antes conhecerem o espírito e o método com que a educação e as aulas são levadas a cabo — e sem saberem a que tipo de pessoas os filhos são confiados. Dito em poucas palavras: irresponsavelmente, os pais e responsáveis ignoram a proposta político-pedagógica da instituição escolar (STEIN, 2003).

    Politicamente, a educação — formal e informal — não é neutra:

    [...] a educação é um ato político. Não há prática educativa indiferente a valores. Ela não pode ser indiferente a um certo projeto, desejo ou sonho de sociedade. Ninguém é educador por simples acaso. Ninguém forma por formar. Há objetivos e finalidades, que fazem com que a prática educativa transborde dela mesma. Isso não quer dizer que a educação seja uma prática partidária [...] (FREIRE, 1989, p. 20).

    Na conferência do dia 3 de abril de 1932, Edith Stein refletiu sobre o surgimento de uma nova escola, fruto de acaloradas lutas de reforma — uma escola nascida de um autêntico amor pelas crianças, de uma séria vontade de educadores e de um elevado idealismo, organizada de diversos modos. Edith Stein reflete que os educadores de todo tipo — da educação infantil ao ensino superior —, os teóricos e práticos e os especialistas da administração educativa prepararam e empreenderam a reforma, levando-a a cabo. Não obstante, desapareceu — lamentavelmente — a participação dos pais e responsáveis. Historicamente, a escola cidadã seguiu atuando ao modo do Estado autoritário — [...] a educação segundo o princípio: o silêncio é a primeira obrigação do cidadão [...] (STEIN, 2003, p. 381).²²

    O Estado — de base contratualista — colocou sua mão [pesada] sobre a escola: dirige-a, assume uma grande parte dos custos de manutenção e obriga à assistência. Os súditos devem matricular os seus filhos na escola — e nada mais. Na presente conferência, Edith Stein menciona o Estado democrático, que possibilita a todo cidadão — inclusive as mulheres — a participação da configuração do sistema educativo (STEIN, 2003). [...] Minha mãe costumava dizer que, para ela, cada filho era um enigma singular [...] (STEIN, 2018, p. 46).

    Pedagogicamente, eis o caminho e a função da mãe autêntica:

    [...] cada vez mais retrair-se, não querer fazer valer a própria pessoa, senão mirar até a meta: que a criança chegue a ser o que Deus quer dela. No início, se dá à criança tudo em suas mãos, e cada vez mais se lhe emancipa e antes ou depois chega o dia em que exteriormente tem que dar-lhe tudo, quase como um segundo nascimento, uma separação espiritual, que pode ser muito mais doloroso do que o primeiro. Não ajuda em nada por resistência. Quanto mais se engane a mãe em manter o filho para si e retê-lo, com maior segurança e definitivamente o perderá, inclusive ainda que lhe pudesse levar a que exteriormente permanecesse com ela. Quanto mais disposta esteja a devolvê-lo nas mãos [7v] de quem lhe deu, tanto mais seguro pode esperar que lhe será novamente ofertado em sentido novo, elevado e santo (STEIN, 2003, p. 386).²³

    3. ESTADO, EDUCAÇÃO E RELIGIÕES

    Nos escritos de Edith Stein, a primazia da esfera religiosa diante das demais e a obediência — absoluta — exigida por ela dos mandamentos da Lei de Deus revelam-se incompatíveis com a obediência incondicional que o Estado exige de suas ordens. Nas relações tecidas entre religião e modernidade não podemos negar que toda pessoa humana está submetida, primordialmente, ao Soberano supremo — e nenhuma relação de senhorio terrestre pode modificar esta situação. No Estado,

    […] se o crente recebe uma ordem de Deus — seja diretamente, na oração ou por meio do representante divino na terra —, o crente tem a obrigação de obedecer, sendo indiferente que para isso tenha que atuar ou não contra a vontade do Estado (STEIN, 2005, p. 648).²⁴

    Na vida política, delineada em circunstâncias concretas da existência do Estado, Sigmund Freud aponta duas exigências de poder, que se excluem mutuamente. Na vivência intersubjetiva do Estado, o maior crime-pecado é não ter amado, "[...] ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a

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