Planejamento Estratégico no Setor Público
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Planejamento Estratégico no Setor Público - Flávio Mascarenhas Roriz Pedrosa
1. INTRODUÇÃO
Sem um planejamento estratégico competente, ninguém sobreviverá nestes tempos globalizados
(Michael Porter).
A necessidade de maior entrega de valor público ao cidadão é uma grande tendência global para os Governos do século XXI. A conquista de direitos políticos, econômicos e sociais no decorrer dos últimos séculos gerou uma demanda maior e mais exigente por serviços e bens públicos de qualidade, o que pressiona os atores governamentais a aumentarem sua produtividade e inovarem em suas políticas públicas. Logo, a transformação de estruturas administrativas e burocráticas em estruturas flexíveis, empreendedoras e com foco no serviço é o maior desafio da gestão pública na atualidade.
Nesse novo contexto de Estado, a função administrativa de Planejamento é uma das principais ferramentas para a transformação da gestão pública. Um grande desafio é a adoção de modelos modernos de gestão que não sejam engolidos pela cultura burocrática na administração pública.
Em contrapartida, entende-se que o desenvolvimento da administração pública no Brasil passou por fases distintas. Ora demonstra uma consolidação de burocracia técnica à revelia da política, ora tentou-se descaracterizar seu caráter funcional em nome da política. Sua origem convencionada seria no Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP) no Estado Novo de Getúlio Vargas. O período é caracterizado pela especialização de órgãos, uma reforma administrativa e a estruturação de normas e métodos rígidos que refletiam padrões tipicamente burocráticos de Estado (MARTINS, 1997).
Entre 1945 e 1964, período da Segunda República, houve uma adaptação institucional às estratégias desenvolvimentistas e fortes ajustes foram realizados em nome da disfunção burocrática e crises política, econômica e social. Entre Vargas, Juscelino, Jânio e Jango, houve uma diminuição no nível de racionalidade da administração pública e um forte caráter clientelista (MARTINS, 1997).
Durante o Regime Militar, houve uma radical reestruturação do entendimento a respeito da maquinaria pública e entendeu-se a necessidade de reformá-la. O Decreto Lei n° 200 é um epítome deste momento, trazendo os princípios de planejamento, organicidade e centralização de decisões. Mesmo com a repressão democrática, o Estado sofreu uma vigorosa modernização administrativa rumo a um modelo tecnocrático (COLLIER, 1982).
Em seguida, os primeiros anos após a redemocratização apresentaram diversos sinais de crise e cansaço no aparelho estatal. Falhas herdadas do modelo tecnocrático e a volta da influência patrimonialista geraram uma deterioração da administração pública (MARTINS, 1997). A tentativa de implementar um Estado Social que atendesse todas as expectativas da Constituição de 1988 conviveu com crises de desorganização na estrutura pública, seu sistema de carreira e a autonomia de decisão dos órgãos.
Uma tentativa de alteração na administração pública ocorreu no Governo Fernando Henrique Cardoso, no qual o Ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira comandou uma reestruturação gerencial para responder à crise do nacional-desenvolvimentismo e patrimonialismo brasileiro (MARTINS, 2006). O Plano Diretor da Reforma do Estado tinha por objetivo transformar a cultura patrimonialista em uma cultura gerencial dentro do setor público. Suas propostas se baseavam nas teorias de Administração Gerencial surgidas na Inglaterra na década de 80, incluindo a necessidade de adaptação de ferramentas de gestão do setor privado para a administração governamental (DE PAULA, 2005).
Esse modelo de Administração Gerencial surgiu em um contexto de crise para reduzir custos e tornar mais eficiente a administração dos recursos sob a responsabilidade do Estado. Sua premissa é de que Estado tem o papel de assegurar o interesse do cidadão-usuário, a maior eficiência e qualidade dos serviços públicos e não verificar exclusivamente o cumprimento da legislação em vigor (SOUZA, 2010).
Nesse novo Estado, a função administrativa de planejamento é uma das principais ferramentas para a transformação da gestão pública. Um grande desafio é a adoção de modelos modernos de gestão que não sejam engolidos pela cultura dominante na administração pública. No caso do Brasil, há a particularidade da convivência de aspectos de Estado patrimonialista, desenvolvimentista, burocrático tecnocrata, gerencialista e até mesmo empreendedor, todos ao mesmo tempo. Essa miríade traz enormes dificuldades para que o Governo consiga planejar de verdade.
Entende-se por premissa que o planejamento governamental tem por objetivo fornecer um direcionamento comum com responsabilidades, alinhamento e accountability nas organizações. Assim, refletiria o plano de governo que foi aprovado pela sociedade nas urnas, garantindo o alinhamento entre os diversos programas desempenhados pelas diferentes pastas e meios para medir o alcance de objetivos.
A importância de um planejamento governamental eficiente, mensurável e legítimo é reforçada pela necessidade de Governos se desenvolverem nos períodos de turbulência, transição de mandatos, incertezas conjunturais e também aproveitarem novas oportunidades.
Nesse contexto, o Planejamento Estratégico fornece insumos que possibilitam às organizações conhecer o ambiente em que estão inseridas, proporcionando um senso de direção e evitando riscos em suas ações (PORTER, 2001). Por isso, a importância do PE como uma ferramenta de gestão no setor público é proporcional à latente necessidade de aprimorar a entrega de valor público que a máquina pública no Brasil oferece ao cidadão.
Por isso, este livro começa pela conceituação de Planejamento Estratégico (Capítulo 2). Em seguida, passamos para a discussão de como os governos planejam (Capítulo 3) com exemplos de casos internacionais (Capítulo 4). A partir disso, podemos aprofundar no planejamento governamental brasileiro (Capítulo 5) e apresentar um estudo de caso do governo do Distrito Federal, que adotou uma forma de planejamento estratégico (Capítulo 6). Por fim, apresentamos uma metodologia original para avaliar os processos de planejamento em governos (Capítulo 7).