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Sob Os Ventos Do Moinho
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E-book170 páginas2 horas

Sob Os Ventos Do Moinho

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Sobre este e-book

O ritmo de vida de uma pacata cidade sertaneja passa a mudar com a chegada de uma construção. Essa construção veio trazendo grandes problemas à população local e que desenterrará segredos escondidos à sombra de um velho moinho. Fernando, Ananita, Matias e Jungo são personagens centrais que darão impulso a história que os ventos do moinho não conseguiram soprar para longe.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento6 de jul. de 2019
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    Sob Os Ventos Do Moinho - Dênis Venceslau

    Sob os Ventos do Moinho

    Copyright © 2019 Dênis Venceslau

    Nenhuma parte desta publicação pode ser armazenada, fotocopiada, reproduzida por meios mecânicos, eletrônicos ou outros quaisquer sem a prévia autorização o autor.

    venceslaubevenuto@gmail.com

    Editora

    Clube de Autores

    www.clubedeautores.com.br

    Produção editorial

    Clube de Autores

    Revisão

    A autor

    Capa & Diagramação

    Antonio dos Anjos

    Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Venceslau, Dênis

    Sob os Ventos do Moinho/Dênis Venceslau ISBN: 978-85-85330-84- 2

    1. Literatura. I. Título. II. Romance 2. 1ª Edição- 2019

    Clube de Autores Publicações S/A-CNPJ: 16.779.786/0001- 27 Rua Otto Boehm, 48 Sala 08, América Joinville/SC, CEP 89201- 700

    I

    Unido ao terreno de Matias, aparecia erguido em meio à supremacia do tempo o inspirador de épicos, um moinho. O Moinho Tilim, assim o chamavam. Era a única coisa que, até o ano em que faleceu Nelson Falcão Rodrigues, fazia o limite entre as terras de Jungo Vianei e as de Matias Silva. Contam que em 1975 essa atafona foi retirada por uma tropa do governo, talvez por acreditar que um dia o mar invadiria o Sertão ... Enquanto todo o país escondia as bandeiras

    da democracia e da liberdade em seu quintal, devolvida ao lugar pelo mesmo órgão que em 1950 a instalou naquelas terras, o cata-vento conservou - se em pé em pleno funcionamento, com muitos reparos, até 1979, ano em que o Riacho Verde perdia sua vitalidade.

    À margem do Riacho Verde, apesar do sol bastante formoso e em forma de urupema cheia de luz, alguns girassóis não se abriram. O cavalo de Jungo, pronto para ser cavalgado, rejeitara o milho em espigas jogado de forma grosseira ao chão. Em alguns grãos soltos, afastados pelo focinho do animal e que germinariam antes de 24 horas, aos poucos os brotos surgiriam, e bem não começaram a se manifestar, o cavalo os comeu quando com fome ao ser esquecido no outro dia por seu dono. Uma jandaia curetou um tronco seco e voou para o umbuzeiro próximo que, também, era cobiçado por outras aves e por muitos anos foi a alegria das

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    crianças que nasceram e cresceram por perto. Mina foi uma dessas crianças, mas sua alegria durou somente até descobrir: seu pai era outro, e não Antonino. Voltou toda a felicidade perdida quando casou com Jungo, era o que bem demonstrava a única fotografia do casal exposta na sala da casa. Os galos cantavam entre as madrugadas e as manhãs, quase sempre na mesma hora. Houve uma vez que os galos não cantaram no horário certo, a mãe de Mina faleceu, foi o que ela ouviu falar quando criança. A poucos metros da janela do quarto ficava o galinheiro, e quando Mina sentia que os bichos iam passar do horário de cucuricar e cacarejar, ela batia em panelas, fazia chiados, pisava forte no chão, falava alto, só não acordava Jungo, isso era o trabalho dos galos do sítio.

    O sossego da casa acompanhava o de Mina. Envolta nos braços de Jungo, brincava com as palmas das mãos do esposo. Jungo estava apressado para ir à cidade, mas os carinhos, as conversas, as carícias recebidas pela esposa e as náuseas que ela as sentia o fizeram esquecer tudo o que não estivesse nas histórias contadas naquele dia pela mulher.

    Tão logo despertou outro dia. Jungo se levantou como quem põe para fora todas as ruins sensações. Abriu a janela do quarto e, com as mãos sobre a travessa da janela, deu um forte grito tirando-lhe do descanso intenso que o impedia de ver o moinho. Debruçou-se sobre a travessa inferior, ficou com metade do corpo para fora do quarto, com a mão direita espalmada sobre o olho

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    esquerdo e em direção ao sol, o olho direito fechado, conseguia ver apenas a coroa do sol. Mina tentou alcançar a perna do esposo e puxá- lo novamente para a cama, mas ela se desequilibrou e quase se estatelou no chão. Com os dedos dos pés tentou pegar uma toalha toda desfiada na cabeceira da cama. Jungo afastou-se da janela e, mais ágil do que Mina, pegou a toalha e foi ao banheiro.

    O relincho do cavalo na baia foi o que fez Mina se despertar. O cavalo estava como que reclamando o peso da cela nova. A cela, presente de casamento que Antônio Danúzio dissera ter trazido dos estrangeiros, tinha rabecheira, peitoral, cabeçada, capa, cilha e sub-cilha. O cavalo esticava os beiços e tentava tocar a água na gamela onde um pequeno rato submerso catava restos de comidas que flutuavam. O cavalo espirrou tão forte que dessa vez Mina se levantou da cama e foi para a janela. Para ela, era a janela do quarto que dava acesso ao mundo passado, pois por aí, todas as manhãs, via ainda o velho moinho e, também, percebia um mundo que por mais que se movia continuava da mesma forma.

    Jungo se enxugava quando escutou um grito, que pela altura, intensidade e timbre, percebeu de que era da esposa. Entre a cama e uma mesinha que servia de criado-mudo, Mina se encontrava desmaiada. A claridade do sol fazia sombra do moinho. Um vento brando entrou pela janela e balançou uma pena de pavão que servia de enfeite em cima do criado-mudo. E a pena, que sempre ajudou Mina ver, também, que o tempo fora

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    da casa não parava, continuava a se mover desordenadamente. Vento e sombra continuamen te foram o relógio de Mina. E antes de amparar a amada, e mesmo antes de terminar de se secar por completo, Jungo colocou a pena novamente em pé, pois o derrubara quando se aproximara da mulher. Várias vezes tentou acordá-la ali no chão, angustiou-se e sem compreender o que de fato aconteceu, pegou-a nos braços e deitou-a na cama. Mina continuou a se mexer como em soneca. Jungo balançou bruscamente a cabeça da esposa. Os últimos pingos de água, que desciam de seus cabelos, deslizavam nas pálpebras da esposa como que pretendessem acordá-la. A extrema aflição do homem fez dizer-lhe palavras que em condições ditas normais não sairiam de sua boca; não por não a amar, mas por pensar que isso diminuía-lhe um pouco da romanesca tradição de um bom caboclo sertanejo: homem não chora, homem não diz isso, homem não diz aquilo. Quando Mina se despertou, ainda deu para escutar algumas palavras afáveis do esposo, e caiu no choro. Era um choro de assombro.

    Depois de um bom tempo, abraçados, Mina apontou para um lugar que não existe, um vazio no ar, falando que havia ali um mulato grande e forte que a observava. O esposo não a ouviu direito, foi o tremor na voz da esposa e o relinchar do cavalo que balançava a crina espantando moscas. Do outro lado da pequena casa, as galinhas carcarejavam, o que fez, novamente, Jungo entender pouca coisa do que a esposa falara. Deitou a cabeça dela no

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    travesseiro, tirou um bornó de alças longas e uma espingarda de pressão por trás do guarda-roupa, e retirou-se pelo fundo da casa. Saiu reparando a mola de sua arma e os projétis de chumbo, que na pressa, caíram em seus pés, recuperando-os poucos. Ele olhou para o Tilim, exatamente para o

    Tilim, como quem pedisse álibi para o que poderia vir a acontecer, mas o moinho estava lá, com movimentos irrealizáveis, nem sempre de pé, mas agora como com convicção de que nada mudou ao seu redor. E o que é convicção de moinho senão a redundância de seu próprio movimento existencial? Jungo deu algumas voltas ao redor da casa,

    mas nada encontrou. Parou em frente ao Tilim, virou o cano da espingarda para uma das hélices do moinho, e cravou a vista entre os espaços de duas hélices. Apontou para baixo e voltou a mirar o vazio entre as hélices. Atento, jogou todos os seus sentimentos à linha de visada e disparou – um disparo acompanhado de um som estranho como se estivesse arranhando algo. Teve susto com as poucas pombas de arribação que voaram em bando por causa do barulho, e foi o que fez, também, Matias e Ananita se acordarem achando estranho que algum caçador estivesse atirando próximo a sua residência. Ainda com a arma apontada para o céu, descreveu círculos sobre círculos e só parou quando Mina gritou por seu nome.

    Ao retornar para dentro da casa, certificou - se se não havia algum vulto entre as árvores mais próximas. Várias vezes, Jungo foi para fora, distanciando-se não muito da porta. Da arma não se

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    separou, segurando-a em abraço. Em uma cadeira no alpendre, Jungo deu uns cochilos.

    O Riacho Verde, que se dissimulava atrás da casa de Jungo, logo surgiria suspeito com os pingos de chuva que há meses deixaram de cair. Em tempo de grandes correntes, inundava parte da estrada que fica entre Avenca e o Cemitério da Boa Morte. Foi, por isso, que Jungo fez páreo, para chegar depressa à cidade, com as poucas águas q ue começaram a descer por recantos de encostas e riachos.

    As águas, que carregaram um pouco da raiva de Jungo, corriam pelo lado esquerdo do cavalo e mal tocavam em suas patas. As botinas sem cadarços, desgastadas, pareciam ferraduras e desestabilizaram Jungo que tombou na deterioração de um degrau da cobertura que sobressai do telhado do bar. Topou em Fernando e logo depois em Bassã, o vigésimo terceiro das pegas de boi no mato e o primeiro e único moleiro de Crumataí. – Espinhos de juremas e touceiras de xique-xique são mais afiados do que hélice de moinho – Foi a gracinha que Jungo soltou a Bassã. Depois de algumas conversas entre Bassã, Fernando e Jungo, Bassã começou: O poeta já dizia, na seca inclemente no nosso Nordeste/ o sol é mais quente e o céu, mais azul/ e o povo se achando sem chão e sem veste / viaja a procura das terras do Sul. Jungo apontando para o céu, continuou: Porém quando chove é riso e festa/ o campo e a floresta prometem fartura/ escutam-se as notas alegres e graves/ dos cantos das aves louvando a natureza...

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    Antes que terminassem de declamar, foram interrompidos pelas palmas de Fernando e por Antônio Danúzio que, aparecendo na porta, dizia que aqueles versos o faziam lembrar-se de José Faustino Vila Nova, um grande cantador que ouviu em Caruaru. De fato era do Vila Nova. Antônio Danúzio estirou a mão direita com a palma virada para baixo em direção a Jungo e puxou-o para si. Pensou em segurá-lo por mais um pouco, mas deixou-o escapar para pedir desculpa a Bassã por tê-los interrompidos. Depois de muita conversa: sobre o péssimo inverno, os animais de um circo que acabara de chegar à cidade e o preço de terras agricultáveis. Antônio Danúzio antes de deixar o recinto ofereceu a Jungo quarenta cruzeiros (Cr$ 40,00) pelo seu alqueire, media cerca de cinquenta por cem (50 x 100). E como mais de um minuto se passara sem nada o homem o responder, Antônio Danúzio deu uma tapinha nas costas de Jungo que se limitou apenas em soltar um riso preso e um olhar vago.

    Mas o que fez Jungo permanecer fincado na porta, mesmo com o céu se abrindo para lhe mostrar o anilado que havia por trás das nuvens que refluíram para dar passagem ao sol que aos poucos aparecia, foi a oferta que Antônio Danúzio lhe fez de comprar suas terras.

    Dava-se para ver um fogo que se alargava em labaredas sobre a Serra do Poço. A Serra do Poço – ramificação de uma serra bastante conhecida no Sertão – serve para limitar os municípios Crumataí e Cunhaú, e nela têm suas

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    vertentes as águas de dois riachos: a do Rio do Pato, que fica em Cunhaú, e a do Riacho Verde, que corta praticamente todo o município de Crumataí e deságua no município de Serra Pontuda. O Açude Batistão serve como represa de outro riacho que cai no Riacho Verde.

    Depois da chuva, era estranho e incomum o fogaréu que se expandia sobre a caatinga ao impulso do aracati. Jungo e Bassã saíram da sacada com os olhos voltados para o fogo e não viram que ao mesmo tempo pisaram em excrementos do cavalo de Antônio Danúzio. Bassã abaixou-se para olhar o esterco nas sandálias, passou-as em uma mancheia de água, o que só fez piorar, e se lamentou por se sujar nas sandálias que as us aria em sua viagem.

    Jungo saiu resmungando para si, e não se ouvia se era sobre os excrementos em sua botina, sobre o moleque Malaquias que perturbava o cavalo que Jungo amarrara em um cedro ou a oferta de Antônio Danúzio a sua propriedade, ou ainda, não ter entrado no bar de Bina para tomar uma birita. Tentou retornar a sua residência, sendo impedido apenas por um fiapo de água no Riacho Verde que, mesmo depois de a chuva ter cessado, fazia sinuosas curvinhas como que quisesse desviar de seu destino – morrer hora depois.

    O riacho perdeu completamente a vigência diante das patas do cavalo. O animal tentou beber o resto de água que a pequeníssima correnteza fez questão de transformá-lo em poça de água. Jungo desceu do cavalo e ajoelhou-se diante da água,

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    onde o reflexo era menos turbulento do que nos espelhos de sua casa. Com as mãos em formato de côncavo, trouxe-lhe água à boca e ao dorso do cavalo que se movimentava como que se assustasse com a própria

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