Beleza roubada
De C. Ribeiro
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Sobre este e-book
Um jogo psicológico de tirar o fôlego, com tantas idas e vindas que nem a experiente psiquiatra Dra. Catrina Rey, nem o capacitado Inspetor de polícia do DEIC, Benício Valcarengue conseguem vislumbrar. Porque há uma névoa de ofuscamento nas ações de uma serial killer, com seus crimes pintados por Augusta Mathias, a irmã da Miss São Paulo desaparecida anos atrás. Para Benício são borrões em todas as tonalidades de verde, para Catrina são rostos de vítimas perfeitas, mulheres belas que tiveram suas vidas e beleza roubadas por uma psicopata capaz de confundir a todos, até os leitores.
C. Ribeiro
Escrevendo romances policiais para um público infanto-juvenil, YA, e também adulto, a autora C. Ribeiro tem esse lado virtual impresso em alguns de seus livros, numa realidade que se passa dentro e fora dos computadores. C. Ribeiro escreve policiais da década de 50 e atuais, escreve suspense e terror, escreve ficção científica e fantasia além do nosso tempo e realidade.Ação e aventura adoráveis, que permeiam temas polêmicos, teorias de conspiração e mentes doentias.C. Ribeiro é uma autora que gosta de escrever personagens diversos, multiculturais, em todos os tipos de gêneros literários, permitindo que o leitor viaje pelas suas muitas histórias, conhecendo a maravilha que a literatura pode proporcionar.***********************Writing detective novels for children, YA and adults, C. Ribeiro has a virtual side imprinted in some of her books, a reality that takes place inside and outside computers.C. Ribeiro novels that takes place in the 50's and nowadays. Writes suspense, horror, science fiction and fantasy beyond our time.Also adorable action and adventure that permeate hot topics, conspiracy theories and sick minds.C. Ribeiro is an author who likes to write diverse, multicultural characters in all types of literary genres, allowing the reader to travel through her many stories, knowing the wonder that literature can provide.
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Beleza roubada - C. Ribeiro
Represa do Guarapiranga, São Paulo.
Julho de 2001.
A virada do século foi marcada por transformações, uma época de transição na qual a tecnologia atual ainda estava se tornando popular. Ter seu nome na Internet ainda era coisa estranha.
Mas Helena Mathias teve seu nome em diversas divulgações, das de puro glamour às páginas de jornal sensacionalista. Com vinte e um anos, Helena havia sido coroada Miss Beleza com um bebê no ventre de já sete meses, no dia 18 de outubro de 2000, no Concurso de Miss Beleza de São Paulo.
De uma beleza esfuziante, 1.78 de altura, 55 quilos, sorriso grande, ela resolvera largar todo glamour, vender joias e imóveis, quadros de artistas renomados, tapetes persas e carros últimos modelos e comprar uma casa pequena, rústica; uma cabana tão diferente da sua atual condição que chocou os poucos amigos. Lá um berço, uma cama pequena, de lençóis rasgados e costurados, e uma mesa com duas cadeiras. Também um fogão à lenha e uma geladeira de carvão.
Localizada na região sul de São Paulo, em área que conserva parte da Mata Atlântica, a Guarapiranga, com seus vinte e sete mil metros quadrados, era um dos maiores espaços para contemplação da natureza e meditação existentes no Brasil.
Mas talvez fosse a beleza, o crime da escuridão.
Lá na cabana de Helena não havia eletricidade, TV ou computadores, não havia nada na nova vida dela a não ser o inesperado. Numa manhã fria de 10 de janeiro de 2001, um casal que acampava na região ouviu o choro intermitente de uma criança. Se aproximando da casa, que parecia mais ser uma cabana abandonada, o casal encontrou Bernardo, um bebê de dois meses que chorava, com sinais de desidratação, faminto, e mais nada.
Nenhum bilhete de suicídio, nenhuma xícara quebrada ou sinal de arrombamento, nenhum bilhete de resgate, nada fora do lugar, nenhuma única mancha de sangue.
Ali, só uma certidão de nascimento sem o nome do pai da criança.
A região se mobilizou em busca de Helena, a Miss Beleza São Paulo, a beleza que estampou capas de revistas, que agora estampava os jornais da impressa marrom.
Muitos policiais foram realocados para o caso que ficou conhecido como ‘beleza roubada’, mas nenhum progresso foi feito e a investigação se viu parente um fantasma; Helena havia desaparecido e sua beleza roubada.
O caso esfriou como aquele julho de 2001, quando a irmã se declarou culpada pelo assassinato, mesmo nenhum corpo tendo sido encontrado.
As buscas foram suspensas.
Ó beleza! Onde está tua verdade?
.
William Shakespeare.
Capítulo 2
Hospital Psiquiátrico Démission.
Bairro do Belenzinho, São Paulo.
01 de abril, 09h00min.
Não que fosse mentira, mas Catrina Rey sentia que naquele dia tudo que acontecia dentro do Démission, parecia surreal. Talvez porque ela havia tomado uma decisão difícil ao aceitar comandá-lo, com problemas de comando há muito instalado.
Catrina era bonita em toda sua essência. Mexicana de nascimento chegou ainda bebê com a família, com seu pai vindo ao Brasil para uma viagem de estudos e daqui não saindo mais. Morena, com grandes e expressivos olhos verdes, e grossos lábios. Pele branca, avermelhada quando sob emoção, era uma mulher encantadora, que conhecia seus dons femininos, que nunca passavam despercebidos. E apesar de todos darem certo de que Catrina seguiria carreira de modelo ou coisa parecida, pela beleza plena, nada a fez mudar sua ideia de estudar medicina, de ser uma médica da mente.
De família tradicionalmente legista, bisavô, avô e pai, Catrina inovou pela escolha da psicopatologia descritiva, um ramo da psiquiatria usada como ferramenta diagnóstica exclusiva do psiquiatra, que ela usava no Démission, que era o que se podia chamar de uma franquia hospitalar bem sucedida, com hospitais psiquiátricos franqueados pelo mundo todo.
Uma ideia de construir hospitais nos moldes do Démission francês, com concepções de autarquias, onde o paciente participava das decisões sobre como governar sua vida, o que trazia uma avalanche de reclamações da área médica, com milhares de processos contra indivíduos considerados fora do sistema comportamental e legal, sem quaisquer condições de tomar as rédeas de sua vida, já que o Hospital Psiquiátrico Démission de São Paulo, capital, era um hospital psiquiátrico que também recebia indivíduos do sistema prisional, condenados por assassinatos, e sem totais condições de voltar a viver em sociedade.
E Catrina decidiu comandá-lo porque ela fora levada até ali pelo Dr. Cláudio Tokie, seu professor, mas que tinhas seus próprios demônios, seus crimes da escuridão, que se suicidou tomado pela culpa.
Uma culpa que Catrina sabia que ele tinha, porque gerenciava o Démission de uma maneira pouco convencional, diminuindo medicamentos importantes para o equilíbrio químico e biológico dos doentes mentais, que não podiam nunca mais ser recuperados. Aquilo incluía a sala lúdica, onde Cláudio costumava deixar doentes perigosos, psicopatas misturados, defronte a pinceis e telas, pintando.
Catrina havia decidido que nada daquilo podia mais acontecer, todas as fichas e anotações de Cláudio foram destruídas por ela. De agora em diante, ela própria tiraria suas conclusões, entrevistando assassinos e seus crimes, mazelas de mentes doentias, criando ela mesma a base para sua psiquiatria.
Thaís Takawada, sua Enfermeira psiquiátrica de vinte e cinco anos, com os cabelos ruivos tingidos, sem um único fio caindo sob os olhos asiáticos, recebeu a notícia que todas as telas de pintura deveriam ser retiradas das paredes e armários da sala lúdica, alocadas numa sala trancada e as atividades suspensas por tempo indeterminado. Achou mesmo que aquilo era algum tipo de pegadinha de primeiro de abril, mas a força com que Catrina Rey dera aquela ordem, a apavorou.
— Não pode fazer isso! — Thaís a interpelou daquele jeito mesmo, no meio do corredor, na frente de outros funcionários.
E Catrina não gostou do que ouviu.
— Não posso o que Thaís?
— Não pode tirar os quadros, cancelar as pinturas.
— Posso!
E todos à volta delas começaram a sair de perto.
— Não Doutora! As oficinas terapêuticas são um instrumento comum a todos os modelos alternativos de assistência, apontando-se como sinônimo do próprio movimento de reforma psiquiátrica.
— É impressão minha ou está me dando uma bronca?
E Thaís se encolheu, assustada com sua própria atitude.
— Eu... Eu só queria... — e Thaís tomou-se de coragem. — A maioria dos nossos trinta pacientes internados passam o tempo ocioso, não realizam atividades como brincadeiras, jogos, exercícios físicos, o que gera mais isolamento e recaídas devido ao transtorno mental.
— Está dizendo que minha forma de gerenciar o Démission é falha?
— Não. Mas nos últimos anos, o papel da enfermeira psiquiátrica vem sendo criticado, porque somos pressionadas a inventar novas formas de engajamento na equipe de saúde mental.
— Não estive aqui nos últimos anos, Thaís. E para repensarmos o papel da enfermeira nos moldes do novo paradigma da assistência psiquiátrica, precisamos idealizar experiências maiores que atividades lúdicas.
— Como, por exemplo?
— Medicamentos e entrevistas são importantes.
— Eu sei que o Dr. Cláudio gostava de...
— Cláudio morreu! — a exclamação de Catrina foi tão forte que parecia mesmo que estava gritando. — Toda e qualquer lembrança dele some daqui em diante. Se você não se sente capacitada para fazer essa nova jornada ao meu lado, por favor, demita-se! — e Catrina foi embora.
Todo o corpo da esmirrada Thaís tremia, ela toda mantinha suas mãos apertadas, querendo se controlar sem saber como. Só saiu dela um lufar nervoso de sua boca, e Thaís voltou ao trabalho, tirar da sala lúdica os quadros.
Já Catrina chegou também tremendo em sua sala, braços e pernas, nervosa por ter que confrontar o staff do Démission, que não parecia muito adepto de sua gerência, de seu estilo de levar as coisas. Se havia realmente tomado à decisão certa, ela não sabia, mas precisava tomar um rumo e aquele fora o escolhido.
Seriam entrevistas, primeiros os mais psicóticos, com Modus operandi ditos exóticos, com suas assinaturas, para formar um padrão. Depois os menos afetados por psicopatias graves, onde quase todos ali dentro tinham. E por onde começar estava sendo um problema, Thaís era só a ponta do iceberg a percorrer.
Apesar dos outros funcionários do Démission e a própria instituição francesa ter aceitado os termos de seu trabalho, Catrina sabia que não era suficiente para sentir que era bem-vinda ali.
Talvez por isso ficasse ali paralisada, olhando sua sala com uma mesa grande com poucos papeis em cima, uma parede à sua direita vazia, com um sofá confortável embaixo, na outra parede, à sua esquerda, uma estante lotada de caixas coloridas contendo os perfis de seus pacientes, àquela altura com o Démission contendo 30 internos, e pastas vazias, já que havia destruído toda a obra de Cláudio, que não fizera bem o seu trabalho em conhecer seus pacientes.
Se Catrina havia feito à coisa certa, ela só ia perceber no futuro, que ela esperava nunca chegar.
Hospital Psiquiátrico Démission.
01 de abril, 15h00min.
O dia correu feito uma gazela, Catrina só se ateve a hora quando sentiu o cheiro de linóleo, um tipo de tecido impermeável feito de juta e untado com óleo de linhaça e cortiça em pó, usado no revestimento de pavimentos, chegar até seu olfato. Catrina então se levantou e seguiu o cheiro até a sala lúdica, por um piso que parecia estar sendo limpo, onde encontrou Marcello Tognolo, vinte e sete anos, enfermeiro de mais de 1.90, encorpado, contracenando com a esmirrada enfermeira Thaís Takawada, que afastava quadros por cores.
— Por que por cores Thaís? — foi o que Catrina quis saber.
E a voz dela paralisou os dois.
— As cores eram importantes para