Quase nada sobre tudo
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Sobre este e-book
Daniel Cotrim
Daniel Cotrim de Paiva nasceu em Niterói, cidade do Rio de Janeiro em 1992, é professor de Literatura, Língua Portuguesa e Redação. Ingressou à faculdade de Letras aos dezenove anos. Publicou três poemas no jornal O Globo, tendo o primeiro sido publicado aos dezesseis anos. Publicou, também, um conto por um concurso da Universidade Federal Fluminense, onde se graduou. Publicou na coletânea de poemas Trilha de Lótus e é autor do livro de poemas Tudo é (medo do) amor, lançado em 2015.
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Quase nada sobre tudo - Daniel Cotrim
ATRÁS DA PORTA
Luis estava dormindo mal. Mexia-se na cama de um lado para o outro, suava, o sono profundo faltava-lhe. Mais uma vez três e meia da manhã. Mais uma vez a sede que dá de madrugada nos que são cansados pelo dia, mas ansiosos pelos dia e noite seguintes.
O jovem Luis olhou para o teto do seu quarto, como quem quisesse encontrar a estrela mais distante no céu. Mexeu a cabeça de forma negativa. Levantou, um pouco hesitante, e decidiu ir à cozinha. É bem verdade que mosquitos também o atrapalhavam. E muito! Com a mão direita, espantava os insetos enquanto se apoiava com a esquerda à cama. Pisava o chão tentando achar seus chinelos. Logo os encontrou.
A porta da geladeira parecia um portal. Refrescou-se ali mesmo, como se estivesse num paraíso. Água! Gelada e confortante. Gostosa! Calmante! Água.
O plano era voltar a dormir. Poucas horas para o jovem acordar e seguir a rotina. Um barulho comum na porta da área chamou a atenção do Luis. Por quê? Não se sabe. Mas às vezes o comum chama atenção porque está prestes a se tornar diferente. Não custava nada verificar. Pôs-se, então, em frente à porta e chegou a levantar a mão direita para abri-la. Mas... o que há atrás da porta?
O que há atrás da porta? Tudo, nada, nem mesmo o meio-termo. Atrás da porta tem uma montanha para se escalar, atrás da porta tem um buraco largo e profundo. Atrás da porta tem um monte de passarinhos tristes que cantam lindos assobios; tem a vegetação mais seca, mais dura, mais pedra. Não há rio, não há. Há mar, amar em movimento, há onda, há um deslize contínuo e áspero. Atrás da porta não existe voz. O silêncio é inquieto, um pouco gritante. O silêncio fala.
O rapaz chega mais perto.
O quê? O que há atrás da porta? Quedas de aviões em ruas e corações, destinos levados por barcos, vontades a jato, sonham que andam a pé e a cavalo, balançam, balançam... Atrás da porta tem lápis, caneta e papel. Nem sempre tinta, apontador e muita folha, mas tem. Atrás da porta tem sossego; tem desespero previamente pensado. A ansiedade atrás da porta é calmamente vivida.
O que tem atrás da porta? Tem muito desejo, segredo, coisas a serem ditas. Atrás da porta faz um calor estranho, um pouco frio e às vezes a chuva é linda. Outras vezes, é ácida. Corrói como palavras cruéis ditas da boca para fora e coração adentro. Atrás da porta o amor é surpresa, a verdade surpreende e o dinheiro compra qualquer mentira que se quer ver ou escutar. Há homens-bomba, sem-teto, amantes, escravos, iniciantes, todos disfarçados de alguém. Há multidões atrás da porta, para um lado e para o outro, sem sentido e direção; há ninguém.
Atrás da porta? Medo, amor, olhares, um céu nada azul, mas cinza. Respira-se cada vez menos, fala-se cada vez mais. Tudo é consumido, nada se esgota. Atrás da porta existem corajosos, bravos mentirosos e conquistadores caros de mentes. Belos índios mapuches e iroquais, guerreiros tupi, orgulhosos portugueses, charmosos franceses, inteligentes ingleses, lindos árabes, religiosos, malandros... um reino desunido – e em desunião (ou união forçada).
Vai abrir a porta, Luis? Por que você está esperando além da porta? Abra a porta. Com medo do que existe atrás da porta? O medo é o maior estímulo para a descoberta do mundo exterior. O interior não se descobre, se sente, serve para que se sofra calado dentro dos conflitos mais intensos e extensos da mente.
O que existe atrás da porta? Atrás da porta há clássicos, cânones, bibliotecas pretendidas pelos intelectuais e por pseudo-sábios e entendedores de tudo. Atrás da porta há a falta de espaço para o novo. O diferente sofre, trabalha para ser aceito. Mais uma notícia de anteontem nas promessas de futuro atrás da porta.
De frente para a porta, mão quase à maçaneta.
O quê? O que realmente há atrás da porta? Suspiros e saudades, falsas verdades da vida, choques e tensões das surreais realidades. O dinheiro é o pedido favorito dos cardápios. Não há peixes no mar.
A mão já conquistou o território. Agora só é preciso forçar a maçaneta e puxar.
Luis, vai abrir a porta? Abra de uma vez! Atrás da porta, qualquer coisa é tudo. Tudo é nada; quase nada diz muito. E o muito é qualquer coisa. Há quase nada sobre tudo. Vai abrir a porta, Luis? O que espera atrás da porta? O que te espera atrás da porta? O que se espera atrás da porta?
ENCRUZILHADA
José Mário. Esse é um nome comum. Talvez não seja tão comum quanto os outros nomes que passaram pelo caminho desse homem. Aliás, homem comum no Rio de janeiro: advogado, descendente de portugueses, branco, com barba feita, corpo regular. 47 anos, corpo de 35, homem bem cuidado. Seus bonitos cabelos lisos, mafiosamente penteados e grisalhos e seus olhos glaucos combinavam com seus bonitos ternos e chamavam atenção dos olhares femininos e masculinos. Olhares, porém, vazios.
O ano era 2010 e José Mário trabalhava na cidade do Rio de Janeiro. Advogado experiente – 23 anos de formado –, laborava em um escritório no centro da cidade, na Rua São José. De segunda a sexta, tinha de atravessar a famosa Avenida Rio Branco, onde passam milhares de pessoas todos os dias. Pessoas e olhares. José Mário, homem comum, seguia ao trabalho e passava por Juliana, por Carol, por Daniele, por Eduardo, por Luiza, por Carlos, por José, por Jairo, por Maria, por Alessandro, por Cláudia e por muitas outras pessoas comuns. Os olhares eram trocados, é claro. Muitas vezes, os olhares duelavam por alguns segundos e milésimos. Minutos não eram passíveis de uso, pois a quantidade de informação visual e auditiva complicava a vida das pessoas. O sol carioca dava vida ao cinza e ao colorido