Os Navegantes
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Os Navegantes - Marco A. Stanojev Pereira
Os Navegantes
Marco A. Stanojev Pereira
© 2014, Marco Antonio Stanojev Pereira
© Os Navegantes
1ª Edição, Janeiro de 2014
ISBN: 978-85-916389-2-5
Depósito Legal: 637798/14
Depósito Legal:
Dedicatórias
Ao meu querido irmão, cujo oceano dos séculos nos levou ao mesmo ancoradouro.
Navigare necesse, vivere non est necesse.
Pompeu
Soneto à Calíope
À Calíope, da divina inspiração,
da bela voz e das musas rainha.
Coroada de glórias, sempre em meditação,
dos literatos é a deusa madrinha.
Inspira à todos os puros corações,
a serem assim como o ínclito Orfeu,
que por amor compunha versos e canções,
e que por amor à Eurídice, tristemente morreu.
Com linda e florida grinalda,
inspira a poesia e a ciência,
onde de tua nobre cabeça coroada,
nos chega a força desta eloquência,
para compor e escrever mesmo que defronte,
do grande Cérbero e o implacável Caronte.
Capítulo 1 - Os Navegantes
O espírito humano é o grande navegante, que utiliza seu corpo como embarcação, seus amigos e familiares como Portos Seguros, suas aflições diárias como as tempestades que se formam, caem e desaparecem trazendo a bonança, e diariamente vê diante de si o imenso oceano do progresso e da evolução à ser descoberto e conquistado, dependendo apenas de si aproveitar ou não os ventos favoráveis para levantar as âncoras e singrar por mares nunca d’antes navegados.
Nesta óptica, podemos chamar de navegantes todos aqueles que enfrentam o oceano do desconhecido, do novo, do dia-a-dia, e aventuram-se em sua conquista. O medo, que nestes momentos sentimos, é o instinto secular da manutenção da integridade física, que nos mantém vivos.
Interessente que vemos este semblante nos rostos de todas as figuras que estão presentes no Padrão dos Descobrimentos
- ilustrado aqui na primeira página desta obra - erguido na Freguesia de Belém, em Lisboa, por ocasião das comemorações dos quinhentos anos da morte do Infante D. Henrique, o Navegador.
Desta forma, não são apenas os nomes de Cristovão Colombo, Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral, Manuel Pessanha, Gil Eanes, John Cabot, Yermak, Juan Ponce de León, Fernão de Magalhães, Willem Barents, Abel Tasman, Vicente Yáñez Pinzón e Willem Jansz, entre muitos outros, que se destacaram na história na época conhecida como Grandes Navegações
, mas todos que, mesmo com o medo, aventuram-se e descobrem, inventam, mudam, sugerem, criam, levando toda a humanidade a evoluir.
Esta obra é, assim por dizer, dedicada à toda a humanidade, homens mulheres e crianças que, mesmo com o medo, enfrentam e domam o desconhecido do dia-a-dia.
Capítulo 2 - Navegar é Preciso
A questão era: ou lançarem-se ao mar ou perecerem.
Sobre Tifiu, como chefe do clã, recaia toda a responsabilidade de decidir se sacrificava seu povo aos inconstantes e sanguinários deuses do grande oceano, que estendia-se soberano às margens de sua aldeia ou, aos não menos sanguínários deuses da guerra.
Enquanto um era personificado em figuras lendárias, veementemente reverenciados e festejados, o outro era representado por pessoas e espadas reais de seus inimigos, cujo sangue dos imolados Tifiu já via escorrer pelo bronze cortante de suas espadas e lanças impiedosas.
Tifiu era um chefe sábio que, embora inexperiente devido a pouca idade, possuia uma visão de futuro e presença de espírito que se distinguia de seus contemporâneos.
Já tinha uma solução em sua cabeça, contudo, a prudência aprendida e desenvolvida na prática pela observação das lições dos mais velhos, levou-o a consultar os oráculos de sua nação.
Orientado nos antigos rituais de hecatombe aos deuses eternos, escolhe, juntamente com os veneráveis anciães da tribo, que são os repositórios de tradições seculares, a oferenda que mais agradaria o senhor dos deuses: um touro sem máculas ou defeitos.
Feita a escolha e já todo paramentado, manipula com grande destreza o punhal sagrado de ouro, e o grande animal tomba com estrondo para a direita, o que é identificado pelos augúres como um bom presságio.
Em seguida, recolhendo o sangue em um recipiente, despeja-o em uma vala quadrada cavada no chão, forrada de cereais, folhas de loureiro e fragmentos de metal de sangue - o cobre -, e todos ficam a aguardar o pronunciamento divino.
Enquanto esperam, outros já preparam o touro para assar suas carnes, onde esperam que o fumo elevado aos céus, carregando sua oferenda aos deuses, seja aceite, verificada na comunicação do oráculo.
De olho para o céu, proferindo as palavras sagradas de evocação, o ancião sacerdote vê uma águia perseguir um pássaro, que consegue escapar de seu destino sangrento escondendo-se em uma nuvem, em seguida, um grande estrondo é ouvido, indicando que Céu e Terra estão em contato divino, assim, a linha de comunicação estava fechada e, o oráculo já dava as primeiras orientações.
Chamou a atenção de todos para a figura da perseguição, onde o céu representava a terra firme e a nuvem o mar e, mesmo que a nuvem figurasse para o pássaro uma incógnita do que esperar, enfrentou-a sem receios, pois sabia ser sua única garantia de escapar do agressor. Desta forma o mar se afigura para a aldeia o único meio disponível de sobrevivência.
Continuou dizendo que a oferenda foi bem aceite pelos deuses, pois eles sabiam da grande fé que animava a aldeia, a fé na proteção divina e a fé que cada um tinha neles próprios pois, mesmo com os inimigos em seus calcanhares, procuravam outras saídas, além daquelas já conhecidas por todos, os embates.
Disse ainda para aguardarem um enviado que, sem saber da missão que o aguarda, irá chegar na aldeia em tempo certo e, enquanto isso, toda a tribo, que não participava desta comunicação, deveria continuar a trabalhar normalmente, e sem perda de tempo deveriam plantar e colher, reservando a terça parte.
Contente com os bons augúrios, a comissão sai da tenda e comunica o aceite de suas preces pelos deuses, partindo assim todos para banquetearem as carnes do boi sagrado.
Enquanto todos festejam, Tifiu olha absorto para as costelações que deslizam no firmamento, tentanto decifrar o futuro que aguarda sua gente, até que é despertado de seus devaneios por um amigo, que lhe traz um grande bocado de carne assada.
- Tifiu, Tifiu, pés no chão e coração na razão – pensou o preocupado chefe.
Neste instante, Crimato chega e põe fim em suas meditações lançando-se ao seu colo. Com seus sete anos de idade, e toda a energia que uma criança desta idade possui, é seguido por sua mãe Anaid com a pequena Adama no colo. Todos se acomodam-se próximo dele, e também passam a vislumbrar os céus misteriosos.
- Papai, o que são estes pontos no céu?
- São os olhos de nossos deuses, Crimato, que velam por nosso povo.
- E eles estão a nos espionar? Para nos castigar?
- Somente quando fazemos algo errado, quando infringimos a lei.
- E como eles sabem que infringimos a lei?
- Porque somos denunciados.
- Por Adad, o sacerdote?
- Não, por nossa consciência. Quando fazemos algo errado ela grita tão alto que os deuses podem facilmente escutar.
A inocência do menino apenas o levou a emitir um som de admiração e voltar a admirar aquele céu magnífico de fim de verão.
No outro dia, Tifiu tratou de comunicar a orientação do oráculo em todos os aspectos, menos da chegada do emissário, onde de toda a produção deveriam guardar a terça parte, pois o oráculo havia dito que navegar era preciso
.
E toda a tribo começou a trabalhar e esperar. Alguns achavam que estavam a esperar o ataque dos inimigos, que estavam cada vez mais próximos, outros que aquele procedimento era para fazer reservas para o inverno, que talvez viesse com mais fúria, em comparação com outros anos, e outros ainda achavam que era uma grande perda de tempo tudo aquilo, pois a morte era iminente.
E chegou o inverno que, para tristeza dos profetas de plantão da aldeia que vaticinavam a morte de todos no gelo, não foi pior ou melhor que os anos anteriores.
Todo o trabalho da aldeia diminuia bastante devido as nevascas mas, naquele ano a ferraria continuava a trabalhar em plena potência, produzindo algo parecido com os pregos até então