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Quase nada sobre tudo
Quase nada sobre tudo
Quase nada sobre tudo
E-book84 páginas1 hora

Quase nada sobre tudo

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Sobre este e-book

Quase nada sobre tudo é um olharatento aos diferentes acontecimentos davida. O tudo e o nada se misturam nospassos, nos gestos, nos piscares de olhos,no tão natural e (in)aceitável que a vidapode oferecer. Tensões e intenções fazemos (des)conhecidos e (des)pretensiososcaminhos serem trilhados. Já se tem vida.Deve-se agora, então, vivê-la. Prever émuito pouco para quem quer viver.Indefinições inquietam. É desconfortantever que o comum é tão incomum. Omundo é muito. Tudo está por aí. Aqui háquase nada sobre tudo.
IdiomaPortuguês
EditoraLitteris
Data de lançamento17 de set. de 2019
ISBN9788537404706
Quase nada sobre tudo
Autor

Daniel Cotrim

Daniel Cotrim de Paiva nasceu em Niterói, cidade do Rio de Janeiro em 1992, é professor de Literatura, Língua Portuguesa e Redação. Ingressou à faculdade de Letras aos dezenove anos. Publicou três poemas no jornal O Globo, tendo o primeiro sido publicado aos dezesseis anos. Publicou, também, um conto por um concurso da Universidade Federal Fluminense, onde se graduou. Publicou na coletânea de poemas Trilha de Lótus e é autor do livro de poemas Tudo é (medo do) amor, lançado em 2015.

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    Quase nada sobre tudo - Daniel Cotrim

    ATRÁS DA PORTA

    Luis estava dormindo mal. Mexia-se na cama de um lado para o outro, suava, o sono profundo faltava-lhe. Mais uma vez três e meia da manhã. Mais uma vez a sede que dá de madrugada nos que são cansados pelo dia, mas ansiosos pelos dia e noite seguintes.

    O jovem Luis olhou para o teto do seu quarto, como quem quisesse encontrar a estrela mais distante no céu. Mexeu a cabeça de forma negativa. Levantou, um pouco hesitante, e decidiu ir à cozinha. É bem verdade que mosquitos também o atrapalhavam. E muito! Com a mão direita, espantava os insetos enquanto se apoiava com a esquerda à cama. Pisava o chão tentando achar seus chinelos. Logo os encontrou.

    A porta da geladeira parecia um portal. Refrescou-se ali mesmo, como se estivesse num paraíso. Água! Gelada e confortante. Gostosa! Calmante! Água.

    O plano era voltar a dormir. Poucas horas para o jovem acordar e seguir a rotina. Um barulho comum na porta da área chamou a atenção do Luis. Por quê? Não se sabe. Mas às vezes o comum chama atenção porque está prestes a se tornar diferente. Não custava nada verificar. Pôs-se, então, em frente à porta e chegou a levantar a mão direita para abri-la. Mas... o que há atrás da porta?

    O que há atrás da porta? Tudo, nada, nem mesmo o meio-termo. Atrás da porta tem uma montanha para se escalar, atrás da porta tem um buraco largo e profundo. Atrás da porta tem um monte de passarinhos tristes que cantam lindos assobios; tem a vegetação mais seca, mais dura, mais pedra. Não há rio, não há. Há mar, amar em movimento, há onda, há um deslize contínuo e áspero. Atrás da porta não existe voz. O silêncio é inquieto, um pouco gritante. O silêncio fala.

    O rapaz chega mais perto.

    O quê? O que há atrás da porta? Quedas de aviões em ruas e corações, destinos levados por barcos, vontades a jato, sonham que andam a pé e a cavalo, balançam, balançam... Atrás da porta tem lápis, caneta e papel. Nem sempre tinta, apontador e muita folha, mas tem. Atrás da porta tem sossego; tem desespero previamente pensado. A ansiedade atrás da porta é calmamente vivida.

    O que tem atrás da porta? Tem muito desejo, segredo, coisas a serem ditas. Atrás da porta faz um calor estranho, um pouco frio e às vezes a chuva é linda. Outras vezes, é ácida. Corrói como palavras cruéis ditas da boca para fora e coração adentro. Atrás da porta o amor é surpresa, a verdade surpreende e o dinheiro compra qualquer mentira que se quer ver ou escutar. Há homens-bomba, sem-teto, amantes, escravos, iniciantes, todos disfarçados de alguém. Há multidões atrás da porta, para um lado e para o outro, sem sentido e direção; há ninguém.

    Atrás da porta? Medo, amor, olhares, um céu nada azul, mas cinza. Respira-se cada vez menos, fala-se cada vez mais. Tudo é consumido, nada se esgota. Atrás da porta existem corajosos, bravos mentirosos e conquistadores caros de mentes. Belos índios mapuches e iroquais, guerreiros tupi, orgulhosos portugueses, charmosos franceses, inteligentes ingleses, lindos árabes, religiosos, malandros... um reino desunido – e em desunião (ou união forçada).

    Vai abrir a porta, Luis? Por que você está esperando além da porta? Abra a porta. Com medo do que existe atrás da porta? O medo é o maior estímulo para a descoberta do mundo exterior. O interior não se descobre, se sente, serve para que se sofra calado dentro dos conflitos mais intensos e extensos da mente.

    O que existe atrás da porta? Atrás da porta há clássicos, cânones, bibliotecas pretendidas pelos intelectuais e por pseudo-sábios e entendedores de tudo. Atrás da porta há a falta de espaço para o novo. O diferente sofre, trabalha para ser aceito. Mais uma notícia de anteontem nas promessas de futuro atrás da porta.

    De frente para a porta, mão quase à maçaneta.

    O quê? O que realmente há atrás da porta? Suspiros e saudades, falsas verdades da vida, choques e tensões das surreais realidades. O dinheiro é o pedido favorito dos cardápios. Não há peixes no mar.

    A mão já conquistou o território. Agora só é preciso forçar a maçaneta e puxar.

    Luis, vai abrir a porta? Abra de uma vez! Atrás da porta, qualquer coisa é tudo. Tudo é nada; quase nada diz muito. E o muito é qualquer coisa. Há quase nada sobre tudo. Vai abrir a porta, Luis? O que espera atrás da porta? O que te espera atrás da porta? O que se espera atrás da porta?

    ENCRUZILHADA

    José Mário. Esse é um nome comum. Talvez não seja tão comum quanto os outros nomes que passaram pelo caminho desse homem. Aliás, homem comum no Rio de janeiro: advogado, descendente de portugueses, branco, com barba feita, corpo regular. 47 anos, corpo de 35, homem bem cuidado. Seus bonitos cabelos lisos, mafiosamente penteados e grisalhos e seus olhos glaucos combinavam com seus bonitos ternos e chamavam atenção dos olhares femininos e masculinos. Olhares, porém, vazios.

    O ano era 2010 e José Mário trabalhava na cidade do Rio de Janeiro. Advogado experiente – 23 anos de formado –, laborava em um escritório no centro da cidade, na Rua São José. De segunda a sexta, tinha de atravessar a famosa Avenida Rio Branco, onde passam milhares de pessoas todos os dias. Pessoas e olhares. José Mário, homem comum, seguia ao trabalho e passava por Juliana, por Carol, por Daniele, por Eduardo, por Luiza, por Carlos, por José, por Jairo, por Maria, por Alessandro, por Cláudia e por muitas outras pessoas comuns. Os olhares eram trocados, é claro. Muitas vezes, os olhares duelavam por alguns segundos e milésimos. Minutos não eram passíveis de uso, pois a quantidade de informação visual e auditiva complicava a vida das pessoas. O sol carioca dava vida ao cinza e ao colorido

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