Pressupostos Teórico-Metodológicos e Políticos da Cidadania dos Bebês: Contribuições de Fúlvia Rosemberg
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Pressupostos Teórico-Metodológicos e Políticos da Cidadania dos Bebês - EDUC – Editora da PUC-SP
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
Reitora: Maria Amalia Pie Abib Andery
Editora da PUC-SP
Direção
José Luiz Goldfarb (até 28/2/2021)
Thiago Pacheco Ferreira (a partir de 1°/3/2021)
Conselho Editorial
Maria Amalia Pie Abib Andery (Presidente)
Carla Teresa Martins Romar
Ivo Assad Ibri
José Agnaldo Gomes
José Rodolpho Perazzolo
Lucia Maria Machado Bógus
Maria Elizabeth Bianconcini Trindade Morato Pinto de Almeida
Rosa Maria Marques
Saddo Ag Almouloud
Thiago Pacheco Ferreira (Diretor da Educ)
Frontispício© 2022 Maria Luiza Rodrigues Flores e Marta Lúcia da Silva. Foi feito o depósito legal.
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Reitora Nadir Gouvêa Kfouri / PUC-SP
Pressupostos Teórico-Metodológicos e Políticos da Cidadania dos Bebês: Contribuições de Fúlvia Rosemberg. - São Paulo : EDUC.
Bibliografia
1. Recurso on-line: ePub
ISBN 978-65-87387-79-6
Disponível para ler em: todas as mídias eletrônicas.
Acesso restrito: http://pucsp.br/educ
Disponível no formato impresso: Pressupostos Teórico-Metodológicos e Políticos da Cidadania dos Bebês: Contribuições de Fúlvia Rosemberg. - São Paulo : EDUC, 2022. ISBN 978-85-283-0644-6
1. Rosemberg, Fúlvia, 1942-2014. 2. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social. Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade. 3. Bebês - Cuidado e tratamento. 4. Creches. 5. Direitos das crianças. 6. Educação de crianças. 7. Cidadania. I. Flores, Maria Luiza Rodrigues. II. Silva, Marta Lúcia da.
CDD 361.712
371.21
346.0135
Bibliotecária: Carmen Prates Valls – CRB 8A./556
Este livro teve o apoio da Fundação Carlos Chagas.
EDUC – Editora da PUC-SP
Direção
José Luiz Goldfarb (até 28/2/2021)
Thiago Pacheco Ferreira (a partir de 1°/3/2021)
Produção Editorial
Sonia Montone
Revisão
Otacílio Nunes
Projeto Gráfico e Diagramação
Fábio Cesar Oliveira Bernardino
(Núcleo de Comunicação da Fundação Carlos Chagas)
Editoração Eletrônica
Gabriel Moraes
Waldir Alves
Capa
Graciele Almeida de Oliveira e Fábio Cesar Oliveira Bernardino
(Núcleo de Comunicação da Fundação Carlos Chagas)
Administração e Vendas
Ronaldo Decicino
Produção do e-book
Waldir Alves
Revisão técnica do e-book
Gabriel Moraes
Rua Monte Alegre, 984 – sala S16
CEP 05014-901 – São Paulo – SP
Tel./Fax: (11) 3670-8085 e 3670-8558
E-mail: educ@pucsp.br – Site: www.pucsp.br/educ
Prefácio
Sandra Unbehaum
Socióloga, doutora em Educação: Currículo (PUC-SP), pesquisadora da Fundação Carlos Chagas
O livro Pressupostos teórico-metodológicos e políticos da Cidadania dos Bebês: contribuições de Fúlvia Rosemberg é uma coletânea marcada por memória afetiva e acadêmica. Cada uma das autoras, cada um dos autores fez desta produção um projeto de vida pessoal e profissional que envolveu inúmeros desafios, o mais importante deles o de honrar o legado da mentora professora doutora Fúlvia Rosemberg, idealizadora do Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade (Negri), vinculado, desde os anos 1990, ao Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Cabe destacar a dupla coordenação teimosa
, de quem sempre persiste nas lutas nas quais acredita: Maria Luiza Rodrigues Flores e Marta Lúcia da Silva.
O desafio envolveu três anos de dedicação na organização do conjunto de textos aqui apresentados pela busca de rigor científico, teórico, metodológico e político em temas muito caros à Fúlvia Rosemberg para, assim, dar voz aos sujeitos sociais como as crianças e os bebês e consolidar, por meio de grupo de orientandas(os) brancas(os) e negras(os), mais de uma década de pesquisa coletiva do Negri. Outro importante desafio superado foi o de buscar meios para a publicação, sobretudo em um contexto recente de dificuldades para apoio à pesquisa no campo das humanidades e à divulgação científica. Um salve para a Educ – Editora da PUC-SP.
Fruto do trabalho coletivo, o livro traduz um dos princípios que regia, melhor dizendo, ainda rege o Negri desde a sua criação há quase quatro décadas. Na minha memória afetiva, de quem participou desse grupo, por meio de disciplinas ministradas por Fúlvia, em dois momentos distintos, o primeiro deles em seu início, anos noventa, quando mestranda em sociologia pela USP, e mais recentemente, em 2011, como doutoranda em Educação: Currículo na PUC-SP, visualizo, nesta publicação, o legado dela, no seu jeito de ser e viver ao reunir em torno de si jovens mulheres e homens fortemente interessados em pesquisar problemas sociais relevantes e contribuir, a partir de evidências, para a superação de desigualdades históricas na realidade brasileira, em particular, aquelas que afetam o direito à educação. O Negri produziu dissertações e teses sobre discursos enunciados por diferentes atores sociais brancos e negros e sobre as crianças e, em especial, os bebês, sua educação e cuidado em contexto público, visando a colaborar para a agenda de políticas públicas e para o campo dos estudos sociais da infância e das relações raciais.
A esse grupo de pesquisadoras e pesquisadores do Negri se reuniram com outras estudiosas e interlocutoras de uma vida toda de Fúlvia Rosemberg, como Maria Malta Campos, parceira de importantes projetos na FCC ao longo de mais de 40 anos de convivência e amizade; Ana Lúcia Goulart de Faria e Ana Maria Mello, Maria Carmen Silveira Barbosa, as quatro juntas conformam uma geração de mulheres ativistas, pesquisadoras do campo da educação e da infância, que, com Fúlvia Rosemberg, são referências incontestes para várias gerações de pesquisadoras(es) e muito contribuíram para avanços nas políticas educacionais da primeira infância, dando-nos a certeza de que toda vida vivida a favor da justiça social e dos direitos humanos sempre valerá a pena. Nesse universo não poderia deixar de estar Rita de Cássia Freitas Coelho, que, por meio de entrevista, contribui com um registro da história recente das políticas para a educação infantil brasileira, nota necessária para a memória das e dos que ainda virão.
Apresentação
Ana Mercês Bahia Bock
Psicóloga e professora titular na PUC-SP
Pressupostos teórico-metodológicos e políticos da Cidadania dos Bebês: contribuições de Fúlvia Rosemberg
Fúlvia Maria Mott Rosemberg era e é sinônimo de coragem. Coragem para pensar grande, para enfrentar o pensamento tradicional instalado, em suas limitações e conservadorismos; coragem para buscar novas referências e utilizá-las a partir de um diálogo crítico com elas; coragem para enfrentar, a partir da ciência, tudo que for autoritarismo, desigualdade e desvalorização do outro; coragem para unir o fazer científico rigoroso com o posicionamento de uma cidadã que afirma a natureza política de tudo que se faz na vida coletiva, inclusive a ciência. Esta era Fúlvia.
Nascida em 6 de outubro de 1942 e falecida em 12 de setembro de 2014, Fúlvia fez, de seus quase 72 anos de vida, uma trajetória de luta. Abriu espaços importantes para o debate e o enfrentamento do pensamento conservador; atuou, levando consigo resultados de pesquisa que lhe deram sempre o respaldo necessário no debate e na intervenção.
Uma de suas importantes iniciativas foi a criação do Negri – Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade, na PUC de São Paulo. Foi daquele lugar que a PUC-SP e a sociedade brasileira viram Fúlvia reunir estudantes de pós-graduação e, como parceira, ajudá-los na produção de conhecimento de modo rigoroso e de forma crítica. Era uma cientista que compreendia, de modo radical, a necessidade de uma ciência pautar-se sempre, sem descanso ou descaso, em teorias e em um método.
Assim eu conheci Fúlvia. Posicionada politicamente, embasada em suas pesquisas, usou sua própria voz para falar em nome de mulheres, negros, indígenas e crianças em situações vulneráveis ou desvalorizadas e silenciadas pela sociedade. Com ela, esteve o Negri. Estudantes que chegavam, muitas vezes, sem saber ainda o que estudar e pesquisar. Ao encontrarem Fúlvia como orientadora, não levavam muito tempo para entender o papel da ciência na sociedade, os desafios que enfrentam os cientistas e a necessidade de uma ciência comprometida com o fim da exploração, da dominação, da desigualdade e do pensamento colonizado.
Esta publicação é, sem dúvida, uma declaração de reconhecimento. São ex-orientandas(os) e pesquisadoras(res) do tema central do Negri que escrevem os doze capítulos que a compõem, buscando coletivamente registrar e possibilitar acesso aos Pressupostos teórico-metodológicos e políticos da Cidadania dos Bebês: contribuições de Fúlvia Rosemberg.
Na primeira parte do livro, intitulada "Bases teórico-metodológicas da ‘Cidadania dos Bebês’, segundo Fúlvia Rosemberg, estão artigos de ex-orientandas(os). São sete capítulos envolvendo nove pesquisadores. Na segunda parte, intitulada
Contribuições de pesquisas sobre o direito dos bebês à educação", estão cinco artigos envolvendo nove pesquisadoras de grande relevância e força no campo. O último capítulo dessa parte traz uma entrevista realizada por duas autoras que conversam com Rita de Cássia Freitas Coelho, fortalecendo a afirmação dos demais capítulos de garantia dos direitos à educação para todas as crianças.
Na parte 1, o primeiro capítulo está assinado por Flores e Silva e traz os pressupostos teórico-metodológicos da Cidadania dos Bebês, sistematizando elementos do pensamento e legado de Fúlvia Rosemberg no que tange à conceituação e à delimitação do campo de estudos e pesquisas por ela denominado Cidadania dos Bebês. A metodologia utilizada foi a análise documental, a partir do resgate e da sistematização de um conjunto de proposições teórico-metodológicas registradas em artigos, palestras, entrevistas e documentos sobre o tema, ao longo da trajetória de Fúlvia. Além das ideias originais da autora, o artigo apoia-se em dados decorrentes de pesquisa coletiva por ela coordenada no Negri – PUC-SP, articulando estudos de mestrandos(as) e doutorandos(as) desse Núcleo, que problematizam a posição social de subordinação ocupada pelo bebê no que se refere ao seu direito à creche e ao seu lugar na agenda brasileira de políticas educacionais, a partir da análise de discursos proferidos por diversos atores sociais adultos, inclusive nas mídias. O capítulo indica as principais teorias utilizadas pelo Negri que foram os estudos sociais da infância, compreendendo esta como uma construção sócio-histórica e a criança como um sujeito de direitos, ator social, ativo e produtor de cultura. Apresentam, ainda, o diálogo e a referência na ideologia e hermenêutica de profundidade de Thompson (2009). Concluem sobre a originalidade e a relevância da abordagem utilizada por Fúlvia para subsidiar o campo da educação infantil nas diversas disputas presentes na agenda social de defesa dos direitos dos bebês à educação e ao cuidado no espaço público e à superação de desigualdades.
O segundo capítulo, assinado por Ribeiro e Santos, apresenta as contribuições de Thompson aos estudos do Negri. Apresenta o percurso teórico-metodológico de Thompson e suas contribuições para a compreensão da subordinação de idade no contexto das políticas públicas brasileiras para a infância. As autoras explicitam compromisso com a busca da superação de desigualdades sociais relativas às questões etárias que, historicamente, em nosso País, têm colocado o bebê em uma posição de subalternidade. Diversas instituições culturais forneceram base importante para a acumulação dos meios de informação, de comunicação, de recursos materiais e financeiros, forjando os meios com os quais as informações e os conteúdos simbólicos são produzidos e distribuídos pelo mundo social, contribuindo com condições para a intrusão mediada de mensagens ideológicas nos contextos práticos da vida cotidiana.
O terceiro capítulo, assinado por Secanechia, relata estudo que, analisando documentos vinculados a algumas instituições que compuseram a amostra, pesquisa os discursos sobre o bebê e a creche captados em cursos de pedagogia da cidade de São Paulo. Também baseado nas contribuições de Thompson, os dados evidenciam que os discursos captados nos cursos de pedagogia, entendidos como produtores e receptores de formas simbólicas, ainda situam os bebês em posição de subalternidade em relação às demais etapas da vida. A partir das conclusões do estudo, o capítulo apresenta sugestões aos diversos atores sociais e instâncias responsáveis pelos cursos de pedagogia, no sentido de contribuir para a melhor qualificação da formação inicial do(a) professor(a) de educação infantil.
O quarto capítulo está assinado por Torres e analisa a visibilidade pública dos bebês e o direito à creche no Brasil. São apresentadas as ideias dos principais autores que pesquisam a construção dos problemas sociais e enfatiza-se o papel da mídia nesse processo nas sociedades contemporâneas. A questão que se coloca é a baixa visibilidade pública dos bebês e das crianças pequenas – do direito à creche de qualidade –, temática esta que não se constrói enquanto problema social no Brasil. Rosemberg (2009) e Gottlieb (2009) são apontadas como duas autoras que oferecem importantes pontos de reflexão sobre essa questão ao teorizar a respeito da reduzida oferta de educação pública gratuita e de qualidade às crianças de 0 a 3 anos e sobre a exígua produção acadêmica referente a esse grupo etário.
O quinto capítulo, assinado por Reis, trata da educação infantil em área rural. No Brasil, a criança de zero a três anos pertence a um tempo social discriminado, no campo tanto acadêmico, como político. A metodologia do estudo que dá origem a esse artigo incluiu a realização de entrevistas semiestruturadas com três mães de bebês ou crianças pequenas de até três anos de idade residentes na região rural de Pouso Alegre, estado de Minas Gerais. Como nas outras pesquisas realizadas no Negri, buscou-se ampliar a visibilidade da criança pequena, inserindo o tema na agenda de políticas públicas de educação. O aporte teórico foram os estudos sociais da infância, a partir de uma concepção de infância como construção social e da criança como um ator social e sujeito de direitos. A noção de habitus, de Pierre Bourdieu, também foi utilizada, possibilitando entender como se dão a socialização e a sua influência nas escolhas dos indivíduos. Os resultados mostraram que as mães participantes dessa pesquisa compreendem a creche pública como espaço apropriado para a educação e o cuidado dos bebês; além disso, elas a consideram como local que deve proporcionar tranquilidade para que trabalhem sem a culpa de submeter os filhos, ainda pequenos, a grande carga de sofrimento. Concluiu-se do estudo que, além das relações de gênero, de raça e de idade, a situação de domicílio familiar também sustenta relações de desigualdade social.
O sexto capítulo, assinado por Borges, apresenta resultados de pesquisa que investigou concepções de diretoras de centros de educação infantil paulistanos, sobre creche, educação e cuidado de crianças de até 3 anos. O aporte teórico foi constituído à luz da teoria de Thompson (2011) e dos novos estudos sociais da Infância. No campo metodológico, foi usada a hermenêutica de profundidade, proposta por Thompson (2011) e a técnica de análise de conteúdo desenvolvida por Bardin (1977). Os principais resultados revelaram que, apesar das inúmeras dificuldades enfrentadas, a creche da rede direta foi associada à melhor opção de educação e cuidado, a ser ofertada como um dever do Estado e um direito do bebê, sendo considerada, pelas entrevistadas, como espaço coletivo de melhor padrão de atendimento, sobretudo por contar com docentes qualificados, formação continuada e serviços especializados.
O sétimo capítulo, assinado por Santos, traz análise dos discursos sobre o bebê e a creche na propaganda eleitoral de 2012 de 12 candidatos(as) à prefeitura do município de São Paulo. O referencial teórico foi constituído através da teoria de ideologia de Thompson (1995) e dos estudos sociais da Infância. O campo metodológico foi formado pela: hermenêutica de profundidade, de Thompson (1995), e pela técnica de análise de conteúdo de Bardin (1977). Apresenta-nos a conclusão de que, nesses discursos, aparecem dois modos de operação da ideologia: dissimulação em relação à criança que foi apresentada de forma genérica, esmaecida, nomeada por poucos termos não indicando sua idade, e a reificação da creche como um serviço dedicado à população mais carente.
A segunda parte da publicação, Contribuições de pesquisas sobre o direito dos bebês à educação
, inicia-se (no capítulo 8) com Campos que reflete sobre bebês e crianças pequeninas no contexto das políticas sociais. O texto analisa a situação de bebês e de crianças pequenas no País, a partir do lugar social que ocupam na família, nas políticas de educação infantil e, mais recentemente, no contexto das políticas voltadas à pequena infância. Destaca o impacto que mudanças na estrutura familiar, na expansão desigual da cobertura na educação infantil e na evolução da demanda por esse atendimento tem tido sobre a situação das crianças pequenas em uma realidade marcada por grande desigualdade social.
O nono capítulo, assinado por Silva, Faria e Macedo, afirma a dialética que caracteriza as crianças e o papel ativo que cumprem na história e na cultura. O texto aborda como as crianças constroem as culturas infantis, a vida social, como exploram o meio natural, como estabelecem múltiplas relações, como negociam papéis e como inter-relacionam pensamento e ação enquanto brincam. Indica como uma pedagogia da escuta, das relações, da diferença, deve estar atenta às culturas infantis produzidas pelas crianças pequenininhas em espaços coletivos de educação infantil. Ao frequentar a creche, as crianças ampliam seu espaço social e devem ser reconhecidas como sujeitos de direito e tratadas(os) como cidadãos(ãs) de pouca idade.
O décimo capítulo, assinado por Barbosa, Gobbato e Boito, pesquisadoras em programas de pós-graduação da região Sul do Brasil, situa reflexões de Fúlvia Rosemberg sobre o tema bebês e crianças bem pequenas, seu cuidado e educação em creches e apresenta ideias-chave das pesquisas realizadas nessa região, incluindo inovações metodológicas e teóricas sobre os bebês e formas de trabalho no campo da educação.
O décimo primeiro capítulo, assinado por Mello, apresenta alguns modos de acolhimento para a criança pequena na cidade de São Paulo, relacionando-os às práticas aí desenvolvidas. A metodologia envolveu a análise de vários sites de órgãos oficiais de São Paulo, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), bem como a análise do Relatório de Ampliação de Vagas, publicado pelo Fórum Municipal de Educação Infantil; artigos publicados na mídia que evidenciavam o desafio para a criação de novas vagas nessa cidade. Os resultados apontados destacam os inconvenientes das práticas informais e afirmam a possibilidade de organizar formalmente diferentes modos de acolhimento e atenção na cidade de São Paulo.
E, por fim, o capítulo décimo segundo que apresenta a entrevista com Rita de Cássia Freitas Coelho realizada por Craidy e Flores. A entrevistada esteve à frente da coordenação geral da educação infantil na Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (Coedi/SEB/MEC). Sem dúvida, a entrevista, ao resgatar um período da trajetória da educação infantil no País, completa a contribuição do conjunto de artigos na tarefa de evidenciar o importante papel de Rosemberg.
Um livro que representa e reconhece a significativa contribuição de Fúlvia Rosemberg. Em cada pesquisa das ex-orientandas(os) e na contribuição à reflexão de cada pesquisadora ouve-se a voz de Fúlvia. E, seguindo princípios que a guiavam em todas as suas atividades, o livro espalha o pensamento crítico sobre a cidadania dos bebês, enfrentando ideologias. Ao ler essas contribuições, Fúlvia se fará presente.
Fúlvia Rosemberg, PRESENTE!
Referências
BARDIN, Laurence (1977). Análise de conteúdo. Lisboa, Edições 70.
GOTTLIEB, Alma (2009). Para onde foram os bebês? Em busca de uma antropologia de bebês (e de seus cuidadores)
. Psicologia US. São Paulo, 20(3), jul./set., p. 313-336.
ROSEMBERG, Fúlvia (2009). A educação infantil brasileira: tendências e desafios. Instituto Nacional de Formación Docente del Ministerio de Educación de la República. Argentina: Insitu (curso on line) (mimeo).
THOMPSON, John Brookshire (1995). Ideologia e cultura moderna: teoria social e crítica na era dos meios de comunicação de massa. 4. ed. Petrópolis, Vozes.
______ (2009). Ideologia e cultura moderna: teoria social e crítica na era dos meios de comunicação de massa. Petrópolis, Vozes.
SUMÁRIO
Parte I
Bases teórico-metodológicas da Cidadania dos Bebês, segundo Fúlvia Rosemberg
1. Pressupostos teórico-metodológicos da Cidadania dos Bebês: contribuições de Fúlvia Rosemberg para pensar o direito humano à educação
Maria Luiza Rodrigues Flores e Marta Lúcia da Silva
2. Contribuições de John B. Thompson aos estudos do Negri
Maria Sílvia Ribeiro e Carla Pellicer dos Santos
3. Discursos sobre o bebê e a creche captados em cursos de Pedagogia da Cidade de São Paulo: uma interpretação à luz da ideologia de Thompson
Lourdes Pereira de Queiroz Secanechia
4. A visibilidade pública dos bebês e o direito à creche no Brasil: a construção de um problema social
Maria Eduarda Abrantes Torres
5. Educação infantil em área rural, uma questão de habitus
Maurício Muniz Reis
6. Discursos e concepções de diretoras de Centros de Educação Infantil paulistanos sobre creche, educação e cuidado de crianças de até 3 anos
Rosana Capputi Borges
7. Discursos sobre bebê e creche na propaganda eleitoral de 2012
Ângela da Cruz Santos
Parte II
Contribuições de pesquisas sobre o direito dos bebês à educação
8. Bebês e crianças pequeninas no contexto das políticas sociais
Maria Malta Campos
9. As crianças pequenininhas e a dialeticidade do brincar
Elina Elias de Macedo, Ana Lúcia Goulart de Farias e Adriana Alves Silva
10. Os bebês e as crianças bem pequenas: visibilidade em pesquisas acadêmicas educacionais
Maria Carmen Silveira Barbosa, Carolina Gobbato e Crisliane Boito
11. Algumas reflexões sobre modos de acolher crianças de até 3 anos
Ana Maria Mello
12. Políticas públicas para a educação infantil: diálogos para avançarmos Entrevista com Rita de Cássia Freitas Coelho
Entrevistadoras: Carmen Craidy e Maria Luiza Rodrigues Flores
Sobre autoras e autor
PARTE I
Bases teórico-metodológicas da Cidadania dos Bebês, segundo Fúlvia Rosemberg
1
Pressupostos teórico-metodológicos da Cidadania dos Bebês: contribuições de Fúlvia Rosemberg para pensar o direito humano à educação
Maria Luiza Rodrigues Flores
Marta Lúcia da Silva
Apresentação
Este texto tem como objetivo sistematizar elementos do pensamento e do legado de Fúlvia Rosemberg (1942-2014) no que tange à conceituação e à delimitação do campo de estudos e pesquisas por ela cunhado como Cidadania dos Bebês, enfocando especificamente o direito humano à educação. A metodologia utilizada por nós contemplou basicamente a análise documental, a partir de: (1) resgate e sistematização de um conjunto de proposições teórico-metodológicas registradas em artigos, palestras, entrevistas e documentos sobre o tema, ao longo da trajetória dessa pesquisadora e ativista; (2) dados decorrentes de pesquisa coletiva por ela coordenada no Núcleo de Estudos de Gênero, Raça e Idade (Negri – PUC-SP), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social, cujo enfoque recaiu sobre a compreensão de problemas sociais. Esta linha de pesquisa está alinhada às características históricas da PUC-SP – dialogando com as questões sociopolíticas, que se propõem a discutir no campo acadêmico os problemas sociais evidentes, que necessitam de enfrentamento e mobilizam a sociedade brasileira (PUC-SP, 2019).
Os estudos incluídos neste livro, que foram elaborados por mestrandos/as e doutorandos/as do Negri, dialogam entre si ao problematizarem a posição social de subordinação ocupada pelo bebê na sociedade no que se refere ao seu direito à creche e ao lugar do mesmo na agenda brasileira de políticas educacionais, a partir da análise de discursos proferidos por diversos atores sociais adultos, inclusive nas mídias. Para a sustentação teórica das pesquisas do Negri foram utilizados aportes dos Estudos Sociais da Infância, compreendendo essa última como uma construção social e a criança como um sujeito de direitos, ator social, ativo, competente e produtor de cultura. Complementam o aporte teórico-metodológico do grupo os estudos sobre Ideologia e Hermenêutica de Profundidade de John B. Thompson (2009).
Este resgate do trabalho do Negri está organizado em duas seções: na próxima, trazemos uma breve apresentação de Fúlvia Rosemberg com a descrição dos processos de estudo e pesquisa do Negri, desenvolvidos como uma pesquisa coletiva sobre a Cidadania dos Bebês. Na sequência, encontra-se uma segunda seção na qual discorremos sobre duas abordagens que embasaram o trabalho do grupo, a saber, os Estudos Sociais da Infância e as ideias de John B. Thompson (2009) concernentes à Ideologia e Hermenêutica de Profundidade. Contextualizando a teoria, colocamos em diálogo alguns dados sobre a oferta de creche no Brasil em anos recentes, de maneira a situar a relevância que o tema precisa ter na agenda dos problemas sociais e a pertinência e adequação da teoria escolhida por Rosemberg para a fundamentação do conceito de Cidadania dos Bebês.
Por fim, retomamos os objetivos do texto com uma conclusão sobre as contribuições de Rosemberg para que hoje continuemos entendendo o direito humano à educação como algo que precisa considerar todas as crianças, desde os bebês.
Fúlvia Rosemberg, o Negri e a pesquisa coletiva sobre Cidadania dos Bebês
Fúlvia Maria de Barros Mott Rosemberg é seu nome completo, mas a autora assinava sua produção intelectual como Fúlvia Rosemberg. Reconhecida no meio acadêmico como uma das mais importantes pesquisadoras e ativistas brasileiras na defesa dos direitos de cidadania dos bebês e das crianças pequenas em relação à educação pública, Rosemberg também se dedicou ao trabalho incansável na defesa da igualdade de gênero para as mulheres e da igualdade nas relações étnico-raciais.
Nascida em 6 de outubro de 1942 e falecida aos 71 anos, no dia 12 de setembro de 2014, na cidade de São Paulo, em 1965, Rosemberg formou-se em Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP) e iniciou seu doutorado no mesmo ano em Psychobiologie de l’Enfant, na École Pratique des Hautes Etudes/Université de Paris, concluído em 1969. Trabalhou por 34 anos como pesquisadora na Fundação Carlos Chagas (FCC) e como professora na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), onde criou e coordenou o Negri, por 22 anos, sendo este institucionalizado desde 1992 junto ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Desde a década de 70, com os primórdios do Movimento de Mulheres no Brasil, até 2014, quando veio a falecer, Rosemberg desenvolveu uma forte discussão na academia sobre esses três temas de pesquisa, sendo que a articulação entre eles contribui para os estudos do Negri no sentido de evidenciar a sobreposição de algumas das principais desigualdades sociais que colocam os bebês em desvantagem na agenda de políticas públicas. Por sua vez, os estudos por ela desenvolvidos, coordenados ou orientados contribuíram e ainda contribuem significativamente para o desenvolvimento de pesquisas na Psicologia, especialmente na Psicologia Social, na Educação, dentre outras áreas do conhecimento científico.
Nas diversas publicações ao longo de sua carreira, a autora abordou conceitos que reafirmam a necessidade de que o país assuma a efetivação da Cidadania dos Bebês, ou seja, passe a considerar na prática, e não apenas em documentos, os bebês como pessoas e cidadãos de direitos na sociedade, pois, de fato, estes geram contribuições materiais/econômicas, mas não usufruem igualmente de seus direitos constitucionais.
Durante o percurso marcante de Rosemberg na academia, de acordo com um levantamento de Amélia Artes sobre a trajetória da pesquisadora, esta realizou, entre os anos de 1987 e 2014, um total de 58 orientações de mestrado e doutorado; teve 95 artigos publicados entre 1973 e 2014; escreveu 102 livros e capítulos de livros entre os anos de 1976 e 2014 e realizou 128 apresentações de trabalhos entre os anos de 2000 e 2014¹. As publicações da autora encontram-se nas principais plataformas de consultas: Scielo, Tede PUC-SP, Repositório CRPSP, Google Acadêmico, entre outros, deixando um legado para atuais e novas gerações de pesquisadores/as.
O Negri foi estabelecido por Rosemberg como um importante espaço de estudos, discussões e reflexões intensas sobre o ato de pesquisar e a formação de pesquisadores/as, constituindo-se a partir de encontros formais e informais em torno dos eixos desigualdades de gênero, raça e idade e, principalmente, de fortalecimento de um arcabouço teórico apara a sustentação da defesa dos direitos dos bebês e da infância. Em conjunto, o trabalho coletivo no âmbito do Negri se desenvolvia de maneira