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Dança Um Tango Sobre a Minha Campa
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Dança Um Tango Sobre a Minha Campa
E-book467 páginas7 horas

Dança Um Tango Sobre a Minha Campa

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Sobre este e-book

A adorada esposa de Lucas, Brenda, morrera há três anos nos seus braços, na casa de ambos em Lisboa. Neste fim de tarde, a escassos segundos da sua própria morte, Lucas recebe um telefonema de Manaus, no Amazonas, em que Brenda lhe pede que se encontre com ela lá, no coração da maior selva do mundo.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento14 de dez. de 2021
ISBN9789899003934
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    Dança Um Tango Sobre a Minha Campa - Alberto Couto

    I

    Lucas

    Lisboa, quarta-feira 17 de Outubro

    Quando já ia chutar a cadeira, o telemóvel tocou no bolso direito das calças com aquele toque da canção de Bobby McFerrin Don’t Worry, Be Happy, que ele havia descarregado dias antes.

    Lucas havia há muito decidido o ano da sua morte, 2046, mas resolveu antecipar. O plano original era simples: chegado 2046, então com 90 anos, se o Grande Ceifeiro o viesse inspeccionar e desse meia volta, decepcionado com a excelente saúde de que Lucas sempre gozou, então continuaria a aproveitar, usufruindo do bónus até ao dia em que sentisse que a cabeça e o corpo já não faziam grande companhia um ao outro.

    Don’t Worry, Be Happy, continuava o telefone.

    Como raio foi ele deixar o telefone no bolso? – pensou. Não se esqueceu de tirar os óculos, nem os sapatos, nem o relógio, nem mesmo o anel!

    Hesitou por um longo momento, atrapalhado pelo insólito da situação.

    – Ahhhh! – desabafou para si, agastado – Não vou atender. Não agora. Que se lixe!

    E atender para quê? E atender como, com os pulsos presos para desencorajar fraquezas no último instante?

    Tentou ignorar o telefone e decidiu-se a chutar a cadeira. Tinha sido muito difícil reunir a coragem de chegar até àquele ponto para fraquejar agora.

    O telefone, entretanto, desistiu de tocar.

    Readquirido o silêncio, Lucas lançou um longo olhar pelos janelões da varanda à belíssima paisagem daquele andar alto sobre o mar interior do Tejo. Estava um fim de tarde de beleza extraordinária, daqueles de que Lucas mais gostava. Enquanto de Leste se aproximava uma tempestade violenta e relâmpagos rasgavam as nuvens pesadas naquela metade do céu, na outra metade o Sol descia sobre o mar e lançava uma bela luz rasante sobre Lisboa, pintando de brilho tudo o que a chuva recente havia molhado.

    Lucas inspirou uma golfada profunda e entrecortada pelos nervos, cerrou com força os lábios e os olhos e ergueu o pé direito encostando-o ao espaldar da cadeira, pronto para o desfecho.

    Já apoiado apenas no outro pé, o telefone toca novamente.

    Don’t Worry, Be Happy.

    Sobressaltado por ser arrancado subitamente da sua intensa concentração nesse momento solene, a peúga escorrega no assento de couro da cadeira e, no esforço involuntário para se equilibrar, o pé acaba mesmo por tombá-la para fora do alcance e ele fica pendurado da corda presa no gancho do tecto que segura o candelabro da sala.

    A balouçar e sufocado com o súbito estrangulamento, o instinto fá-lo debater-se violentamente tentando recuperar a cadeira já deitada no chão. Com os movimentos descontrolados dos seus oitenta quilos, o gancho desprende-se do tecto, o desespero dos pulsos para se libertarem acaba por romper a abraçadeira plástica com que ele os havia amarrado num último aperto com os dentes, Lucas cai de costas desamparado enquanto o gancho, a corda, o candelabro e o estuque do tecto desabam sobre ele.

    Do seu bolso direito continuava a sair a suave melodia Don’t Worry, Be Happy.

    Gemendo de dor com o candeeiro no peito, surpreso e atordoado, exclama – Puta Que Pariu!

    Com um esgar contrariado leva a mão ao bolso, olha para o número que não percebe sem os óculos, passa o dedo no botãozinho verde e atende numa voz desanimada.

    – Alô?

    *

    – Boa tarde – responde uma voz de homem do outro lado, com forte sotaque brasileiro. Estou falando com o marido da D.ª Brenda Couto Rosa da Martha, de Portugal? Sr. Lucas Rosa da Martha?

    – Sim… é ele… Mas quem fala?

    – A sua esposa é Brenda Couto Rosa da Martha?

    – Sim… mas… – Lucas estava muito confuso – Mas, com quem falo?

    – O meu nome é Gabriel Nuno, de Manaus. Sou advogado.

    – De onde?

    – Manaus, no Brasil, Amazonas. Recebi no meu escritório uma incumbência de sua esposa que lhe diz respeito.

    – Desculpe – interrompeu Lucas – Incumbência de quê? Quando? Para mim…!?

    – A sua esposa é a D.ª Brenda Couto Rosa da Martha, não é mesmo? Uma senhora portuguesa. E o senhor é o marido dela, o Sr. Lucas Rosa da Martha, certo?

    – Sim… sou eu, mas…

    – Pois fomos contactados por ela para…

    – Desculpe – interrompeu novamente Lucas, cada vez mais confuso – Doutor… como é mesmo o seu nome… Dr. quê?

    – Gabriel Nuno, advogado de Manaus.

    – E diz-me que foi contactado pela… Espere lá… quando foi isso?

    – O assunto chegou às nossas mãos anteontem, mas eu estava viajando e só regressei ontem de noite e…

    – Dr. Nuno, desculpe… – Lucas interrompe, passa a mão sobre a testa e cobre os olhos, confuso, tenta retirar a corda do pescoço mas apenas consegue aliviá-la.

    – Dr. Nuno – continuou – há aqui alguma confusão muito estranha. Está a dizer-me que a minha mulher, a Brenda, foi ao seu escritório e…

    Interrompeu-se novamente, confuso.

    – Isso quando… anteontem?

    – Sim, segunda-feira 15 pela manhã. Eu só cheguei ontem.

    – Entregar o quê?

    – Uma embalagem, tipo caixa de encomenda postal com um envelope aparentemente contendo papéis e outros itens.

    – Dr. Nuno, diga-me: – Alguma forma de saber alguma data por esses papéis? – pergunta Lucas, a tentar ainda recompor o corpo e as ideias.

    – Está tudo fechado num envelope dentro da embalagem, para ser aberto por si conforme as instruções que me são dadas numa carta, a única coisa que vi do conteúdo porque me é dirigida.

    – Carta? A dizer o quê? De quando?

    – Quanto ao teor da carta, enfim… ela pede para tudo ser tratado pessoalmente. A data é recente… deixa ver… é do dia 12. Hoje é 17, tem cinco dias.

    Lucas ergueu o telemóvel e fitou-o directamente, como que a dizer ao aparelho lê os meus lábios, e vincou bem as palavras.

    – Dr. Gabriel Nuno, a minha mulher morreu há três anos.

    Uns bons cinco segundos de silêncio fizeram-se ouvir de ambos os lados da linha, silêncio que o advogado brasileiro quebrou.

    – Tem certeza?

    – Como tenho certeza!? Que raio de pergunta é essa?

    Lucas procurou sentar-se melhor e afastar o candelabro que entretanto ia descaindo ameaçadoramente com as suas hastes de metal e pingentes de cristal sobre o pior lugar possível, o meio das pernas. Enquanto lutava para se desenvencilhar daquela confusão de metal e pingentes no colo, estuque na cabeça, corda ao pescoço e telemóvel na mão, um ruído seco acima de si chama-lhe a atenção, olha para cima e a última coisa que vê, antes de o cérebro se iluminar num súbito clarão e o mundo ficar às escuras, é uma secção do pesado barrote de madeira antiga que prendia o gancho do candelabro, por trás do estuque do tecto falso, finalmente partir-se e despencar-lhe bem no meio da testa.

    *

    Foi por fases que Lucas voltou a si. Ainda antes de abrir os olhos sentiu várias dores, uma na cabeça, outra com um ardor no pescoço e outra numa das jóias.

    Quando entreabriu os olhos, pelos janelões da varanda a tempestade de Leste já havia engolido a bela luz rasante que pintara a cidade de molhado. Ainda não era noite mas o céu estava cinza-negro, relâmpagos espadeiravam-se por entre nuvens pesadas, vento empurrava a chuva contra as vidraças e um trovão mais forte não ajudou à dor de cabeça.

    Levou algum tempo, imóvel, à espera que o cérebro conseguisse religar-se. A visão do tecto estragado e o candelabro em cima dele começaram a fazer sentido.

    – Bardamerda para isto! – exclamou baixinho em tom de desalento – Ultimamente, não consigo que nada dê certo.

    O cérebro ainda não se tinha bem ligado, pelo que reagiu começando pelo mais urgente: tirar o candelabro de cima do colo, pois aquela haste estava a causar-lhe uma dor intensa que lhe subia pela virilha. O pescoço e a cabeça ver-se-ão depois, os tintins são o mais importante.

    Lucas conversava muito consigo próprio desde criança, na segunda pessoa, em voz normal como se ele próprio estivesse ali ao seu lado. Uma vida de prática nesses diálogo-solilóquios ajudaram-no a tentar não fazer isso em público, mas a verdade é que nem sempre funcionava.

    – Por quanto tempo apagaste, Lucas, meu idiota?

    – Não sei bem – respondeu-se – Não pode ter sido muito, isto ainda não é bem noite, é um entardecer prematuro.

    – Mas tu gostas de palavras caras, porra! Vê lá é se te pões fino para limparmos esta merda que fizeste.

    Eu fiz? Não fui eu que nos quis matar, minha besta. Olha, pára aí no espelho. Já viste a bela merda que também fizeste na testa? Queres saber por quanto tempo apagaste? Esse sangue todo já não está vermelho e nem escorre, faz as contas.

    – Pára de me chatear, preciso de pensar, a minha cabeça não está clara.

    – A tua cabeça? Usa a minha, que está melhor. Ahhhhh, se não for eu a cuidar das coisas tu ultimamente só fazes merda.

    – Bom… aí tenho que concordar contigo.

    – Vamos à casa de banho, tenho que limpar este sangue e meter a cabeça num chuveiro frio. E, depois, quero um café bem grande e bem negro.

    – Ouve cá, tive um sonho estranho. Desmaiados também sonham?

    – Acho que sim. Eu também desmaiei e também tive um sonho esquisito.

    – Queres ver…? Vais-me dizer que foi o mesmo sonho!

    – E desde quando não é?

    – Conta tu primeiro, senão vou achar que copiaste.

    – Se eu contar primeiro, eu vou achar que tu copiaste. Desembucha.

    – Sonhei com a Brenda.

    – Isso não tem nada de novo, sonhamos com ela a toda a hora. O que tu sonhaste foi com um homem a falar dela.

    Lucas interrompeu um pouco o diálogo e parou a caminho da casa de banho, a olhar para o chão de madeira antiga, esforçando-se por resgatar uma memória difusa numa cabeça ainda confusa.

    – Este parecia real, mas não me lembro bem do que era.

    – Todos os sonhos parecem reais até acordarmos.

    – Sim, mas depois já não e desvanecem-se rapidamente, em pouco minutos deixamos de ter uma memória clara do que foi.

    – É o caso deste.

    – Sim, mas este eu sinto diferente.

    – Claro que é diferente. Levaste com uma viga de madeira nos cornos, olha bem para ti.

    – Tenho a cabeça a estalar, estou zonzo e não consigo pensar direito. Vai buscar uma aspirina e fazer um café enquanto eu me vou afogar em água fria.

    – É para já. Mas vais sem mim, génio?

    – Cala a boca e faz o que te digo.

    Lucas entra na casa de banho e regula o chuveiro para quase-frio, despe-se em frente ao espelho para inspeccionar os estragos, lança um olhar de comiseração a si próprio, abandona toda a roupa no chão e entra no polyban. Com os braços musculosos apoiados nas duas torneiras da parede, baixa a cabeça sob o chuveiro forte e fica a observar os fios de sangue a escoarem-se pelo ralo enquanto o latejar na cabeça parece dar-lhe uma trégua. A névoa que lhe envolvia o cérebro começa aos poucos a dissipar-se.

    De súbito ergue a cabeça, o movimento doeu mas ele não ligou. Com os braços ainda apoiados nas torneiras crava os olhos muito abertos nos azulejos à sua frente e exclama entredentes: – Raios me partam e macacos me mordam!

    – O advogado de Manaus!

    – Lucas! – repetiu em voz alta – O advogado de Manaus!

    – Tu sempre tiveste sonhos estranhos, e essa porrada na cabeça não ajudou. Mas agora que falas nisso, tens razão, estou a lembrar-me agora. Mas donde diabo foste tirar essa?

    – Não foi sonho! – insistiu – Nós caímos porque o telefone tocou e eu sobressaltei-me, foi por isso.

    – O telefone tocou porque é isso que eles fazem, alguém ligou. Agora, essa do advogado de Manaus a ligar-te por causa da Brenda… essa aí foi de levares com a viga na testa e ficaste a ver passarinhos e advogados a esvoaçarem à volta da tua cabeça.

    – Onde está o telefone?

    – Estavas a falar nele quando levaste com a viga nos cornos. Só pode estar no chão da sala.

    – Então escusamos de estar aqui a conjecturar, essa é fácil de resolver.

    Lucas nem se secou. Saiu encharcado do chuveiro e seguiu em passo apressado para a sala, molhando o chão pelo caminho, os passos pouco seguros no chão escorregadio.

    – Cai outra vez, vai, cai! Com outra boa pancada talvez fiques bom.

    – Cala a boca e ajuda-me a encontrar o telefone, não o vejo.

    – Tem que estar por aqui. Vê debaixo dos sofás, deves ter-lhe dado um bom safanão.

    – Encontrei, estava mesmo debaixo do sofá. Onde é que eu deixei os óculos?

    – Não os tinhas quando tiveste essa ideia de génio de rebentar com o tecto em lugar de morrer. Guardaste-os junto com o relógio e a carteira, em cima da mesinha da entrada.

    Nu e a pingar, Lucas vai buscar os óculos e perscruta o telefone. Quatro últimas chamadas recebidas do mesmo número, sem nome, só a segunda atendida com quatro minutos e treze segundos de conversa, a primeira e as duas últimas não atendidas. O coração começou a bater mais rápido, pois imediatamente percebeu que o número era de fora.

    – 5592… de onde…

    – 55 é Brasil, isso eu sei. 92 acho que… tenho quase a certeza de que é de…

    – Uma rápida pesquisa aos indicativos diz-lhe que 92 é do Paquistão, mas não é isso.

    – Vê dentro do Brasil, génio!

    Lucas tira lentamente os óculos, o olhar fixo em coisa nenhuma.

    – Raios me partam e macacos me mordam! 92 é Manaus.

    Numa espécie de transe pensativo, com os óculos e o telefone na mão, ainda completamente nu e com o cabelo a pingar-lhe sobre os ombros, Lucas caminha lentamente até um dos janelões da varanda da sala, afasta as cortinas translúcidas para a guerra celestial a ser travada lá fora e, imóvel, tenta juntar os fragmentos desse fim de tarde em alguma coisa que faça sentido. Lá fora, a tempestade parece agora querer acabar com o mundo.

    Outros vultos desenhavam-se à contraluz que saía dos apartamentos pelas grandes vidraças dos prédios vizinhos sobranceiros ao Tejo, certamente a admirar, como ele fazia agora, a furiosa tempestade que se abatia sobre Lisboa. Aí, Lucas percebeu que, se ele os via apesar da cortina de água que escorria das vidraças, eles também viam a sua silhueta nua recortada pela luz dos outros candeeiros da sala. E com os relâmpagos incessantes, a sua figura enquadrada pelo janelão oferecia nítidos flashes fotográficos que fariam os vizinhos esquecer a tempestade e deterem-se com estranheza nesse quadro digno de um bom thriller erótico.

    – Lucas deixa-te ficar aí mesmo. Queres que eu aproxime o candeeiro de pé para te verem melhor? A vizinha da frente vai ficar contente.

    – Ah sim, pois é. Hã… vou tomar a tal aspirina e o tal café, preciso muito desta cabeça agora.

    – Não queres acabar o chuveiro primeiro? Deixaste a água a correr.

    – Hã? Ah sim… tens razão. Vou fazer o café.

    – E não te queres matar primeiro? Lembras-te? Deixaste isso a meio também.

    – Uma coisa de cada vez, porra! Estou zonzo, preciso pensar.

    Completamente alheado enquanto continuava a olhar para o telefone, Lucas caminhou para o corredor. Daí a dois segundos teria que decidir se viraria para a esquerda para a casa de banho ou para a direita para a cozinha. Mas isso era um problema que ele resolveria nessa altura, pois, por agora, os olhos e os pensamentos estavam cravados no telefone.

    – Raios me partam e macacos me mordam!

    *

    – Ai Lucas, meu velho, como chegaste a isto? – lamentou-se a si próprio, com a cabeça debaixo da água fria do chuveiro. Era uma boa coisa para fazer passar a dor de cabeça, poder começar a arrumar ideias e fazer algum sentido dos eventos daquela tarde. Uma aspirina e um café depois fariam o resto.

    Lucas faz constantemente balanços do seu percurso de vida e de si próprio, numa tentativa de não se perder no meio da confusão das idiossincrasias e anacronismos do ser humano, de como as pessoas conseguem aparentemente conviver com paradoxos e contradições impossíveis dentro duma mesma cabeça. Se os introduzissem num computador, este bloquearia ou explodiria em protesto, mas o ser humano parece estranhamento confortável em conviver com paradoxos e verdades gritantemente contraditórias. Sem dúvida, uma enorme vantagem evolutiva, mas estranha não obstante. Fazer esses balanços com frequência tem a utilidade de perceber onde acertou e onde errou, e traçar o caminho à frente.

    Lucas é um homem com boa aparência mas nunca se achou bonito. As mulheres discordavam e, com o avançar da idade, ele próprio começou a dar-lhes alguma razão. Com o cabelo curto bem penteado e já quase todo branco, praticamente sem rugas e com um corpo seco e musculoso invejável para a idade. Só pode ser genético, pois há trinta anos que não faz exercício, a maior parte do tempo se não está sentado à secretária ou no carro está deitado a dormir, nunca cometeu grandes excessos embora também nunca tenha tido um cuidado especial com a saúde nem com a alimentação, sempre teve uma saúde de aço inox. A única vez que se recorda de ter ido à revisão a um médico foi já na meia idade, para lhe dizerem que parecia tudo bem. Nunca tomou drogas excepto tabaco, sempre bebeu mas nunca foi alcoólico e detesta bebedeiras e bêbedos, e sempre fumou.

    Sempre foi nervoso e tímido e em jovem era muito gago, herança do pai, mas a meio dos trintas achou que isso era uma chatice e resolveu nunca mais gaguejar. Foi de um dia para o outro. De vez em quando ainda tropeça nas consoantes explosivas e nos ff, principalmente quando está nervoso, mas só quem o conhece consegue perceber.

    É claro que também perdeu as vantagens de ser gago, porque as há. Quando, na casa dos vintes, regressou do Brasil deixando para trás um bom emprego para se reunir com a família, Portugal era um país economicamente deprimido pós-revolução e o primeiro emprego que conseguiu foi como vendedor loja-a-loja de uma marca de chocolates suíços. Como era tímido e muito gago, os donos das lojas tinham pena dele e compravam. Foi o melhor vendedor da empresa no curtíssimo mês em que lá esteve, pois sempre detestou vendas.

    Já a meio dos trintas e numa subida meteórica na carreira que havia desenvolvido no Brasil e que acabou por conseguir retomar em Portugal, as suas funções levavam-no a constantes reuniões com as administrações de topo de grandes empresas. Para grupos engravatados sentados ao redor de luxuosas mesas em luxuosas salas, invariavelmente abria as reuniões declarando, antes de abrir o tema a que vinha: «Os senhores vão ter paciência comigo porque sou muito gago», ao que também invariavelmente o gelo se quebrava, desenhavam-se sorrisos e ouviam-se algumas exclamações de aprovação como «O senhor é um desportista! Fique à vontade». Lucas fechou grandes negócios assim.

    Lucas nasceu em Luanda, fruto do amor entre uma belíssima e elegante Quanhama de Sá da Bandeira e de um irresistível lisboeta, jornalista em início de carreira que ali foi cumprir o serviço militar. Mal tinha deixado de usar fraldas quando rebentou em Angola a guerra de libertação e o pouco que presenciou dos horrores daqueles dias marcaram-no para sempre. Segundo a família, ele já era uma criança um pouco estranha, que via coisas que mais ninguém conseguia ver apesar dos seus esforços frenéticos para lhes mostrar, indignado por mais ninguém ver o que ele via com toda a clareza: «Está ali mesmo, não vêem?» dizia, exasperado. «A senhora está ali mesmo, a olhar para nós, não vêem?». Ou então encontravam-no fechado totalmente às escuras na despensa, sentado no meio das vassouras e o resto da tralha, a olhar para o tecto. «O que estás a ver?», perguntavam-lhe, ao que ele apontava o dedinho: «As estrelas são bonitas». De noite, acordava com as vozes dos milicianos concentrados lá em casa, a sala transformada em arsenal, as armas encostadas à parede, prontas para a patrulha da noite. Vendo o seu pai, integrante de uma das milícias formadas pela ausência de tropas coloniais em Angola, atrapalhado com a ausência de bolsos suficientes para guardar as munições, Lucas vai à cozinha buscar um dos seus babetes com bolso e entrega-lho. O pai agradece, ata o babete ao pescoço, ache o bolso do babete com as poucas munições que nele cabiam, dá-lhe um beijo e sai para a patrulha da noite. Naquela mesma casa escaparam por muito pouco, e por puro acaso, ao morticínio que estava planeado para os dias seguintes. A represália que se seguiu marcou-o para a vida, com memórias dolorosamente nítidas.

    Só muito mais tarde, adulto, Lucas viria a associar aqueles eventos como tendo talvez agravado a sua gaguez hereditária. E também, em momentos de maior tensão, Lucas isolava-se e recorreria à companhia de um outro ele, um alter-ego da sua criação, valente, corajoso, determinado, destemido e autoritário, que prontamente acorria a protegê-lo da sua timidez e insegurança naturais. Esse seu confidente e fiel protector passou a acompanhá-lo ao longo da vida, de tal forma que passou a ser uma presença constante, não surgindo apenas quando invocado nos momentos de maior necessidade. Lucas e o seu alter-ego passaram a dialogar corriqueiramente, num diálogo-solilóquio constante sempre que se lhes deparava uma escolha, uma decisão a tomar, um caminho a escolher, fosse para uma decisão vital de mudança de vida fosse para escolher a cor da camisa.

    Ele e ele tornaram-se amigos inseparáveis, de tal modo que, com o passar dos anos, nenhum já sabia qual deles tinha criado o outro. Essa parceria foi inestimável ao longo da vida nos momentos de perigo e nas fases de maior ansiedade. Face a uma ameaça, acontecimento traumático ou fase particularmente assustadora da vida, um dos dois Lucas tomava imediatamente as rédeas da situação e exercia uma feroz protecção. A intimidade e confiança mútua eram tais que frequentemente um entregava a vida ao outro durante longos períodos, por vezes anos, nos anos mais difíceis.

    Eles não eram de forma alguma antissociais, pelo contrário, conviviam bem com uma roda alargada de amigos, conhecidos e estranhos em funções sociais. Mas a sua vida social foi sendo progressivamente posta de lado nos anos de separação com a Brenda, na longa ausência desta no Brasil, e praticamente extinta no regresso dela a Lisboa, doente, até à sua morte. Nesse ponto, os Lucas ficaram sós no mundo.

    Antes do isolamento total do casal, uma amiga próxima, psicóloga, havia delicadamente chamado a atenção de Lucas para o exacerbar dessa dualidade identitária a que ela se referiu como condição, segundo ela relativamente comum até um certo ponto mas que, agora aparentemente muito mais marcada, ao que lhe parecia com a convivência com ele, ela receava poder tornar-se numa condição. Ele desvalorizou o pré-diagnóstico mas, a insistências dela, acabou por concordar em fazer parte de um estudo que um colega profissional dela estava a promover.

    – Está bem – acabou ele por concordar, meio divertido – Vamos os dois, eu e eu, falar com o teu colega.

    Com uma curiosidade insaciável, entusiasmado pela vida e muito dedicado ao trabalho. Aventureiro, mas ao mesmo tempo adepto de planos solidamente traçados, coisa com que a vida dificilmente concorda. Cedo teve que ir trabalhar para o Brasil no rescaldo da revolução portuguesa de 1974 – ter com o pai que entretanto já o havia feito, desempregado que ficou em Portugal por conotações da família com o regime deposto – em prejuízo de um curso de navegação já concluído no corpo de fuzileiros navais para acesso à academia militar e de um curso universitário. Esse primeiro emprego no Brasil, precisamente em Manaus – daí a estranha coincidência do telefonema dessa tarde – definiu para o futuro a sua carreira profissional em comércio internacional e investimento, na qual foi muito bem sucedido embora totalmente alheia ao que sempre quis fazer como profissão: voar, navegar e escrever. Mesmo dentro do âmbito dessa carreira para a qual a vida o empurrou, a sua curiosidade insaciável – tudo lhe interessa – levou-o a especializar-se em tudo, uma profissão pouco comum. Um dos motes da sua vida sempre foi especialização é saber cada vez mais sobre cada vez menos até saber quase tudo sobre quase nada, e Lucas não ia permitir que isso acontecesse com ele. Nunca foi capaz de ser apenas uma roda dentada na engrenagem. Embora sempre muito diligente no trabalho, a sua ânsia de saber e experimentar sempre o obrigou a olhar com alguma distância para o conjunto da obra de arte, pois quando o nariz está encostado à obra de arte os olhos só vêem borrões.

    Lucas e Brenda eram um casal relativamente abastado, com excelentes rendimentos e sem preocupações financeiras e, na verdade, sem grandes preocupações de qualquer outra natureza. Conheceram-se ainda crianças e a grande diferença de idades não formou propriamente uma amizade entre iguais, mas o seu convívio atravessou a infância de Brenda e a adolescência de Lucas. Ano e meio após a revolução de 1974, terminado o liceu, Lucas foi para o Brasil, de onde regressou passados cinco anos. Já um jovem adulto, quando regressou teve um choque quando reencontrou Brenda. Aquela menina travessa, truculenta e meio maria-rapaz tinha-se transformado numa adolescente de grande beleza, mas a diferença de idades ainda era impensável para Lucas. Ele com 24, muito jovem ainda mas já endurecido por anos de trabalho numa terra tão longe, tão estranha e tão violenta, e ela com apenas 14, em que a beleza, a altura e as formas de mulher não conseguiam disfarçar um ar de criança que ainda não viu o mundo. Durante os anos que se seguiram, Lucas escondeu e tentou suprimir o forte impacto que o reencontro com Brenda lhe tinha causado, e conseguiu-o durante quatro anos. Brenda, por seu lado, enrubescia sempre que Lucas estava por perto. Fascinavam-na o ar confiante e alegre e as histórias que ele trouxe de terras estranhas e distantes, mau grado a gaguez que, aos olhos de Brenda, só lhe emprestavam mais encanto.

    Quatro anos depois, durante uma festa em casa de amigos, Lucas deixa a sala dos copos, das conversas e dos festejos dançantes e vai ao terraço fumar um cigarro. Demorava-se a admirar a vista naquela noite de Verão quando Brenda sai também e se posta ao lado dele.

    – Que bela vista! Sempre gostei desta casa.

    – Não estavas a dançar, Brenda? – O que é feito daquele rapaz?

    – Não o conheço, apenas me pediu para dançar. Eu não sou boa dançarina.

    – Pois, eu sou o mestre do Tango! – exclamou Lucas, com um olhar cómico e um largo gesto teatral.

    – Tu és pé de chumbo, Lucas, isso sim! – riu-se Brenda – Mas contigo eu dançava um Tango. Fazes ideia de como se faz? Eu acho o Tango uma dança linda, mas nunca irei conseguir.

    – Lucas vai ao outro lado do terraço, arranca com cuidado uma rosa vermelha da sebe, coloca-a entre os dentes e caminha com um ar dançante em direcção a Brenda.

    – Vou-te mostrar como se dança o Tango.

    – Lucas! Tu és um desajeitado a dançar! Vais-me pisar ou atirar-me do terraço abaixo.

    – Vem cá, mulher!

    Com a rosa vermelha entre os dentes, Lucas abraça-lhe a cintura e puxa-a para si num gesto brusco, másculo e teatral, como que ao som dos primeiros acordes sensuais de um Tango ao luar numa noite de Verão.

    Envolvida pela cintura, ela corou e estremeceu, e ele parou de repente como se se tivesse esquecido do que ia fazer.

    Brenda e Lucas casaram-se nesse mesmo Outono.

    Foi um casamento de um amor e amizade profundos durante os primeiros vinte e sete anos, até ao dia, há cerca de cinco anos, em que Lucas caiu na asneira de sucumbir aos avanços da mulher que Brenda considerava a sua amiga mais próxima. Podia ter sido uma sirigaita qualquer, e Brenda até talvez tivesse conseguido ultrapassar o ultraje, mas não com ela, não aquela.

    O amor e a amizade profundos que os unia sempre foi pontilhado pelos atritos dos carácteres fortes que um e o outro possuíam, e por várias vezes voaram panelas e cinzeiros lá em casa, mas fornicar com a amiga foi demais. E para o ultraje ser completo, na casa deles! Na cama deles!

    Foi uma cena clássica, nada de imaginativo, nada de interessante, sem enredo, sem elegância. Brenda veio de Coimbra, sem avisar, trezentos quilómetros ida-e-volta apenas para ir a casa buscar algo de que se esquecera no dia anterior e regressar à estrada de imediato. O resto já todos vimos nos filmes baratos. Lucas nem devia estar em casa, deveria estar em Madrid numa viagem relâmpago. Mas estava em casa, levou com os candeeiros das mesas-de-cabeceira e o que mais de pesado estava à mão de Brenda, e a sirigaita foi puxada pelo pescoço e empurrada, vestida apenas com os anéis, os brincos e o relógio, porta fora para as escadas do prédio. Lucas, cavalheiro, ainda fez menção de fintar Brenda e tentar chegar à porta para entregar as roupas, mas sem sucesso. Um pesado cinzeiro e o porta-guarda-chuvas da entrada obrigaram-no a retroceder à procura de abrigo. Lucas nunca – nunca – tinha ouvido sair da boca de Brenda uma imprecação mais cabeluda do que merda, e mesmo essa muito raramente. Mas o grito de Brenda nessa tarde, à porta do apartamento ecoando pelas escadas do prédio, mostraram-lhe uma estranha enfurecida como ele nunca havia visto:

    – Vai dar o cu na rua, puta de merda! Se voltas aqui quem te dá na cona sou eu! COM OS MEUS CORNOS! – gritou.

    E com Lucas, o que se seguiu também não foi bonito.

    Brenda era uma profissional bem sucedida, com dois mestrados e um doutoramento feitos com a ajuda de Lucas, que não tinha nenhum curso superior mas era também muito bem sucedido na sua carreira. Lucas tinha um imenso orgulho na sua esposa, e não se cansava de o apregoar mesmo nas situações menos necessárias. Bióloga e doutorada em química orgânica, com uma invejável carreira em investigação, Brenda estava, na altura da traição de Lucas, a hesitar entre aceitar ou não uma comissão de investigação de dois a três anos no Brasil em nome de um consórcio entre duas indústrias farmacêuticas europeias e o instituto onde trabalhava em Lisboa.

    A cagada no casamento por parte de Lucas e da sirigaita, mais o seu feitio impetuoso, resolveram o assunto por ela. Já próxima da data da partida para o Brasil, um pouco mais calma pelas insistentes súplicas de perdão por parte do marido, a fúria de Brenda acalma um pouco e ambos resolvem dar um tempo e ver onde a vida os levará. Para já, ela ia trabalhar para o Brasil num projecto da maior importância.

    Lucas nunca soube que projecto era esse. O convite fora muito recente, e ultimamente ele e Brenda não falavam muito sobre os seus trabalhos. De cansados que estavam quando chegavam a casa, apenas queriam tomar um banho, jantar e namorar enquanto viam um filme.

    O mal-estar que se instalou após esse episódio tornou escassa a comunicação entre eles durante a ausência de Brenda nesses três anos. Telefonemas nos aniversários e nas datas festivas, alguns emails a tratar de assuntos comuns ao casal, e um ou dois faxes de Lucas com saudosas mensagens marotas e corações desenhados, ao que Brenda lhe chamou a atenção para não fazer isso por fax, porque a máquina estava na sala dela mas qualquer pessoa podia passar por ali. Nesses três anos ela não foi a Portugal nem ele ao Brasil. Nos últimos meses da sua comissão de trabalho, o ambiente parecia estar a desanuviar. O amor de ambos e a evidente saudade por parte de Lucas pareciam estar a amolecer o coração de Brenda, a quem a falta de Lucas também estava a cobrar o seu preço. Voluntariosa e orgulhosa, tinha-se vingado furiosamente no trabalho e nunca deixou que ninguém lhe visse as lágrimas.

    Resolveram colocar os acontecimentos passados para trás das costas e, no final da comissão de trabalho, Brenda regressou a Lisboa. Não vinha bem, sentia-se cansada, o que ela atribuía ao trabalho intenso desses anos e às mudanças. Então, uma consulta no médico destruiu-lhes a vida; Brenda contraíra leucemia e o prognóstico era de uma clareza cruel, o monstro fora detectado tarde.

    Lucas e Brenda tinham posses, alguns imóveis e outros investimentos. Os esforços foram desesperados para contrariar o inevitável, com viagens incessantes para consultas e tratamentos noutros países, mas sempre com a mesma resposta. Brenda, cansada e doente, disse para o marido: Chega, meu amor, chega de viagens, de hospitais e de médicos. Já não aguento mais. Só quero ficar em paz, com o meu Lucas.

    Próximos do final, nos últimos dias da longa batalha que sabiam perdida, passavam as tardes de inverno reclinados nas cadeiras de praia que juntavam uma à outra, agasalhados debaixo da mesma pesada manta, a olharem da sua varanda o mar e a azáfama da cidade. Serenamente resignada e em paz, as últimas preocupações de Brenda eram com o marido, o imenso e único amor da sua vida que ela em breve ia deixar. Brenda conhecia bem o marido e a sua postura de super-homem, a bravata de que enfrentava tudo na vida, a desmesurada autoconfiança, como também conhecia, por detrás dessa carapaça de valentia de peito aberto em desafio à vida, o homem sensível, emotivo e afectivo que se esforçava por disfarçar as lágrimas quando lhe morria um amigo ou quando via um passarinho perdido que caíra do ninho.

    – Meu amor, presta atenção – dissera-lhe ela em várias ocasiões nesses dias de última contemplação da vida – Quando chegar a hora, quero que leias o meu diário, aquele que está no meu lado do armário. Conto a história da minha vida e do meu trabalho nestes últimos anos no Brasil, e tens ali matéria para aquele livro que há tantos anos dizes que vais escrever e nunca escreveste.

    – Mas eu não quero escrever sobre ciência, meu amor – respondia ele – eu gosto muito de ler sobre ciência mas não percebo nada disso, a cientista é tu.

    – Lê o diário – insistia ela – Vais ficar surpreendido, confia em mim. Além de ficares a saber o tamanho do meu amor pelo meu Lucas, tens ali matéria extraordinária para o teu livro. Não vamos enganar-nos, querido, ambos sabemos que estamos praticamente falidos e eu não vou tranquila sabendo as dificuldades por que vais passar. Faz o que te peço, lê o diário e escreve o teu livro com o que lá vais encontrar. A indústria farmacêutica vai tentar pagar-te uma fortuna para que não o publiques e as editoras vão pagar-te outra fortuna para que o faças.

    – Chantagem? – ria-se Lucas, com um sorriso amarelo.

    – Sim, vais ficar rico – respondia ela deixando escapar uma risada que só conseguiu fazê-la tossir dolorosamente – Mas não abras o diário logo depois de eu… Espera um ano. Não o abras antes de um ano, ambos sabemos como tu és, não vais ter cabeça nem espírito para o leres e escreveres o teu livro.

    – O enredo é bom? – perguntava ele, forçando um sorriso amarelo – Dá para um bom livro?

    – É um enredo fantástico, meu amor. Tu sempre quiseste ser escritor, piloto de aviões e navegar por esses mares. Não te posso dar um avião nem um barco, mas deixo-te um livro para escreveres.

    Um ano após a morte de Brenda, Lucas tentou por várias vezes abrir o diário que ela lhe deixara mas nunca conseguiu fazê-lo. Assim que pegava nele, a postos

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