Ser professor: representação social e construção identitária
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Ser professor - Alessandro Messias Moreira
Editora Appris Ltda.
1ª Edição – Copyright© 2015 dos autores
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Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.
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Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS - PSICOLOGIA SOCIAL
Dedicamos este livro a todos aqueles que trabalham para a construção do conhecimento e que são comprometidos com uma visão humanística desse conhecimento.
Aos nossos familiares e amigos que pela crença e convicção na vida nos inspiram a continuar buscando a compreensão do sujeito humano em todas as suas dimensões.
AGRADECIMENTOs
Gostaríamos de agradecer a participação dos professores da rede estadual de ensino de Minas Gerais, por sua paciência em nos atender e pela colaboração na coleta de dados, sem os quais este trabalho não teria sido possível.
Agradecemos igualmente à Universidade de Taubaté, que nos propiciou o ambiente e as condições de trabalho para completarmos nossa pesquisa.
Nosso obrigado vai também para o Centro Universitário do Sul de Minas, a Secretaria de Estado da Educação de Minas Gerais e para a Superintendência Regional de Ensino de Varginha pelo apoio financeiro ao projeto.
Finalmente, queremos registrar aqui nosso agradecimento à Appris Editora e Livraria, por seu apoio e por acreditar em nosso projeto.
APRESENTAÇÃO
Toda sociedade é apoiada na formação dos indivíduos que a compõem, como condição necessária para sua existência e sua reprodução. Essa formação, pelo menos nas sociedades ocidentais, é baseada na educação em sua forma escolarizada. De fato, há mais de dois séculos, a educação em seu formato escolar constitui o modo dominante de socialização e desenvolvimento humano nessas sociedades. Entre outras atividades sociais e culturais, esta se tornou uma maneira privilegiada de transmissão do conhecimento socialmente acumulado historicamente.
Os professores, que são atores centrais nesse processo, cresceram em número no Brasil a partir da segunda metade do século passado, quando começa um forte processo de expansão da escolarização básica no país. Esse grande crescimento em tempo relativamente curto se deu à custa de soluções provisórias e de adaptações mal arranjadas, incluindo cursos rápidos de formação de docentes, admissão de professores leigos etc.
Ao longo dessa história, a representação dos professores no imaginário social e perante o poder público, que define e organiza seu papel profissional, transformou-se consideravelmente.
Assim, nos anos 1960, vemos os professores identificados por meio de estatísticas e papéis sociais a eles atribuídos. Já nos anos 1970, eles passam a ser o centro das atenções, tendo sido transformados em culpados pelo fracasso escolar e principais agentes reprodutores das desigualdades sociais. A partir daí multiplicaram-se as instâncias de controle do professor dentro do sistema educacional, buscando-se uma racionalização do ensino representada pela separação entre a concepção das tarefas docentes e sua execução.
Se, em tempos recentes, buscou-se uma ampliação do acesso à escola e uma melhoria das condições de ensino, nos falta ainda avançar no quesito qualidade: e esse avanço passa necessariamente pelo trabalho do professor.
Embora a ampliação da escolarização básica seja meritória, ela coloca, ao mesmo tempo, desafios significativos para a atuação dos professores, particularmente pelas pressões por práticas educativas que apontem para uma sociedade mais justa e democrática e para uma formação cidadã.
Ao mesmo tempo, apesar de reconhecidos esforços do governo no sentido de valorizar o docente, é bastante clara a trajetória de proletarização do professorado, com sobrecarga de trabalho e defasagens salariais.
Não surpreende, portanto, que o ser professor
hoje seja marcado pela indefinição, senão crise, identitária. As origens dessa crise podem, ao menos em parte, ser associadas à perda do reconhecimento social do trabalho docente e à falta de percepção por parte dos professores do que é sua profissão.
É nesse contexto que se coloca o trabalho que apresentamos ao leitor, que busca apreender, na construção do ser professor
, os vínculos e as tensões entre o pensamento social e o pensamento pedagógico, entre o papel social e o pertencimento a um grupo, entre a dinâmica profissional e a dinâmica identitária.
Debruçamo-nos sobre a questão da identidade profissional docente a partir das formulações da psicologia social, particularmente da Teoria das Representações Sociais, desenvolvida nos anos 1960 por Serge Moscovici, pesquisador de origem romena radicado na França e falecido em 2014.
Essa é uma abordagem que tem se mostrado frutífera para compreender a construção identitária do professor, a qual tem reflexos profundos em sua maneira de atuar em sala de aula e interagir com os alunos, com seus pares e com o sistema educacional como um todo.
Procuramos estabelecer uma ampla revisão teórica sobre a formação docente, com foco na formação profissional e na identidade profissional docente. A essa análise teórica se associa a uma extensa pesquisa de campo realizada junto a professores da rede estadual de ensino fundamental de 28 municípios do estado de Minas Gerais.
A decisão de se utilizar a teoria das representações sociais como eixo principal da análise se deve ao potencial explicativo da teoria, que articula as relações entre um sujeito coletivo (os professores) e um objeto (a identidade profissional ou o ser professor
).
De fato, as representações sociais, constituem uma forma de conhecimento prático, construído no cotidiano dos membros de um grupo, orientado para a comunicação, a compreensão e o domínio do meio ambiente social e material desse grupo. Esse conhecimento está ligado, no caso dos professores, a sua atividade docente, ao ser professor
, aos saberes e fazeres frutos de formação, experiência e relacionamento que são pouco a pouco construídos na vida profissional.
Não se trata de absorção pura e simples do que existe, mas de reconstrução a partir de uma perspectiva privilegiada e de uma rede de significados previamente existente no grupo. Essa representação construída em mundo simbólico, mas com fortes e concretas relações com o meio, orienta a ação do sujeito a priori e justifica essa ação a posteriori, constituindo-se em um meta-sistema de regulação das ações e pensamentos do indivíduo. Representações sociais não definem o comportamento dos indivíduos ou grupos, mas delimitam cognitiva e afetivamente o universo de suas possibilidades.
Aí repousa o potencial explicativo da teoria, ou seja, nas relações que se estabelecem entre representações e práticas sociais. Em diversas situações, particularmente aquelas nas quais o indivíduo dispõe de uma autonomia relativa – e esse é seguramente o caso de professores em sala de aula – estudos tem mostrado que as representações sociais orientam diretamente as práticas e participam, assim, da constituição identitária do professor.
Quer entendamos a identidade como papel desempenhado na sociedade, como pertencimento a um grupo ou como características intrínsecas do indivíduo, ou ainda como uma composição dessas dimensões, as representações sociais participam diretamente dessa definição. Essa é a razão fundamental para a escolha do conceito como chave mestra da análise da profissão docente.
Da teoria à prática, o texto que se propõe ao leitor busca aplicar o conceito de representação social a um caso concreto. Tomando como grupo de estudo professores de anos iniciais do ensino fundamental (1º ao 3º ano), distribuiu-se um questionário orientado a coletar informações sobre a formação e a prática docente, suas características, vivências e dificuldades. Os quase 400 questionários respondidos permitiram estudar, sob diversos ângulos, o que ser professor
representava para esses sujeitos.
As respostas obtidas, que convidamos o leitor a analisar com mais vagar ao longo do livro, abarcam dimensões epistêmicas, psicológicas e sociais da formação. Um resultado importante obtido a partir da pesquisa aqui apresentada diz respeito à formação docente e à organização da representação social sobre ela que é feita pelos professores. Essa organização, como já mencionado, estrutura-se em torno de dimensões sociais, psicológicas e epistêmicas. No entanto, e isso é bastante interessante, aspectos sociais parecem ser privilegiados em relação aos aspectos epistêmicos, o que parece indicar que a prática e a experiência dos professores parecem ganhar relevo diante dos conteúdos da formação. Essa é uma representação que aparece com sinal invertido em relação às representações de estudantes de licenciatura em geral, que tendem a privilegiar o conteúdo da formação inicial. Essa dinâmica da representação social dos professores, que parece evoluir de um polo mais cognitivo para um polo mais psicossocial é digna de nota e aponta para novos estudos na área.
Uma contribuição significativa deste livro, também, está associada à combinação de métodos de pesquisa. Além de análises estatísticas sobre respostas a um questionário, o estudo é enriquecido com uma análise realizada sobre texto que os professores escreveram livremente sobre o tema indutor ser professor
. A avaliação dessas respostas textuais, feita por meio de análise de conteúdo informatizada, revelou a teia de inter-relações entre diversas categorizações da identidade presentes no discurso dos professores: identidade enquanto idealização profissional, identidade relacional, identidade instrumental e o processo de identificação. Convidamos novamente o leitor a navegar nos resultados obtidos com essa poderosa técnica de análise.
Em conclusão, o texto que propomos ao leitor apresenta um horizonte bastante amplo de questionamentos e abordagens, com os quais se pretende chamar atenção para as possibilidades das