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CALDAS NOVAS: CIDADE DAS ESCULTURAS
CALDAS NOVAS: CIDADE DAS ESCULTURAS
CALDAS NOVAS: CIDADE DAS ESCULTURAS
E-book352 páginas4 horas

CALDAS NOVAS: CIDADE DAS ESCULTURAS

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Sobre este e-book

Caldas Novas- cidade das esculturas é o sexto livro de Carlos Albuquerque, em que ele expõe suas ideias, que já estão sendo implantadas, para transformar Caldas Novas num museu a céu aberto, com suas esculturas e de outros artistas, para serem apreciadas gratuitamente pela população local e os 3 milhões de turistas que visitam anualmente a cidade. O autor acredita no valor das Artes para a melhoria de vida das pessoas, aumento do nível cultural, uma forma de lazer, bem como a oferta de empregos e renda dos cidadãos com o incremento do Turismo.
O livro é uma autobiografia que conta a trajetória profissional, artística e pessoal, com suas viagens, cursos de Educação Sanitária ministrados em 18 estados brasileiros, trabalho como chefe de projeto da ONU/FAO, em Moçambique, para formação de administradores, extensionistas rurais e formadores para o desenvolvimento rural. Foi pioneiro no uso da televisão para agricultores e é um dos criadores do programa Globo Rural. Recebeu vários prêmios com a Educação Sanitária, sendo o maior deles o 1º lugar no X Concurso Nacional de Inovação na Gestão Pública Federal, em 2005.
Apresenta 130 esculturas originais de sua autoria, coloridas, em estilo moderno, com os seguintes dados: dimensões, materiais usados, nomes das obras, significados de cada obra e local onde pode ser observada. Muitas dessas esculturas participaram de eventos nacionais e internacionais, ganhando prêmios.
O livro é escrito numa linguagem simples, direta e coloquial. São 16 capítulos, entremeados com as fotos das suas esculturas.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento16 de mar. de 2022
ISBN9786553701076
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    CALDAS NOVAS - Carlos Albuquerque

    CAPÍTULO 1

    INFÂNCIA

    Meu nascimento

    Nasci em Curvelo, no centro geográfico de Minas Gerais, em 14 de janeiro de 1944, no fim da Segunda Guerra Mundial. Nasci nesse lugar, meio por acaso, devido ao fato de meu pai, Roberto Montenegro de Albuquerque Lima, ter passado no concurso do Banco do Brasil, naquele tempo um dos empregos mais cobiçados do Brasil; para aqueles que quisessem ser promovidos mais rapidamente, ofereceram vagas, em locais longínquos de São Paulo. Meu pai mostrou um mapa para minha mãe: eram apenas três dias de viagem de trem com algumas baldeações. Ela, que era muito corajosa e boa companheira, topou a parada, casaram e foram para Curvelo.

    Era uma cidade pequena, não tinha casa para alugar e ficaram morando num hotel muito simples, com janelas que, em vez de vidros, tinham papel de jornal; o banheiro era fora, muito desagradável para uma jovem que tivera vida rica na infância. O hotel sempre estava cheio, na maioria com caixeiros viajantes. Na mesa do café da manhã, só tinha uma faca, que era passada de mão em mão.

    Na cidade havia muitas pessoas com bócio ou papo, doença causada pela falta de iodo na alimentação (atualmente as indústrias de sal de cozinha são obrigadas a adicionar o iodo nos seus produtos). E minha mãe, que nunca tinha visto uma pessoa com essa doença, ficava assustada, quando elas vinham pedir comida na janela do hotel.

    Depois de alguns meses meu pai conseguiu finalmente alugar uma casa, porque um outro funcionário do Banco mudou para outra cidade.

    Pessoal de cidade grande faz algumas coisas esquisitas: meu pai resolveu criar galinhas... e comprou um galo para cada galinha. Minha mãe para pegar alguns gravetos e mexer na terra colocava luvas. Para os vizinhos tudo aquilo era motivo de gozação.

    . As galinhas eram soltas e cada vizinho fazia uma marca especial, no corte das asas. Um vizinho emprestou um galo para o meu pai melhorar a qualidade das aves. Meu pai pegou o galo e cortou as penas da asa. O vizinho ficou uma fera, pois era um galo de briga. Tirando esses incidentes iniciais, o relacionamento com os vizinhos era muito cordial. Minha mãe ficou grávida na lua-de-mel (naquele tempo a mulher tinha que casar virgem, e, se não fosse, o casamento podia ser anulado). Enjoou os 9 meses, ficou um palito.

    A mãe do prefeito de Curvelo era a única que tinha uma geladeira em casa e, com pena da minha mãe, guardava para ela maçã e mamão gelados, únicos alimentos que o estômago aceitava. Depois de todo esse sofrimento da minha mãe eu resolvi ver como era a luz do mundo. Foi um parto natural e ela sofreu muitas dores. Mas valeu a pena, pois nasceu um menino muito saudável e bonito (toda mãe fala isso). Aí me lembrei da história da coruja, que falou para o gavião que os filhos dela eram os mais lindos do mundo. O gavião chegou no ninho e viu aquelas avezinhas tão feias e comeu todas.

    Após muitos meses sem ver a família, minha mãe recebeu a visita do meu avô Percy Corbett e da madrinha da minha mãe, Maria Edwiges Pereira Sampaio, minha avó torta, a vovó Quica, Mariquinha, que muito ajudou minha mãe, após a morte de minha avó, Antonieta Marques Leite Corbett, de tradicional família paulistana. Quando minha avó morreu, minha mãe tinha apenas 12 anos de idade. Era a caçula de 5 irmãos, todos mais velhos que ela, alguns já casados e ela ficou meio sem chão. De vez em quando a vó Mariquinha passava algum tempo, ajudando na criação da minha mãe e de sua irmã Maria Cecília, 4 anos mais velha. Toda a família torcia para que o vovô Percy casasse com a vó Mariquinha, mas ele tinha outros planos.

    Minha mãe casou com 21 anos, após se formar no curso Secretarial e meu pai como contador, na época, esses cursos eram considerados de nível médio.

    Logo que se formou minha mãe trabalhou como secretária do Colégio São Paulo, no bairro Perdizes. Muito responsável, trabalhava demais e ganhava pouco, mas tinha todo o apoio da diretora, dona Júlia, que deu a responsabilidade da parte financeira da escola para minha mãe. Acontece que familiares da dona Júlia começaram a se intrometer nos negócios financeiros da escola, e aí minha mãe pediu demissão.

    Meu pai perdeu o pai, quando tinha 15 anos. Era primo em segundo grau da minha mãe, pois suas avós eram irmãs. Naquele tempo as regras morais eram muito rígidas e as mulheres só podiam ir a festas ou ao cinema, acompanhadas de algum membro da família mais velho, a vela. Por isso era muito comum casarem com primos, parentes próximos ou filhos de pessoas conhecidas, com o mesmo nível social ou de educação.

    Meus pais ficaram em Curvelo pouco mais de um ano. Eu tinha poucos meses de vida, quando meu pai foi promovido e transferido para Marília, no estado de São Paulo, bem mais perto da capital paulista, onde moravam todos os parentes. Em Marília ficaram três anos, onde fizeram amizades, algumas duraram décadas. Nessa cidade nasceu meu único irmão, Paulo Renato.

    Minha infância em São Paulo na casa do meu avô

    Depois desse período em Marília, meu pai foi transferido para São Paulo, para a agência central do Banco do Brasil, na avenida São João, onde foi chefe de alguns colegas que entraram com ele no concurso, mas que não quiseram se aventurar em outras plagas mais distantes.

    Quando chegamos a São Paulo meu pai resolveu construir uma casa no bairro Brooklin Paulista Novo, recém inaugurado, com pouca infraestrutura e longe do centro e dos parentes, que achavam um absurdo minha mãe morar lá. Enquanto a casa era construída com financiamento da Caixa Econômica, ficamos morando na casa do meu avô materno, Percy Sidney Corbett, em frente ao Parque Agropecuário da Água Branca.

    Meu avô nasceu em São Vicente, um dos locais mais antigos do Brasil colônia, da época das capitanias hereditárias e vizinho da cidade de Santos, fundada por Braz Cubas, em 1530. Além da naturalidade brasileira, meu avô conseguiu a cidadania inglesa, que era uma condição para trabalhar na Companhia São Paulo Railway, onde seu pai, um engenheiro inglês, veio trabalhar no Brasil, no reinado de Dom Pedro II, para a construção da estrada de ferro Santos- Jundiaí, para escoar a produção de café que seria exportada pelo porto de Santos. Essa ferrovia é uma maravilha de obra de engenharia do fim do século 19, com seus túneis e pontes altíssimas, construídas na Serra do Mar, região de difícil acesso.

    Minha infância no bairro Brooklin Novo Paulista

    Finalmente a casa construída no Brooklin Novo ficou pronta, em 1950. Eram poucos os vizinhos: um do lado com uma senhora bem idosa e dois no fundo, onde moravam famílias francesas. O resto era mato e pasto, onde deixavam soltos cavalos e algumas vacas. Tinha um riacho, no início limpo, mas que depois começou a receber esgoto doméstico clandestino, pois não havia rede pública de água e esgoto. A água era tirada de um poço com bomba elétrica, várias vezes roubada, que ficava perto da cozinha. A fossa ficava no jardim, perto da rua. Quando a fossa enchia era preciso chamar o caminhão limpa-fossa.

    Minha infância foi boa, mas eu sofri muito com doenças de ouvido, garganta e bronquite asmática. Aos dez anos fiquei surdo e precisei operar a garganta (amígdalas e adenóides). Naquele tempo não tinha antibióticos como hoje. Os ouvidos ficavam cheios de pus, doía muito, e o médico tirava o pus com um ferro com algodão embebido de antissépticos. Minha mãe ficava muito orgulhosa com minha coragem de passar por aquele sofrimento todo, sem reclamar.

    Nessa época fiz o exame de admissão ao Ginásio Estadual Professor Alberto Conte, em Santo Amaro, quase sem escutar nada. E o ditado era o item da prova que mais peso tinha. Quase passei (tirei nota 3,5, quando o mínimo eram 4 pontos). Fui operado e em fevereiro de 1955 fiz o exame de segunda época, após fazer um curso rápido com a professora Iraciara, famosa por preparar bem os alunos, e passei em 2º lugar. Quando anunciaram o meu nome e eu tive que me apresentar, ouvi alguém dizer: coitado, tão pequeno com um nome tão grande. Aquilo me incomodou e eu falei para minha mãe que eu queria me chamar Ari Sá.

    Naquele tempo os Colégios do governo estadual eram considerados bons. Particulares bons, eram aqueles tradicionais, destinados aos filhos dos ricos. Mas muitas escolas particulares eram procuradas pelos pais dos alunos que não passaram no exame de admissão ou que iriam ser reprovados durante o curso e iam para os colégios do tipo PP: pagou, passou.

    Depois da operação de garganta tive que fazer durante meses sessões de radioterapia, muito desagradáveis, que até hoje não sei porque e nem para quê. Só fiquei bom da bronquite asmática aos 16 anos, após vários tratamentos, inclusive o BCG (usado no tratamento contra a tuberculose) e a prática sistemática de esporte, principalmente a natação, para abrir o peito e aumentar a capacidade respiratória dos pulmões. Sofri muito com essa doença e minha mãe também, que, muitas vezes passava a noite toda ao meu lado. Eu sofria muito com as brincadeiras de luta livre, em grupo, quando ficavam por cima do meu peito, me deixando sem respirar até eu pedir água, ou seja, desistir da luta.

    No nosso bairro a maioria dos meus amigos era de origem estrangeira: dois chineses (Chu Shao Yong e Lin), três franceses (Guy, Jacques e Michel Pral), um alemão (Horst Dinslage), dois japoneses (Adolfo e Mário Sawada), um italiano (Ângelo Callegari) e somente eu e meu irmão, brasileiros. Quase todos tinham vindo por causa das guerras, na Europa e na Ásia. Foram meus primeiros amigos de infância. Mais tarde, já na adolescência, vieram outros (Falk, alemão, Alain, francês e Eduardo Peixoto Oliveira, brasileiro. Na nossa turma só tinha homens. Era o Clube do Bolinha, onde menina não entrava. De menina só tinha a Ulla, alemã, irmã do Horst e a Cristiane, prima dos franceses. Elas eram mais velhas e não gostavam das nossas brincadeiras de jogar futebol e guerra dos números (tipo esconde-esconde, em que cada jogador tinha um tipo boné de papelão com números; quem acertava o número de 6 dígitos, eliminava o outro; e assim ia até matar o último, que ganhava o jogo.

    Antes dos amigos estrangeiros, meus primeiros amigos eram crianças, que frequentavam a missa dos domingos e a sessão de cinema, à tarde, do Cine Meninópolis, que a gente assistia depois da aula de catecismo. A maioria desses meninos morava em favelas; às vezes iam lá em casa e minha mãe dava lanche e pastéis para eles. Muitos deles não tinham todos os dentes e eu achava que isso é que era bonito. Quando alguém quebrava o braço ou a perna, eu também achava o máximo, pois todos queriam assinar o nome no gesso, ouviam as bravatas de como tinha sido o acidente, enfim o acidentado era o centro das atenções e do carinho dos colegas.

    Desde muito pequeno (6 a 7 anos) eu queria ganhar dinheiro para um dia comprar uma fazenda. Queria ser como os amigos da igreja, que, desde cedo, trabalhavam para ajudar os pais. Eu e meu irmão catávamos esterco seco de cavalo e vaca, esfarelávamos, peneirávamos, ensacávamos e vendíamos para os vizinhos, que achavam bonito dois meninos tão novos já trabalhando. Montei um caixote para engraxar sapatos, só que não conseguia fazer igual ao dos outros, que tinham um formato trapezoidal, onde guardavam os apetrechos. E nem era preciso, pois os vizinhos deixavam seus sapatos na calçada para nós engraxarmos.

    Também fui carregador de feira, pois quando minha mãe ia à feira sempre vinha com um menino carregando a sacola cheia. Minha mãe pagava muito bem e ainda dava alimentos gostosos. Quando ela chegava na feira, era aquela briga para ver quem ia com ela. Isso me incentivou. Sem contar nada, eu ia à feira e carregava sacolas muito pesadas para o meu tamanho. Na hora de receber pelo trabalho era uma ninharia, quase uma esmola. E nada de comidinha, nem água.

    Minha infância na fazenda do meu tio Charles

    Na infância, uma das coisas que mais gostava, era quando éramos convidados para passar as férias na fazenda Monte Olimpo, em Descalvado- São Paulo, cujo proprietário, o doutor Jaime Pereira, catedrático da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo- USP, era o sogro do tio Charles, irmão da minha mãe, também médico e professor da USP. A fazenda era do sogro, mas quem a administrou, por 23 anos, foi o meu tio.

    Iam vários primos e era aquela farra. A tia Leni tinha muita paciência para ficar quase um mês com aquele monte de sobrinhos. Ela era bondosa, mas muito brava e eu morria de medo dela. Eu era muito criativo e gostava de fazer algumas travessuras inocentes. Fiquei uma vez de castigo, sem poder andar a cavalo, nem ir para a piscina, que era um tanque de lavar café. Fiquei magoado porque todos os outros também haviam participado e se divertido. Por que só eu era castigado? O único que foi solidário comigo foi meu irmão, que ficou comigo o tempo todo. Foram duas férias que passei nessa fazenda e penso que pesaram bastante para a escolha da minha profissão de engenheiro- agrônomo, aliadas ao fato de eu ter vivido toda minha infância em contato com a natureza, ainda que numa grande capital.

    CAPÍTULO 2

    ADOLESCÊNCIA EM SÃO PAULO- CAPITAL

    O bairro do Brooklin Novo foi crescendo, com a construção de várias casas, chegada de água encanada, esgoto, telefone fixo. Mas sobrou uma área grande, onde fizemos nosso campinho de futebol e jogávamos todas as tardes, depois de fazer a lição de casa. Os meninos foram se tornando adolescentes, gostando de outras coisas, eu me interessando pelas meninas, pelos bailinhos e pelo basquete. Jogava basquete todos os dias: nas aulas de educação física, na hora do recreio, no clube Banespa e nas férias na quadra do colégio das freiras, que nunca era usada.

    Fui vítima de assaltos

    A turminha começou a gostar de acampar: inicialmente no bairro do Morumbi, no local onde hoje está o estádio do São Paulo Futebol Clube, e, que na época era muito deserto. Íamos de bicicleta, bem cedo e voltávamos no fim da tarde. Por duas vezes fomos assaltados por marginais, que conseguiram levar nosso dinheiro, que era pouco. Num desses assaltos o malandro disse que nós tínhamos andado no seu cavalo e roubado o cabresto. Tentei argumentar que não éramos nós, que ele podia perguntar para uns pedreiros que estavam trabalhando numa obra ali perto e que tinham nos visto. Ele não aceitou. Então eu disse para ele nos cheirar e ver se tínhamos cheiro de cavalo. Ele respondeu que não era do tipo de ficar cheirando homem. Eu sugeri que chamássemos a rádio patrulha, que costumava passar por ali. Ele disse que polícia não prestava e veio com o cavalo para cima de mim. Deu uma chicotada, que arrancou o meu chapéu de palha. Saí correndo, e ele atrás com o cavalo e as chicotadas no ar; tinha uma cerca de arame farpado, que eu voei por cima e não sei como consegui passar para o outro lado da cerca.

    O medo e o perigo nos dão forças, que não sabemos de onde vêm. Nessa corrida desesperada gritei:Manhê, me acuda e os meus amigos ficaram dando risada. Sei que era de nervoso, mas fiquei chateado. Depois que os ânimos se acalmaram, voltei, com as pernas bambas e tremendo muito, novo motivo para eles rirem. O malandro pegou o dinheiro da turma,dizendo que era para pagar o uso do cavalo e o cabresto que sumiu. Perguntei se ele aceitava passe escolar para o ônibus, e quase que ele apelava de novo. Assim que ele foi embora, aqueles amigos covardes começaram a contar vantagem, que podiam ter derrubado o assaltante do cavalo, dado uma surra nele e outras bravatas, que me deixaram com muita raiva, além das risadas que deram, quando eu estava sendo perseguido.

    A Juventude Estudantil Católica- JEC

    Na infância e adolescência fui muito ligado à Igreja Católica. Não faltava à missa, nem ao Catecismo, procurava seguir os ensinamentos de Jesus Cristo e até ganhei medalha de bronze numa competição sobre religião.

    Aos dezesseis anos entrei para a JEC- Juventude Estudantil Católica, ramo pertencente à Ação Católica, posteriormente extinta pelo papa Paulo VI. Nessa época participei de acampamentos, onde conheci o padre Romeu Alberti, que depois foi nomeado bispo auxiliar de São Paulo. Com ele aprendemos a vivência do cristianismo no dia-a-dia, na prática. À noite, no acampamento, tinha uma reunião para se fazer a avaliação do dia, em que cada um relatava o que fez de bom, onde errou; também se podia criticar ou elogiar o ato de outro companheiro. Ao final o padre Alberti fazia um balanço do dia e todos iam dormir.

    No dia seguinte todos trabalhavam, preparando as refeições, lavando a louça, limpando e arrumando os quartos e barracas. Depois era jogar futebol, nadar, ir até a cidade, pescar. Aprendi muito com ele, como ser cristão no convívio diário com outras pessoas.

    Depois da volta às aulas, tínhamos que dar o testemunho cristão, fazer a "nucleação’’, através de conversas e reuniões, visando trazer novos membros para o nosso grupo. Como me destaquei nesses trabalhos fui convidado para fazer parte da equipe diocesana, que coordenava as ações de todas as equipes da capital. Depois de muito pensar, resolvi não aceitar o convite, pois teria que abdicar dos jogos de basquete do campeonato paulistano, onde joguei pelo Esporte Clube Banespa, por dois anos (1960 e 61) até ir para a faculdade. Como as reuniões eram feitas aos sábados e iam até quase meia noite, eu iria perder os jogos do campeonato, os bailinhos e a oportunidade de namorar. Mas o convite me encheu de orgulho.

    Os bailinhos

    Nos bailinhos, que ocorriam nas casas de família, eu e meu irmão, no início das festas, tirávamos para dançar aquelas meninas feinhas ou sem graça, que nunca eram convidadas para dançar, para fazer as nossas boas ações. Algumas eram simpáticas, sabiam conversar, eram alegres; outras eram chatas e antipáticas e por isso tomavam chá de cadeira. Depois dessa ação solidária, íamos tentar conquistar aquelas meninas mais interessantes.

    Naquele tempo os costumes eram muito rígidos: se uma menina fosse muito assanhada, ficasse no agarra-agarra, ela era mal vista, mal falada, não servia para casar.

    Uma coisa que eu achava divertida era furar festa, ou seja, entrar em festa, com dança, em que nós não tínhamos sido convidados. Com meu irmão e alguns amigos que sabiam dançar, íamos ao local e procurávamos algum amigo, que nos pusesse para dentro da casa, nos apresentasse e então éramos bem recebidos. Certa vez entramos numa festa, em que eu não conhecia ninguém. Dançando com uma garota, perguntei quem era a dona da casa. Adivinha quem era ela? A própria. Eu não tinha onde botar a cara. Aí ela me agradeceu, pois a nossa turma alegrou a festa e ainda fomos convidados para participar de outras festas da turma dela.

    Meus primeiros trabalhos sociais

    Por causa dos trabalhos com a Igreja Católica comecei a despertar para os problemas sociais e tentar ajudar os outros. Perto de casa tinha um casarão abandonado, um cortiço, em que moravam várias famílias, com muitas crianças. Reuni vários amigos da turminha e começamos a arrecadar roupas e alimentos para dar para o pessoal do cortiço. Muita gente cooperou. Davam roupas estrangeiras muito boas, melhor do que as nossas. Dava até vontade de pegar algumas. Mas nada, pois os princípios de honestidade em que fomos criados não permitiam isso. Levávamos as roupas e comida e as deixávamos lá, sem fazer alarde nem discurso e íamos embora. Eles faziam a maior festa, mas não sei como era feita a distribuição, nem me preocupava com isso. O importante era o gesto de querer ajudar.

    Me lembro de um menino negro, que tinha problemas no ouvido, que sempre estava purgando e doía muito. Eu conhecia bem esse problema. Procurei ajuda médica, pois eu não tinha condição de pagar consulta. Depois de bater em várias portas, encontrei um médico de Santo Amaro, com consultório perto do colégio em que eu estudava, que se dispôs a tratar o menino, que eu levava de ônibus. Depois eu mudei de cidade e fui fazer a Faculdade em Piracicaba e quem levava e trazia o menino era meu irmão. Acho que o menino ficou bom, mas nunca mais tive

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