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A Dança Das Sombras
A Dança Das Sombras
A Dança Das Sombras
E-book120 páginas1 hora

A Dança Das Sombras

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Sobre este e-book

Este romance narra uma jornada até as profundezas da alma, uma jornada que dependerá do quão longe deseja ir o leitor, de onde deseja partir, de onde e quando deseja retornar. Uma jornada cruel, silenciosa, apaixonada e inesquecível que rompe o percurso e as convenções para conduzir-se além do tempo. O ritmo da narrativa é o mesmo que um respiro, a velocidade, o de um olhar, o tempo restrito a um passo de dança, mas expansivo como um sonho. Tudo para tentar buscar a harmonia do retorno àquele local do qual cremos jamais ter partido.
IdiomaPortuguês
EditoraTektime
Data de lançamento6 de mai. de 2019
ISBN9788893985222
A Dança Das Sombras

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    A Dança Das Sombras - Nicky Persico

    Nicky Persico

    A dança

    das sombras

    Tradução Por:

    Gabriel Bonatto Roani.

    Obra protegida por direitos autorais – todos os direitos reservados – é proibida qualquer divulgação ou reprodução mesmo que parcial se não expressamente autorizada.

    Copyright © 2019 - Nicky Persico

    A todos aqueles que estão

    no caminho.

    Boa viagem.

    Um dia

    em que não gostava do mundo

    inventei um para mim.

    É ali onde vivo eu.

    Todos os dias, ao anoitecer, o fluxo do tempo começa a desacelerar.

    Antes que escuridão, assim como a neve, comece cobrir tudo, a luz atenua-se, espalhando-se suavemente sobre as cidades e os gatos que estão nos tetos, e também sobre os choupos e as tílias, sobre as praias, sobre as florestas, sobre os automóveis, sobre os campos, sobre os livros e sobre os jovens nas motonetas, e sobre a água que, por todos os lados, reflete e multiplica as cores.

    Nas casas, cada janela é iluminada e anuncia a noite iminente.

    Por fim, o horizonte incendia-se de laranja e de celeste para então converter-se lentamente ao azul ultramarino.

    É ao crepúsculo o momento dos pensamentos, das lembranças, dos profundos suspiros e das respirações suspensas. Se se pudesse contar, descobrir-se-ia que naquele momento no mundo há o maior número de olhos voltados ao céu.

    Tudo é revelado, neste momento, na maior beleza possível: mesmo nas anônimas e frias áreas repletas de fábricas empilhadas no fim das metrópoles, quando o aroma do vento leve as invade pelas imensas avenidas idênticas, desertas e muitas vezes silenciosas.

    Exatamente ali, perfeitamente, naquele dia ao final de maio, no centro exato de uma imensa e vazia praça de carga e descarga, rígido e imóvel ao fundo do pôr-do-sol destacava-se um homem decidido, envolto em um casaco bem apertado e abotoado, logo ao lado de um velho e elegante carro que acabara de estacionar bem no meio daquele lago cinza de asfalto.

    Inspirou profundamente, imerso no silêncio interrompido apenas pelas poucas folhas de jornal que tentavam em vão voar para longe, e então expirou vagarosamente.

    Abriu a porta e, flexionando as pernas, pôs-se na cabine. Fechou então os olhos, com os punhos sobre o assento, absorvendo profundamente o aroma.

    Levantou-se por fim, olhou os arredores, pegou delicadamente uma garrafinha de um canto dos assentos dianteiros, colocou-a no bolso, retirou-se: fechando a porta com delicadeza, acariciou o recipiente gentilmente.

    Por fim, girou os ombros e se encaminhou devagar. Sem olhar para trás, alcançou o fim do interminável pátio. Desaparecendo atrás de uma esburacada parede cinza, começou a percorrer um enorme beco ladeado por chapas de zinco levemente enferrujadas.

    Ao passar dos minutos, a escuridão começou a dominar o ambiente como poeira de cinzas, cobrindo toda vista: surgiram de repente grandes cones de luz gerados pelos postes, e no céu espectral lâmpadas vermelhas sinalizavam torres invisíveis.

    Com os olhos baixos, o homem, de nome Asdrubale, fitava os próprios passos e escutava nitidamente os seus sons, no silêncio que o circundava, ouvindo nitidamente alternar rítmico do pé direito e do pé esquerdo: não havia outro barulho presente naquele dia quase noite, exceto pelo eco fraco, distante e disforme dos ruídos da metrópole ao fundo daquele pequeno mundo.

    Também em sua mente, as perguntas estavam em silêncio. As respostas, por outro lado, não tinham a menor importância e foram dissolvidas até desvanecerem, inúteis.

    Tudo parecia novo, claro, fresco e leve. Como nunca antes.

    Aquela era, esta noite, a última vez. Acariciara o velho carro com amor e gratidão após terem percorridos juntos por anos os mesmos idênticos trajetos, nos invernos inóspitos e desolados, protegido pelo sistema de aquecimento da cabine, enquanto o rádio aquecia a alma mantendo-o em contato com o mundo. E nos verões, ao cair da noite, sonhando com os vidros e os olhos bem abertos, fantasiando sobre as luzes que brilhavam no horizonte.

    Aquele automóvel fora o seu mundo, o seu refúgio, a sua companheira reconfortante e gentil. Pedira sempre tão pouco, em troca, e nunca fizera perguntas. Certamente teria uma alma: quase envergonhando-se pensara sempre secretamente sobre isso. E até mesmo chegara a crer, um dia, que fosse verdade. Uma certa manhã, tomou coragem e o perguntou enquanto dirigia, sentindo-se subitamente, para sua surpresa, aliviado de um pouco de sua angústia.

    À primeira vista, aos olhos de outrem, aquela última carícia, dada com gentileza antes de se encaminhar e ao final do dia, pareceria claramente uma saudação: um terno adeus.

    Pouco tempo depois, com uma caneta, o mesmo aconteceu.

    Estava com ele há anos: mantinha nítida a recordação daquele aniversário em que lhe fora presenteada, céus. A baquelite tinha vários e grandes sinais de uso, inimitáveis e preciosas marcas do seu sacrifício. Certa manhã, pegou-se observando-a e sentindo-se injusto por todas as vezes que a considerara um mero objeto, e lembrou o gosto do desânimo no dia em que a perdera, quando, com os olhos semicerrados, ele se percebeu dizendo a si mesmo: Ó caneta, caneta minha, quem sabe o quanto sentes a solidão e quanto estarás sofrendo. Certamente te perguntas como posso ter te esquecido. Perdão. Perdão. Peço-te perdão.

    E assim, de tempo em tempo, de objeto em objeto, começou a aproximar-se das coisas como se fossem vivas. Às vezes mais do que das pessoas, porque convencera-se que as coisas possuíam ainda mais coração.

    Chegara a um ponto em que uma vez aconteceu de o carro estragar e ele se convencia de que estava doente, precisou se controlar, pois além de querer levá-lo a um mecânico, quase quis levá-lo ao hospital.

    Tendo consciência disto, precisou começar a se mascarar, a se moderar na hora de externalizá-lo. Ninguém entenderia este seu hábito.

    Ele por sua vez, às coisas, dedicava seu amor. Como poderia ser diferente?

    O carro, por exemplo: fizeram tantas coisas juntos. Naquela vida sempre igual, muitas vezes injusta, fria, ingrata.

    Como esquecer certas alvoradas incandescente percorrendo os exatos mesmos caminhos, enquanto sonhava com aventuras inimagináveis? Abrigado da chuva torrencial, protegido do vento de tempestade furiosa, aquecido no frio e refrescado no calor escaldante: era sempre ele a protegê-lo, em um mundo inóspito, quando, certas noites, como hoje, a cidade, lá ao fundo, parecida uma enorme espaçonave com milhares de luzes, chegada de um planeta desconhecido.

    Sim: amava as coisas. Poderiam dizer-lhe que estava louco, se quisessem. Ele sabia bem, afinal, como todos acreditam que — tolos — as coisas não são melhores que as pessoas. E não é assim. Basta olhar ao redor, aquilo que acontece: os humanos, eles sim, fazem coisas assustadoras.

    Lentamente, nesse tempo, escureceu e ele chegou ao fim daquela enorme avenida.

    Ajeitou o colarinho e olhou ao redor: à sua direita, distante, a espaçonave urbana. À sua esquerda escuridão profunda: subúrbios ou campos, ou quem sabe o que mais.

    A escolha era simples, no fundo.

    Porque desta vez chega, estava muito cansado. De tudo. Pensar, acordar, de precisar levantar. De fazer todos os dias coisas sem sentido para poder continuar vivo e então fazer ainda mais coisas sem sentido. Constantemente sem sentido.

    Sobravam apenas os crepúsculos, as alvoradas e as coisas para poder sonhar e por fim realmente viver.

    Encaminhou-se decidido por uma pequena estrada de terra. Uma lua brilhante iluminava os campos, ao redor.

    Não se sentia só. Não estava. Tinha algo de importante consigo. Relembrou de quando a pérola d’água que conservava com tanto apego no bolso entrara na cabine e na sua vida. Na manhã anterior, quando o céu estava claro.

    Da janela recém-aberta, de repente, explodiu uma chuva misteriosa. Nem sequer uma nuvem no céu. E acabou encharcando a manga do casaco tanto que, no escritório, ele teve de torcê-lo: inadvertidamente uma enorme gota entrou na garrafinha que utilizava normalmente para carregar seu café. Lavada há pouco, estava sobre a mesa aberta, para secar.

    Colocado o casaco no aquecedor, pegou a garrafa e observou o interior: naquela esfera liquida e oscilante conseguiu enxergar seu próprio reflexo, e foi como reconhecer-se, subitamente.

    Que estranho.

    Recolocou a tampa

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