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O Estado Contra O Estado
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E-book395 páginas4 horas

O Estado Contra O Estado

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Sobre este e-book

Em 22 de novembro de 1910, eclodiu uma revolta na cidade do Rio de Janeiro. O Estado brasileiro determinava que marinheiros fossem punidos com castigos físicos. Neste dia, um deles recebeu 250 chibatadas. Os revoltosos ameaçaram bombardear a cidade (então capital do Brasil). O Senador Rui Barbosa bradou veementemente: O que constitui as forças das máquinas de guerra não é a sua mole, não é a sua grandeza, não são os aparelhos de destruição - é a alma do homem que as ocupa, que as maneja, e as arremessa contra o inimigo. As almas dessas máquinas que povoam os nossos grandes dreadnoughts, hoje, em nossa baía, sejamos justos ainda para com esses infelizes no momento de seu crime, as almas desses homens têm revelado virtudes que só honram a nossa gente e a nossa raça. [...] Extinguimos a escravidão sobre a raça negra, mantemos, porém, a escravidão da raça branca no Exército e na Armada, entre os servidores da pátria, cujas condições tão simpáticas são a todos os brasileiros. Era necessário que não se continuasse a esquecer que o marinheiro e o soldado são homens. O Estado continua a oprimir os seus agentes nos dias atuais...
IdiomaPortuguês
Data de lançamento22 de jan. de 2017
O Estado Contra O Estado

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    O Estado Contra O Estado - Fabrício Ribeiro

    O

    ESTADO

    CONTRA

    O ESTADO

    Fabrício Ribeiro

    Em 22 de novembro de 1910, eclodiu uma revolta na cidade do Rio de Janeiro. O Estado brasileiro determinava que marinheiros fossem punidos com castigos físicos. Neste dia, um deles recebeu 250 chibatadas. Os revoltosos ameaçaram bombardear a cidade (então capital do Brasil).

    C:\Users\GERSON\Desktop\Augusto_Malta_Revolta_da_Chibata004.jpg

    Os marinheiros negociam por carta através do deputado José Carlos de Carvalho...

    C:\Users\GERSON\Desktop\Carta dos marinheiros.jpg

    "Comandante José Carlos. Entraremos amanhã ao meio-dia. Agradecemos os seus bons ofícios em favor de nossa causa. Se houver qualquer falsidade o senhor sofrerá as consequências. Estamos dispostos a vender caro as nossas vidas.

    Os Revoltosos."

    Il.mo e Ex.mo Sr. Presidente da República Brasileira

    Cumpre-nos comunicar a V. Ex.a, como Chefe da Nação brasileira: 

    Nós, marinheiros, cidadãos brasileiros e republicanos, não podendo mais suportar a escravidão na Marinha brasileira, a falta de proteção que a Pátria nos dá; e até então não nos chegou; rompemos o negro véu que nos cobria aos olhos do patriótico e enganado povo.

    Achando-se todos os navios em nosso poder, tendo a seu bordo prisioneiros todos os oficiais, os quais têm sido os causadores da Marinha brasileira não ser grandiosa, porque durante vinte anos de República ainda não foi bastante para tratar-nos como cidadãos fardados em defesa da Pátria, mandamos esta honrada mensagem para que V. Ex. a faça aos marinheiros brasileiros possuirmos os direitos sagrados que as leis da República nos facilita, acabando com a desordem e nos dando outros gozos que venham engrandecer a Marinha brasileira; bem assim como: retirar os oficiais incompetentes e indignos de servir à Nação brasileira. Reformar o código imoral e vergonhoso que nos rege, a fim de que desapareça a chibata, o bolo e outros castigos semelhantes; aumentar o nosso soldo pelos últimos planos do ilustre Senador José Carlos de Carvalho, educar os marinheiros que não têm competência para vestir a orgulhosa farda, mandar pôr em vigor a tabela de serviço diário, que a acompanha.

    Tem V. Ex.a o prazo de 12 horas para mandar-nos a resposta satisfatória, sob pena de ver a Pátria aniquilada.

    Bordo do encouraçado São, Paulo em 22 de novembro de 1910.

    Nota: Não poderá ser interrompida a ida e volta do mensageiro.

    Marinheiros."

    Exmo. Sr. marechal Hermes da Fonseca, presidente da República - Arrependidos do ato que praticamos em nossa defesa, por amor da ordem, da justiça e da liberdade, depomos as armas, confiando que nos seja concedida anistia pelo Congresso Nacional, abolindo como manda a lei o castigo corporal, aumentando o ordenado e o pessoal, não importa, para que o serviço de bordo possa ser feito sem o nosso sacrifício. Ficamos a bordo obedientes às ordens de V. Ex. em quem muito confiamos - Os Reclamantes.

    O Governo opta por não atacar os marinheiros, o que desagrada os oficiais da Marinha, que viam na quebra da hierarquia feita pelos revoltosos, algo de muito perigoso para a instituição, pois abriria um precedente.

    "Artigo 1º - É concedida anistia aos insurretos da parte de navios da Armada Nacional, se os mesmos, dentro do prazo que lhes for marcado pelo Governo, se submeterem às autoridades constituídas.

    Artigo 2º - Revogam-se as disposições em contrário. 

    Rio de Janeiro, 25 de novembro de 1910, 89º da Independência e 22º da República."

    Diante da grave situação, o presidente Hermes da Fonseca resolve aceitar o ultimato dos revoltosos. Porém, após os marinheiros terem entregues as armas e embarcações, o presidente determina a expulsão de alguns revoltosos.  A pergunta que fica é: O que mudou?

    AGRADECIMENTOS

    Ao Evangelho de Jesus que preparou o meu espírito para este momento crucial na minha vida, creio que sem o conhecimento dele, não estaria mais aqui para relatar toda esta história; a minha família que preparou o meu caráter e mostrou o caminho na qual eu devo andar. A Nelson Mandela, Gandhi, Luther King, Martinho Lutero, Antônio Conselheiro, Bento Gonçalves, João Candido Felisberto – o Almirante Negro, Malcolm X, Madre Tereza e muitos outros por prepararem a minha mente, dando-me conhecimento através de suas vidas. A Li Siu Long, Hélio Gracie, Wilson Santos, Odair, Miguel, Rone, Andreas Geller, pois os seus conhecimentos em lutas, prepararam o meu corpo e físico, para derrubarem os gigantes existenciais que a cada dia persistem em combater-me, tornando-me mais forte. Aos meus adversários, pois sem vocês, certamente eu não chegaria até aqui e não seria o que sou.

    A morte é algo inevitável. Quando um homem já fez o que ele considera ser seu dever perante suas pessoas e seu país, ele pode descansar em paz.

    Nelson Mandela

    Introdução

    Resolvi escrever as veracidades históricas de tudo o quanto passei enquanto estava na PM; primeiramente para esclarecer algumas dúvidas que ainda pairam na mente das pessoas que de longe me conhecem, ou já ouviram falar sobre mim; no segundo plano, é para desmistificar alguns paradigmas que com o tempo foi ficando e gerando, aumentando e tornando, sobre um super Ninja que entende de tudo e faz de tudo. Aqui também resolvi mudar o nome de algumas pessoas sem omitir as verdades dos fatos, por respeitar as famílias e até mesmo, apesar dos erros cometidos pelos tais, melhor mesmo que alguns nem saibam quem são eles, nem tenham o desprazer de tê-los como amigos; pois são atos vergonhosos que diminuem o ser em sua essência. Creio que este trará consciência para todas as categorias de trabalhadores, para que não se tornem massa de manobra nas mãos de seres ignóbeis e sem escrúpulos, que fazem de tudo e de todas as formas em prol de seu narcisismo, egoísmo e do próprio umbigo. Nesta caminhada vivi com indivíduos esquizofrênicos e psicopatas, sem sentimento algum para com o próximo, induzindo-os e sujeitando-os a diversos males existenciais em proveito próprio. Essas vítimas, eu mesmo acompanhei de perto quando entraram em desespero, depressão e/ou foram abandonadas por aquele que um dia elas idolatraram como uma cura para a sua irremediável enfermidade, o que quase sempre ocasiona uma gravidade crônica incurável. Espero que possa contribuir com a história, dando crédito a quem merece e desmerecendo fanfarrões enganadores, aproveitadores. Os lobos frontais são responsáveis pela inteligência e pela razão, se tão somente uma única pessoa puder entender, compreender e orientar outras mais, todo este trabalho terá em si, cumprido o seu propósito. Pois povo sem história é povo sem memória. E a história nos mostra que uma mentira contada muitas vezes, passa a soar como verdade absoluta. O livro aborda os meus momentos de alegria, dor, depressão, solidão, lutas, fraquezas, franqueza... O meu momento de desistência em plena eleição, para que não fosse associado o meu nome com os falsários que mentiam descaradamente para a população visando apenas seus votos. Verdadeiramente confesso que tive imensa dificuldade em escrever este livro, pois me trazem à memória, momentos conflitantes de dores e de perda, coisas que o cérebro se ocupou em lançar nas profundezas do obscurantismo, tive que trazer novamente às claras, a luz solar da existencialidade em pleno meio-dia. Notar-se-á que às vezes dou um salto de meses para depois tornar a escrevê-lo, subjugar-me, repassar pelo vale da sombra da morte, ressuscitar mortos, cavar sepulturas e chamar à tona os esqueletos que um dia foram habitados por espíritos do mal, que assombrou e ainda assombra, assombra, mas não assusta, pois aprendi em tudo a ser maior do que eles.

    "Sim eu me orgulho do meu discurso. Sei que as sociedades costumam eliminar as pessoas que promovem mudanças; mas se eu morrer, tendo mostrado as minhas ideias e exposto verdades significativas, que ajudem a acabar com o câncer do racismo que é maligno no corpo desse país, então todo crédito será de Deus, apenas os erros terão sido meus". Malcolm X

    Porque nada podemos contra a verdade, senão pela verdade.

    2 Coríntios 13:8

    Lembro do dia na qual ingressei na polícia militar. Nunca quis ser PM, porém, meu pai queria. Havia passado no concurso para ser bancário, nem ousei questionar. Tive que me apresentar no quartel, raspar a cabeça e ter que seguir inúmeras normas e comandos absurdos.

    Eu que já havia sido adestrador de cães, estava naquele momento passando pelas mesmas coisas, ao menos foi a conclusão que tirei. Que me aproveitaria como PM ficar adestrando a minha mente para ficar o dia todo prestando continências? Imagine, no Estatuto Policial Militar até para casar eu teria que pedir permissão ─ Permissão pra casar coronel! ─ se fosse assim seria fácil, porém, havia uma lista enorme até chegar ao coronel. Como eu era aluno-a-soldado, tinha primeiro que pedir permissão ao soldado:

    ─ Permissão soldado fulano...

    ─ Prossiga MONSTRO!

    ─ Aluno-soldado Fabrício, número 39 turma B, permissão para falar com o cabo...

    ─ falar o que monstro...?

    ─ Quero me casar e tenho que pedir permissão ao comando.

    ─ Permissão concedida.

    ─ Permissão pra falar cabo... (E muitas vezes um estava ao lado do outro, mesmo assim tinha que repetir o ato).

    ─ Fala monstro...

    ─ Aluno soldado (...), permissão para falar com o sargento.

    ─ Falar o que seu monstro?

    ─ Quero me casar...

    ─ Permissão sargento...

    ─ Fala monstro...

    ─ Permissão para falar com o tenente...

    ─ Permissão tenente...

    ─ Permissão para falar com o capitão...

    ─ Permissão capitão...

    ─ Permissão para falar com o major...

    ─ Permissão major...

    ─ Permissão para falar com o tenente-coronel...

    ─ Permissão coronel (Tinha que ser chamado assim, pois a maioria deles sofre de crise existencial e se sentiriam rebaixados se fossem chamados de tenente-coronel).

    ─ Permissão senhor coronel...

    ─ Diga aluno. Quem te deu permissão de chegar até aqui?

    ─ Permissão para falar com o coronel...

    ─ Falar o que monstro?

    ─ Quero me casar!

    ─ Permissão concedida.

    Agora vem a pior parte. Tinha que torcer para que o coronel estivesse de bom humor. Se por acaso na noite anterior ele tivesse sofrido uma ejaculação precoce, ou uma broxada; todo o grupamento seria penalizado. Imagina, um coronel broxa e um soldado pedindo para casar...

    ─ Permissão coronel...

    ─ Fala monstro...

    ─ Permissão para adentrar ao recinto...

    ─ Permissão concedida

    ─ Aluno soldado (...) Permissão para falar...

    ─ Prossiga!

    ─ Coronel..., permissão pra casar!

    Imaginem aí se de lá viesse: ─ Permissão negada!

    Pois é, na PM tudo era motivo de punição, tudo era crime. E o pior: rezava a constituição que o militar seria regido por leis próprias. Mas que leis? Aquilo lá era uma esculhambação, o verdadeiro faça o que eu digo, mas não o que faço. Neste caso, o que mando. Pois daí surgia o dizer: manda quem pode, obedece quem tem juízo. Simples assim.

    Além do Estatuto da PM, teríamos que ter conhecimento do R-CONT, RISG, RDPM, código penal militar... E o que mais fosse inventado pelo comando para penalizar o policial, claro que a maior parte da tropa sempre desconhecia tais leis, até o dia na qual sofria o dano e o seu advogado mostrar qual foi a infração que o demitiu e/ou o levou preso. Na cadeia como forma de consolo, todos dizem: ─ quando entrei na PM já sabia que seria um pé na cova, outro na cela. ─ Esse era o mundinho militar, tão neófito e com tamanhas armadilhas, ignóbil, cruel e inimaginável. Não é a toa que a maior parte dos advogados fogem do assunto e quase sempre não conseguem resolver questões inerentes ao militarismo, eu não estava disposto a viver os meus dias com aquela paranoia, inúmeros PMs já foram parar no manicômio ou se tornaram alcoólatras devido a tudo isso; também não poderia ser covarde e pedir pra sair, se eles quisessem, eles que me tirassem. Como aconteceu!

    O inicio

    Apenas por dificuldade, sacrifício e ação militante a liberdade pode ser conquistada. A luta é minha vida. Vou continuar lutando pela liberdade até o fim dos meus dias. Nelson Mandela

    Passar no concurso da PM não quer dizer ainda que você já está na PM; após isso tivemos que enfrentar inúmeras outras etapas dificílimas. Após o resultado da prova escrita, vem o psicoteste (que não prova nada), tivemos que ir até a capital do estado (Salvador), para fazer este exame, eu nunca tinha feito um exame como este até então. As empresas de ônibus sabendo disto, começam logo a tirar de circulação os ônibus mais comuns, obrigando-nos a comprar antecipadamente passagens mais caras. Lembro muito bem que estava com pouco dinheiro e na hora de comprar a passagem de retorno, me disseram que para aquele dia só tinham passagens de ônibus leito. Eu me recusei veementemente a comprar a passagem, tive que dormir na rodoviária. Aliás, nem consegui tirar um cochilo, pois era véspera de jogo de futebol. O time baiano, Vitória, iria enfrentar um time de fora. Os torcedores do outro time também estavam acampados na rodoviária. O exame foi pela tarde. Terminou umas 17hs, daí, tinha então, até as primeiras horas do outro dia, um tempinho vago para conhecer a capital, sem dinheiro, fui para a rodoviária. Do outro lado das pistas avistei um shopping Center e uma catedral da Igreja Universal do Reino de Deus. Nunca fui chegado a Shoppings, resolvi dar uma olhada na igreja. Era um dia de sábado e na programação era dia de Terapia do Amor. Uma espécie de culto onde ensina a se relacionar e/ou arrumar alguém para seguir a vida a dois. O clima até que era bem agradável, o pastor, bem persuasivo; o problema era as mulheres no local, se alguém fosse ali em busca de salvação nessa área de carência, certamente preferiria morrer como pagão. As músicas variavam de Roxete a Roberto Carlos. O pastor pregou sobre ser corajoso, ter iniciativa para não mais ficar sozinho. Desafiou os homens presentes a pegarem alguma jovem pela mão, levar até uma salinha que ficava ao lado do templo, e prosear para se conhecerem. Vi alguns corajosos levantando e escolhendo algumas moças, eu ali pensando que não tinha nascido para ser homem-bomba.

    Naquela noite ninguém pegou ninguém, as moças que foram escolhidas para uma Prosa, foram cruéis para com os rapazes corajosos. Disseram não na frente dos presentes. Na maioria das vezes as bombas são mais exigentes do que as moças padronizadas. Aquilo me revoltou um pouco, com o término do culto resolvi dar uma passeada lá fora. Perto dali encontrei uma igreja batista, na placa estava escrito: Primeira Igreja Batista do Brasil. Antigamente essa igreja fazia parte da convenção batista brasileira, mas, por causa de alguns modismos estranhos às realidades das igrejas tradicionais, ela fora deixada de fora. Achei que era hora de retornar para a rodoviária e assim o fiz, procurei um assento, reclinei-me e tentei relaxar até às 6hsda manhã. Aquele pequeno período de tempo durou uma eternidade e até hoje posso vislumbrar aquele pavor noturno em um lugar estranho, uma cidade estranha, pessoas estranhas...

    Meses se passaram e por fim saiu o resultado do psicoteste. Inúmeros foram deixados de fora sem explicação alguma, simplesmente foram tidos como loucos, foidetectado algum surto pelos profissionais. Lá entre os aprovados estava o meu nome. Apesar de não querer ir pra PM, eu estava feliz, pois havia vencido mais uma etapa. Em seguida foi a vez de entregar os exames de saúde, foram vários exames. Dessa vez tive que entregar na cidade de Porto Seguro. Quanta complicação, sendo que na minha cidade havia um batalhão e pessoas de outras cidades, foram obrigadas a entregar no neste. Ali estava eu em mais uma cidade desconhecida, pessoas desconhecidas e um destino desconhecido por vir. Com pouco dinheiro tive que repetir novamente a refeição feita em Salvador, um sanduíche simples e um suco e isso, se a fome apertasse. Dessa vez não tive que dormir na rodoviária. Até que achei aquele batalhão bonito, a cidade agradável e o povo mais prestativo, afinal, eu também era um turista, só não podia gastar, mais era.

    Seguindo esta etapa vieram os exames físicos. Há meses que eu e um grupo de futuros PMs estávamos correndo todos os dias e fazendo todo tipo de exercício. Sempre fui atleta em modalidades de lutas. Como a única casa que tinha internet naquela época era a minha, inúmeros colegas corriam todos os dias até a minha residência para saber se já tinha saído algum resultado das outras etapas; notório se fez notar queeles pediram para treinarem comigo para o preparo dos exames físicos. Este por fim foi realizado na minha cidade: corrida, abdominais, Burpees etc. fui aprovado em todos com mérito. Faltava agora aguardar o chamado para a apresentação.

                        Mais alguns meses se seguiram e por fim veio a convocação, já havia se passado dois anos desde a prova escrita. Na entrada do quartel encontrei inúmeros jovens felizes, risonhos, afinal, estavam empregados. Eu estava tenso e desconfiado. Ao entrar no quartel para a apresentação, alguns jovens resolveram sentar nos bancos, surgiu um tenente gritando e mandou que todos se sentassem no chão, ou então, um no colo do outro. Todos ficaram pasmos... que tipo de tratamento era aquele? Olhos arregalados os jovens ali já não sabiam o que fazer. Mais gritos e dessa vez, era um capitão ordenando que todos entrassem em um auditório. Lá dentro ele afirmou categoricamente que iria fazer da nossa vida um inferno, que ainda era tempo de desistir. Estava nos chamando de novinhas para divertimento e risos dos outros oficiais. Ali seríamos chamados por números e não pelos nomes, às vezes éramos chamados por nomes: Seu monstro, Aluno-miserável, novinha...

    Alguns rapazes estavam com os cabelos grandes, logo foram levados para os fundos do quartel e tiveram que passar a máquina de cortar cabelo sem pente algum. Entravam com uma juba, saiam como uma raposa. Alguns deles eram universitários e estavam se sujeitando aquilo em virtude do emprego. Na primeira vez que um oficial se mostrou gente-boa para conosco, nos sentimos mais a vontade, o mesmo lançou uma pergunta: ─ Quem dentre vós está aqui por vocação?

    No meio de cento e vinte e seis jovens, menos de trinta levantaram as mãos. Não havia mulheres naquele agrupamento. Ficamos sabendo que em cursos passados algumas alunas eram obrigadas a fazerem serviços extras quando chegava a noite. Levavam as moças para o campo de futebol do batalhão  e se aproveitavam delas. Tais moças eram aprovadas com notas máximas. Eles não sabiam que alguns vizinhos tiravam fotos, crianças presenciavam as cenas e tudo iria virar um escândalo. Os comandantes da capital fizeram então a proibição e curso de formação para Pfens (Policiais Femininas), estava proibido no interior do estado.

    No final daquele dia muitos já estavam pra baixo, com o psicológico abalado, a palavra terror estampada na cara, uma vontade imensa de desistir. Para o segundo dia determinaram que nos apresentássemos vestidos de calça jeans e camisa branca e assim, chegamos antes das sete da manhã. Quem chegasse atrasado certamente ficaria impedido (preso), no final de semana. Naquela manhã fomos obrigados a sair correndo pelas ruas da cidade. Fiquei com pena de alguns gordinhos, mas eles aguentaram o traquejo, de volta ao quartel fomos obrigados a tirar as camisas e sair rolando nos matos, mesmo com espinhos. Gritos e mais gritos, parecia o inferno. Tiros foram dados na tentativa de nos amedrontar e lá estávamos, um agarrado na perna do outro e rolando pelo capim. Espinhos, fezes de animais e suor grudavam no corpo. Após horas daquela constrangedora situação nos mandaram fazer polichinelos, depois com todos em forma, nos mandaram pegar nossas camisas e sapatos, pois também foram deixados, e que o último a sair pelo portão, ficaria preso. Todos correram em direção ao local na qual havia deixado seus pertences; os sapatos estavam todos misturados e as camisas, umas dadas nós nas outras. Foi um desespero geral. E quem que iria parar para identificar qual que era a sua? Naquela situação nem pelo cheiro. Pegamos a primeira que conseguimos desatar, mesmo cheia de suor, vestimos, pegamos os sapatos nas mãos e saímos correndo até o portão. Ninguém queria ser o último naquele inferno de lugar. Às 14hs deveríamos estar de volta para a apresentação da tarde, ficávamos ali em pé, com as mãos para trás em um local onde não houvesse sombra alguma até que algum filho de Deus resolvesse nos tirar daquele lugar.

    No terceiro dia nos organizaram em turmas ─ A, B, C e D ─ as três primeiras foram parar em salas minúsculas, construídas às pressas e a facão, para poder receber os alunos. A turma D (de desgraça, conforme os instrutores falavam), por não terem uma sala, ficavam no auditório que era mui melhor e espaçoso. Eu havia ficado na turma B. sabedor que os últimos na classificação final iria certamente ser jogados no quinto dos quintos, a saber: onde Judas perdeu as botas.

    Assim eram os nossos dias: chegada pela manhã e entrávamos em forma com as mãos pra trás e em turma. A cada dia um era o aluno de dia, outro, o capitão da guarda de alunos, alguns ficariam de serviço com fuzil e capacete, parados em frente a algum pavilhão, os demais iriam pra casa almoçar, voltava às quatorze horas e talvez, a depender do humor dos oficiais, podiam sair às dezoito horas para as demais obrigações, como ir para a faculdade. Na chegada pela manhã os alunos eram obrigados a cantarem o hino nacional, da bandeira e o da força invicta, às vezes vinham determinações para cantarmos algum outro mais. Após isso, alguém era selecionado para fazer uma palestra; depois íamos para as salas de aula. Coisa rara era ter aula. Os oficiais estavam com os nomes ali como instrutores tão somente para receberem por aquele serviço. Alguns alunos aproveitavam para dormir, outros para fazerem resenhas, outros ficavam na porta pra ver se vinha alguém. Se alguém fosse pego em flagrante conversando, a turma toda corria o risco de ficar impedida no final de semana. Momentos horríveis, ficar ali naquele canil humano. O clima era tão tenso que a maioria começava a peidar, porta fechada, telhas de Eternit, aí já viu. Logo vieram as provas. Lembro que me dediquei com afinco na primeira prova que fiz naquele lugar. No dia do resultado, mesmo tendo acertado tudo, havia tirado uma nota oito. Quis esclarecer com o capitão o motivo daquela nota. Ele me disse que o dez, tiraquem havia escrito o livro, nove era do instrutor, pra aluno, oito estava bom demais. Não havia critério para notas naquele lugar. Cada instrutor fazia o que queria. Havia instrutores que também eram praças, eram designados pelos oficiais, alguns já chegavam montando esquemas, separando alguns do grupo e dizendo: ─ Quem me favorecer me pagando umas cervejas e me arrumando umas negas, eu entrego as perguntas que irão cair na prova. ─ Certamente que logo surgiam interessados no esquema. A corrupção policial já começava na sala de aula. Após notar toda aquela bagunça o que eu mais queria era fazer com que as minhas notas baixassem. Primeiramente para que ficasse notório que eu não participava de esquema algum, seguindo a isso, eu queria ir para a turma D de desgraça, pois lá havia espaço e ar refrigerado, sairia do calor e dos peidos impiedosos. E assim sucedeu. Minhas notas baixaram e eu fui rebaixado, agora estava no auditório da turma D, todos estranharam. Logo eu que ficava o dia inteiro lendo. Enquanto a maioria aproveitava os finais de semana para beber e pagar bebidas para alguns instrutores, eu pegava parte do pagamento, que era fracionado, e ia comprar livros de direito para saber os meus deveres e o do cidadão.

    Passava os dias lendo e relendo. Ali os alunos recebiam um salário mínimo durante os noves

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