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Isto não é um documentário
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E-book145 páginas1 hora

Isto não é um documentário

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Sobre este e-book

Isto não é um documentário: entre a imagem e a palavra, entre o verso e a prosa, entre o poema e o ensaio, a escrita de Marcos Siscar visita várias línguas e abre diálogo com diversos artistas – de Ana Cristina Cesar e Ferreira Gullar a Jean-Luc Godard e João Moreira Salles – trazendo à tona questionamentos sobre cinema e poesia e sugerindo interseções entre as duas formas de arte. De acordo com Joana Matos Frias, podemos entrever, nos versos preciosos do poeta, "datas, filmes, casas; vidas, livros, lastros: língua e deslíngua, verso e inverso" num espelhamento fascinante do que há ao mesmo tempo de mais concreto e abstrato ao nosso redor. Com talento e criatividade, Siscar leva cada vez mais longe os limites da poesia, explorando todos os campos da linguagem para criar uma obra única e original.
IdiomaPortuguês
Editora7Letras
Data de lançamento31 de ago. de 2020
ISBN9786586043709
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    Isto não é um documentário - Marcos Siscar

    Sumário

    jardim das simplicidades

    Caprichos

    Força de ofício

    Isto não é um documentário

    Jardim das simplicidades

    O rompimento

    O golpe e o espelho

    Hora de poesia

    Cuspindo contra o vento

    De novo dia

    A figura e o desastre

    Rendimento

    As mãos

    Advertência para leitores diletantes

    Árvores não trocam de casca

    Sedimentos

    [uma árvore sem raízes aparentes]

    Do talo e da lata

    Escrito na lata

    Dificuldade de fundo

    O poeta e a larva

    Outro poema sujo

    Tudo foi dito

    Preço médio

    Viajantes

    Brecha

    cinema

    [Filme é o que está diante dos olhos]

    Gênesis

    Paisagem com estrada

    O menino na ponta do trampolim

    Jardim de vestígios

    Congelar a imagem

    A câmera clara

    O silêncio e o fundo

    Nossos filmes geralmente acabam assim

    Às vezes como agora

    Baseado em fatos reais

    De novo luz

    Sujeito à deriva

    O ator de si mesmo

    A personagem secundária

    Segurando a fotografia

    Nada além de nós

    O retângulo eviscerado

    Uma torneira vaza

    Quando descemos a rua de bicicleta

    Extremo ocidente

    A menina e a morte

    O choro da filha

    Quando a cabeça submerge

    O mar que se vai com o sol

    Neva ainda

    Road movie

    Retrato de artista

    Império da visão

    Da obscenidade da morte

    Diante dos olhos

    Dois filmes ao mesmo tempo

    O cinema do teatro

    A linguagem é o filme da coisa

    Como entre todos

    Um boi se aproxima

    Ao sair encoste o portão

    Nós nos entretemos

    Cinema do infinito

    Making of

    Créditos

    endereços

    Às voltas da casa / Essai sur le retour

    Estamos na casa

    Moramos juntos

    Um modo de estar

    Onde não me encontro

    Reinventar a situação

    Endereços da casa

    Construção e reforma

    Meu animal e minha planta

    A casa é sua

    traduções impenitentes

    A impostura

    Se me lesse amanhã

    Perda de original

    A corriola rude

    Poema de sete espelhos

    Cartilha da luta

    Como saindo de mim

    Pietà

    Texto de orelha

    Sobre o autor

    Percebo ainda que sou eu que sou vivida, sou eu

    que sou grafada, sou eu também que escuto

    em surdina o velho discurso que me grafa.

    ana cristina cesar

    jardim das simplicidades

    Penso que a distância não aconteceu por acaso. [...]

    É que ele não era apenas meu personagem,

    eu não era apenas um documentarista.

    Santiago, de João Moreira Salles

    Caprichos

    toda vez que me agacho vejo o carrapicho

    é simples não posso dizer mais do que isso

    perto do chão não há muito a se ver senão

    o mundo encapsulado desse trigo ruim

    cada vez que flexiono os joelhos e fecho

    os olhos o que acho é apenas carrapicho

    outros quando vão ao sol veem figuras

    enredos molduras de carne ou de osso

    eu só encontro terra e carrapicho

    e às vezes quando me levanto sinto

    vertigem nos olhos como se da altura

    de um homem enxergar fosse um capricho

    Força de ofício

    eu bem que queria ser mais simples

    e usar apenas as mãos

    diria olhe para minhas mãos

    são leves

    como quem diz não verá o que mais importa

    eu bem que queria ser mais fino

    e cultivar um olhar exótico

    deixar ressoarem palavras

    fluctissonantes

    como quem diz não me procure já fui embora

    eu bem que queria ser mais neutro

    e arriscar uma solução sagaz

    manter no espaço um vazio

    acrobata

    como quem diz agora o problema é todo seu

    mas estamos aqui e nunca é tão simples

    só seus olhos têm força de ofício

    chove em nossas palavras

    os fatos me inundam

    e há quem diga que não é nada disso

    Isto não é um documentário

    o modo como vivi me confundiu com o que acontecia

    viver era a transformação implacável de eu em nós

    desde o início essa distância dentro de nós

    um por não saber em que resultava

    outro por não entender o que sucedia

    um não era apenas personagem tampouco o outro documentarista

    a memória fiel dos começos e o sabido atrativo dos fins

    não firmaram quem era o mordomo de quem

    de quem era a dívida ou a quem se servia

    no chiaroscuro dos pronomes, estampado no meio da tela

    vê-se agora um corte uma cicatriz

    ou inversamente

    um rasgo para a plateia

    Jardim das simplicidades

    passo perplexo entre as línguas que ouço

    nem todas estrangeiras mas em excesso

    me atravessam de um lado a outro

    como antigos espinhos expulsos pela pele

    às vezes uma delas me rasga até a boca

    e é o que se chama de simplicidade

    mesmo as palavras encontradas na rua

    dessas caídas por descuido manchadas

    de tanta saliva quase impróprias para o uso

    esfrego-as contra o rosto e sinto na língua

    a matéria podre e sebosa com um fundo

    adstringente que ajuda a abrir os poros

    tento fazê-las capazes do que delas espero

    O rompimento

    muitos olhos vão ficar sepultados

    debaixo dessa lama há lama demais

    há lama por toda parte perdi amigos

    perdi parentes a casa perdi a fome

    foi tudo muito rápido há corpos

    duros aterrados uma cena de pompeia

    petrificados pela lama com a boca

    cheia de lama com as roupas cor

    de lama o gesto de quem ainda

    esperava que acabasse mas a lama

    veio mais e cobriu tudo não há nada

    a fazer há lama por toda parte

    não há mais tijolos só há corpos

    pegos em antigos hábitos de vida

    tijolos decompostos restos de linguagem

    e por toda parte o odor azedo da opinião

    janeiro de 2019

    O golpe e o espelho

    Não houve surpresa. Poetas e contrabandistas sabem bem o quanto custam artifícios de seda. Flutuamos. Mas a história da gravidade é feita de golpes. O mais duro é o que rompe. O corpo se abate rígido num baque. E na rua nasce o cadáver. As palavras secas dos dessemelhantes. Jaz ruidoso nosso pacto de silêncio. E entre nós se insinua uma triste afinidade. Resta apenas acusar o golpe. Denunciá-lo em nós. Sem crime nem perdão. Mas diante

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