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Terapia Peripatética de Grupo Fenomenologia e Psicopatologia
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E-book353 páginas4 horas

Terapia Peripatética de Grupo Fenomenologia e Psicopatologia

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Sobre este e-book

Se em seu primeiro livro, Demétrius França discute a terapia peripatética, também conhecida como acompanhamento terapêutico, com pinceladas dos dilemas de um jovem psicólogo, neste segundo livro apresenta a evolução do trabalho, incluindo uma reflexão do autor sobre a definição, perspectivas e prática da terapia peripatética.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento4 de fev. de 2021
ISBN9786558200208
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    Pré-visualização do livro

    Terapia Peripatética de Grupo Fenomenologia e Psicopatologia - Demétrius França

    COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO MULTIDISCIPLINARIDADES EM SAÚDE E HUMANIDADES

    À memória dos amigos Norberto e Ganges

    Agradecimentos

    Aos professores doutores Andrés e Jean-Marie.

    À equipe de terapeutas que apoiaram a atividade.

    Aos parceiros do ISM, diretor Ulisses, Melissa, Edimar e Nelson.

    A Wilson Theodoro e Wilson Theodoro.

    Aos meus irmãos.

    A Maria e Maria.

    As pessoas não morrem.

    Ficam encantadas.

    (Guimarães Rosa)

    APRESENTAÇÃO

    Este livro, inicialmente, demanda uma contextualização prévia, por mínima que seja, quanto à história da saúde mental no mundo, no Brasil, e, especificamente, em sua capital Brasília, onde a intervenção terapêutica que aqui descrevo foi realizada. Essa contextualização mostra-se necessária porque a percepção do que é saúde e doença no campo da saúde mental não é uniforme ao redor do mundo, tendo correlação direta com o contexto ético, cultural e econômico dos diferentes povos e países. E, claro, essas especificidades também se encontram sujeitas às variações da evolução histórica ao longo do tempo.

    Proposto inicialmente por Bleuler em 1908, o diagnóstico de esquizofrenia em sua origem referia-se a distintas causalidades e possíveis evoluções. Nessa perspectiva, o delírio era a manifestação do prejuízo afetivo e associativo por parte da pessoa adoecida. Esse diagnóstico representou um importante avanço diante da dita demência precoce de Kraepelin, que não se distinguia da demência convencional quanto à causalidade e ao tratamento. O diagnóstico de esquizofrenia representa, portanto, um esforço ativo de compreensão e cuidado com as pessoas em sofrimento psíquico.

    Mesmo que pouco conhecido atualmente, Eugène Minkowski apresenta-se como pioneiro e referência histórica dentro da saúde mental. Enquanto ex-assistente de Bleuler, Minkowski teve importante papel na popularização do diagnóstico da esquizofrenia na França. Talvez a maior marca de Minkowski seja a proposta de mudança de postura do psiquiatra, que sai do lugar de meramente perguntar e listar sintomas para buscar compreender a experiência vivida do paciente, utilizando como referencial a própria consciência. Não por acaso, Lacan escreve sobre a importância do trabalho de Minkowski.

    Felizmente (ou não), o campo da saúde mental não evoluiu de forma crescente e linear, tampouco uniforme. Por mais que o leitor compreenda, hoje, a importância do bom cuidado em saúde mental, vários são os exemplos das consequências dos movimentos éticos, culturais e econômicos na oferta de serviços em saúde mental. No século XX, houve a ascensão do movimento higienista (social hygiene movement), na Europa e nas Américas, que passou a definir políticas públicas. Dessa forma, a maioria dos serviços de saúde mental se desenvolveu a partir de um modelo asilar e higienista. Tal ideologia motivou o pressuposto de que as pessoas adoecidas, menos capazes e/ou menos adaptadas, deveriam ser isoladas, sob justificativas eugênicas formais ou informais, do restante da sociedade.

    Esse pensamento apresentou repercussão no mundo inteiro. Como exemplo, podemos citar o caso francês, que mesmo proferindo formalmente o discurso de liberdade, igualdade e fraternidade, permitiu que asilos psiquiátricos franceses¹ na Argélia funcionassem, em 1953, como verdadeiros depósitos humanos, onde as alas psiquiátricas eram divididas entre os diferentes grupos étnicos. Pode não ser razoável, mas os franceses brancos dispunham de uma ala exclusiva, distinta da ala que abrigava árabes e berberes – aparentemente a cidadania francesa era mera formalidade para essas pessoas tratadas como selvagens na perspectiva psiquiátrica da época.

    No Brasil, a mesma política de isolamento higienista se manifestou. O exemplo mais extremo se encontra em Barbacena, Minas Gerais. O maior hospital nessa cidade dispunha de uma maioria negra, refletindo os ideais eugenistas do higienismo. Curiosamente, 70% dos pacientes internados não dispunham de diagnóstico psiquiátrico. Desempregados, homossexuais, epilépticos, crianças que sofriam de enurese e até mães solteiras foram encaminhados para esse asilo construído para os desajustados. Sem a possibilidade de sair, estimativas acusam a morte de pelo menos 60 mil pessoas nessa instituição fúnebre, que, não obstante as condições já degradáveis, também vendia cadáveres ilegalmente para uso em escolas de medicina, por exemplo.

    Essa política de morte foi combatida por esforços individuais de diversos profissionais, tomando a forma e o nome coletivo de antipsiquiatria, termo cunhado por David Cooper. Esse movimento combateu o uso indiscriminado da eletroconvulsoterapia e da lobotomia, exigiu tratamento humanizado e propôs alternativas terapêuticas, em liberdade, para as pessoas em sofrimento psíquico.

    Entre os pioneiros da antipsiquiatria, podemos citar Franz Fanon, que eliminou as distinções raciais do hospital argelino em que trabalhou como diretor em 1953. Além disso, agrupou os moradores dos manicômios de acordo com o diagnóstico e a gravidade do adoecimento e introduziu atividades terapêuticas, como partidas de futebol fora dos limites hospitalares. No caso de Fanon, vale acrescentar que ele não se limitou à saúde mental e lutou também contra o imperialismo francês e segue como referência do pensamento decolonial contemporâneo.

    No Brasil, a Reforma Psiquiátrica foi inspirada no trabalho de Franco Basaglia, convergindo para uma política pública de fechamento de manicômios e abertura de hospitais-dias. Entretanto, a política pública, aprovada diante da pressão dos defensores de direitos humanos e dos escândalos de tortura e maus-tratos, não modificou necessariamente os preconceitos e a cultura de políticos e profissionais de saúde de um país historicamente racista e excludente: no caso brasileiro, ocorreu o fechamento gradual dos manicômios, mas não uma mudança estrutural definitiva quanto à importância da saúde mental, que segue subfinanciada no Brasil. Por parte dos profissionais de saúde, muitos seguem atuando guiados por preconceitos de gênero e raça, entre outros elementos higienistas que provocam ou justificam a indiferença e/ou rejeição aos pacientes fragilizados e que não podem se defender ou demandar dignidade.

    É nesse contexto que este presente trabalho foi desenvolvido. O manicômio chamado Clínica Planalto, localizado no entorno do Distrito Federal, foi forçado a encerrar suas atividades somente em ٢٠٠٣, devido a acusações de crimes contra a humanidade. Além dos maus-tratos, também ocorreu o desaparecimento de algumas das pessoas aprisionadas nesse lugar, que lá estiveram sob o pretexto de serem tratadas e cuidadas. Esse caso específico me é caro pois, à época, era estudante de Psicologia na Universidade de Brasília (UnB) e recordo não apenas das celebrações pelo fechamento do manicômio, mas também das implicações que demandaram a organização de uma estrutura de acolhimento e encaminhamento dessas pessoas libertas, que seguiam necessitando de cuidados após o fechamento da instituição.

    Essas memórias foram reavivadas em 2014, 11 anos mais tarde, durante o meu doutorado, quando reencontrei alguns dos sobreviventes da Clínica Planalto no Instituto de Saúde Mental (ISM), em Brasília – instituição onde desejava desenvolver minha pesquisa. Além disso, o perfil dos moradores do ISM mudou ao longo dos anos, acomodando também pessoas oriundas do sistema prisional. Apesar de a legislação brasileira exigir a oferta de residências terapêuticas para as pessoas oriundas dos manicômios, os diferentes governadores do Distrito Federal completaram 20 anos em 2020 sem cumprir com essa normativa. Essa condição precária apenas reforçou a obrigação ética de incluí-los no meu projeto terapêutico.

    Esse breve resumo ilustra como nossas experiências profissionais ocorrem de forma integrada a nossas histórias de vida. Talvez um dos diferenciais deste livro, que nasceu a partir da minha tese de doutoramento defendida em 2016 no Programa de Pós-Graduação em Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP), é a busca pela demonstração do amadurecimento que ocorreu não apenas por meio da reflexão e apropriação da obra de Minkowski, mas também do exercício ativo de aplicação desses princípios no trabalho terapêutico, desenvolvido com as pessoas que mais necessitavam de um profissional dedicado a alcançá-los.

    Esse processo de reflexão e amadurecimento segue um ritmo vivido distinto do prazo cronológico de quatro anos que é necessário para iniciar e concluir um doutorado. O livro trata-se, portanto, da elaboração de diversos questionamentos iniciados no doutorado e/ou fora dele, que organizei mais tarde para apresentar ao leitor. Ainda que números não reproduzam a realidade, o livro conta com aproximadamente 10 mil palavras a mais que a tese, tornando-se uma obra bastante distinta quando comparada ao projeto que a originou.

    Neste segundo livro de minha autoria dedicado inteiramente à terapia peripatética de grupo, será possível identificar e compreender não apenas a maturação de um trabalho para o outro, mas também o desenvolvimento de um manejo profissional diferenciado e o esforço pela compreensão dos pacientes. A própria narrativa do processo clínico descrito de forma integral, dos semelhante a uma crônica, torna a obra uma experiência diferente da maior parte das publicações clínicas, que geralmente omitem ou resumem as partes do processo que possam ser consideradas menos significativas ou feias, mas que em última instância são essenciais para transmitir a evolução gradual e orgânica do processo – um processo no qual nem o terapeuta, nem os participantes estão prontos para os grandes insights ou para as porradas clínicas.

    Para os interessados em fenomenologia, outro elemento que torna a obra atraente, é a descrição e apropriação da obra de Eugène e Françoise Minkowski. Além de minha apropriação ocorrer adaptada à terapia peripatética de grupo, creio que se trata também de uma introdução à obra dos Minkowski (Eugéne e Françoise) em língua portuguesa. A psicopatologia viva para pessoas vivas desenvolvida por Eugène Minkowski mostra-se cada vez mais atual em um contexto no qual nossos profissionais dedicam cada vez menos tempo à compreensão das pessoas em sofrimento, sob a justificativa do uso de uma técnica rígida e de uma burocracia castradora que preconizam como deve ocorrer um tratamento.

    Esta pesquisa foi realizada em um momento de luta da saúde mental pelo avanço na qualidade dos serviços e, claro, pelo incremento da rede de hospitais-dias. Em 2020, de um lado, deparamo-nos novamente com restrições orçamentarias que, na prática, inviabilizaram a oferta de serviços em saúde mental. Por outro lado, o Governo Federal (e também as esferas estaduais e municipais) financia, novamente, entidades asilares privadas, em sua maioria religiosas. Mesmo que as chamadas comunidades terapêuticas no Brasil tenham inúmeros registros comprovados de trabalho forçado, tortura e outras modalidades de desrespeitos aos direitos humanos, elas se fortalecem diante da aliança política do governo com grupos políticos religiosos – que também pressionam a ideia eugênica de uma suposta reversão de homossexualidade.

    Diante dessas oscilações, entre avanços e retrocessos quanto ao falso dilema sobre oferecer o cuidado, ou a exclusão dos desajustados, autores como Minkowski e Fanon seguem atuais e necessários. Mesmo que produto de um contexto específico (Brasília – Brasil – Planeta Terra), no século XXI, este livro propõe um debate atualizado sobre a obra de Eugène e Françoise Minkowski e sua aplicação em uma modalidade particular de terapia.

    Assim como a terapia peripatética funciona fora dos limites convencionais das quatro paredes e muros dos consultórios e instituições, no esforço terapêutico por meio do estímulo à criação de novos sentidos e ressignificação de velhos afetos. É meu desejo que este livro facilite ou provoque uma peripateia em que o leitor dialogue com o autor sobre as possibilidades dessa clínica ambulante.

    O autor

    PREFÁCIO

    Este livro esforça-se para aplicar os insights fenomenológicos de um dos maiores psiquiatras do século XX – Eugène Minkowski –  em uma nova forma de terapia de grupo – a terapia peripatética de grupo.

    Para entender o projeto, precisamos saber o que tais insights fenomenológicos são, o que era tão excepcional sobre Minkowski, e o que se entende por terapia de grupo peripatética.

    1. Insight fenomenológico

    Nos anos 1920, quatro psiquiatras reuniram-se em uma conferência e formularam um método compartilhado para investigar desordens psiquiátricas. Seus nomes eram Eugène Minkowski (francês naturalizado), Ludwig Binswanger (suíço), e Victor von Gebsattel e Erwin Straus (alemães). Seus projetos eram contra os determinismos psicológicos e biológicos, além de serem, essencialmente, uma primeira tentativa da psicopatologia filosófica – aplicando os pensamentos filosóficos de vários filósofos, não unicamente a escola fenomenológica – ver a seguir. Minkowski foi principalmente influenciado por Bergson, Binswanger oscilou entre Husserl e Heidegger, Von Gebsattel deve ao Scheler, e Straus ao Aristotle.

    A escola de filosofia fenomenológica foi um produto de três filósofos na virada do século XX – Edmund Husserl, Max Scheler and Martin Heidegger (todos alemães). Suas visões-chaves sobre a natureza dos seres humanos e do mundo são tão díspares que é difícil acreditar que eles integraram a mesma escola filosófica. Heidegger inverteu a filosofia de Husserl – que era uma forma extrema de Cartesianismo – e proclamou que o homem primariamente habitou uma forma de ser pré-reflexiva, preconsciente – pouco separada da forma animal. Scheler criticou duramente ambos colegas e opinou que o homem era tanto animal quanto espírito, e não era nem um solipsismo nem um animal.

    O insight fenomenológico que França escreve não é, portanto, derivado de nenhum desses filósofos mencionados, nem de outro filósofo do século XX considerado como sendo fenomenológico em seus escritos – e.g. Maurice Merleau-Ponty, Jean-Paul Sartre, e numerosos outros. É antes um termo demasiado utilizado para o que é nada menos que a prática de intuição da parte do psicólogo, do psiquiatra ou do terapeuta –  não para ser subestimado, nem se vincular a uma escola filosófica que estava em desacordo com ela mesma e cujos supostos pais regularmente negavam que eram fenomenologistas, e não se relaciona com um grupo de psiquiatras cujo mentores filosóficos eram, às vezes, não fenomenologistas.

    2. O status excepcional de Minkowski

    Minkowski foi um emigrado polonês que se instalou na França após a Primeira Guerra Mundial e escreveu vários trabalhos e livros durante os anos 1920 e 1950. Seu principal foco era na esquizofrenia e depressão, seu mentor era Bergson e não um dos três supostos pais da escola filosófica fenomenológica – Husserl, Scheler, Heidegger. Seu método visava identificar flagrantes anomalias, no que chamo de inventório filosófico – e.g. tempo, espaço, personalidade, objetividade, subjetividade – todos esses fragmentos que determinam o que experienciamos e como experienciamos. Para Minkowski, o(a) paciente psiquiátrico(a) era aquele(a) cujo self e mundo estavam distorcidos vis-à-vis ao normal, porque seu espaço, tempo, personalidade, subjetividade e objetividade eram diferentes do dito saudável.

    Minkowski não apenas formulou a psicose em fragmentos até então inéditos, mas ele percebeu, como nenhum outro psiquiatra (nem filósofo) percebeu antes, que o esquizofrênico e o depressivo, de maneira diferente e inversa, eram exemplos vivos de falsas posições filosóficas sobre o ser humano normal: a esquizofrenia é um idealismo vivo, e a depressão, um materialismo in vivo

    3. Terapia peripatética de grupo

    Se alguém deseja conhecer e tratar distúrbios psiquiátricos, quanto mais perto possível de suas vidas essenciais, melhor. Settings artificiais, como se sentar em quarto de hospital com uma equipe de saúde mental, devem ser considerado como o mais distante possível do dia a dia. Acompanhar o paciente às refeições, ao teatro, a exposições de arte e afins é muito melhor. A terapia é fenomenologicamente derivada, no sentido de que é baseada na intuição e no cotidiano. A escola de filosofia fenomenológica e a escola de psiquiatria  fenomenológica, ambas as quais eram, de qualquer forma, heterogêneas, estão somente tangencialmente envolvidas no assunto discutido, cuja validade deve ser avaliada nos parâmetros científicos usuais de se algo funciona ou não.

    4. Em conclusão

    Qual é a melhor abordagem para a questão da saúde mental é um tópico que tem desafiado doutores e leigos interessados desde os gregos. Os mais efetivos têm sido os serendipíticos – antidepressivos, antipsicóticos, terapia eletroconvulsiva. Mas isso sempre me pareceu insatisfatório. O que Demétrius França faz neste livro é unir a melhor consideração teórica sobre distúrbios psiquiátricos – baseado em Minkowski – e ver se tal pode sustentar um tipo particular de terapia.

    Dr. J. Cutting

    Psiquiatra britânico, foi professor honorário na Kings College Hospital – Londres e Institute of Psychiatry – Londres, e autor de livros sobre psiquiatria.

    Maio de ٢٠٢٠

    Sumário

    Introdução 25

    Terapia peripatética: história, conceitos e princípios 35

    Definição 35

    Contrato terapêutico 35

    Teoria e técnica psicológica 36

    Setting clínico ambulante 37

    História 41

    Terapia peripatética de grupo 46

    O ensaio (2005) 48

    A primeira dissertação (2004) 50

    A segunda dissertação (2009) 55

    A experiência argentina 60

    Conceito de exclusão para a terapia peripatética 64

    Therapeutic Accompaniment 65

    Fenomenologia 73

    Psicopatologia fenômeno-estrutural 75

    Primeiro momento 77

    Segundo momento 79

    Um caso de depressão esquizofrênica 82

    Transferência (bilateral) 90

    Método 99

    Local e participantes 99

    O ISM e a definição de residência terapêutica 99

    Moradores do ISM 102

    A terapia peripatética na prática 104

    Psicopatologia fenômeno-estrutural na terapia peripatética de grupo 105

    Resultados 111

    A residência 113

    A segunda equipe conhece a residência 114

    Trilha ecológica 115

    Música e dança 119

    Trilha ecológica 121

    Reunião de programação 124

    Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) 129

    Piquenique na piscina 137

    Piscina 140

    Biscoitos de aveia 141

    Bolo 143

    Jogos 145

    24 e 26 de setembro 148

    Piscina do ISM 148

    Parque da Cidade 150

    Parque Onoyama 153

    Bingo 156

    Planejamento da programação 159

    Museu da República 163

    Calendário 168

    Teatro na Polícia Rodoviária Federal 169

    Uma queda 171

    Um resultado inesperado 172

    Piscina e piquenique 174

    Parque da Água mineral 176

    Escolha das fotos preferidas 177

    Mapa das histórias 178

    Cancelado 179

    Estádio Mané Garrincha 179

    Despedida 180

    Ganges e a Constituição Epileptoide 183

    1o Round 183

    2o Round 190

    3o Round 193

    4o Round: O Desafio Final 195

    Terapia Peripatética de Grupo: desdobramentos 203

    Baixa Retenção de Temporalidade 205

    Gênero 208

    Evolução da terapia peripatética de grupo 209

    Espaço-temporalidade 213

    Encerramento 215

    Elementos de uma psicopatologia colonial 217

    Última Metáfora 225

    Conclusão 233

    REFERÊNCIAS 237

    Anexos 245

    Anexo A – Nomes Fictícios dos Moradores 245

    Anexo B – No

    M

    es fictícios da Equipe 246

    ÍNDICE REMISSIVO 247

    ÍNDICE REMISSIVO

    Introdução

    Pode-se comprar uma caixa de pêssegos, mas como faz para comprar um pomar de pêssegos em flor?

    (Sonhos, Akira Kurosawa, 1990)

    Foi em 2004, durante a supervisão da minha primeira paciente, no meu primeiro estágio na psicologia clínica, que vivi uma situação muito desagradável, mas que fez parte central na minha escolha pela fenomenologia. Ainda empolgado, pois era a segunda sessão deste caso inaugural, e um pouco ingênuo sobre os professores de forma geral, comentei com um sorriso bem humorado, durante minha supervisão, a estranha situação na qual minha paciente exigiu sentar-se na minha cadeira, e não na poltrona mais confortável que tinha sido disponibilizada para ela. Pego de surpresa, e um pouco ansioso para iniciar a sessão de terapia, eu concordei e não questionei a situação.

    Fui imediatamente censurado: minha supervisora recriminou-me quanto ao que eu considerava importante interpretar acerca do caso, e, apresentando sua opinião como verdade absoluta, analisou a insistência da paciente em sentar-se no meu lugar. Fui censurado porque não percebi o teste a que fora submetido. Minha paciente quis ocupar o lugar do terapeuta e eu cedi tolamente. O manejo proposto por minha supervisora, obviamente, era o de que eu deveria enquadrá-la no seu lugar de paciente².

    Somente assim ela poderia iniciar seu processo terapêutico, conduzido por mim, o terapeuta. Senti-me culpado com a censura, afinal, reprovara no primeiro teste a que fora submetido como clínico.

    Ingênuo e inexperiente, acolhi a fala da minha supervisora e entrei na terceira sessão pronto para mostrar quem é que mandava³. Pelo menos era assim que me sentia orientado a agir. Tão logo a paciente entrou e tentou sentar-se na minha cadeira, disse a ela que aquele era o meu lugar e que ela deveria sentar-se na poltrona. Constrangida, a paciente insistiu que não sentaria na poltrona.

    Questionei e ela respondeu que a poltrona era muito alta e que se incomodava porque seus pés não tocavam o chão. Por um lado, compreendi que minha supervisora se antecipou e orientou-me inadequadamente quanto à paciente baixinha. No entanto, precisei buscar uma cadeira mais baixa para não contrariar minha supervisora. Afinal, além de censurado, senti-me constrangido ao lado dos outros estagiários e não queria correr o risco de passar novamente por isso.

    Ao explicar a situação após o esclarecimento da paciente, a supervisora permaneceu impassível e não teceu maiores comentários. Apenas reforçou o cuidado que eu deveria ter para permanecer no lugar de terapeuta. Com o avanço do estágio entendi que a supervisora provavelmente entendia que a regra também se aplicava a ela. Então, ela não poderia nem assumir um erro, nem rever sua própria supervisão.

    Retomando a questão da minha primeira paciente, pode-se dizer que nunca se firmou uma relação de confiança. Diante de minha postura fechada, replicando o papel de terapeuta plenipotenciário que não cedia aos questionamentos da paciente, creio que a transferência nunca se estabeleceu. Ela solicitou o encerramento da terapia antes de completar dois meses de atendimento. Da minha parte, ponderei se realmente tinha talento para trabalhar como clínico e não dei continuidade ao estágio na clínica-escola da minha universidade.

    Eu somente compreendi, ou elaborei melhor, esta situação com o tempo – mais precisamente um ano depois, quando a apresentei à professora mestra Gabriela Celidônio (2004). Eu cursei, no último semestre do curso de psicologia, a disciplina tópicos em psicoterapia, na qual tive uma introdução à daseinanálise⁴, uma abordagem terapêutica de viés fenomenológico. A professora mestra Celidônio (2004), ainda mestranda, ministrou a disciplina como prática de docência, obrigatória no mestrado da Universidade de Brasília (UnB), e utilizou a experiência da sala de aula para sua pesquisa de mestrado e descreveu o episódio da minha primeira experiência como clínico, bem como sua reflexão sobre a discussão que tivemos em sala de aula:

    Nesse sentido, refletimos como certos conceitos relacionados a ideias comuns ao repertório dos psicólogos podem atrapalhar a compreensão de questões fundamentais de um paciente. Isso porque são conceitos que fizeram sentido no contexto em que foram pensados, dentro de certas teorias, mas quando são tratados como óbvios, impedem a procura por outros significados (em geral isso acontece com os conceitos que já parecem muito bons). (Celidônio, 2004, p. 23)

    Esta abertura para conhecer e dialogar com o indivíduo em suas peculiaridades, bem como a forte crítica ao enquadramento teórico forçado dos pacientes que muitas abordagens psicoterapêuticas estimulam ou favorecem entre seus praticantes ecoaram profundamente em mim. Celidônio (2004) fez ainda outro comentário sobre a situação que demonstrou as implicações para o manejo clínico dessa abertura proporcionada pela fenomenologia durante a terapia:

    O que seria essa tal de manipulação do paciente, que muitas vezes é entendida como algo que caberia a nós,

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