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Impacto: Titã: Impacto
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Impacto: Titã: Impacto
E-book371 páginas4 horas

Impacto: Titã: Impacto

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Sobre este e-book

Como evitar matar a Terra se você nem sabe quem mandou o assassino

250 anos atrás, a humanidade quase se destruiu na Grande Guerra. Logo antes, uma espaçonave cheia de pesquisadores e astronautas encontrara um novo lar na lua Titã de Saturno e sobreviveu tornando seus descendentes geneticamente adaptados ao ambiente hostil.

Os titanianos, como se chamam, têm orgulho de sua sociedade cooperativa e pacífica, enquanto, sem seu conhecimento, a humanidade lentamente se recupera na Terra. Quando um pedaço de rocha de 30 quilômetros escapa do cinturão de asteroides e parece estar em rota de colisão com a Terra, os titanianos temem que pareça que eles lançaram o bombardeio mortal. Eles poderão prevenir o impacto e, assim, evitar uma guerra de outra forma inevitável com os terráqueos?

IdiomaPortuguês
Data de lançamento31 de ago. de 2023
ISBN9781667461991
Impacto: Titã: Impacto

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    Impacto - Brandon Q. Morris

    Impacto: Titã

    IMPACTO: TITÃ

    Hard Science Fiction

    O impacto

    Book 1

    BRANDON Q. MORRIS

    HardSF.info

    Impacto: Titã

    Escrito por Brandon Q. Morris

    Copyright © 2023 Brandon Q. Morris

    Todos os direitos reservados

    Distribuído por Babelcube, Inc.

    www.babelcube.com

    Traduzido por Sofia Rezende Pereira e Silva

    Design da capa © 2023 Aditya Mashardito

    Babelcube Books e Babelcube são marcas comerciais da Babelcube Inc.

    Brandon Q. Morris é uma marca registrada do autor.

    Contents

    Impacto: Titã

    Nota do Autor

    Um Tour Guiado a Saturno

    Glossário de siglas

    Impacto: Titã

    4790.3

    Bóris esperou até que a camada de metano líquido oleoso tivesse evaporado de sua pele. Então ele abriu os dedos dos pés, se abaixou e desalojou os grânulos de gelo que ficaram presos entre o quarto e o quinto dedo. O número 92 se acendeu em verde na parte de trás de sua mão direita, revelando que o líquido estava dois graus mais frio naquele dia do que no anterior. Mas qual seria a profundidade? Estava tão imóvel que a superfície preta parecia quase vidro, lembrando-o de gelatina. Olhando de perto o suficiente, podiam-se ver fios cinzentos de névoa subindo no ar acastanhado. Depois de quase três dias de nada além de chuva constante, o ar estava quase perfeitamente parado.

    Bóris atravessou a superfície mais elevada do lago. O plano deles era loucura e só poderia ter vindo de um Vnutri. Ele deu meia-volta. Anna estava alguns metros atrás dele, ligeiramente para o lado, e coçando a axila naquele momento.

    — Qual é o problema? — ela perguntou. Seus lábios se moveram em sincronia com suas palavras por trás da membrana sobre a boca, mas sua voz soou diretamente na mente dele.

    Bóris desligou o transmissor. Àquela distância curta, eles se entendiam com a mesma facilidade do bom e velho jeito, através de ondas sonoras. Nunca era má ideia economizar energia.

    — Você quer que eu continue parado aqui ou o quê?

    Sua irmã era a colega mais legal que alguém poderia querer, mas naquele dia ela estivera estranhamente irritada desde o café da manhã. Ela não dissera por quê, contudo. Teria tido outra briga com a namorada? Ele reativou o transmissor, subitamente se lembrando de que tinham um projeto a completar. Ele mesmo estava obviamente um pouco desconcentrado. Devia ser por causa do objetivoo daquela tarefa. Geralt, o arqueólogo, estava falando com eles em voz baixa. Ele estava sentado na seção Vnutri da estação e tudo o que tinha que fazer era esperar até que eles lhe trouxessem o que queria.

    Você tem que se concentrar, Bóris, ele disse a si mesmo. Snarushi não são imortais.

    Lentamente, ele avançou com o pé direito, testando o leito do lago. Arenoso, um bom sinal. Ele transferiu todo o peso para o pé direito e este afundou cerca de cinco centímetros. Até aí, tudo bem. Ele levou o pé esquerdo para a frente, testando o chão do lago novamente. Lenta e cautelosamente, ele o deslizou um passo de comprimento pelo leito do lago, que permaneceu arenoso. Aquilo era bom. Àquelas temperaturas extremamente baixas, cristais de gelo de água se comportavam como areia de silício.

    O perigo vinha do metano. Se ficasse frio demais, o lago congelaria de baixo para cima. Não poderia ter ocorrido a Geralt procurar aquele pedaço de lixo alguns períodos orbitais antes? Então ainda seria outono lá, e não já inverno. Um aumento de cinco graus e definitivamente não haveria gelo algum no leito. Talvez todo o conteúdo do lago de metano tivesse evaporado. Então eles poderiam ter fácil e confortavelmente cavado na areia de gelo de água.

    Bóris deslizou o pé direito para frente. Outro passo. A areia molhada no chão tentou segurá-lo, mas não tinha chance contra as fibras de energia nas articulações dele. Ainda nenhum gelo no fundo. Talvez fossem ter sorte. Agora era a vez da perna esquerda.

    Bóris fez cada um de seus movimentos cuidadosa e intencionalmente. Ele tinha crescido naquele mundo exterior, mas isso não significava que a lua ainda não lhe fosse perigosa. Apenas um em cada dez Snarushi morria de idade. No entanto, quase todo jovem em Titã queria pertencer aos De Fora, como alguns chamavam os Snarushi. Bóris nunca tinha se arrependido da decisão, mesmo que ela tivesse vindo com certas restrições. Os Vnutri possuíam todos os laboratórios e estufas, mas Titã toda pertencia a ele.

    O metano líquido agora alcançava seus quadris.

    — Parece bom — disse ele, então se virou.

    Anna o seguia. Sua irmã mais nova era pelo menos tão habilidosa e ágil quanto ele, mesmo que só tivesse se tornado uma Snarushi 50 períodos orbitais antes. Foram necessários pelo menos cinco períodos orbitais para que as peles interna e externa se juntassem. Anna tinha completado a fase de treinamento subsequente, quando a recruta aprendeu a lidar com seu novo corpo em dois terços do tempo padrão. A mãe deles, se ainda fosse viva, certamente teria ficado orgulhosa dela.

    Bóris tentou sentir o chão à frente com o pé direito. Mas não havia nada lá. Ele ficou tão surpreso que quase caiu.

    — Cuidado. Tem uma ribanceira aqui — ele avisou Anna.

    Aquilo não era incomum. A subsuperfície se comportava um pouco como rocha cársica amassada pelas forças de maré de Saturno. Por vezes, formavam-se rachaduras ou o solo entrava em colapso devido a um canal subterrâneo de metano.

    Bóris colocou os óculos no lugar. Eles lembravam um pouco óculos de mergulho, mas continham uma combinação de instrumentos de sonar, radar e lidar. Com eles, ele enxergava sob a superfície ou em névoa densa. Então, ele ajustou sua mochila pesada cheia de blocos de chumbo. Sem eles, permaneceria flutuando na superfície do lago de metano como um patinho de borracha.

    Ele colocou os braços para frente, empurrou-se e mergulhou. Anna mergulhou também, ao mesmo tempo.

    A seta apontava para frente. Bóris estalou os dedos e o mostrador no dorso de sua mão mudou. Estava muito gradualmente esfriando. Ele estalou os dedos novamente. Já estavam a oito metros. Não havia lagos tão profundos quanto aquele quando os humanos chegaram em Titã pela primeira vez. Mas a energia de que eles precisavam para se manter vivos produzia calor residual que entrava na atmosfera, e esse calor estava lentamente aquecendo o ambiente.

    Chovia mais do que antes e havia tempestades agora, não apenas a cada poucos períodos orbitais, mas em vez disso, em quase todo período orbital. No Conselho, havia até uma pequena facção exigindo a eliminação dos Vnutri, os De Dentro, que precisavam do calor das estações. Mas aquela era uma avaliação ingênua da situação deles. Sem a comida das estufas e o oxigênio dos tanques, os De Fora também não conseguiriam sobreviver por lá.

    As células luminescentes na mão dele mostraram que eles ainda estavam a 150 metros de distância da área de busca. Bóris girou e procurou Anna. Ela estava nadando em sua direção com braçadas fortes e poderosas. Apesar da pele externa de um centímetro de espessura, ele ainda conseguia ver a ondulação dos músculos dela. Seus ombros tinham se tornado tão largos quanto os quadris. Ela tinha se tornado uma mulher muito bonita e, ultimamente, vinha chamando a atenção de todos os meninos e das meninas também. Ela freou seu movimento para frente com movimentos rápidos dos braços. Seu olhar estava fixo para baixo e ela parecia estar se esforçando para distinguir algo.

    O que ela tinha visto lá embaixo? Bóris alternou os óculos por todos os comprimentos de onda diferentes. Havia algo lá, no infravermelho. Lembrava um pouco uma cobra emergindo do interior da lua abaixo. Devia ser algum tipo de nascente subterrânea.

    Eles ainda sabiam muito pouco sobre a geofísica da lua para explicar a existência daquelas nascentes. Mas elas eram interessantes para os geólogos, porque muitas vezes levavam a todo tipo de compostos fascinantes e diferentes. Minerar era difícil em Titã porque havia muito pouca rocha exposta, então geralmente valia a pena obter metais e outros elementos dessas fontes líquidas.

    — Está gravando isso? perguntou ele.

    — Claro, irmãozinho. Não se preocupe.

    Ele balançou a cabeça. Claro que se preocuparia. Na verdade, ela era a irmãzinha, e Anna às vezes fazia as coisas um tanto impulsivamente. Por isso quase fora expulsa do programa Snarushi. Ela deixara a estação sem permissão antes de seu treinamento ter sido concluído.

    Nunca antes, nem desde então, houvera tamanho escândalo. Nenhum Snarushi jamais fora obrigado a desistir de sua pele externa, que os protegia da atmosfera de Titã, mas a transgressão provocara conversas sobre isso como punição. A camada especial eventualmente se juntava à pele interna. Assim, para removê-la, Anna teria que ser esfolada viva. O Conselho, no final, considerou isso uma punição drástica demais.

    — Vamos continuar nadando — disse ele. — Ainda temos cinco horas antes de precisarmos estar de volta no tanque.

    — Tem que ser isso. Lá embaixo, na nossa frente.

    Bóris se virou instintivamente. Anna estava nadando alguns metros atrás dele. Ele via sua silhueta mais claramente no infravermelho. A pele externa fornecia um isolamento excelente e emitia muito pouco calor, mas no frio extremo lá embaixo, uma diferença de meio grau na temperatura era claramente distinguível nos óculos.

    — Está vendo alguma coisa? — perguntou ele.

    — Não, mas estas são as coordenadas que Geralt nos deu.

    — Temo que isso não signifique muito.

    Ele considerava Geralt um amigo, mas o arqueólogo muitas vezes agia como se fosse mais sábio do que realmente era. Suas afirmações e proclamações demasiado frequentemente acabavam por se basear em nada mais do que palpites ou chutes.

    Anna não esperou por sua aprovação.

    — Vamos dar uma olhada, de qualquer forma. — Ela logo estava flutuando bem acima da lama que cobria o fundo.

    Lama não era realmente a palavra certa para aquilo; não era uma mistura de areia e líquido. Em vez disso, o fundo do lago estava ou em um estado constante de descongelamento e derretimento lento ou congelando lentamente, de modo que um fundo exato não podia ser definido. O material tinha uma consistência um tanto como manteiga macia. Ou pelo menos foi essa a experiência de Bóris durante sua primeira visita ao fundo de um lago de metano.

    Bóris respirou fundo e seguiu a irmã. Ela tinha acabado de alcançar o fundo e estava tentando vasculhar pela lama com as mãos.

    — Não acho que isso vai funcionar — disse ele.

    — Não. O fundo está duro demais.

    — Duro demais? Que estranho, pensou ele.

    — Sim. Tente.

    Ele tocou o fundo e soube que Anna estava certa. Aquilo não era lama. O que significava aquilo?

    — Hmm — ele resmungou.

    — Não acreditou em mim? Você não tem jeito.

    Por favor, não comece outra conversa inútil agora, ele pensou. Temos um trabalho a fazer.

    — Eu sugiro que você troque para radar — disse ele. — Ele deve ser capaz de penetrar fundo o suficiente no leito do lago para podermos achar esse negócio.

    — Vamos torcer.

    Eles deslizaram lentamente acima do fundo do lago congelado, ficando a cerca de quatro metros de distância. Geralt lhes dera uma área onde o objeto que estavam procurando poderia ter caído. Com um raio de busca de cerca de dez metros, tinham cerca de duas horas para vasculhar toda a área e retornar à estação. Uma hora para a recuperação, uma para a viagem de volta, isso deixava outra hora de margem de segurança, mais do que suficiente.

    Era uma tarefa tediosa. Ele tinha certeza de que Geralt estava lá na estação, sentado na biblioteca, lendo. Mas Bóris não estava com inveja. Apenas a ideia de ter que confiar num daqueles trajes volumosos sempre que quisesse sair da estação lhe dava uma sensação claustrofóbica. Ele adorava a vastidão das paisagens em Titã. Flutuar pela atmosfera densa com um conjunto de asas de voo ou mergulhar num lago, aquilo era vida.

    — Está vendo aquilo lá embaixo? — Anna perguntou enquanto apontava para o fundo.

    — Uma cratera. Provavelmente causada pelo desmoronamento do leito. — Ele ficou grato pela pergunta, pois pelo menos era uma distração.

    — Eu não quero uma explicação. Olhe para o formato. O que você vê?

    — Eu vejo uma cratera que…

    — Você não tem imaginação, Bóris? — interrompeu ela.

    Claro que tinha imaginação. Ele imaginava Anna mergulhando na cratera e então sendo levada por uma corrente inesperada, ou Anna cortando a pele externa no material afiado da borda da cratera, mesmo que isso fosse praticamente impossível. Isso não provava que tinha imaginação? Mas ele não diria nada disso à irmã.

    — É um arco. Bem ali. — A lanterna dela iluminou uma forma arredondada que alguém poderia chamar de arco se fosse um tanto generoso.

    — Sim, estou vendo. Super — disse ele.

    — Lembra metade de uma daquelas tempestades anticiclone em Saturno.

    Metade de um anticiclone. É claro. Não existia meio ciclone e, é claro, meio anticiclone também não existia. Mas Bóris se absteve de fazer comentários.

    — Acho que encontrei alguma coisa — disse Anna.

    — Deixe eu ver. — O campo de vista de Anna apareceu diante de seus olhos, em vez do seu próprio, projetado por lasers minúsculos no interior de suas lentes sintéticas. Sim, havia algo lá no subsolo que não parecia ter crescido naturalmente.

    — Então?

    — Tem razão, Anna, pode ser isso. Mas vai levar um tempo para desenterrar o que quer que seja.

    Bóris exibiu o tempo restante. Ainda três horas e quatro minutos. Ele ficou aliviado. Estavam bem dentro do cronograma.

    — Tudo bem. Vamos pensar em como devemos proceder primeiro — disse ele. Anna não respondeu. Em vez disso, ela se dobrou e desceu em direção ao radar. — Espere por mim, droga!

    O lago era extraordinariamente profundo lá. Ele mudou o mostrador de mão para mostrar sua profundidade atual: 10 metros, 12, 15. Quando chegou ao fundo, mostrava 29 metros. Devia ser um recorde de profundidade em Titã. Havia muitos lagos cobrindo partes da superfície da lua, mas eles raramente eram mais fundos do que alguns metros. Por que não tinham notado antes que era tão fundo lá? Devia ter havido um desmoronamento enorme lá, talvez uma cratera.

    Seu pulso vibrou. A pele externa estava lhe dando um aviso. Números vermelhos apareceram em sua mão: 86 graus. Tinha ficado bem frio lá embaixo. O metano estava super-resfriado em quatro graus. O fato de não estar congelado devia ser devido à pressão mais alta que existia àquela profundidade. Era um golpe de sorte para eles. Nunca teriam sido capazes de alcançar a peça de museu se tivessem que cavar 20 ou mesmo 10 metros de metano congelado.

    Anna estava cavando na lama que formava uma cobertura sobre o fundo do lago lá.

    — Tome cuidado — disse ele.

    — Peguei — disse a irmã. — Mas é bem pesado!

    — Espere um minuto… Vou te ajudar.

    Ele nadou até ela com duas braçadas fortes. Ela estava puxando algo que parecia um tipo de hélice.

    — Só que não se parece nada com uma asa-delta — disse Anna. — Geralt não chamou de libélula?

    — O nome da sonda era Libélula. Eu sei que você já viu fotos de asas-deltas chamadas libélulas, mas esse se refere ao nome em inglês antigo para os insetos da ordem Odonata.

    — Também não se parece nada com a libélula inseto.

    Ele tinha que concordar com ela. O objeto não se parecia com nada que voasse. Em vez de asas, tinha quatro rotores. Geralt alegara que esses rotores também possibilitavam que aquela coisa flutuasse na atmosfera de Titã, mas era difícil de se imaginar, encontrando-a lá naufragada no fundo daquele lago de metano.

    De acordo com documentos antigos, ela teria aterrissado lá quase 6.000 períodos orbitais antes, então explorado Titã para os ancestrais deles por 50 períodos orbitais e, no final, sido deliberadamente afundada.

    — Bem, vamos lá, vamos tirá-la daí — disse ele. — Já é hora de irmos embora.

    Ele tirou o cinto que estava usando ao redor da cintura e prendeu o mosquetão em uma das extremidades do cinto em um dos rotores.

    Anna prendeu seu cinto ao rotor diagonalmente oposto ao dele.

    — E… subindo — disse ele.

    Eles puxaram os cintos simultaneamente. O objeto era pesado, mesmo sob a força de gravidade baixa em Titã. Geralt não estava exagerando quando disse que pesaria em torno de 450 quilogramas.

    A libélula se moveu. A lama se agitou em toda a área ao redor dela. Subitamente, o objeto tombou do lado de Anna.

    — Merda. O cinto escorregou da minha mão. O rotor deve ter se mexido ou coisa do tipo.

    Bóris inspecionou a máquina terrestre. Um dos rotores estava girando lentamente. Mesmo depois de todo aquele tempo! Seus ancestrais deveriam ter uma tecnologia impressionante. O que teria acontecido com eles? Quase 5.000 períodos orbitais antes, quando a Grande Guerra eclodira na Terra, o povo de Titã rompera todas as conexões com ela. Todo mundo sempre tinha trabalhado bem junto em Titã, não importava de onde tivessem vindo. Os fundadores de Titã tinham decidido que a única maneira de preservar isso seria torná-la completamente independente e autossuficiente.

    — Espere — disse ele. — Vamos tentar os outros dois rotores.

    Ele soltou o mosquetão e se puxou ao longo da sonda para o rotor diretamente ao lado. Ele se abaixou para prender o cinto à sonda novamente quando ouviu um barulho como nunca tinha ouvido antes. Parecia uma crepitação muito fina e delicada repetida um bilhão de vezes.

    Não estava apenas em sua cabeça. Vinha de fora, o que era impossível. Estaria o chão desabando mais? Ele já tinha visto o chão desmoronar antes. Tinha começado com um barulho crepitante alto. Mas aquele barulho era diferente, de alguma forma. Vinha de todas as direções simultaneamente e parecia estar subindo de baixo.

    — Temos que sair daqui agora! — ele bradou.

    Agora, tinha uma ideia do que poderia ter causado o barulho. Estava muito frio lá embaixo, frio demais. O metano deveria ter congelado havia muito tempo. Apenas a pressão elevada estava impedindo que congelasse. Mas tudo o que precisava era de um gatilho, uma ligeira alteração nas condições, para iniciar o congelamento do metano, e a ação de recuperação deles devia ter fornecido esse gatilho.

    — Eu ainda tenho que soltar meu cinto do rotor — disse Anna.

    — Foda-se o cinto! Saia daqui! Agora!

    Ele sentiu o pânico se acumulando na boca do estômago. Não podia deixá-lo crescer mais. Tinha que ouvir seus próprios conselhos. A regra básica dos heróis: primeiro, coloque-se em segurança, então ajude quem mais precisar. Se o gelo o pegasse, não seria capaz de ajudar Anna. Ele nadou freneticamente para cima. O barulho ficou mais fraco e finalmente parou. Bóris olhou para o mostrador na mão. Estava a uma profundidade de 12 metros. Onde estava Anna?

    — Anna, diga alguma coisa. Você está aí?

    — É claro que estou aqui, seu idiota.

    A voz dela soou em sua cabeça, então ela devia estar logo atrás dele. Aliviado, ele se virou, mas não a viu em lugar algum.

    — Anna, onde você está? Não estou te vendo.

    — Estou bem em cima da Libélula.

    — Ah. Você consegue…?

    — Não, não consigo.

    — Merda.

    Ambos sabiam o que aquilo significava. Anna estava presa no gelo de metano. Pelo menos tinha sorte por não ser gelo de água. Ao contrário de gelo de água, metano não expandia quando congelava, ou ela teria sido esmagada. Mas ela teria que estar de volta ao tanque em cerca de duas horas, pois isso era cerca do tempo que tinha até que tivesse usado todos os recursos armazenados em sua pele externa.

    — Você está bem? — Anna perguntou.

    Bóris bufou. Como se aquilo importasse naquele momento. Como poderia estar bem quando sua irmã estava presa no gelo? Ele tinha que tirá-la de lá. Mas como? Não conseguiria ajuda da estação. Só tinham duas horas. Os Snarushi estavam todos ocupados trabalhando em outros lugares em Titã. E um Vnutri não seria nada útil para eles lá, porque os trajes espaciais não eram projetados para mergulho. O ajudante inevitavelmente ficaria congelado também.

    — Estou bem — disse ele. — Mas queria que nossas situações estivessem invertidas.

    — Infelizmente, acho que não vou poder conceder seu desejo.

    — Vou tirar você daí — ele disse. — Não se preocupe. Deixe eu pensar.

    — Tudo bem, pense o quanto quiser. E diga a Frida que eu a amo.

    — Isso eu vou deixar você fazer por conta própria.

    Bóris olhou para o mostrador de mão. Trinta minutos haviam se passado. Ele tinha contatado Geralt pelo rádio, mas não havia nenhum Snarushi por perto. Ele mal fora capaz de convencer Geralt de que não seria nada bom para ele sair correndo num traje espacial para tentar ajudar. Ele era um cara legal, o arqueólogo. Tinha passado a situação para o resto do coletivo, então Bóris não era mais o único pensando em jeitos de salvar Anna. Aquilo era reconfortante, pelo menos um pouco.

    Ainda era verdade que cada um deles faria qualquer coisa para ajudar o outro. Pelo menos, foram capazes de preservar isso através de todas as gerações. Também era mais do que meros laços de família. O fato de que todos eles descendiam dos fundadores resultara em haver poucos sobrenomes. Essa era uma das razões para terem trocado para uma convenção de nomenclatura materna quatro gerações antes.

    — Bóris?

    — Sim, Anna?

    — Não há nada que você possa fazer. Aconteça o que acontecer agora, prometa que você não vai se culpar.

    — Tá bom, vou tentar. — Mas é claro que se culpava. Tinha falhado. Não tinha cuidado direito de sua irmãzinha.

    — Prometa.

    — Tá bom, tá bom.

    — Diga: Prometo que não vou me culpar.

    — Prometo que não vou me culpar.

    — Obrigada, irmãozinho, isso faz eu me sentir melhor. Só no caso do meu plano não funcionar.

    — Seu plano?

    — Não posso falar mias. Você vai entender. Pense no que deve dizer a Frida.

    — Anna, por favor, não faça nada estúpido.

    Ela não respondeu. O que estaria planejando? Será que queria encerrar a própria vida nos próprios termos? Ele olhou com os óculos na direção aproximada dela. O radar não conseguia penetrar longe o suficiente e não mostrou nada. Mas ele conseguia distinguir algumas formas e contornos no infravermelho. Ele identificou uma estrutura plana que tinha as dimensões aproximadas de Anna. O que estaria fazendo? Estaria aquecendo um pouco sua pele externa, apenas o suficiente para derreter o gelo acima dela?

    Aquilo funcionaria? Ele estimou o calor de fusão necessário e comparou o valor com as reservas de energia em sua casca exterior. A de Anna devia ter cerca de tanta energia residual quanto a dele. Seu plano só funcionaria sob uma condição: ela teria que desativar seu suporte vital e baixar a temperatura do corpo. Era uma jogada perigosa, mas combinava com ela. Ele também não conseguia pensar em nenhuma outra opção.

    Ele observou a forma no infravermelho conforme parecia estar subindo lentamente. O ponto mais frio do gelo devia ser o fundo, então Anna precisaria de mais energia lá. Ela parecia ter levado isso em conta. Se conseguisse continuar com seu progresso atual, estaria com ele em cerca de sete minutos, ele estimou.

    Sete minutos! Três minutos sem oxigênio e o cérebro dela morreria. Mas talvez não àquelas temperaturas baixas. E talvez não com as máquinas de reparo em sua corrente sanguínea. Mas depois disso? Ele teria que carregá-la por outra hora através das planícies antes que alcançassem a estação. Seria tarde demais, não importava o que acontecesse.

    Mas ele não disse nada. Não queria tirar a última esperança de Anna. Será que ela ainda estava consciente? Seus braços e pernas pareciam estar se movendo, mas isso não significava nada. Talvez ela tivesse programado os propulsores para operarem automaticamente. E tudo aquilo por um pedaço de sucata da Terra! Realmente não valia a pena. Mas o destino não perguntava quanto valia uma vida.

    Ela já tinha quase o alcançado. Ele começou a derreter o gelo por cima. Tinha que tomar cuidado para não usar muito da própria energia, contudo, porque ainda teria que carregá-la de volta para casa de alguma forma. Então, pelo menos, Frida e todos os outros poderiam dizer adeus a ela.

    Lá estava! Ele agarrou o braço dela. Estava rígido. Ele teve que puxar com bastante força. O gelo meio derretido estava espesso como mel. Pronto, agora ele a tinha. Ele subiu o mais rápido que pôde.

    — Anna? — Ela não respondeu. — Estou com ela! — ele gritou pelo rádio.

    — Isso é bom. Estou no litoral — respondeu Geralt.

    — O quê? O que você está fazendo aí?

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