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Julia E Jose Luzes Na Eternidade
Julia E Jose Luzes Na Eternidade
Julia E Jose Luzes Na Eternidade
E-book242 páginas3 horas

Julia E Jose Luzes Na Eternidade

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Sobre este e-book

Quando eu decidi escrever sobre as minhas lembranças de infância, não imaginava que seria tão nostálgico. São passagens maravilhosas e encantadoras. Só lamento que muitas das pequenas histórias que, na época, vivi, tenham sido apagadas de minha memória. Sob essa nostalgia da saudade ofereço a leitura deste singelo livro, Júlia e José Luzes na Eternidade, como prova de um amor fraterno. Para tanto, pretendi demonstrar através de minhas aflições tudo aquilo que sinto desses entes queridos. Sentir saudades pressupõe o desejo de o autor voltar no tempo, reviver as coisas e rever as pessoas que lhe davam prazer e coragem para enfrentar as dificuldades. Nada foi esquecido, da garapa ao pé-de-moleque e dos puxões de orelhas às surras por desobediência. Tudo fez parte da sua construção de mundo! Seria possível transportar-se ao passado para encontrar sua mãe e dizer lhe o que não foi dito? Seria possível rever seu pai para ajudá-lo empurrar com mais afinco aquela carroça na subida da serrinha? Sob fortes emoções o autor escreve na primeira pessoa, mostrando a saga de uma vida difícil. Confessando, portanto, que suas histórias são marcadas por momentos de superação, dor e saudade.
IdiomaPortuguês
Data de lançamento9 de jun. de 2017
Julia E Jose Luzes Na Eternidade

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    Julia E Jose Luzes Na Eternidade - Joaquim B. De Souza

    APRESENTAÇÃO

    Quando o autor decidiu escrever sobre as suas lembranças de infância, para resgatar a história de vida de sua mãe Júlia e de seu pai José, não imaginou que seria tão nostálgico. São passagens de um período árduo e ao mesmo tempo encantadoras. Às vezes, cercadas de alegrias, outras permeadas de dor e sofrimento. É uma pena que muitas das pequenas histórias que viveu, tenham sido apagadas de sua memória, como o próprio autor relata. A leitura deste livro proporciona profundas e valiosas reflexões sobre nossa presença na Terra. A vida de seus pais foi reproduzida neste livro, como exemplo de superação e luta. 

    Sob a nostalgia da saudade, suas lembranças nos oferece a leitura do livro Júlia e José Luzes na Eternidade, como prova de um amor fraterno, afetuoso. Júlia, a mãe, viveu para os filhos: onze partos em casa na zona rural! José, o pai, para prover o sustento da família, superando conflitos econômicos, políticos, guerras civis e mundial. O autor demonstrou através de suas aflições tudo aquilo que sentiu e ainda sente a respeito desses seus entes queridos, desde sua transcendental passagem deles para o cosmo espiritual, ou seja, suas mortes!

    O livro foi escrito sob uma narrativa clara, modesta, sem se esmerar por uma linguagem rígida e clássica. O autor não rebuscou em termos finos ou requintados que poderiam parecer presunçosos demais, afinal os personagens de sua história assim o eram. Os acontecimentos se permeiam na simplicidade e na imaginação. Seu sonho foi resgatar a sua pulquérrima infância que ficara para traz. Buscar resposta para pergunta: como uma mãe, em tempos ruins, pode parir e criar todos aqueles filhos? O objetivo principal foi mostrar no livro lembranças dessa meninez. Se ele incluiu trechos de sua adolescência, foi por acaso, deveras tão importante quanto, ou simplesmente porque a infância ia até mais tarde naquele tempo.

    A história transcorreu num tempo em que o homem bruto da roça, o camponês na essência da palavra, pouco compreendia o mundo externo. Tratava com violência o mundo que fosse além de seu próprio umbigo. Esses campesinos eram preteridos de oportunidades. Eles, num todo, eram encarcerados na sujeição e submissão. Embora, vivessem de maneira árdua as labutas diárias de sua subsistência, ora eram instintivos ora eram subservientes à Igreja. Porém, para sobreviver eram capazes de tudo!

    A imaginação não se torna grande, até que os seres humanos, se tiverem a coragem e a força, a usem para criar.

    (Maria Montessori)

    I – A MÃE

    Fig.1 – Júlia (1914 – 1977)

    Fig.1 – Júlia (1914 – 1977)

    Famílias felizes são todas parecidas. Cada família feliz é infeliz de seu próprio jeito.

    (Liev Tolstói)

    Faltam-me palavras para descrever o semblante enigmático daquele homem, na ocasião, portador de uma notícia triste. Parecia agoniado. Entardecia quando ele entrou na agência dos Correios. O sol atravessava a vidraça projetando sua sombra em cima do guichê, onde eu estava debruçado sobre envelopes, cartas e telegramas. De súbito, assustei-me com a sua presença imóvel em frente ao balcão. Seu bigode bem aparado não escondeu seus lábios tremerem entre as poucas palavras que dissera:

    – Sua mãe foi levada ao hospital pelo professor, o seu vizinho. É sério, ela não está bem! 

    De fato, o que ele me relatou exigia urgência! Suas palavras ainda que poucas, foram suficientes para arrefecerem meu coração. Gaguejei alguma coisa como se dissesse "obrigado". Nem me preocupei em trancar as gavetas da escrivaninha. Não me lembro de ter fechado o cofre. Lembro-me apenas de que fechei a porta, e corri para o hospital. O percurso me pareceu uma eternidade, embora fossem apenas dois quarteirões.

    O corredor do hospital parecia um túnel sem fim. O som de meus passos ecoava entre as paredes. Ainda assustado encontrei o quarto. Em frente à porta semiaberta me hesitei. Depois de alguns segundos entrei. Junto de minha mãe ofegante, meu pai estava com um padre que proferia o sacramento da extrema-unção. Ele a ajudava segurar uma vela. Ela ainda me fitou num gesto de despedida. Em silencio, eu retribui com um olhar confortador, no intuito de lhe dar esperança. Ela não tinha fôlego para dizer mais nada. Nesse instante, eu sai do quarto!

    Em minhas recordações minha mãe foi um ser único tanto na educação quanto na criação! Guardei na memória o seu afeto e abnegação. Não estou me referindo ao DNA, mas sim a sua personalidade, paciência, afetuosidade, ternura. Ela foi um ser incomparável, pois foi sempre a única oferecer seu colo quando eu chorava. Não tínhamos vidas de luxo, e cabia a ela a dura tarefa do lar.

    Apesar do afã diário nunca a vi se queixando do trabalho árduo em turno intermitente de vinte e quatro horas, ou de dupla jornada, todos os dias da semana, meses e anos a fio. Todo esse sacrifício era para carregar nas costas aquela família numerosa. Eu era o seu décimo primeiro filho! Parecia-lhe ser o papel social de mãe desempenhar as relações de protetora e de acolhimento. Seus filhos eram acolhidos!

    A cor cinza do quarto sob a luz da lamparina era testemunha de que nunca a vi se queixando de acordar a noite para atender os prantos de um progênie chorão. Talvez, fosse por um motivo qualquer que acordara, quiçá com frio ou urinado. Enquanto isso, o resto da casa dormia no escuro da noite. Era possível ouvir roncos pelos quartos da casa, que se misturava ao coaxar dos sapos de uma várzea próxima. Recordo de ver todas as manhãs o varal ao sol secando os lençóis manchados pelo mijo.

    Vez e outra, a várzea se enchia pelas enchentes do caudaloso rio Marialva que banhava o fundo do sítio. Onde os meninos nadavam e os adultos pescavam. Eu admirava as enchentes. Quando o rio transbordava sobre a várzea, eu ficava ansioso para recolher os peixes que ficavam enroscados nos capins ou na grama. Outras crianças também corriam para beira do rio assim que a água baixasse. Em tempos de estiagem, os gados pastava ali.

    Às vezes, outros irmãos mais velhos se incomodavam com a manha e birra dos caçulas. Justificavam-se pelo trabalho árduo do dia seguinte na roça. Dormir bem era preciso! Mas, o amor incondicional que ela nutria pelos filhos superava qualquer adversidade, contratempo ou cansaço. Fosse para amamentar os chorões madrugada adentro, anos a fio, fosse em noites chuvosas, de temporais, frias ou calorentas. Tudo acontecia enquanto o resto da casa repousava nos braços de Morfeu².

    Os filhos sempre estiveram em primeiro lugar. É possível que isso também seja predicado de outras mães. Porém, o que fazia minha mãe tão especial? As noites pareciam intermináveis enquanto ninava em seu colo a criança que era acometida por uma doença. Lutar contra a dor, a febre ou até mesmo contra uma birra era seu afazer usual. Conversava em segredo aos ouvidos do bebê mimos inaudível por outros filiados da casa. Em muitas noites não pregara o olho até ver a luz do Sol penetrar pelas frestas da casa de madeira mal rejuntada. Rompia um novo dia para recomeçar tudo de novo. Acham que os filhos já crescidos ajudavam? Não! Não moviam uma palha! Ela se importava? Não! Era sinal de que tudo estava bem com eles.

    Ela aprendeu sozinha a trocar fralda ainda nos tempos das de pano, feitas por suas mãos, na velha máquina de costura. Aprendeu enfrentar essa tarefa, às vezes, no escuro ou apenas com a luz parda de lamparina ou de lampião a querosene! Preparou as primeiras papinhas com o maior cuidado ainda nos tempos da revolução de Getúlio Vargas, meados do Século XX, período crítico da política nacional, entre conflitos, intolerâncias e ódio. Ela jamais se importou com a política. Em seu coração vinham em primeiro lugar os filhos. Jamais os barulhos de canhões ou gritos de soldados a fariam afastar de seus filhos.

    Eu ouvi inúmeras vezes meus irmãos mais velhos dizerem que nossa mãe comeu comida fria, e outras vezes, foi à última a se servir ou mesmo deixou de comer. Em primeiro lugar estavam seus rebentos, por certo que, bem alimentados teriam melhor saúde. Não iriam ficar doentes para se tornarem presas fáceis da morte! Na época, não se via luxo para "comer", as pessoas se serviam do que estava postos na taipa do fogão a lenha.

    Ela almejou a cada nascimento para que o filho logo se arrastasse, engatinhasse e, no final, saísse andando, correndo, tropeçando, caindo e se levantando. Torceu para que cada um deles pudesse desocupar um pouco o seu colo para ela se ocupar com outras tarefas. Cada vez que isso acontecia, sentia saudades do bebezinho manhoso que ficava horas do dia em seu colo. Agora já gatinhava. Agora já dava os primeiros passos. Agarrava nas coisas. Colocava grãos de terra na boca. A criança já estava percebendo um novo mundo. Criando o seu histórico de vida. A mãe é claro, sempre de olho! Um descuido era um tombo. Outro descuido era um corte, gritos e choros. Era um Deus nos acuda cada vez que isso acontecia.

    Os primeiros filhos deram muito trabalho, mas conforme a prole ia crescendo, os mais velhos ajudavam nos cuidados com os mais novos. Menos a noite, pois dormiam feito pedras. Eu sou o filho caçula, por certo, todos deram palpite na minha vida: não faz isso, não faz aquilo! Com certeza, ajudaram a me alimentar, a me dar banho, como também puxões de orelhas e safanões! Exceto minha mãe que me poupava. Meus irmãos mais velhos e o meu pai, sempre abusaram de umas boas chineladas ou cintadas. Talvez eu merecesse. Talvez eu não fosse de todo inocente. Eu fazia diabrura sim!

    Em sua fé, minha mãe implorava aos céus não ter que olhar para um termômetro marcando 37°. Ter que passar a noite segurando a mão de um filho para sentir a febre baixar. Ter que correr pra cidade de carroça ou charrete para buscar ajuda de um médico. Isso se encontrasse! Jesus! O percurso era longo, por estrada de chão. E se chovesse como iria sair daquele sítio afundado no rincão Araripa?

    Naquele tempo a medicina era precária e de poucos recursos. Os médicos eram raros e distantes. Nessas horas, morria de vontade de chorar ao ver o filho doente, sem forças, mas segurava firme a vontade de sorrir a qualquer sinal de melhora, usando medicação à base de planta, farinha e limão para salvá-la de diarreia, vômitos e cólicas. Os chás sempre ajudavam na cura. Ela fazia xarope de cenoura, arrancada ali mesmo da horta. Fazia sucos de laranjas com água fresca tiradas com sarilhos do poço. Chá de cebola, de hortelã, de picão. As plantas eram a medicina que ela precisava. As ervas do campo eram o alívio da cura!

    Sem dúvida, ela acordava exausta depois de uma noite mal dormida, mal repousada. Apesar disso, fazia tudo do mesmo jeito outra vez: dava banho, fazia comida, brincava com os pequeninos, trabalhava na roça, cuidava da casa e colocava os filhos pra dormirem de novo! Ela nunca quis estar sozinha e abrir mão de tê-los todos sob sua saia até ter certeza de que ficassem bem sem ela, estivessem eles criados, adultos e até casados, vivendo com as suas próprias famílias. Depois de cada matrimônio vinha à espera de um netinho ou netinha. Pegar no colo esse também. O amor materno não cansa nunca!

    Nunca pagou pra ver! E se esse dia chegasse, com certeza iria chegar, contaria os dias para receber o abraço da volta, uma visita que fosse. Ela exercitava a paciência todos os dias com as crianças brigando por causa de um brinquedo ou até mesmo por causa de comida. Uns achavam que mereciam mais mistura que os outros. Até que perdia a paciência de vez em quando, entre uma crise de birra e outra, mas superava logo, buscando a paz em suas orações.

    Minha mãe ouviu dos filhos cada palavra que lhe ensinou. Percebia a cada dia que não bastava falar, era preciso dar exemplo. E não há no mundo exemplo melhor! Jamais sentiu culpa por tanto trabalho, por tanta dedicação, por exigir tanto de si mesma. Ela aprendeu sozinha que, com duas mãos era possível fazer muito mais do que duas tarefas ao mesmo tempo. A correria do dia a dia era o elixir para suas forças. Ah, mas ela sentiu também… Cada mãozinha tão pequena e tão forte que segurara seu dedo indicador como que querendo dizer: mãe, estou aqui!. Pouco me lembro, mas recordo que aos quatro anos eu fingia estar dormindo para voltar para casa em seu colo, após o terço na capela. Essa igrejinha ficava uns quinhentos metros de casa. Outras mães diziam, ele está bem grandinho para colo! Põe esse menino no chão! Mas, ela que nada! Andava todo o trecho me levando nos braços. Vez e outra, ainda acariciava os meus cabelos.

    A cada novo rebento por alguns anos afagava os cabelos daqueles pequenos anjos, enquanto ainda estavam sob suas asas. Ela se enchia de felicidades em ter a casa cheia de risadas e de gritos, até mesmo aqueles chorinhos. Sorria ao ver a criança correndo pelos cantos da casa: brincando, até brigando. Quantas vezes eu sai nos tabefes com meus outros irmãos. Quando crescidos, eles iriam se lembrar de como se divertiam com carrinho de rolimã, de boneca de pano, de esconde-esconde atrás das árvores, de pega-pega pelos terreirões, do jogo de bétia e do mais desejado pelas crianças: o futebol, tantas vezes jogado com bola de meia de pano. Até bexiga de porco serviu de bola. Mas, essa furava logo. Poucos chutes, babau!

    Dentro de seu coração jamais houve espaço para covardia ou preguiça. Ela tentava sempre ser uma pessoa melhor em seu cotidiano, resiliente e afetuosa. Nos terços, nas missas, na fé! Porque cada filho merecia essa mãe que se aprimorara com o tempo e descobrira que o coração é um espaço infinito, sem limite. Quanto mais amava seus filhos, mais amor cabia em seu coração. Esse era o universo de todos nós! Não havia outro mundo que pudesse ser melhor!

    As recordações não povoam nossa solidão, como dizem, ao contrário, fazem-na mais profunda!

    (Gustave Flaubert)

    II – O PAI

    Fig. 6 Seu José (1910 – 1998)

    Fig. 6 Seu José (1910 – 1998)

    Temos de nos tornar na mudança que queremos ver.

    (Mahatma Gandhi)

    Confesso de alma cândida, meio século depois, que ao descrever sobre a serrinha ainda me causa calafrios. O lugar era sombrio. Diziam que a morte ficava à espreita, e a cada instante alguém poderia sucumbir. Na verdade, muitos morreram ali. À noite o trecho ficava isolado, quase ninguém trafegava o percurso. Ladrões ficavam à moita de tocaia a espera de suas vítimas. Devido à inclinação da estrada, os veículos e as carroças passavam tão lentos quanto às pessoas a pé. Chance em que os espertalhões aproveitavam

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