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Formação de Trabalhadores: Reflexões Contra-Hegemônicas
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Formação de Trabalhadores: Reflexões Contra-Hegemônicas
E-book224 páginas2 horas

Formação de Trabalhadores: Reflexões Contra-Hegemônicas

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Sobre este e-book

A presente obra busca partilhar reflexões e algumas experiências formativas de caráter contra-hegemônico sobre a educação e a formação de trabalhadores com vistas à construção de interpretações e enfrentamentos às contradições do capitalismo. Assim, são abordados nesta obra as condições precárias de trabalho, o tratamento indigno aos trabalhadores privados de liberdade, a falsa inclusão educativa de trabalhadores por meio de recursos tecnológicos. Mas são também evidenciadas a reação de pessoas trabalhadoras terceirizadas e precarizadas e suas lideranças emergentes, a atuação de redes de solidariedade e defesa da educação como direito, tanto em âmbito nacional quanto internacional, e, ainda, as contribuições políticas e pedagógicas da Pedagogia da Alternância e a explicitação de atividades extensionistas com foco no acolhimento e na inclusão de populações vulneráveis. Trata-se de um esforço coletivo de resistência e persistência na defesa de uma educação na perspectiva integral humana.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento29 de jun. de 2022
ISBN9786525022932
Formação de Trabalhadores: Reflexões Contra-Hegemônicas

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    Pré-visualização do livro

    Formação de Trabalhadores - Dianina Raquel Silva Rabelo

    INTRODUÇÃO

    O presente livro representa o encontro e as partilhas de educadores/pesquisadores no âmbito do Núcleo de Pesquisas e Estudos em Educação e Formação de Trabalhadores (Nupeeft), núcleo de pesquisa cadastrado no CNPQ e no Instituto Federal de Goiás (IFG) – campus Goiânia. O Nupeeft tem como concepção estabelecer intercâmbios e trabalhos acadêmicos na área de Ciências Humanas numa perspectiva interinstitucional. A linha de pesquisa na qual se insere é Educação, Políticas e Formação de Trabalhadores, e congrega projetos de pesquisa desenvolvidos no âmbito do IFG e das instituições parceiras.

    A proposta desse núcleo é proporcionar o desenvolvimento de pesquisas e estudos com vistas a ampliar o campo de conhecimento acerca dos processos de ensino e aprendizagem voltados para os sujeitos trabalhadores e estudantes no âmbito da educação profissional e tecnológica, considerando a pluralidade e a diversidade de tais sujeitos, assim como dos processos socioeconômicos em torno da formação de trabalhadores.

    Ao considerar o contexto atual brasileiro de contradições entre os processos de produção e geração de riqueza e a precarização da formação profissional e das relações de trabalho, característicos do capitalismo, a educação e a formação profissional precisam ser assumidas como questões centrais. É nessa perspectiva que as pesquisas aqui assumem o compromisso de explicitar os processos de contradição da nossa sociedade e, ao mesmo tempo, propor enfrentamentos por meio de reflexões e experiências formativas contra-hegemônicas.

    Nesse sentido, reunimos aqui trabalhos que, por um lado, historicizam e problematizam aspectos sociais, econômicos, políticos e formativos da sociedade e do mundo do trabalho em que estamos inseridos, explicitando sua face mais atual, e, por outro, apresentamos experiências contra-hegemônicas de atendimento, acolhimento e, sobretudo, de formação profissional. Para o propósito da presente obra, buscamos, dentro das limitações apresentadas pelo contexto, ouvir os próprios sujeitos trabalhadores, estudantes e demais agentes sociais inseridos no mundo do trabalho. Ressaltamos que a concepção de educação presente nesta coletânea é perspectivada do ponto de vista freiriano, ou seja, emancipatório, libertador, com vistas a uma formação que possui como marca a indissociabilidade entre teoria e prática, por meio da formação integrada. Uma educação com o olhar voltado para os sujeitos trabalhadores, e não para as contradições do capitalismo. Uma educação em busca de caminhos possíveis para um mundo melhor.

    ENTRE A PANDEMIA DE COVID-19 E A PROPAGAÇÃO DO VÍRUS DA PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO: TERCEIRIZAÇÃO E INFORMALIZAÇÃO

    Claudia Borges Costa

    Clisivânia Duarte de Souza

    Juliana Damando Vaz

    Sebastião Cláudio Barbosa

    1 Introdução

    A inquietude que move a trajetória desta pesquisa é propiciada pelos inúmeros questionamentos advindos de nosso olhar ensaístico para o contexto atual da classe trabalhadora, bem como por toda a indignação diante da dura realidade de exploração, desemprego, pobreza e morte, que revela a condição de reafirmar e recrudescer a desigualdade social neste país. Enquanto a renda da metade mais pobre da população caiu cerca de 18%, somente o 1% mais rico teve quase 10% de aumento no poder de compra, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad). Ainda segundo a Pnad Contínua/2020 e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com base no índice de Gini — medidor global de desigualdade —, no primeiro trimestre de 2020 a população que vive na pobreza aumentou 33%, atingindo 11,2% de brasileiros contra os 8,4% antes registrados. É preciso reconhecer e reafirmar a concepção que norteia o caminho deste estudo, isto é, a análise ensaísta qualitativa unida à objetividade da pesquisa social por meio da lente do materialismo histórico-dialético.

    Este trabalho de pesquisa considera o contexto de precarização crescente das relações e do próprio trabalho e, também, a mencionada concepção dialética materialista histórica, por isso, buscou a síntese de totalidade advinda da apreensão histórica das mediações e da contradição. Dessa forma, dentre outros procedimentos, na segunda parte, recuperamos alguns aspectos históricos que explicam o estado de coisas vivenciado hoje na sociedade e no mundo do trabalho; na terceira parte, fazemos um pequeno estudo da Lei n.º 13.429/2017 – Lei da Terceirização, de 2017 – e suas consequências deletérias para a classe-que-vive-do-próprio-trabalho, tendo em vista as características dessa forma de gestão e como ela se configurou inicialmente, precarizando o trabalho no interior de instituições públicas. Procuramos compreender sua face mais atual, a partir de sua vigência, principalmente considerando o tempo da pandemia que se estabeleceu durante o ano de 2020. Além disso, ainda nessa parte, buscamos, na medida do possível, por meio de entrevistas e contatos a distância, depoimentos de trabalhadores/as terceirizados/as, sobretudo no âmbito do IFG², que, de várias maneiras, fortaleceram nossas conclusões; na quarta parte, nos apropriamos de depoimentos, alguns pontos de vista acadêmicos, opiniões variadas, tomando como critério para a obtenção de dados as informações advindas das mais variadas mídias eletrônicas. Nesse sentido, procuramos decupar, de forma ensaística, algumas entrevistas, posts, matérias jornalísticas e documentários disponíveis na internet acerca do tema, dentro do espaço temporal que envolve a pandemia, de março a dezembro de 2020. Como podemos constatar, infelizmente, a pandemia ainda está em curso em 2021.

    A pretensão deste escrito, em última instância, foi, de forma inicial, inventariar lutas e tendências, assim como lideranças emergentes destacadas, para apreender o lugar de fala e o apontamento ideológico dos trabalhadores/as terceirizados/as e precarizados/as de toda ordem: entre a condição de classe (perspectiva dentro da racionalidade moderna que envolve o entendimento de luta de classes entre o trabalho e o capital) e, por outro lado, as subjetividades que permeiam esse debate e o discurso da identidade ensimesmada. Isto é, na nossa visão, tal discurso da identidade ensimesmada apresenta perspectivas dentro do espectro do pós-modernismo — como o empreendedorismo, a proatividade e o individualismo — que expressam a ideologia do self made man (homem que se faz a si mesmo [sozinho])³, que pressupõem, cada uma à sua maneira, uma visão fragmentada da realidade, em que cotidiano e história estão cindidos na consciência.

    2 Novo Imperialismo, Sobretrabalho e a classe-que-vive-do-trabalho: entre a história e as lutas inglórias

    O contexto de desconfiguração do Estado como sustentáculo mínimo dos direitos sociais é a tônica que vem reafirmando ainda mais a desigualdade social e a exploração do capital. Harvey (2020), que faz uma digressão histórica sobre o capitalismo global e sua vivência crônica e subsistente da sobreacumulação desde a década de 1970, discute a inconstância do capitalismo internacional e os inúmeros arranjos para driblar as recessões e desvalorizações generalizadas com o objetivo de manter o poder hegemônico do capital.

    Para Harvey (2020, p. 283), acumular por despossessão tem sido a forma de marcar o denominado novo imperialismo, definido pela sobreacumulação em determinado sistema territorial. Significa dizer que essa é uma condição que está delineada, segundo o autor, por dois tipos de excedentes:

    [...] de mão de obra (desemprego crescente) e excedentes de capital (registrados como acúmulos de mercadorias das quais não se pode desfazer sem perdas, como capacidade produtiva ociosa e/ou excesso de capital-dinheiro carente de alternativas produtivas e lucrativas de investimento)⁴.

    Esse cenário, que traz a marca da exploração irrestrita ao planeta e, sobretudo, aos mais pobres, impõe à classe trabalhadora o sobretrabalho. Além disso, aponta a dimensão do trabalho e o olhar para a realidade que escancara o tsunami de transformações que a classe trabalhadora tem enfrentado nas últimas décadas no Brasil, bem como no cenário internacional.

    Tomamos como noção ampliada da classe trabalhadora a classe-que-vive-do-trabalho, expressão cunhada por Antunes (2009), que carrega o sentido contemporâneo da classe trabalhadora em Marx e a que nós, propositalmente, acrescentamos neste texto o termo próprio, tornando a expressão de Antunes, já bastante explicativa, em "classe-que-vive-do-[próprio]-trabalho. Isso tudo em função de haver, no senso comum, um entendimento confuso em relação ao trabalho no sentido de, supostamente, ele ser explicativo de todos os seres humanos indiscriminadamente. Fica claro que a expressão de Antunes se refere, implicitamente, à classe trabalhadora assalariada. Contudo, acreditamos que explicitar tal entendimento não é mera redundância, mas sim contribuir didaticamente com o esclarecimento. Nesse sentido, segundo Antunes (2009, p. 103), a classe-que-vive-do-[próprio]-trabalho" abrange

    [...]todos aqueles e aquelas que vendem sua força de trabalho em troca de salário, incorporando, além do proletariado industrial, dos assalariados do setor de serviços, também o proletariado rural, que vende sua força de trabalho para o capital.

    Acrescentamos aqui, em plena era da informatização do trabalho, os/as trabalhadores/as em situação informal, os/as terceirizados/as, os/as subcontratados/as, os/as flexibilizados/as, os/as trabalhadores/as em tempo parcial, os/as teletrabalhadores/as, além dos aplicativos e da uberização, que expõem a atualidade do trabalho precarizado.

    Reafirmada essa opção por uma concepção ampla de classe trabalhadora, propõe-se, nesta segunda parte, um breve olhar histórico sobre o tema, com base em estudiosos/as do mundo do trabalho, tomando como ponto de partida a crise do modelo taylorista e fordista.

    As décadas de 1970 e 1980 foram marcadas pela referida crise. No campo econômico e social, a derrocada dos níveis de produção e produtividade (com o aumento da inflação e do desemprego, combinado com os baixos salários), a contenção de investimentos nas políticas que visavam ao fortalecimento do Estado de bem-estar social e a desorganização das relações econômicas internacionais estabeleceram todos os elementos que, de forma conjunta, fundamentaram a crise nesse período. Como alternativa para uma nova era, surgiu o trabalho caracterizado por uma produção mais flexível.

    Nesse ínterim, o Brasil apresentava suas especificidades, pois vivenciava um processo de industrialização tardio e sobrevivia ao regime militar que, por meio de suas várias medidas econômicas, buscava inserir o país na modernização econômica. Nesse sentido, já nas décadas de 1960 e 1970 se consolidavam os princípios e métodos tayloristas-fordistas. O trabalho fragmentado passou a se fazer presente em muitas indústrias, principalmente nas do setor metalmecânico (metalúrgico), na automobilística e na têxtil. Nesse contexto, houve uma ampliação das práticas tayloristas-fordistas nas grandes indústrias de móveis, confecções e calçados. Vale ressaltar que, no Brasil, o modelo fordista se caracterizou como sendo excludente e concentrador de renda, impedindo que parte significativa de excedentes gerados fossem revertidos para os/as trabalhadores/as, intensificando-se a concentração da renda e da riqueza, uma vez que os ganhos de produtividade não se deslocaram de forma significativa para salários e preços.

    No final no século XX e início do novo milênio, um dos debates presentes na sociedade consiste na nova configuração da classe trabalhadora. Promoveu-se a mudança do processo de produção fordista/taylorista para o desenvolvimento de um novo arquétipo industrial e tecnológico, estabelecendo novos padrões de organização e de gerenciamento do trabalho. Essa mudança apresentou uma reestruturação produtiva, apoiada no modelo toyotista, também conhecido como acumulação flexível, a qual caracteriza-se especialmente pela flexibilidade da produção, ou seja, o/a trabalhador/a não necessariamente realiza uma única função repetitivamente durante a produção, mas pode ter o conhecimento de todo ou da maior parte do processo produtivo e dispor de várias funções, o que se associa diretamente ao processo de precarização do trabalho, bem como à intensificação de terceirizações constantes da produção. Esse processo ajuda a explicar a necessidade do empresariamento da educação e a consequente tentativa de submeter os processos educativos aos critérios neoliberais da gerência empresarial, do mercado e da economia de serviços.

    Segundo Hobsbawm (2015), analisar essa realidade é pensar no legado cultural do processo anterior, que culminou no atual modelo de desenvolvimento do capitalismo. O/a trabalhador/a fordista, que fazia parte da produção em massa, convivia com o/a trabalhador/a detentor/a de outro perfil, polivalente e com maior grau de instrução. O novo contexto do processo produtivo expôs outras situações, exigindo um trabalho sob novas formas e padrões de comportamento e, assim, instigando diferentes modos de participação. As empresas buscam chamar a atenção dos/as trabalhadores/as no sentido de aperfeiçoar o processo de trabalho por meio de seu esforço e mérito. Esse padrão industrial representa muito mais uma forma de administração do que uma mudança na situação do/a trabalhador/a.

    A nova organização pautou-se no incremento da tecnologia aprimorada entre as pequenas e médias empresas e no formato flexível das relações de trabalho. Na Europa e em outros lugares, como, por exemplo, nos Estados Unidos da América (EUA), o emprego de alta tecnologia (como robôs, por exemplo) e a desconstrução do trabalho parcelado por meio da organização e da reunião de tarefas para uma produção completa possibilitaram uma transformação do mundo do trabalho. No entanto, o questionamento maior ao taylorismo veio do Japão, que conseguiu reunir novos arranjos na cadeia de fornecedores com a nova organização, sob a perspectiva de integração das tarefas, que terminou por aumentar a capacidade competitiva do novo sistema. O sistema industrial do Japão, a partir de 1970, apresentou força para se disseminar pelo mundo ocidental, pois surgiu como uma alternativa para os países desenvolvidos saírem de mais uma crise capitalista. Segundo Antunes (2009, p. 56):

    O toyotismo (ou ohnismo, de Ohno, engenheiro que criou [tal perspectiva de engenharia de produção] na fábrica Toyota), como via japonesa de expansão e consolidação do capitalismo monopolista industrial, é uma forma de organização do trabalho que nasce na Toyota, no Japão pós-45, e que, muito rapidamente, se propaga para as grandes companhias daquele país.

    Em O privilégio da servidão, Antunes (2018) afirma que inúmeros mitos sobre o trabalho emergiram nas últimas décadas do século XX, sobretudo com o avanço das tecnologias de informação e comunicação (TICs), que aparecem como possibilidade e promessa de um novo tempo de tranquilidade e facilidade, o reino da prosperidade, supostamente sem sofrimento para o mundo do trabalho. No entanto, a realidade é dura, pois o sistema capitalista tem aumentado a exploração sobre o trabalho e essa realidade é cada vez mais planetária.

    Antunes, na continuidade do seu texto, reforça a ideia do capitalismo como processo multiforme, em que a informalidade, a precarização, a materialidade e a imaterialidade tornaram-se aparatos essenciais para a manutenção e a ampliação da lei do valor. Dessa forma, o capitalismo segue ampliando sua lei do valor: A enorme expansão do setor de serviços e dos denominados trabalhos imateriais que se subordinam à forma-mercadoria confirma essa hipótese, dado seu papel de destaque no capitalismo contemporâneo (ANTUNES, 2018, p. 38). O autor discorre, ainda, sobre a expansão significativa de trabalhos assalariados, condição que muitos buscam ocultar por meio da fantasia do trabalho autônomo, e cita exemplos, como a empresa Uber:

    [...]

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