Descontos condicionados e a defesa da concorrência
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Sobre este e-book
Empresas e empresários veem-se obrigados a inventar e reinventar não só produtos, como também novos modelos e estratégias
de negócio.
As políticas comerciais desempenham um papel importante na modelagem e na estruturação das empresas. Tal protagonismo é tamanho que, em diversos casos, o sucesso de determinada prática comercial é decisivo para o resultado financeiro positivo ou negativo dos agentes de mercado.
Muitas dessas práticas comerciais têm, nos descontos condicionados, relevantes ferramentas para impulsionar o escoamento de produtos, trazer maior segurança na administração dos negócios e alavancar a conquista e/ou a manutenção da participação de mercado.
Nesse cenário, é essencial para as empresas, especialmente aquelas que detêm posição dominante, atentarem-se à possibilidade de suas políticas de descontos condicionados produzirem efeitos anticompetitivos passíveis de sanção pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Refletir sobre a potencialidade lesiva dos descontos condicionados é ainda mais relevante tendo em vista o declarado ímpeto do Cade de dedicar mais tempo à normatização e à investigação mais detalhada de casos envolvendo condutas unilaterais, como é o caso dos descontos condicionados.
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Descontos condicionados e a defesa da concorrência - Daniel Nascimento
Sobre o Autor
Rosto do autor Daniel Elias do NascimentoDaniel Elias do Nascimento
Daniel Elias do Nascimento é advogado, com atuação destacada em direito da concorrência. É mestre e especialista em Direito pela Escola de Direito de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas (FGV – SP). É membro do Núcleo de Pesquisa em Concorrência, Política Pública, Inovação e Tecnologia (Compitt) da FGV – SP, e membro da Comissão Especial de Defesa da Concorrência, da OAB Nacional.
Sumário
Capa
Folha de rosto
Sobre o Autor
Agradecimentos
Sumário
Prefácio
Llista de figuras
Lista de quadros
Introdução
Capítulo 1 - Conceitos Elementares
1.1. A LDC, seu fundamento constitucional e objetivos
1.2. Infração da ordem econômica na LDC
1.3. Mercado relevante
1.4. Poder Econômico e Posição Dominante
1.5. Condutas coordenadas e unilaterais
1.6. O abuso da posição dominante
1.7. A Criação de Barreiras ao ingresso e desenvolvimento de concorrentes no mercado
1.8. Economias de escala, de escopo e custo de transação
Capítulo 2 - A regra da razão e a regra per se, o ilícito por objeto e o ilícito por efeitos
2.1. O direito norte-americano: regra da razão e regra per se
2.2. O TFUE e o ilícito por objeto e o ilícito por efeitos
2.3. O direito brasileiro e o Cade
Capítulo 3 - Descontos Condicionados e seus efeitos pró e anticompetitivos
3.1. O que são descontos condicionados
3.2. Efeitos pró e anticompetitivos dos descontos condicionados
3.3. Classificação dos descontos condicionados
3.3.1. Desconto por fidelidade
3.3.2. Desconto por volume
3.3.3. Descontos para pacotes ou multiprodutos
3.3.4. Descontos puramente exclusionários
Capítulo 4 - A Metodologia de Análise de descontos condicionados adotada pela União Europeia
4.1. Enquadramento legal dos descontos condicionados pela União Europeia
4.2. Orientação de aplicação do art. 102
4.2.1. Contexto
4.2.2. Principais pontos trazidos pelas Orientações sobre o art. 102 acerca dos descontos condicionados
4.3. Caso Intel
4.3.1. O caso
4.3.2. Decisão da Comissão
4.3.3. Do julgamento pelo Tribunal Geral
4.3.4. Do julgamento pelo Tribunal de Justiça
4.3.4. Da nova decisão do Tribunal Geral
4.3.5. Da natureza e da metodologia de análise dos tipos de descontos condicionados
4.4. Conclusão sobre a União Europeia
Capítulo 5 - A Metodologia de Análise de descontos condicionados adotada pelos EUA
5.1. Contexto
5.2. Metodologia aplicada pelos EUA: regra da razão
5.2.1. LePage’s vs. 3M e Mckenzie-Willamette Hospital vs. PeaceHealth,
5.2.2. ZF Meritor vs. Eaton e Eisai vs. Sanofi-Aventis
5.3. Conclusão sobre o entendimento americano
Capítulo 6 - A análise de descontos condicionados pelo Cade e a sugestão de metodologia a ser adotada pelo Cade
6.1. A Resolução nº 20/1999 e a análise de condutas unilaterais
6.2. Casos de conduta unilateral e de descontos condicionados já analisados pelo Cade na vigência da LDC, uma análise quantitativa
6.3. O Caso Ambev Tô Contigo
6.3.1. A denúncia da Schincariol
6.3.2. A defesa da Ambev
6.3.3. A decisão do Cade
6.3.4. Conclusão
6.4. Outros Casos
6.5. Sugestão de Metodologia a ser adotada pelo Cade
6.5.1. Do panorama atual de análise de condutas unilaterais
6.5.2. A Análise Econômica do Direito Concorrencial
6.5.3. Sugestão de metodologia a ser adotada pelo Cade
Conclusão
Bibliografia
Anexo 1 – Processos Julgados pelo Tribunal do Cade de 2012-2020 envolvendo Conduta Unilateral
Ficha catalográfica
Prefácio
Leonor Cordovil1
Um bom advogado não esquece nenhum de seus casos, mesmo que tenham se passado anos de seu julgamento. Contudo, embora se lembre de todos eles, o bom advogado sempre tem seu caso favorito, aquele cujos detalhes sórdidos não lhe saem da cabeça, o que faz com que ele acorde na madrugada e se surpreenda pensando devia ter feito isso, devia ter feito aquilo
.
Foi exatamente esse caso favorito que despertou o interesse do Daniel para os descontos condicionados. A experiência, o estudo e a aprendizagem prática, em um caso concreto, foram tão intensos que, mesmo após o desfecho, Daniel não conseguiu esquecê-lo. E não há provavelmente melhor forma de se sacramentar uma experiência do que desafiá-la em um trabalho acadêmico.
Mesmo sendo um assunto frequente nas mesas dos escritórios de advocacia concorrencial, sobretudo no plano consultivo, é raro ver uma política de descontos na mesa dos Conselheiros do Cade. Daniel, em sua longa pesquisa, descobriu que a autarquia não chegou a julgar nenhuma sob a égide da lei 12.529/2011. Então, para desatar alguns nós e responder à pergunta a que se propôs, Daniel precisou se apoiar nas decisões antigas e no Direito Comparado.
Qual metodologia usar diante de uma investigação de descontos condicionados? Quais os critérios devem ser levados em consideração pela autoridade concorrencial?
Para responder às suas inquietações, Daniel trilhou o caminho lógico ao buscar as experiências europeia e norte-americana. As duas jurisdições já tiveram a oportunidade de examinar, com profundidade suficiente, casos que se tornaram paradigmas e testaram metodologias úteis ao Brasil. Embora sutilmente diferente a depender do país, o Direito da Concorrência nasce a partir da mesma raiz.
Embora o Brasil ainda caminhe pela avenida da racionalidade típica às condutas unilaterais, é certo que as duras penas aplicadas em jurisdições mais antigas vêm provocando reflexões em terras tupiniquins. O caso Intel, por exemplo, foi discutido em vários congressos internacionais, despertando dúvidas sinceras sobre os critérios utilizados. Diante da maturidade da discussão, nada melhor do que se apoiar nela para produzir seu trabalho.
Após traçar o perfil de todas as investigações do Cade em condutas unilaterais dos últimos dez anos, Daniel concluiu, acertadamente, que o maior percentual tratou da exclusividade, e dos 65 casos, 68% resultou em arquivamento. A multa somada de todos os processos totalizou R$ 164 milhões, bem distante dos valores de condenações nas condutas horizontais, como o cartel e a troca de informação sensível. Isso permite a conclusão de que, além de não ter julgado nenhum caso de desconto condicionado, o Cade ainda está distante de um cenário em que uma variedade de infrações verticais domina a história concorrencial. Parte da causa está relacionada às dificuldades naturais de persecução dessas condutas, sobretudo quando comparadas aos carteis, além dos obstáculos encontrados na definição de uma teoria de dano concorrencial e de coleta de provas. Dentre os casos julgados na vigência da lei n. 8.884/94, o Tô Contigo foi certamente o mais relevante, permitindo a conclusão de que a metodologia adotada não se parece com a análise de efeitos proclamada pelo Cade, mas sim com uma análise mais formalista e teórica.
Esse livro é, assim, o resultado de uma pesquisa longa e detalhista, da leitura completa de julgados brasileiros e estrangeiros, que permitiram uma importante conclusão, que prefiro não contar para não estragar a surpresa do leitor. Um trabalho de fôlego, a partir de um tema pouco explorado, é que o que poderão encontrar aqui. Daniel já chegou com a tese pronta, faltando somente escrever. Agora, não falta mais nada, e um grande trabalho está à disposição da comunidade concorrencial.
¹ Doutora em Direito Econômico pela Universidade de São Paulo e em Direito Internacional pela Université Paris 1 – Pantheon Sorbonne. Mestre em direito internacional pela mesma universidade francesa e em Direito Econômico pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professora da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo. Advogada.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Cenário A – Desconto retroativo
Figura 2 – Cenário B – Desconto progressivo
Figura 3 – Passos para a análise da licitude da conduta
Figura 4 – Principais condutas unilaterais investigadas na vigência da LDC
Figura 5 – Tipos de decisão nos julgamentos envolvendo condutas unilaterais ocorridos na vigência da LDC
Figura 6 – Prêmios oferecidos pelo Tô Contigo
Figura 7 – Prêmios oferecidos pelo Tô Contigo
Figura 8 – Kit de Adesão do Tô Contigo.
Figura 9 – Proporção entre as justificativas para o arquivamento de casos
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Tipos de ilícito e formas de análise adotadas pelo Cade
Quadro 2 – Prioridades de Análise dos Descontos Condiciona dos pela Comissão, segundo as Orientações
Quadro 3 – Justificativas do agente detentor de posição dominante
Quadro 4 – Metodologia adotada pela União Europeia na análise de descontos condicionados
Quadro 5 – Principais setores da economia envolvidos nos processos de conduta unilateral julgados pelo Cade na vigência da LDC
Quadro 6 – Características formais do Tô Contigo
Quadro 7 – Justificativas para o arquivamento de casos
Introdução
Não é novidade que a atividade empresarial tende a se desenvolver progressivamente de forma cada vez mais dinâmica. Empresas e empresários veem-se obrigados a inventar e reinventar não só produtos, como também novos modelos e estratégias de negócio.
As políticas comerciais desempenham um papel importante na modelagem e na estruturação das empresas. Tal protagonismo é tamanho que, em diversos casos, o sucesso de determinada prática comercial é decisivo para o resultado financeiro positivo ou negativo dos agentes de mercado.
Muitas dessas práticas comerciais têm, nos descontos condicionados, relevantes ferramentas para impulsionar o escoamento de produtos, trazer maior segurança na administração dos negócios e alavancar a conquista e/ou a manutenção da participação de mercado.
Nesse cenário, é essencial para as empresas, especialmente aquelas que detêm posição dominante, atentarem-se à possibilidade de suas políticas de descontos condicionados2 produzirem efeitos anticompetitivos passíveis de sanção pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Refletir sobre a potencialidade lesiva dos descontos condicionados é ainda mais relevante tendo em vista o declarado3 ímpeto do Cade de dedicar mais tempo à normatização e à investigação mais detalhada de casos envolvendo condutas unilaterais, como é o caso dos descontos condicionados.4
Apesar de o direito concorrencial encontrar fundamento constitucional desde a década de 1930,5 seu fortalecimento e consolidação no Brasil tiveram na Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994 (Lei nº 8.884/94), marco de grande relevância. Tal normativa sistematizou os dispositivos legais de matéria antitruste, criou o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC) e transformou o Cade em autarquia federal com destinação orçamentária própria.
Desde o final dos anos 1990 e início dos anos 2000, a atuação do Cade se mostra em contínua expansão.6
Pode-se dizer que o tema ao qual os conselheiros do Cade mais tempo dedicaram durante a vigência da Lei nº 8.884/94 foi o controle de concentrações empresariais (Atos de Concentração ou AC). Entre os anos 2000 e 2012, cerca de 95% dos julgamentos do Cade relacionavam-se ao controle de concentrações, 3% dedicavam-se a condutas unilaterais e apenas 2% tratavam de condutas coordenadas.7
Este panorama se alterou com a publicação da Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011 (Lei nº 12.529/11 ou LDC), que revogou a Lei nº 8.884/94 e estruturou o novo
SBDC. A LDC instituiu o controle prévio das concentrações econômicas, além da possibilidade de a aprovação das operações ser realizada pela Superintendência Geral do Cade (SG).
Tal mecanismo permitiu a diminuição substancial do número de ACs analisados pelo colegiado,8 conferindo, ao agora chamado Tribunal9, mais tempo para analisar as condutas anticompetitivas, que passaram então a ter mais espaço na pauta dos julgamentos. Em 2020, por exemplo, dos 58 casos julgados pelo Tribunal, 27% eram sobre condutas anticompetitivas, enquanto apenas 22% foram relativos a Atos de Concentração.10
A partir dos dados acima, é possível observar que, ao longo dos anos, a matéria objeto dos processos julgados pelos conselheiros passou por uma clara transição. Anteriormente, julgava-se prioritariamente Atos de Concentração. Atualmente, os Atos de Concentração são, na grande maioria, decididos pela SG e a análise de condutas anticompetitivas tem grande destaque na pauta de julgamento do Tribunal.
Em seu plano estratégico traçado para 2021-2024, o Cade incluiu o fortalecimento e a eficiência ao combate a cartéis e ao abuso de posição dominante como um dos dez objetivos estratégicos centrais a ser perseguido.11
Como um dos marcos intermediários para alcançar tal objetivo, foi incluída a elaboração de nova resolução sobre condutas unilaterais, com término previsto para desenvolvimento de 2022 a 2024.
Isso significa que o próprio Cade admitiu a necessidade de revisar a forma como os casos de condutas unilaterais vêm sendo analisados, assim como também dedicar mais atenção à repressão dessas condutas12.
Diante disso, nota-se que o tema da persecução às condutas unilaterais já está em foco e ficará ainda mais em evidência com a publicação da nova resolução.
O Cade tem uma nova oportunidade de sistematizar a regulamentação da matéria, assim como de criar uma metodologia clara e objetiva para a análise de casos envolvendo condutas unilaterais, inclusive de descontos condicionados.
Esse contexto implica uma maior e mais rigorosa atenção das empresas, especialmente daquelas detentoras de posição dominante, na adoção de políticas de desconto