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Direito Penal e os Direitos Sociais
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E-book551 páginas7 horas

Direito Penal e os Direitos Sociais

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Sobre este e-book

O livro Direito Penal e os Direitos Sociais dedica-se à análise dos direitos sociais e o Direito Penal. Investiga a doutrina da função promocional do Direito Penal que ganhou fôlego no Brasil com a promulgação da Constituição de 1988, refundando a República sob a forma de um Estado Democrático de Direito (Estado Social e Democrático de Direito), contemplando não apenas os direitos fundamentais tipicamente individuais como aqueles de ordem coletiva e difusa, aí incluídos os direitos sociais. Destarte, procura saber se o Direito Penal não teria como escapar da necessidade de releitura das suas funções, permitindo-se o seu uso para a concretização dos direitos sociais e promoção da justiça social. A despeito do conjunto de temas que formaram o objeto da presente pesquisa, ela guiou-se pelas seguintes indagações: A função promocional do Direito Penal encontraria abrigo na dimensão atual do Estado Social e Democrático de Direito? Estariam sendo respeitados os princípios penais clássicos nessa perspectiva promocional no Direito Penal? Teria o Direito Penal adequação para exercer a nova função que lhe foi atribuída? A hipótese é de que a doutrina da função promocional do Direito Penal, embora afirme partir de bases constitucionais, parece não as possuir, pelo que a pesquisa procura contribuir no aclaramento dessa situação, inclusive para determinar se há (in)adequação teleológica e instrumental do Direito Penal para concretização de direitos sociais e promoção da justiça social.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento28 de jun. de 2022
ISBN9786525241661
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    Direito Penal e os Direitos Sociais - Bruno de Omena Celestino

    1. DIREITOS SOCIAIS

    1.1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

    Para adentrar na temática da relação entre direitos sociais e o Direito Penal, em especial do que se entende como sendo função promocional do Direito Penal, faz-se mister a análise prévia do que seja direitos sociais. O presente capítulo dedica-se à breve análise do conceito de direitos sociais.

    1.2. DIREITOS SOCIAIS

    Os direitos sociais são espécie do gênero direitos fundamentais cuja origem remonta ao contexto da passagem dos Estados Liberais para os Estados Sociais. A finalidade geral dos direitos sociais é assegurar condições existenciais mínimas ao indivíduo de forma a permitir a concretização dos direitos de liberdade e igualdade, corrigindo ou diminuindo as distorções existentes no âmbito das sociedades liberais, nas quais o acesso aos bens e recursos são desiguais e, dessa forma, também os meios para o gozo efetivo das promessas liberais. Almejam, com sua concretização, a promoção de igualdade material e de justiça social, onde as desigualdades sejam eliminadas e todos os indivíduos sejam capazes de alcançar meios necessários para o desenvolvimento pleno de suas liberdades.¹

    Cunha Júnior anota que os direitos sociais são posições jurídicas que credenciam o indivíduo a exigir uma prestação do Estado de forma a concretizar direitos que permitam o exercício efetivo das liberdades fundamentais e fazendo com que exista uma igualização entre socialmente desiguais. A obrigação de fazer (facere) distingue tais direitos se comparados com os direitos de liberdade (de defesa) marcados pela postura omissiva (ne facere).²

    Moraes caminha no mesmo sentido, entendendo-os como liberdades positivas e de observância obrigatória, uma decorrência do Estado Social de Direito e tendo por finalidade melhorias das condições de vida aos hipossuficientes e a concretização da igualdade social.³

    Fernandes aponta para a natureza prestacional, que está vinculada a um atuar permanente, de natureza material, de bens dotados de valor econômico e, por isso, dependeria, em parte, de condições econômicas dos Estados.

    Meireles destaca que embora possam existir dimensões negativas nos direitos sociais (chamadas de liberdades sociais), o que realmente faz distinção é a sua natureza prestacional.

    Nesse diapasão, embora os direitos sociais possam exercer outras funções além daquelas de natureza promocional, pois a constitucionalização dos direitos sociais e a elevação desses à natureza de direitos fundamentais promoveram mudanças no campo da hermenêutica constitucional, é fato que a exigência de materialização pela atuação positiva do Estado é a principal característica dos direitos sociais.

    Outra característica conceitual imprescindível, além da natureza a promocional, é a sua perspectiva teleológica, isto é, instrumentalização para consecução de um fim de igualdade material, isto é, a materialização da justiça social.

    Um dos conceitos mais autorizados sobre o tema na doutrina constitucional brasileira é de Afonso da Silva:

    Assim, podemos dizer que os direitos sociais como dimensão dos direitos fundamentais do homem, são prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualização e situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se ligam ao direito de igualdade. Valem como pressupostos do gozo dos direitos individuais na medida em que criam condições materiais mais propícias ao auferimento da igualdade real, o que, por sua vez, proporciona condição mais compatível com o exercício efetivo da liberdade⁷ .

    A perspectiva será referendada por diversos outros autores. Ramos Tavares parte da mesma premissa conceitual: Os direitos sociais, como direitos de segunda dimensão, convém relembrar, são aqueles que exigem do Poder Público uma atuação positiva, uma forma atuante na implementação da igualdade social dos hipossuficientes.⁸ No mesmo sentido estão Araújo e Nunes Júnior quando afirmam que: Vale lembrar, nessa linha de reflexão, que os direitos sociais, como os direitos fundamentais de segurança geração, são aqueles que reclamam do Estado um papel prestacional, de minoração das desigualdades sociais. ⁹ Convém ainda mencionar o compartilhamento do conceito por Oliveira.¹⁰

    A justiça social é uma situação ideal que pressupõe a promoção material da igualdade, noutras palavras, a eliminação ou redução de todas as formas de desigualdades dentro de uma sociedade. O grau do quantum e da extensão desse escopo dependerá da concepção de justiça social adotada pela Constituição.

    Em concepções utópicas de justiça social, a eliminação de toda e qualquer forma de desigualdade social é o fim a ser perseguido. Dessa forma, a estrutura social e do Estado seria revolucionada de forma a perseguir, a qualquer custo, este fim. Trata-se, e.g., da situação do socialismo radical (também chamado por seus defensores de socialismo científico), o que levaria a uma situação final e ideal de comunismo, como foi proposto por Marx e Engels em famoso escrito Manifesto Comunista, no qual propõem a superação de todas as formas tradicionais de ordenação social, desconhecendo instituições como leis, moral e religião, na medida em que seriam meros preconceitos burgueses que justificariam a subjugação, dominação e desigualdade. ¹¹

    Logo, a classe do proletariado não deveria se apoderar dos meios de produção de forma a distribuir riquezas, senão através da destruição de todas as garantias e seguranças da propriedade privada.¹² Daí porque propõem medidas radicais como expropriação da propriedade fundiária, emprego da renda da terra nas despesas do Estado, impostos fortemente progressivos, abolição de direitos de herança, confisco da propriedade de todos os emigrados e rebeldes, centralização do crédito e monopólio exclusivo do Estado, unificação e trabalho obrigatório, exércitos industriais, abolição gradual das diferenças entre cidades e o campo etc.¹³

    Uma perspectiva moderada ou democrática de justiça social, no entanto, como ocorre na maioria das doutrinas sociais-democráticas ocidentais, não propõe a revolução da estrutura social e do Estado, mas sua reforma, cujo fim é a redução ao máximo possível das hipóteses de desigualdade.

    Essa é a conclusão que chega Bonavides acerca da diferença entre Estados Sociais e Estados Socialistas. No primeiro, há uma maior intervenção do Estado em áreas nas quais vigia a iniciativa exclusivamente individual, no momento em que são conferidos direitos sociais como trabalho, previdência, educação, intervenção da economia para combate ao desemprego, regulação de preços, proteção de enfermos etc., enquanto nos Estados socialistas há a supressão ou estorvo da iniciativa privada.¹⁴ A visão democrática na busca por justiça social, portanto, seria o que qualificaria o Estado Social em contraposição ao Estado socialista, pois:

    À medida, porém, que o Estado tende a desprender-se do controle burguês de classe, e este se enfraquece, passa ele a ser, consoante as aspirações de Lorenz von Stein, o Estado de todas as classes, o Estado fator de conciliação, o Estado mitigador de conflitos sociais e pacificador necessário entre o trabalho e o capital. Nesse momento, em que se busca superar a contradição entre a igualdade política e desigualdade social, ocorre, sob distintos regimes políticos, importante transformação, bem que ainda de caráter superestrutural. Nasce, aí, a noção contemporânea do Estado social.¹⁵

    A noção de justiça social que é adotada pela Constituição Federal é a de uma social-democracia ou de um Estado de Bem-estar Social (welfare state) e isso pode ser verificado logo no art. 1º, IV, no momento em que se coloca como fundamentos e princípios do Estado Democrático de Direito tanto os valores sociais do trabalho quanto a livre iniciativa. O art. 3º, I, define como objetivo fundamental a constituição de uma sociedade justa e solidária, ao mesmo o tempo em que, também, almeja uma sociedade livre. No inciso III do mesmo artigo, há uma pretensão radical de erradicar a pobreza e marginalização, mas, logo em seguida, afirma que busca reduzir a desigualdade.

    Portanto, a Constituição brasileira não busca, a todo o custo, a justiça social, muito menos acredita que alcançá-la-á de forma plena, contentando-se com a melhor possível, na medida em que assegura a liberdade, a livre iniciativa e busca reduzir, e não eliminar, as desigualdades, admitindo, portanto, que haverá certa desigualdade. Admite, enfim, uma perspectiva de justiça social moderada ou democrática, típica de um Estado Social e Democrático de Direito (ou Estado Democrático de Direito), não admitindo, todavia, uma concepção de Estado socialista.

    Operacionaliza-se através de direitos sociais, os quais caminharão na mesma senda dos direitos individuais tradição liberal. Buscam a minimização das desigualdades e a maximização dos pressupostos fáticos para o exercício material da liberdade.

    Acentua Cunha Júnior:

    Os direitos sociais, como típica emanação do modelo de Estado de Bem-Estar Social, destinam-se a amparar o indivíduo nas suas necessidades espirituais e materiais mais premente, objetivando resguardar-lhe um mínimo de segurança social, relativamente à saúde, à educação, à previdência, à assistência socia etc., como exigência da própria dignidade da pessoa humana. Por assim dizer, são direitos que tem por propósito garantir um mínimo necessário a uma existência digna, traduzindo na disponibilidade de recursos materiais indispensáveis à satisfação dos postulados da justiça social. Em razão disso os direitos sociais dependem, em regra, de prestações materiais positivas do Executivo e de providências jurídico-normativas do Legislativo. Mas nem por isso esses direitos deixam de ser imediatamente exercidos. ¹⁶

    Democracia e liberdade são também pressupostos da justiça social buscada pela Constituição, razão pela qual não reza a utopia de se eliminar as desigualdades sociais, mas sua redução, respeitando os direitos de tradição liberal, sem pretensão, ademais, dos direitos sociais se arvorarem à condição de superioridade axiológica em face os demais interesses.

    Destarte, Meireles afirma que os direitos sociais [...] surgiram em face das circunstâncias que revelaram a sua imprescindibilidade para o exercício dos direitos fundamentais de primeira dimensão e que, por isso, como já dito, não os substituíram. Somaram-se a eles.¹⁷

    O sentido de justiça social na Constituição de 1988 assemelha-se ao conceito ofertado por John Rawls acerca da legitimação geral do Direito, isto é, fairness. Para Rawls, nas sociedades democráticas a justiça é a primeira virtude das instituições, contudo isso não significa que o interesse da maioria suplantaria os direitos da minoria, pois, em uma sociedade justa as liberdades de cidadãos iguais (e esta igualdade é aquela formal) está assegurada e a salvo de barganhas políticas ou meros cálculos sociais de interesses (utilitarismos). Apenas seria possível imposições de injustiças (relativizações de interesses individuais), se aquela medida for necessária para evitar uma injustiça muito maior.¹⁸ Essa sociedade justa é aquela na qual todos aceitam os mesmos princípios de justiça e as instituições sociais satisfazem ou sabem como satisfazer tais princípios de justiça. ¹⁹

    Contudo, reconhecendo que pessoas divergem acerca dos valores veiculados nos princípios básicos de justiça, Rawls afirma que exsurge na sociedade a necessidade de estabelecimento de um sistema direitos e deveres que assinalem um consenso geral quanto a distribuição de ônus e bônus que justifiquem a cooperação social. ²⁰

    Ademais, sabendo que os conceitos de justiça são distintos entre os homens, uma sociedade justa também pressupõe que suas instituições sociais sejam justas e que não façam distinções arbitrárias quando da aplicação dos direitos e deveres básicos, exigindo regras que determinem um adequado balanceamento entre interesses concorrentes em relação às vantagens de uma vida social, de forma que essa relação exerça o papel de ajudar a identificar os princípios de justiça social. ²¹

    Para Rawls, a justiça do esquema social depende essencialmente do quanto serão assegurados os direitos e deveres fundamentais, as oportunidades econômicas e as condições sociais em vários setores da sociedade.²²

    Estabelecidas tais premissas, pode-se concluir que os direitos sociais são espécies de direitos fundamentais que se caracterizam por uma natureza promocional, visto que se materializam pela atuação positiva do Estado, assim como possuem um fim de justiça social democrático.

    1.3. ESPÉCIES DE DIREITOS SOCIAIS

    Faz-se necessário entender quais são os direitos sociais assegurados em nossa Constituição.

    Classificar quais sejam os direitos sociais previstos na Constituição Federal, entretanto, não é tarefa simples. Primeiro, porque existem divergências na doutrina acerca dos critérios de classificação. Em segundo lugar, porque os direitos sociais estão dispostos de forma esparsa na Constituição. Em terceiro lugar, pois com a natural evolução das estruturas sociais, novos interesses até então inexistentes vão surgindo e sendo reclamados, desafiando, portanto, qualquer pretensão absoluta de sistematização do rol de direitos sociais.

    Não se deve olvidar, outrossim, sendo os direitos sociais considerados como fundamentais, podem ser ampliados de forma a contemplar novos direitos através da celebração de tratados internacionais ou mesmo em decorrência do sistema de princípios, como expressamente reza o art. 5º, §2º, da Constituição.

    Entretanto, essas considerações não impedem um esforço, resumido, de arriscar-se em uma classificação que conte com um certo consenso na doutrina.

    Meireles afirma que são direitos sociais as normas previstas no Título VIII da Constituição Federal, que tratam da Ordem Social, bem como aquelas previstas no Capítulo II do Título II, uma vez que expressamente nominam o que sejam direitos sociais, esclarecendo, no entanto, que mesmo no Título VIII haverá normas que não são direitos sociais (e.g., arts. 199 e 200) .²³

    É a mesma classificação adotada por Coelho, ao aludir, novamente, para o Título II, Capítulo II, que trata dos direitos fundamentais, em que estariam inclusos os direitos nominados como sociais e direitos dos trabalhadores, bem como aqueles especificados no Título VIII da Constituição Federal que trata da Ordem Social.²⁴

    Fernandes, amplia o leque de direitos sociais. Partindo da classificação de José Afonso da Silva²⁵ reconhece como sociais os direitos do art. 6º (direitos sociais em espécie), isto é, direitos sociais dos trabalhadores, direitos sociais de seguridade social (que englobariam direitos à saúde, previdência e assistência social), direitos sociais à educação, à cultura e à moradia. Também inclui com direitos sociais aqueles direitos relacionados com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e com os interesses sociais das crianças e dos idosos.²⁶ É a mesma posição seguida por Cunha Júnior.²⁷

    Bulos ampliará um pouco mais a classificação quando considera como sendo sociais os direitos dos trabalhadores, direitos de seguridade (saúde, assistência social e previdência social), direitos de educação, cultura, lazer, segurança, moradia e alimentação, direitos das famílias, crianças e adolescentes e idosos e direitos de grupos, que englobariam liberdades sindicais, direitos de greve, direitos de contratos coletivos de trabalho, cogestão e autogestão.²⁸

    Ramos Tavares fará uso da classificação que consagra cinco ordens de categorias: os direitos sociais dos trabalhadores, que incluiriam os direitos sociais e individuais e os direitos coletivos dos trabalhadores; os direitos sociais de seguridade social, compreendendo direito à saúde, à assistência social e à previdência social; direitos sociais de natureza econômica, envolvendo direitos de busca de pleno emprego, redução de desigualdades sociais e regionais, erradicação da pobreza e marginalização, defesa do consumidor e da livre concorrência; e direitos sociais de cultura, que englobam direito à educação e direito à cultura.²⁹

    Na presente pesquisa, todavia, adotaremos uma compreensão ampliativa dos direitos sociais, reconhecendo como tais os direitos expressamente elencados no art. 6º da Constituição Federal, isto é, os direitos à(ao): (a) educação; (b) saúde; (c) alimentação; (d) trabalho; (e) moradia; (f) transporte; (g) lazer; (h) segurança; (i) previdência social; (j) proteção à maternidade; (h) proteção à infância e (i) assistência aos desamparados. Partilhamos, outrossim, do entendimento de Coelho de que muitos desses direitos encontrarão sentido no Título VIII da Constituição. ³⁰Contudo, neste título existem outros direitos sociais que não estão referidos expressamente no art. 6º, como o direito social ao meio ambiente equilibrado previsto no art. 225 da Constituição.

    Essa natureza ampliativa e esparsa dos direitos sociais no texto constitucional é aceita por Araújo e Nunes Júnior.31

    É importante destacar que alguns direitos sociais possuem função negativa ou defensiva, isto é, exigirão do Estado um dever de abstenção ou ne facere. Isso somente poderá ser compreendido se previamente forem admitidas duas premissas gerais dos direitos fundamentais: a classificação dimensional (ou geracional) dos direitos fundamentais, embora importante, é insuficiente per se; alguns direitos fundamentais possuem funções diversas daquelas mais destacadas utilizadas para fins de classificação abstrata e prévia.

    Sarlet afirma que a classificação sistemática e objetiva dos direitos fundamentais é complexa, considerando a existência de uma diversidade perspectivas típicas dos direitos fundamentais. Apesar da relevância do agrupamento em dimensões ou gerações, esta é insuficiente para resolver satisfatoriamente todos os problemas. Possibilita uma compreensão abrangente, mas não consegue explicar a diversidade de funções exercidas por direitos fundamentais de uma mesma dimensão. ³²

    Com o fim de melhor compreender esse fenômeno, Sarlet assume de forma relativa a doutrina da teoria dos quatros status de Georg Jellinek, classificando a situação (status) do indivíduo de acordo com a sua relação com o Estado, podendo ser: status subjectionis, em que há uma submissão do indivíduo aos poderes do Estado, estando aí seus deveres; status negativus, em que há uma esfera de liberdade do indivíduo em face do imperii do Estado, gerando um dever do Estado de se abster; status positivus ou civitatis, que é a posição do indivíduo de exigir do Estado uma atuação para determinadas ações; e status activus, no qual pretende-se ver como titular de competências e participador da formação da vontade estatal.³³

    Nessa premissa, agregando as contribuições de Robert Alexy e as perspectivas objetiva e subjetiva dos direitos fundamentais, propõe Sarlet a seguinte classificação: direitos de defesa; e direitos de prestação, sendo que neste último grupo haveria a subdivisão em direitos de prestação em sentido amplo (que, também, dividem-se em direitos à proteção e direitos à participação e procedimento; direitos de prestação em sentido estrito.³⁴ Desta feita, aproxima a noção comumente atribuída aos direitos fundamentais sociais à duas categorias: direitos sociais à prestações em sentido estrito, em que a finalidade é assegurar a compensação das desigualdades sociais e o real exercício da liberdade e igualdade (aqui incluídos o direito à saúde, educação, assistência social etc.); direitos sociais negativos, que comportam direitos sociais prestacionais em sentido amplo e também clássicos direitos de defesa, e nesta última função são chamados de liberdades sociais.³⁵ Como exemplo dessa última faceta, tem-se as liberdades sociais, como a limitação da jornada de trabalho, defesa das convenções e acordos coletivos de trabalho, igualdade entre trabalhadores com vínculo empregatício e avulso, liberdade de associação, direito de greve etc.³⁶

    Meirelles afirma que são também direitos sociais as liberdades sociais, pois buscam a concretização da liberdade e igualdade mediante omissões do Estado e particulares, inclusive exigindo proteção em face de agressões, exemplificando alguns direitos trabalhistas como limitação da jornada de trabalhos, reconhecimento de convenções e acordos coletivos, liberdade de associação sindical, direitos de greve etc.³⁷

    Com efeito, é fato que existem direitos sociais que exigem uma abstenção do Estado (eficácia vertical) e dos indivíduos (eficácia horizontal). São conhecidos como liberdade sociais, em alusão à natureza preponderante de defesa, isto é, defesa da liberdade individual.

    Podemos citar exemplos, nos quais a Constituição estabelece direitos sociais como fundamentais e que exigem uma ação negativa (abstenção) em favor do titular:

    (a) jornada de trabalho não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais (at. 7º, XIII);

    (b) jornada de seis horas para trabalho ininterrupto (art. 7º, XIV);

    (c) repouso semanal remunerado (art. 7º, XV);

    (d) proibição de diferença salariais do exercício de funções por questão de sexo, idade, cor ou estado civil (art. 7º, XXX);

    (e) proibição de qualquer discriminação de salários em razão de trabalhador deficiente (art. 7º, XXXI);

    (f) proibição de distinção entre trabalhadores manuais, técnicos e intelectuais (art. 7º, XXXII);

    (g) proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre para menores de dezoito anos, de qualquer trabalho a menores de dezesseis, salvo aprendiz (art. 7º, XXXIII);

    (h) igualdade de direitos entre trabalhadores com vínculos empregatícios e trabalhadores avulsos (art. 7º, XXXIV);

    (i) vedação de autorização, salvo registro, para fundação de sindicato (art. 8º, I);

    (j) vedação de obrigatoriedade para filiação sindical – liberdade de associação sindical (art. 8º, V);

    (k) vedação de dispensa de empregado sindicalizado, salvo falta grave, que é candidato ou eleito para cargo de direção ou representação sindical até um ano após o final da eleição (art. 8º, VIII);

    (l) vedação de discriminação nas condições para acesso e permanência na escola (art. 206, I);

    (m) liberdade de aprender, ensinar, pesquisar, divulgar o pensamento, arte e o saber (art. 206, II);

    (n) vedação de obrigatoriedade de ensino religioso, apenas facultativo (art. 210, §1º);

    (o) autonomia das entidades desportivas quanto à organização e funcionamento (art. 217, I).

    Como se percebe, nos direitos sociais de função negativa ou liberdades sociais, o gozo pelo titular pressupõe uma abstenção, um ne facere do Estado e particulares o que, em alguns casos, aproxima os conceitos e natureza dos direitos fundamentais individuais defensivos dos direitos sociais.

    Isso, no entanto, como explica Alexy apenas reforça uma visível similaridade entre as duas grandes categorias de direitos fundamentais, isto é, os de natureza preponderantemente defensiva (o que é geralmente tomado pela forma generalizante de direitos individuais) com os direitos sociais de natureza preponderantemente prestacionais. Logo, a similaridade de problemas faz com que fique claro que o fosso que separa os direitos da tradição liberal e os direitos próprios do Estado Social não é assim tão fundo quanto seria possível supor à primeira vista.³⁸

    1.4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

    Como visto, os direitos sociais possuem uma natureza multifacetada. Embora os direitos sociais sejam oponíveis em face do Estado para o cumprimento de um dever prestacional, também podem exercer uma função negativa. Essa complexa natureza jurídica pode ser considerada como uma das causas para a multiplicidade de abordagens e classificações dos direitos sociais. A despeito disso, a exigência de um comportamento promocional do Estado com o fim máximo de se alcançar a justiça social é, sem dúvidas, sua principal característica. Ademais, uma vez que alçados à condição de direitos fundamentais, os direitos sociais se irradiarão sobre todo o ordenamento jurídico influenciando a interpretação e aplicação do Direito.

    Feitas as considerações sobre a natureza e as funções dos direitos sociais, percebe-se então a importância de analisar a relação destes com o Direito Penal. Se os direitos sociais influenciam a interpretação e aplicação do ordenamento jurídico, cumpre investigar se exercem mudanças significativas nas funções do Direito Penal, isto é, se existe uma função promocional das normas penais.


    1 Quanto à origem dos direitos sociais, v. MEIRELES, Ana Cristina Costa. A Eficácia dos Direitos Sociais. Salvador: Juspodivm, 2008, p. 38-42. Em sentido semelhante, v. tb. FERNANDES, Bernando Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 587.

    2 CUNHA JÚNIOR., Dirley da. Curso de Direito Constitucional. Salvador: Lumens Juris, 2008, p. 691-692.

    3 MOARES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 6. ed. São Paulo: 2006, p. 479.

    4 FERNANDES, Bernando Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 588.

    5 MEIRELES, Ana Cristina Costa. A Eficácia dos Direitos Sociais. Salvador: Juspodivm, 2008, p. 75.

    6 Manoel Gonvalves Ferreira Filho prefere utilizar a perspectiva do objeto dos direitos fundamentais como melhor exemplo de classificação. Dessa forma, discorrendo sobre o que seriam os direitos de crédito ressalta a característica promocional daqueles que são conhecidos como direitos sociais: A tipologia mais expressiva é a que leva em conta o objeto dos direitos fundamentais [...] Os direitos de crédito são poderes de reclamar alguma coisa; seu objeto são contraprestações positivas – em geral prestações de serviços. Por exemplo, o direito ao trabalho, à educação, à (proteção da) saúde, cf. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 126. Essa aproximação está mais clara quando discorre acerca dos direitos sociais em si, os quais, não por acaso, acabam se assemelhando aos direitos de crédito: A Constituição enuncia, no art. 6º, alguns direitos sociais, que são também direitos fundamentais: a educação, o trabalho, o lazer, a segurança e previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, aos quais a Emenda Constitucional n. 26/2000 acrescentou o direito à moradia. Tal dispositivo fórmula, entretanto, mera enumeração exemplificativa, cf. FERREIRA FILHO. Op. cit., p. 128.

    7 AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 288-289.

    8 RAMOS TAVARES, André. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 797.

    9 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 241.

    10 Nas palavras do autor: Os direitos sociais vinculam-se a realizações proporcionadas pelo Estado, direta ou indiretamente, enunciadas em normas constitucionais que possibilitam melhores condições de vida aos mais fracos, buscando a igualização de situações sociais desiguais, cf. OLIVEIRA, Erival da Silva. Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 147.

    11 MARX, Karl; ENGELS, Freidrich. O Manifesto Comunista. Álvaro Pina (trad.). São Paulo: Boitempo Editorial, 2005, p. 48-49.

    12 MARX; ENGELS. Op. cit., p. 50.

    13 MARX. ENGELS. Op. cit., p. 58. David Johnston interpreta que a visão marxiana de igualdade crê numa racionalidade humana que será capaz de criar uma sociedade coletivamente ordenada. Afirma: [...] Marx e Engels evocam outra fase, na qual a atividade humana será dividida voluntária não ‘naturalmente’, e na qual os seres humanos irão controlar suas ações em vez se ser controlados por elas. A divisão e o objetivo do trabalho estarão mais separados do interesse comum. Resumindo, os seres humanos serão capazes de assumir, coletivamente, o controle de suas vidas sociais como um todo e de determinar, por meio de sua vontade coletiva, o rumo que a história tomará, cf. JOHNSTON, David. Breve História da Justiça. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2018, p. 208. Carlos Eduardo Sell afirma que o pensamento marxiano ressalta que a visão finalística de igualdade se daria pela revolução que aboliria a propriedade privada e a sociedade de classes: A abolição das classes sociais é colocada por Marx desde o início de suas obras, como podemos perceber relendo alguns trechos de O manifesto do Partido Comunista [...] Na percepção do autor, com a supressão da propriedade privada desaparecia também o fundamento da divisão da sociedade em classes sociais, cf. SELL, Carlos Eduardo. Sociologia Clássica: Marx, Durkheim e Weber. 4. ed. Petrópolis: Vozes, 2013, p. 72.

    14 BONAVIDES, Paulo. Do Estado Liberal ao Estado Social. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 186.

    15 BONAVIDES. Op. cit., p. 185.

    16 CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso de Direito Constitucional. Salvador: Lumens Juris, 2008, p. 699.

    17 MEIRELES, Ana Cristina Costa. A Eficácia dos Direitos Sociais. Salvador: Juspodivm, 2008, p. 42.

    18 RAWLS, John. A Theory of Justice. Cambridge: Harvard University Press, 1999, p. 3-4.

    19 RAWLS. Op. cit., p. 4-5.

    20 Nesse sentido, Rawls vai afirmar: Sociedades atuais são, claramente, em termos bem ordenados nesse sentido, enquanto o que é justo e injusto está geralmente em disputa. Homens discordam sobre quais princípios definiriam os termos básicos de sua associação. Ainda assim, nós podemos continuar afirmando, em que pese essa divergência, que cada um deles possuem uma concepção de justiça. Por isso, eles entendem a necessidade, e eles estão preparados para afirmar, de um grupo de princípios específicos para assegurar direitos e deveres básicos e para determinar o que eles entendem como uma distribuição legítima de ônus e bônus de uma cooperação social [...], cf. RAWLS. Op. cit., p. 159., sendo este trecho uma tradução livre do autor de: Existing societies are of course seldom well-ordered in this sense, for what is just and unjust is usually in dispute. Men disagree about which principles should define the basic terms of their association. Yet we may still say, despite this disagreement, that they each have a conception of justice. That is, they understand the need for, and they are prepared to affirm, a characteristic set of principles for assigning basic rights and duties and for determining what they take to be the proper distribution of the benefits and burdens of social cooperation.

    21 Rawls, acerca da legitimidade das instituições, afirma: [...] Aqueles que possuem diferentes concepções de justiça podem, portanto, continuar acordando que instituições são justas quando não fazem distinções arbitrárias entre pessoas no momento em que asseguram os direitos e deveres básicos e quando as regras determinam um adequado balanceamento entre interesses concorrentes em relação as vantagens da vida social. Homens poder acordar com essa descrição de instituições justas desde que as noções de distinção arbitrária e um adequado balanceamento, os quais estão incluídos no conceito de justiça, estão abertos cada um para interpretação de acordo com os princípios de justiça que eles aceitam. Esses princípios destacam quais as semelhanças e diferenças entre as pessoas são relevantes na determinação dos direitos e deveres e eles especificam qual divisão de vantagens são apropriadas. Claramente a distinção entre o conceito de várias concepções de justiças não colocam questões importantes. Ela simplesmente ajuda a identificar o papel dos princípios na justiça social., cf. RAWLS. Op. cit., p. 5, de uma tradução livre de: (...) Those who hold different conceptions of justice can, then, still agree that institutions are just when no arbitrary distinctions are made between persons in the assigning of basic rights and duties and when the rules determine a proper balance between competing claims to the advantages of social life. Men can agree to this description of just institutions since the notions of an arbitrary distinction and of a proper balance, which are included in the concept of justice, are left open for each to interpret according to the principles of justice that he accepts. These principles single out which similarities and differences among persons are relevant in determining rights and duties and they specify which division of advantages is appropriate. Clearly this distinction between the concept and the various conceptions of justice settles no important questions. It simply helps to identify the role of the principles of social justice.

    22 RAWLS. Op. cit., p. 7.

    23 MEIRELES, Ana Cristina Costa. A Eficácia dos Direitos Sociais. Salvador: Juspodivm, 2008, p. 81-82.

    24 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 762.

    25 A classificação de José Afonso da Silva é sêxtupla. Segundo o autor: Vamos discutir os direitos sociais à vista do Direito positivo. Por isso, sem preocupação com uma classificação rígida, e com base nos arts. 6º e 11, agrupá-los-emos nas seis classes seguintes: (a) direitos sociais relativos ao trabalhador; (b) direitos sociais relativos à seguridade compreendendo os direitos à saúde, à previdência e assistência social; (c) direitos sociais relativos à educação e à cultura; (d) direitos sociais relativos à moradia; (e) direitos sociais relativos à família, criança ao adolescente e idoso; (f) direitos sociais relativos ao meio ambiente, cf. AFONSO DA SILVA, José. Curso de Direito Constitucional Positivo. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 289.

    26 FERNANDES. Op. cit., p. 465.

    27 CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso de Direito Constitucional. Salvador: Lumens Juris, 2008 Op. cit., p. 694-710. Nesse sentido ainda: A Constituição de 1988 avançou muito em relação aos direitos sociais no título II que trata dos direitos fundamentais, não deixando mais qualquer dúvida quanto à natureza destes direitos: os direitos sociais são verdadeiros direitos fundamentais, com força normativa e vinculante, que investem os seus titulares de prerrogativa de exigir do Estado as prestações positivas indispensáveis à garantia do mínimo existencial. No art. 6º, a Constituição reconhece os seguintes direitos sociais: a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a assistência aos desamparados, a proteção, à maternidade e à infância. Os direitos sociais à educação, à saúde, à previdência social, à assistência social, à assistência aos desamparados, à proteção, à maternidade e à infância, estão sistematizados no título VIII que trata da ordem social. Já os direitos do trabalhador foram tratados no art. 7º., cf. CUNHA JÚNIOR. Op. cit., p. 694.

    28 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 10. ed. São Paulo: Saraiva, p. 824.

    29 RAMOS TAVARES, André. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 798.

    30 Segundo o autor: Nos termos do art. 6º da Constituição de 1988, integrado no Capítulo II do Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais –, são apontados/reconhecidos como direitos sociais oponíveis ao Estado brasileiro, por todos quantos vivem em nosso território, a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, e a assistência aos desamparados, na forma estabelecida pela Constituição, o que significa dizer em conformidade com o disposto no Título VII – Da Ordem Social, no qual esses distintos direitos encontram seu desenvolvimento, os mecanismos de sua eficácia ou de seu sentido teleológico e a previsão de acoes afirmativas para a sua realização prática, embora ainda longe de serem satisfatórias, cf. MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 762.

    31 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 242.

    32 SARLET. A Eficácia dos Direitos Fundamentais: Uma Teoria Geral dos Direitos Fundamentais na Perspectiva Constitucional. 10. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 159-160.

    33 SARLET. Op. cit., p. 156-157. Afirma o autor: [...] O que nos parece relevante é o fato de que a teoria dos quatro status de Jellinek, na medida em que foi sofrendo críticas e reparos, foi mantida viva mediante um contínuo processo de redescoberta pela teoria constitucional (inclusive no direito pátrio, de modo especial, na qualidade de parâmetro para a classificação dos direitos fundamentais [...], cf. SARLET. Op. cit., p. 159.

    34 SARLET. Op. cit., p. 166-167.

    35 Nesse sentido: Especificamente no que concerne aos direitos fundamentais sociais na Constituições de 1988, impõe-se aqui ao menos uma breve referência ao fato de que o conceito de direitos fundamentais sociais no direito constitucional pátrio é um conceito amplo, incluindo tanto posições jurídicas tipicamente prestacionais (direito à saúde, educação, assistência social, etc.), quando uma gama diversa de direitos de defesa. [...] Dessa mesma forma, enquadram-se na noção de direitos sociais negativos (de cunho defensivo) os direitos subjetivos de caráter negativo (defensivo) que correspondem também à dimensão prestacional dos direitos fundamentais, inclusive dos direitos sociais a prestações. Nesse sentido, é possível afirmar que assim como os direitos negativos possuem uma repercussão prestacionais, também os direitos a prestações possuem uma dimensão negativa, representada, como já frisado, por poderes (direitos subjetivos negativos). Como teremos oportunidade de explicitar melhor no capítulo relativo à eficácia dos direitos a prestações, estes sempre geram (além de direitos de cunho positivo) direito subjetivo negativo de impugnação de atos que lhes sejam ofensivos, como bem dá conta o exemplo do direito social à moradia em demandas executivas ou em outras situações que aqui não cem ao caso apontar. O próprio reconhecimento de um princípio de proibição do retrocesso, igualmente desenvolvido mais adiante, já constitui por si só uma demonstração inequívoca da dimensão negativa também dos direitos fundamentais sociais., cf. SARLET. Op. cit., p. 173-174.

    36 SARLET. Op. cit., p. 17.

    37 MEIRELES. Op. cit., p. 90

    38 ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Virgílio Afonso da Silva (tradução). 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2017, p. 456.

    2. FUNÇÃO PROMOCIONAL DO DIREITO PENAL

    2.1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS

    O recente movimento de ressignificação da importância jurídico-constitucional dos direitos sociais ressoará no Direito Penal e justificará o aparecimento de correntes doutrinárias aduzindo para uma suposta função promocional. A premissa básica dessa doutrina é no sentido de que o Direito Penal no Estado Social e Democrático do Direito pode ser exigido e utilizado para fins de promoção da justiça social.

    Essa perspectiva doutrinária não despreza a legitimação do Direito Penal na missão de tutela de bens jurídicos penais, no entanto admite nela duas ordens funcionais:

    (a) quando animado pelos princípios do Estado liberal, o Direito Penal atuaria de forma negativa, isto é, contido, limitado à proteção de lesão ou ameaça de lesão de bens jurídicos penais, em especial daqueles preponderantemente individuais;

    (b) quando animado pelos princípios do Estado social, a tutela dos bens jurídicos penais faria com que o Direito Penal, além de protetor, fosse um dos agentes de promoção, em especial nas hipóteses dos bens jurídicos sociais, contribuindo, portanto, para a concretização de direitos sociais e assim transformando-se em verdadeiro instrumento promocional de justiça social.

    Cumpre entender como a doutrina da função promocional do Direito Penal adentrou no Brasil e quais os seus métodos, o que dedicar-se-á nos itens a seguir.

    2.2. FUNÇÃO PROMOCIONAL DO DIREITO PENAL NA DOUTRINA ESTRANGEIRA

    A noção de função promocional do Direito não é nova. Norberto Bobbio é um dos precursores modernos dessa perspectiva. Contemporâneo do processo de consolidação do Estado Social e Democrático de Direito na Europa ocidental no pós-Segunda Guerra Mundial, o autor já aduzia em meados da segunda metade do Século XX para uma distinção entre as novas funções do Direito.

    O autor afirmava que a Teoria do Direito deveria superar a limitação conceitual em só analisar as funções meramente protetivas e repressoras, dando lugar as novas técnicas de encorajamento pelo Direito. Segundo Bobbio:

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