A Divisão do Poder Político: Do Estado Liberal ao Estado Social
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Sobre este e-book
O autor examina como a transformação do Estado foi exigindo a instituição de novos órgãos para o exercício do poder político, abordando a dinâmica da separação dos Poderes e as mudanças percebidas nas feições dos poderes políticos instituídos, especialmente na passagem do Estado liberal ao Estado social.
O texto aborda o modo como foi exercido o poder político na Antiguidade – simples divisão funcional do trabalho –, a situação político-social do medievo – período marcado pela fragmentação da sociedade política –, até chegar ao Estado moderno, com o fenômeno da concentração do poder político no Estado e a sua posterior divisão como mecanismo de controle.
De um modelo bipartido, com a separação do Parlamento, a divisão avança para uma tripartição, com a independência do Poder Judiciário, e vai em busca do equilíbrio entre Executivo, Legislativo e Judiciário, consagrando-se o modelo liberal de divisão do poder.
O estudo revela como a ampliação do campo de atuação do Estado, ao longo dos séculos XVIII e XIX, inviabilizou que se mantivesse a concentração de funções diversas em um único órgão, aprofundando a divisão dos Poderes.
O livro delineia, ainda, uma divisão dos Poderes tipo para o Estado social, buscando demonstrar o papel de cada Poder nessa nova conformação, a partir das ideias de decisão, execução e controle político. Partindo dessas ideias, a obra traça linhas verticais e horizontais para distinguir seis Poderes políticos – Chefia de Estado, Governo, Parlamento, Administração Pública, Poder Judiciário e Tribunal Constitucional – e associar cada poder a uma ou mais funções.
Por veicular assunto ainda pouco explorado na literatura nacional, e pela linguagem simples e dinâmica, este livro constitui interessante fonte de leitura para todos aqueles que se interessam pelo tema da política e teoria do Estado.
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A Divisão do Poder Político - Geomar André Bender
Editora Appris Ltda.
1ª Edição - Copyright© 2019 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.
Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98.
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Foi feito o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nºs 10.994, de 14/12/2004 e 12.192, de 14/01/2010.
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO DIREITO E DEMOCRACIA
Dedico este livro aos meus filhos, pelo exemplo de caráter.
Aos meus pais, por todo amor e cuidados a mim dispensados.
À Universidade Federal do Rio Grande do Sul, pela oportunidade e pelo apoio.
À Advocacia-Geral da União, pelo apoio.
Aos meus colegas do mestrado, pela parceria e compartilhamento das informações.
Ao professor Carlos Eduardo Dieder Reverbel, pelo incentivo e apoio.
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha esposa, pelo carinho, compreensão e parceria em todos os momentos.
Aos meus filhos, pelo carinho e pela inspiração.
Prefácio
A divisão do poder político é assunto controvertido no Direito Público. A doutrina não para, ela cria e recria teorias. Muita tinta foi e ainda será dedicada ao tema sem que se possa chegar a uma conclusão pronta e acabada. Estudiosos e juristas de ontem e hoje contribuem para manter o debate em torno das instituições políticas do Estado vivo na academia. Precisamente neste contexto insere-se o autor, Geomar André Bender, que muito me honra com a escolha para prefaciar o livro que ora vem a público.
Geomar iniciou seus estudos acadêmicos na Universidade do Vale do Rio dos Sinos nos anos 90. Desde cedo, dedicou-se ao estudo do Direito Público, vindo a se tornar Especialista em Direito Internacional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde tive o prazer de orientá-lo no mestrado. Assíduo frequentador dos Grupos de Estudos e dos Seminários de Direito do Estado, permanece incansavelmente pesquisando e, graças a sua competência e ao seu empenho, atualmente cursa o doutorado.
O presente livro, decorrente das pesquisas desenvolvidas pelo autor em sua dissertação, segue a trilha da escola gaúcha de constitucionalistas, cujo grande protagonista é o professor Cezar Saldanha Souza Junior. Analisa a divisão horizontal do poder político, do Estado liberal ao Estado contemporâneo, expondo os diferentes matizes de abordagem, desde a concentração dos poderes políticos, passando pelas teorias já consagradas da separação dos poderes, até as classificações mais recentes.
O autor realiza um estudo abrangente, desde a Antiguidade, utilizando como referência não apenas escritores clássicos, mas também referências contemporâneas na área. Sempre atento às transformações sociais, ressalta a necessidade de adaptabilidade por parte da organização política das instituições estatais às necessidades de seu tempo e a crescente especialização das funções por parte dos órgãos estatais.
Trata-se de obra essencial para a comunidade acadêmica e profissional, cuja leitura recomendamos a todos aqueles que se interessam pelo estudo do Direito Público, mormente àqueles que pretendem ampliar sua compreensão acerca da divisão do poder político em uma perspectiva histórica, e que muito orgulha a tradição da Faculdade de Direito da UFRGS.
Porto Alegre, 31 de janeiro de 2018.
Carlos Eduardo Dieder Reverbel
Mestre e doutor em Direito do Estado pela UFRGS. Doutor em Direito do Estado pela USP
Professor da graduação e do Programa de Pós-Graduação (mestrado e doutorado) da UFRGS
Coordenador da especialização em Direito do Estado da UFRGS. Advogado e Parecerista
APRESENTAÇÃO
Desde antes do ingresso na universidade, na Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais, e mesmo após longo tempo já graduado, sempre entendi a divisão do poder político na forma celebrizada por obra de Montesquieu, entre Legislativo, Executivo e Judiciário.
Essa visão sobre a divisão dos poderes
não é sem razão e não é exclusividade do autor, porquanto, desde Montesquieu, pelo menos em grande parte do mundo ocidental, arraigou-se um modelo de divisão tripartite do poder político, tendo como organismos encarregados do seu exercício, os assim denominados, Poder Legislativo, Poder Executivo e Poder Judiciário.
A simplicidade desse modelo permitiu que ele se multiplicasse em diferentes versões, tendo, porém, um cerne comum, ou um mínimo denominador comum, consistente na identidade das funções fundamentais dos diversos modelos (atribuídas tendencialmente com exclusividade aos três organismos acima referidos): a função normativa ou legislativa (consistente em editar as regras gerais e abstratas com aptidão para formar ou modificar o sistema jurídico de uma dada comunidade); a função executiva (significando a função de efetivar, por intermédio de atos singulares ou pontuais, os comandos estatuídos pelo órgão encarregado da função legislativa); e a função jurisdicional (constituindo a função de decidir as controvérsias surgidas em face de suposta violação das normas estatuídas).
Esse modelo de divisão do poder político, concebido em outro contexto histórico e com o caráter instrumental voltado precipuamente a limitar e controlar o exercício do poder político e, assim, impedir a tirania, permanece, contudo, orientando a forma de organização política de diversos Estados contemporâneos.
O contato com obras e autores que cuidaram de analisar as diversas funções do Estado, para além da função legislativa, executiva e judicial, despertou o interesse em aprofundar o estudo sobre o tema.
Por isso, o objetivo central deste livro é demonstrar que as profundas mudanças sociais ocorridas desde o advento do Estado liberal, com o Estado assumindo funções que, naquele modelo de organização, competiam privativamente à organização civil e com a identificação de outras funções estatais para além daquelas três tradicionalmente concebidas no modelo liberal, tornou-se imperioso ampliar substancialmente a divisão do poder político dos Estados.
Para alcançar esse propósito foi necessário analisar, inicialmente, os dois modos básicos de divisão do poder político: o primeiro, consistente em dividir o poder político verticalmente, entre entes jurídicos diferentes; o segundo, representado por uma divisão no sentido horizontal, com a atribuição de parcelas do poder político entre órgãos pertencentes a um mesmo ente jurídico.
Em seguida o estudo detém-se no exame da divisão horizontal do poder político, procurando apanhar, nesse campo, os modos de divisão do poder desde a Antiguidade até o advento do Estado social.
Para tanto, foi necessário examinar a forma como foram entendidas as funções do Estado no curso do tempo e a forma como essas funções foram atribuídas aos órgãos encarregados do seu exercício.
Da inexistência de uma autêntica divisão de poderes na Antiguidade, passou-se por uma divisão tripartite no Estado liberal, chegando, finalmente, à identificação de uma divisão do poder político entre, pelo menos, cinco diferentes órgãos em grande parte dos Estados contemporâneos.
A par da constatação dessa evolução, e buscando demonstrar a necessidade de diversos Estados, a exemplo do Brasil, de ampliar a divisão do poder político para além do modelo tripartite do Estado liberal, a obra examina as transformações sociais que, gradativamente, foram exigindo uma especialização das funções do Estado e, com isso, ensejar novas divisões no exercício do poder.
Por outro lado, essas mesmas transformações sociais, além do aprofundamento da divisão do poder, foram exigindo uma mudança nas atribuições dos poderes, afetando sobremaneira a face dos Poderes, notadamente, do Executivo e do Legislativo.
O livro está dividido em quatro partes.
A primeira parte da obra reporta-se à natureza social dos seres humanos e da necessidade de instituição de um poder superior para reger e comandar a sociedade: o poder político.
Nessa parte, o livro aborda, ainda, a conformação do poder na Antiguidade, quando o exercício direto do poder político pelos cidadãos e a confusão entre esferas pública e privada inviabilizaram a instituição de uma autêntica separação dos Poderes, havendo, então, uma simples divisão funcional do trabalho.
A segunda parte cuida da resposta política à concentração do poder em um único detentor e descreve os mecanismos institucionalizados para o seu controle: a divisão do poder político entre diversos órgãos e a sua sujeição ao direito. Nessa parte do trabalho, destaca-se o ambiente político inglês que serviu de modelo e inspiração ao desenvolvimento das teorias da separação dos poderes, com destaque para as ideias de Locke, Bolingbroke e Montesquieu, principais teóricos do modelo da tripartição dos poderes do Estado liberal. Segue uma descrição das características de cada um dos Poderes nesse período e fecha essa parte a análise da consagração e transformação do Judiciário, marcando o começo da superação do modelo liberal de divisão dos Poderes.
A terceira parte do trabalho aborda as transformações sociais ocorridas ao longo dos séculos XVIII e XIX e revela que elas vão impactando a separação dos Poderes. As mudanças sociais na passagem do Estado liberal ao Estado social vão interferindo na ordem política, e ensejando mudanças também na feição dos Poderes, no desenvolvimento da jurisdição constitucional e na instituição do Tribunal Constitucional como um Poder autônomo.
Na quarta parte, encontra-se delineada uma divisão dos poderes tipo para o Estado social, fundamentada, especialmente, nos ensinamentos de Karl Loewenstein, Giovanni Bognetti e José Zafra Valverde, formulando-se uma divisão a partir da concepção de determinação política, execução da determinação política e controle da determinação política.
O autor
Sumário
1 • InTRODUÇÃO
2 • DO EXERCÍCIO DIRETO DO PODER POLÍTICO À CONCENTRAÇÃO DO PODER NO ESTADO
2.1 O PODER POLÍTICO
2.2 A DIVISIBILIDADE DO EXERCÍCIO DO PODER POLÍTICO
2.2.1 Dois modos de dividir o exercício do poder político
2.2.1.1 A divisão vertical do exercício do poder político
2.2.1.2 A divisão horizontal do exercício do poder político
2.3 A DIVISÃO FUNCIONAL DO TRABALHO NA ANTIGUIDADE
2.4 A FRAGMENTAÇÃO POLÍTICA DA SOCIEDADE MEDIEVAL
2.5 A DELIMITAÇÃO DO ESPAÇO PÚBLICO E A CONCENTRAÇÃO DO PODER POLÍTICO
2.6 A DOUTRINA DA SOBERANIA DO ESTADO
2.7 O ABSOLUTISMO MONÁRQUICO
2.8 A DESCOBERTA DA TÉCNICA DA REPRESENTAÇÃO POLÍTICA
3 • A DIVISÃO DOS PODERES NO ESTADO LIBERAL
3.1 A SUPREMACIA DO DIREITO E A DIVISÃO DO PODER
3.2 A DIVISÃO DO PODER
3.2.1 A bipartição do poder. A segregação da função legislativa e a supremacia do Parlamento
3.2.2 O postulado do equilíbrio dos Poderes
3.3 A TRIPARTIÇÃO DO PODER. O AMBIENTE POLÍTICO INGLÊS
3.4 A TRIPARTIÇÃO E O EQUILÍBRIO DOS PODERES
3.5 O EQUILÍBRIO DAS FORÇAS SOCIAIS
3.6 A DIVISÃO DOS PODERES TIPO DO ESTADO LIBERAL
3.6.1 As funções fundamentais
3.6.2 O exercício das funções fundamentais
3.6.3 Composição e atribuição dos Poderes
3.6.3.1 A função legislativa
3.6.3.2 A função executiva
3.6.3.3 A função jurisdicional
3.7 A CONSAGRAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO E O INÍCIO DA SUPERAÇÃO DO MODELO LIBERAL
4 • DO ESTADO LIBERAL AO ESTADO SOCIAL
4.1 AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS E A AMPLIAÇÃO DA DIVISÃO DO PODER POLÍTICO
4.2 A CHEFIA DE ESTADO
4.3 GOVERNO E ADMINISTRAÇÃO
4.3.1 O Poder Governamental
4.4 OS PODERES ADMINISTRATIVO E JUDICIÁRIO
4.5 A JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL
4.6 O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
5 • OS PODERES E A DIVISÃO DOS PODERES NO ESTADO SOCIAL
5.1 OS PODERES DO ESTADO SOCIAL
5.2 UMA NOVA DIVISÃO TRIPARTITE DAS FUNÇÕES ESTATAIS: DETERMINAÇÃO POLÍTICA, EXECUÇÃO E CONTROLE
5.3 OS ÓRGÃOS DE DETERMINAÇÃO POLÍTICA
5.3.1 O Governo ou Poder Governamental ou de Direção
5.3.2 O Parlamento ou Poder Deliberativo
5.4 OS ÓRGÃOS DE EXECUÇÃO DA DETERMINAÇÃO POLÍTICA
5.4.1 A Administração Pública ou Poder Administrativo
5.4.2 O Poder Judiciário
5.5 OS ÓRGÃOS DE CONTROLE DA DETERMINAÇÃO POLÍTICA 1
5.5.1 O Parlamento
5.5.2 O Tribunal Constitucional
6 • CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
1
INTRODUÇÃO
A concepção de Estado no qual as funções políticas se reduzam à legislação, à execução e à jurisdição está, há bom tempo, superada, ademais de jamais ter sido unanimemente aceita.
Embora persista com grande significado, a divisão tripartite dos poderes, celebrizada por Montesquieu, entre Legislativo, Executivo e Judiciário, não é possível afirmar que essa divisão seja a mais adequada e realizável na prática em qualquer lugar e a qualquer tempo, porque o evoluir histórico provoca mudanças sociais que vão exigindo um constante rearranjo da organização estatal. Por isso, a organização dos Poderes de um dado momento pode revelar-se inadequada logo a seguir.
Com efeito, a passagem dos séculos XVIII para o XIX, e do século XIX para o século XX, trouxe importantes mudanças sociais que demandaram dos Estados mudanças no modo de conceber a divisão do poder político. A Revolução Industrial, o desenvolvimento tecnológico e o crescimento econômico foram alguns dos fatores que impactaram a atuação do Estado e inviabilizaram a existência de órgãos que concentrassem, com eficiência, diversas funções estatais.
A conformação à nova realidade social veio por diferentes modos, mas sempre com a ampliação da divisão do poder político. De uma parte, Estados unitários optaram por instituir uma divisão vertical do poder, tal como Itália, Espanha e Bélgica. Em outros, a exemplo dos Estados Unidos da América, o processo de formação histórica – em que Estados independentes, sem abrir mão de amplos âmbitos de competência, se uniram para formar uma federação – favoreceu um aprofundamento da divisão vertical já existente.
Outra via eleita foi ampliação da divisão horizontal do poder, valendo destacar o exemplo da Inglaterra, no qual, com a retirada da função governamental do rei, o Estado passou a ter dois novos órgãos: a Chefia de Estado e o Governo.
Colhendo esses exemplos históricos, este estudo tem por objetivo demonstrar a evolução do processo de divisão do exercício do poder político e as transformações que se verificaram no seio de cada um dos órgãos políticos (Poderes) encarregados do exercício do poder no curso da história.
O tema em pauta mostra-se relevante e bastante atual, como denota a flagrante falta de uniformidade no modo como os Estados repartem o exercício das funções políticas e as competências atribuídas a cada um dos Poderes instituídos, revelando a diferente face dos Poderes em cada Estado.
É importante advertir, desde logo, que o simples fato de as constituições tratarem da organização dos Poderes com referência aos três Poderes clássicos – Legislativo, Executivo e Judiciário – pouco esclarece sobre a verdadeira organização política desses Estados, sendo necessário um olhar mais aprofundado para identificar, dentro desse sistema organizacional, os diversos órgãos permanentes (Poderes) encarregados do exercício do poder político. Em outros termos, não é a mera nomenclatura utilizada que define o modelo de separação dos Poderes.
A realidade mostra-nos, e é isso que o texto procura apanhar, que há outros Poderes, assim considerados os órgãos que,