Cavalos pesados
De David Mello
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Cavalos pesados - David Mello
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Parte 1
Imagine aqui o presente, o passado e o futuro. Neste plano que se chama vida, em que se reúnem jovens e velhos, fortes candidatos a saborear a apoteose ou amargar o âmago do fracasso.
Eu sou um amante da música e das artes em geral, um ser humano sensível, e que por vezes flerta nas horas erradas. Eu sou aquele que crê em Cristo, embora seja obra do poeta-filósofo Friedrich Nietzsche – em particular das teorias sobre estética, moralidade e dualidade apolínea-dionisíaca, que me marcaram definitivamente.
Na adolescência eu comecei a guardar os primeiros apontamentos, e a noção romântica de poesia tornou-se mais presente na maneira de compreender o mundo. Talvez seja correto dizer que, para mim, o ser
poeta-escritor se assemelha à compreensão de Rimbaud e Kerouac.
E aqui estou eu, meus caros amigos! Sem mulher, sem bebida... Ah, que lúdico! Nada de farras ou de heróis noturnos que, com suas letras e vozes ferozes, proclamam a visão reacionária de uma geração desnuda de sua própria languidez. Bem, ah, sermos junkies também.
De fato, sou escritor, mas tal ofício ainda não me traz qualidade de vida, pois bebo pra caramba para esquecer quem eu sou. Bebo quando estou triste, bebo quando estou alegre, e também bebo quando estou puto da vida. Eu bebo para comemorar, e bebo com os poucos amigos loucos, no próximo bar.
Eu sou mais um beato, um literato perdido nas beiradas da sarjeta literária. E em alguns momentos, quando fico entediado, encho a cara pro ego inflar e a imaginação, como uma esponja, expandir. Depois vem o efeito rebote, como dizem os psicanalistas, quando ajoelho no banheiro dos mártires, refletindo pensamentos diversos e coisas sobre como a vida me trouxe até o presente momento.
Eu me sinto estranhamente normal...
Entediado? Ok.
Agora vamos imaginar que eu estou a dançar num salão enorme, sozinho, enquanto casais bailam sem parar. Pois é, esse é o mesmo sentimento que um peixe tem quando está cativo em um aquário pequeno e redondo, com o mundo restrito apenas ao próprio olhar. Eu não estou suspirando e nem gemendo, nesse vale de lágrimas que é a vida. Sempre sonhei em viajar... ver outros lugares... mas esses planos eram sempre vagos. Apenas sonhava e nunca dava partida. E este foi o mesmo sentimento que tive aos meus vinte e poucos anos de idade.
Formosa. Essa cidade adotiva que fica tão longe, e ao mesmo tempo tão perto da capital federal, já estava me deixando entediado. Os mesmos rostos, as mesmas conversas e os mesmos burburinhos nas vielas. A pancada foi forte depois de um baita chá de buceta, daqueles que o cara fica pirado. Mas enfim, ela foi embora; e confesso que me libertei de uma amarração. Aliás, ‘muito obrigado por ter se mandado; muito obrigado por ter me deixado como um cachorro otário’. Essa frase não é minha não, mas do saudoso Cazuza.
Eu já tive tantas paixões platônicas...
Romantismo do décimo nono século que em nós aflora, e nos torna capazes de drenar todos os medos e anseios de tal estátua romana, de mármore e fria, que está tão perto e concomitantemente tão longe. Mas nós aprendemos que jamais morreríamos por elas. Somos capazes de comer o câncer arraigado em seus estômagos, mas morrer já é demais.
E aquela foi a primeira vez que amei.
O amor é uma mistura de sudorese com nó na garganta, e borboletas rodopiando no estomago. Mas veio a desilusão, e eu descri do amor. Eu descri de mim mesmo, e da capacidade de amar outro alguém. Acreditar no amor? Só se for para acreditar em mim mesmo.
Toquei o foda-se.
Albertus foi o cara que me estendeu a mão com uma garrafa de bebida e cigarros, e então começamos a