Lei da Biossegurança: Questionáveis Constitucionalidade e Sustentabilidade
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Sobre este e-book
Entretanto, quanto à referida Lei da Biossegurança, notadamente na parte que trata da atuação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio relativamente às deliberações sobre as atividades relacionadas aos organismos geneticamente modificados, dúvidas foram suscitadas sobre essa observância. Ao fim, concluiu-se, por meio do estudo realizado, que a Lei da Biossegurança, nesse particular, se mostra inconstitucional e distanciada dos ideais de sustentabilidade, o que representa sério problema de insegurança jurídica com reflexo até mesmo nas relações internacionais, pois importam em transgressão de tratados dos quais o Brasil é signatário, e, de mais a mais, essa situação expõe o meio ambiente e a saúde da população brasileira ao risco de danos graves ou irreversíveis, comprometendo a biotecnologia e o potencial dos benefícios que deveriam resultar da engenharia genética, rendendo ensejo, inclusive, a certos cuidados especiais conforme sugeridos, sobretudo quanto ao consumo de produtos derivados de organismos geneticamente modificados, principalmente os transgênicos.
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Lei da Biossegurança - Donizete Araújo
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho versa sobre aspectos da Lei n.º 11.105, de 24 de março de 2005, que é conhecida como Lei da Biossegurança e foi editada com o especial objetivo de regulamentar dispositivos constantes do artigo 225 da Constituição Federal que tratam do meio ambiente (BRASIL, 1988, 2005).
É certo que, nos estados modernos, tidos como estados democráticos de direito, há regras de conduta a regerem as relações dos cidadãos entre si e também perante o próprio estado, de sorte que a existência de tais regras se justifica em razão da alteridade, isto é, em função do outro, porque se um indivíduo vivesse solitariamente e isolado num lugar ermo não se lhe imporia qualquer norma comportamental, posto que, na hipótese, isso não faria sentido, ao menos localmente, mas, globalmente, talvez pudesse haver impacto ambiental a exigir-lhe certa postura.
As regras de conduta de uma população constituem o ordenamento jurídico do respectivo estado e, normalmente, são positivadas, ou melhor, expressas em documentos ou diplomas oficiais, como é o caso do Brasil, cujo modelo adotado provém do sistema germânico-romano que é essencialmente escrito, ao contrário, por exemplo, do sistema anglo-saxão, o chamado common law
, que se baseia em usos e costumes tradicionais dos povos que o adotam, mesmo que isso não esteja formalmente expresso nalgum diploma oficial, porém, em razão da globalização que impõe a interação entre os povos de todo o planeta para diversos fins, esses sistemas jurídicos, forçosamente, já se acham mesclados.
Observa-se que, invariável e necessariamente, há, nos ordenamentos jurídicos dos estados modernos, uma hierarquia entre os mencionados diplomas legais, de modo que um diploma hierarquicamente inferior não pode contrariar o que previsto num diploma hierarquicamente superior, mas, se eventualmente isso ocorrer, o diploma inferior, no que se mostrar contrário ao diploma superior, não pode produzir efeitos e esse ponto reverso deve ser extirpado do ordenamento jurídico pelo próprio estado, mediante o uso de processos adequados.
No topo da hierarquia das normas de um estado democrático de direito, a saber, na posição superior a todas demais normas, está a sua carta constitucional, que é também chamada de carta política, carta de princípios, carta magna ou simplesmente de constituição, a qual consiste na lei maior e as demais não podem dispor em contrário do que nela é estabelecido, sob pena de serem consideradas inconstitucionais e, por conseguinte, poderão vir a ser expungidas do ordenamento jurídico por mecanismo estatal apropriado.
No Brasil, a Carta em vigor, ou seja, a Constituição da República Federativa do Brasil foi promulgada em 5 de outubro de 1988, e ao longo do tempo já sofreu mais de uma centena de emendas, isto é, modificações. No entanto, consoante previsão expressa na própria Carta (artigo 60, § 4º), há certas disposições constitucionais que não podem sofrer modificações, o que significa que não são suscetíveis de emendas e, por isso, são chamadas cláusulas pétreas
, característica essa que é atribuída à relevância dos direitos de que tratam tais disposições, sobretudo sob a óptica social, a fim de proporcionar a necessária segurança jurídica à população em suas relações de diversas naturezas (BRASIL, 1988).
De acordo com essa ordem estatal estabelecida no Brasil, todos os demais diplomas oficiais, tais como leis complementares, leis ordinárias, medidas provisórias e decretos são infraconstitucionais, o que significa dizer que são hierarquicamente inferiores à Constituição e devem observar ao balizamento por ela fixado.
A Constituição Federal, efetivamente, estabelece os princípios que devam ser observados pela legislação infraconstitucional e jamais contrariados.
De tal sorte e considerada a dinâmica social, as normas infraconstitucionais são editadas na medida que se torna necessária a regulamentação de um assunto ou matéria, mas, em tese, observando-se estritamente os princípios estabelecidos pela Constituição.
Logo, para dispor sobre organismos geneticamente modificados – OGM e outros assuntos, foi editada a mencionada Lei n.º 11.105, de 24 de março de 2005, tratada como Lei da Biossegurança, que ora é objeto de análise (BRASIL, 2005).
O presente estudo é efetuado sob a perspectiva do princípio da precaução e foca, principalmente, as atividades concernentes aos OGM que são reguladas pela Lei da Biossegurança, bem assim a atuação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio relacionada com tais atividades.
Com efeito, disposições do referido artigo 225 da Constituição Federal abrigam, de modo implícito, o princípio da precaução, que é de índole transnacional e está estabelecido explicitamente em dispositivo da Lei da Biossegurança como diretriz que deva ser seguida (BRASIL, 1988, 2005).
Nada obstante essa previsão expressa, eis que surge um sério problema, a saber: a Lei da Biossegurança observa efetivamente o princípio da precaução?
A cogitação de resposta negativa a essa indagação suscita a hipótese de inconstitucionalidade de dispositivos da Lei da Biossegurança que tratam da atuação da CTNBio e confere a esta a prerrogativa de deliberar, ao seu próprio talante, se atividades concernentes aos OGM são potencialmente causadoras de degradação do meio ambiente, bem como de não exigir licenciamento ambiental e, por conseguinte, de dispensar a realização de estudo prévio de impacto ambiental – EIA.
A confirmação dessa hipótese, além de representar um grave problema de índole jurídica, desencadeia uma série de outros problemas de naturezas diversas e também de considerável gravidade, quais sejam ambientais, econômicos, políticos e