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Galiza, Terra Irmã de Portugal
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Galiza, Terra Irmã de Portugal
E-book117 páginas1 hora

Galiza, Terra Irmã de Portugal

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Sobre este e-book

Sabia que atravessar a fronteira com a Galiza, mais do que entrar em Espanha, significa estar numa “terra irmã”? Que o espaço da antiga Galécia romana, com capital em Braga, constituiu uma unidade até ao século xii e esteve na origem do reino e da língua de Portugal. Desde então, mantiveram-se a continuidade das paisagens, a proximidade linguística, a intermitência dos diálogos culturais e a importância das relações transfronteiriças. O presente ensaio aborda a história e a cultura da Galiza, em diálogo com a evolução histórica de Portugal e, em especial, da Região Norte. Foi escrito desde a história, mas também como uma aposta de futuro que permita entender que as identidades comúns da Galiza com Portugal poderão alcançar uma nova dimensão institucional e um importante peso regional no quadro da União Europeia.
Veja o vídeo de apresentação da obra em youtu.be/-dCjJfnv8mo
IdiomaPortuguês
Data de lançamento1 de mai. de 2022
ISBN9789899064461
Galiza, Terra Irmã de Portugal
Autor

Ramón Villares

Ramón Villares (n. 1951) é professor emérito de História Contemporânea na Universidade de Santiago de Compostela, instituição da qual foi reitor (1990–1994). É também doutor honoris causa pela Universidade do Minho (2015). Entre as suas publicações mais recentes, destacam-se Galicia, una nación entre dos mundos (Pasado & Presente, 2019) e Exilio republicano y pluralismo nacional: España, 1936–1982 (Marcial Pons, 2021). Coordenou, com Josep Fontana, uma Historia de España (Crítica e Marcial Pons, 2007–2017, 12 vols.).

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    Galiza, Terra Irmã de Portugal - Ramón Villares

    Introdução

    A irmandade existente entre a Galiza e Portugal é uma ideia popular profundamente enraizada que tem sido utilizada e proclamada por escritores e poetas. Na segunda edição do poema Maranos (1920), o poeta Teixeira de Pascoaes inclui na dedicatória do livro alguns versos de abertura que foram amplamente difundidos na Galiza através da revista cultural Nós e, em geral, através de todo o movimento político nacionalista dos anos 1920 e 1930. A dedicatória começava com o verso «Galiza, terra irmã de Portugal / Que o Oceano abraça longamente», sobre o qual se construiu a imagem de irmandade baseada em vários pilares: a condição atlântica comum, a mesma cultura e um espírito saudosista, apesar da existência da fronteira política de dois Estados nacionais e da assimetria das suas relações políticas e culturais. Esta visão do poeta de Amarante faz parte de um processo literário e de aproximação cultural que se desenrolou nas primeiras décadas do século passado, embora muito timidamente, entre as duas margens do rio Minho, por meio dos intelectuais republicanos portugueses e dos nacionalistas galegos das Irmandades da Fala e do grupo ou da geração Nós.

    Anos mais tarde, outro poeta português de origem trasmontana e viajante frequente às terras da Galiza, Miguel Torga, conta no seu Diário que em Outubro de 1985 recebeu na sua casa coimbrã a visita de «quatro escritores galegos», que lhe falaram no seu «linguajar nativo que me consolou os ouvidos arcaicos», para concluir que «uma pátria dividida refez durante algumas horas a sua tragicamente perdida unidade». Em ambas as referências apresentam-se problemas semelhantes: as relações assimétricas entre a Galiza e Portugal, a diversidade entre uma língua de Estado e a língua ou o arcaico «linguajar» dos Galegos, assim como os contactos intermitentes das suas elites literárias, os quais, no entanto, são mais intensos do que os de natureza política. Subjacente a esta realidade cultural e política está a continuidade das suas paisagens e as frequentes relações transfronteiriças das suas gentes, que não percebem de fronteiras ou que as atravessam sem disso se dar conta, como aconteceu com a historiadora Maria Filomena Mónica, que, ao chegar ao topo da Portela do Homem em busca das raízes do seu país, confessa: «Entrei na Galiza sem dar por isso.»

    A nota escrita por Torga alude a uma ideia central: a existência de uma «pátria dividida» como resultado «trágico» de uma história que se moveu a ritmos diferentes desde a formação do reino cristão de Portugal no século XII. Essa divisão pode ter sido trágica, mas nunca chegou a concluir-se por completo. Apesar das divergências, as semelhanças são indeléveis, os diálogos nunca cessaram, e os sentimentos de proximidade e de irmandade das populações afloram com frequência. É possível discutir se se trata da mesma terra, da mesma cultura ou da mesma pátria, mas não há dúvidas de que o reino português tem uma ligação clara com a antiga Galécia romana, que se estendia do cabo Ortegal ao rio Vouga, sem que com isso se negue a herança da outra província romana, a Lusitânia, também reivindicada como pátria ancestral da nação portuguesa. Uma questão diferente é saber até que ponto se reconhece tal irmandade nos discursos históricos forjados tanto em Portugal como na Galiza, nos quais o silêncio é muito mais comum do que se poderia esperar.

    Durante séculos, este discurso histórico não pôde ser escrito, mas hoje confrontamo-nos com um presente que nos permite escrever uma história da Galiza como uma «terra irmã» de Portugal, mais claramente do que seria possível há muitos anos, o que também se pode esperar do lado português. A integração europeia e o desaparecimento parcial das fronteiras de Estado favorecem que se pense esta irmandade atlântica em termos mais culturais do que políticos, com um maior peso atribuído a uma estratégia europeia que ultrapassa os Estados nacionais. Seja como for, não é uma história comum ou partilhada, mas sim uma história paralela que, em certos momentos históricos, tende a convergir ou, pelo menos, a admitir um olhar mútuo. Reconhecer esta irmandade não é uma tarefa fácil, já que muitas vezes se preferiu elogiar a amizade ibérica, entendida a partir de uma independência radical: «cada um em sua casa», como diria o diplomata Armindo Monteiro ao intelectual galego Salvador de Madariaga numa das suas conversas em Londres durante a Segunda Guerra Mundial.

    O próprio Madariaga argumentava, contudo, que poderia fazer-se «sob a égide de Portugal» uma hipotética união peninsular. Esta perspectiva faz particularmente sentido a partir da Galiza, como país mediador de uma nova composição ibérica. No entanto, não podemos afirmar que tenha havido um reintegracionismo galego ou um irredentismo português que, conjunta ou alternativamente, defendessem a união com Portugal ou o regresso da Galiza «ao lar materno», para usar as palavras de Pascoaes. Não se trata de lidar com utopias, mas de explicar historicamente o que aparenta ser uma contradição: uma cisão do território da Galécia que, sem ser pacífica, nunca chegou a ser trágica; e, em segundo lugar, uma resistência do Norte da Galiza a perder a sua identidade cultural dentro da monarquia e do Estado-nação espanhol, sem gozar de uma aliança ou de um apoio institucional da sua irmã do Sul. Em suma: trata-se de explicar aos leitores portugueses que a Galiza não é portuguesa e que, inversamente, atravessar a fronteira para o Norte não significa entrar em Espanha, mas sim numa «terra irmã» muito diferente de Castela. Não podemos entender a Galiza e Portugal com base na indiferença

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